
| D.E. Publicado em 10/11/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, nego provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0010920-98.2014.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Cuida-se de ação proposta em 24/11/2014 com vistas ao restabelecimento do pagamento de benefício assistencial, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, e condenação do réu a anular débito previdenciário relativo ao período de 28/09/2007 a 31/08/2014.
Documentos acostados à exordial (fls. 14-61).
Deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 76 v.).
Decisão antecipatória da tutela, na qual foi determinado que o réu se abstivesse de realizar quaisquer cobranças pelo suposto recebimento indevido do benefício de amparo social pela parte autora (fls. 76-78).
Citação, em 13/05/2015 (fl. 81).
Laudo de estudo socioeconômico (fls. 110-112).
Petição da parte autora, na qual foi declinada, por ordem do Juízo a quo, a composição do núcleo familiar (fls. 121-122).
Parecer do Ministério Público Federal, opinando pelo indeferimento do pedido (fls. 128-128 v.).
A r. sentença, prolatada em 23/09/2016, julgou improcedente o pedido (fls. 131-135).
Apelação da parte autora. Pugna pela reforma integral do julgado (fls. 139-143).
Sem contrarrazões (fl. 146), subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0010920-98.2014.4.03.6183/SP
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de recurso interposto pela parte autora contra sentença que julgou improcedente pedido de restabelecimento de benefício assistencial concedido a pessoa idosa de 28/09/2007 a 31/08/2014.
O benefício de assistência social foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência em que se acham, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias. Neste aspecto está o lastro social do dispositivo inserido no artigo 203, V, da Constituição Federal, que concretiza princípios fundamentais, tais como o de respeito à cidadania e à dignidade humana, ao preceituar o seguinte:
De outro giro, os artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/93, com redação dada pela Lei 12.435, de 06 de julho de 2011, e o art. 34, da Lei 10.741 (Estatuto do Idoso), de 1º de outubro de 2003 rezam, in verbis:
O apontado dispositivo legal, aplicável ao idoso, procedeu a uma forma de limitação do mandamento constitucional, eis que conceituou como pessoa necessitada, apenas, aquela cuja família tenha renda inferior à 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, levando em consideração, para tal desiderato, cada um dos elementos participantes do núcleo familiar, exceto aquele que já recebe o benefício de prestação continuada, de acordo com o parágrafo único, do art. 34, da Lei 10.741/03.
De mais a mais, a interpretação deste dispositivo legal na jurisprudência tem sido extensiva, admitindo-se que a percepção de benefício assistencial, ou mesmo previdenciário com renda mensal equivalente ao salário mínimo, seja desconsiderada para fins de concessão do benefício assistencial previsto na Lei 8.742/93.
Ressalte-se, por oportuno, que os diplomas legais acima citados foram regulamentados pelo Decreto 6.214/07, o qual em nada alterou a interpretação das referidas normas, merecendo destacamento o art. 4º, inc. VI e o art. 19, caput e parágrafo único do referido decreto, in verbis:
A inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da mencionada Lei 8.742/93 foi arguida na ADIN nº 1.232-1/DF que, pela maioria de votos do Plenário do Supremo Tribunal Federal, foi julgada improcedente. Para além disso, nos autos do agravo regimental interposto na reclamação n.º 2303-6, do Rio Grande do Sul, interposta pelo INSS, publicada no DJ de 01/04/2005, p. 5-6, Rel. Min. Ellen Gracie, o acórdão do STF restou assim ementado:
In casu, a parte autora, nascida em 28/03/1933 (fl. 14), logrou comprovar o requisito etário, ao demonstrar possuir mais de 65 anos de idade à época da concessão do benefício (17/03/2005).
O estudo social, realizado em 18/12/2015 (fls. 110-111), revelou que a parte autora relatou que com morava com seu marido, Miguel Bispo de Jesus, 84 anos (D.N. 01/01/1930), e que o casal teve oito filhos, sendo dois falecidos.
A filha da autora que recebeu a assistente social, Valdeci Miranda, 61 anos, solteira, sem filhos, aposentada, informou à assistente social: "que não morava com os pais, apenas lhes dava um suporte, e que sua residência ficava na Rua Manoel de Andrade, 27". Os demais filhos da requerente são: Vilson, 60 anos, solteiro, autônomo, trabalha na feira do Brás e reside na mesma região; Normildes Miranda Bispo, 60 anos, solteira, reside com os pais, "trabalha como auxiliar informal numa loja do bairro temporariamente, recebendo R$ 35,00 por dia"; Normando Miranda Bispo, 59 anos de idade, "reside com a companheira, sem filhos, gesseiro autônomo, mora na Vila Constância"; Vilma, 58 anos, desquitada, dois filhos, trabalha como recepcionista, mora no Butantã, e Jairo, 57 anos, casado, possui uma filha, e reside em Guaianazes.
Também foi relatado à assistente social que no quintal existente nos fundo da casa havia um quarto, no qual ficava o genro da autora, Fauzi Antonio Curi, que foi casado com filha da requerente, e que falecera há seis anos. O genro da demandante trabalhava em uma lanchonete, sem registro em carteira. O casal teve um filho, Leonardo Miranda Bispo Curi, 28 anos de idade, vendedor, residente na casa da parte autora.
O genro e o neto da autora não podem ser considerados integrantes do seu núcleo familiar, à inteligência do disposto no § 1º do art. 20, da Lei 8.742/93, in verbis:
Não obstante, após realizado o estudo socioeconômico, por ordem do MM. Juízo a quo (fl. 120), a parte autora protocolou petição para informar os nomes dos componentes do núcleo familiar, oportunidade em que ela declarou que três filhos solteiros residiam com ela: Normildes Miranda Bispo, Normando Miranda Bispo e Valdecy Miranda Bispo, contradizendo as informações constantes em documento acostado à petição inicial, ou seja, na "Declaração da Composição do Grupo e Renda Familiar - BCP" de fls. 26-27, firmada por ocasião do pedido administrativo, e ainda, no laudo relativo ao estudo socioeconômico supracitado.
Ainda, compulsando-se os autos verifica-se que no dia 06/08/2014, aproximadamente um ano e quatro meses antes da realização do estudo socioeconômico, um representante da autarquia ré visitou o local da residência da parte autora (fls. 31-32), e conversou com a Sra. Norma Miranda Bispo, que declarou ser filha da demandante (a autora não informou possuir alguma filha com esse nome por ocasião da visita da assistente social, podendo tratar-se da mesma pessoa, a Sra. Norma e a Sra. Normildes, supracitada). A Sra. Norma informou que residiam na casa seus genitores (que são a autora e cônjuge), ela própria, que vendia cosméticos, e seus dois irmãos Vilson Miranda Bispo e Normando Miranda Bispo, que faziam "bico".
Verifica-se, portanto, que a composição do núcleo familiar da parte autora é convenientemente modificada a cada pesquisa realizada, o que impossibilita se emprestar alguma credibilidade às declarações prestadas pessoalmente pela autora e seus filhos.
Considerando-se a composição do núcleo familiar informada por petição pela parte autora (fl. 121), a renda familiar resumia-se aos proventos de aposentadoria percebidos pelo cônjuge da autora, no valor equivalente a um salário mínimo mensal, e mais o salário auferido por Normildes Miranda Bispo (R$ 35,00 por dia). As rendas dos demais componentes do núcleo familiar foram omitidas. À época o salário mínimo mensal fixado era de R$ 788,00.
De conformidade com fundamentação prévia acima, a renda de um salário mínimo mensal, proveniente de benefício previdenciário percebido pelo cônjuge da requerente, deve ser desconsiderada para fins de apuração da renda per capita.
No entanto, pesquisas realizadas no CNIS - Cadastro Nacional de Informações Sociais e não impugnadas pelas partes (fls. 150-162) demonstram que Valdecy Miranda Bispo, filha da autora, percebe, desde 13/09/2005, benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, em valor superior a um salário mínimo mensal, e que outra filha, Normildes Miranda Bispo labora (formalmente) em empresa do ramo de vestuário, desde setembro de 2015, tendo recebido nesse mês salário de R$ 1.043,42 (superior a um salário mínimo); em abril/2017 seu salário mensal era de R$ 1.258,17.
Já a despesa mensal fixa do núcleo familiar compreendia gastos com aluguel (R$ 1.570,00), alimentação (R$ 500,00), energia elétrica (R$ 259,37), água (R$ 80,42), telefone (R$ 51,35), medicamentos (R$ 183,00) totalizando R$ 2.584,14 por mês.
Verifica-se que além de não terem sido comprovados os gastos declarados com medicamentos (R$ 183,00 por mês), não restou esclarecida a razão daqueles de uso contínuo estarem sendo adquiridos em estabelecimentos privados, ao invés de ser acessada a rede pública de saúde para tanto, ou ainda, exigido judicialmente do Estado seu fornecimento gratuito.
Cumpre observar ainda que parte significativa da renda familiar mensal estaria sendo destinada ao pagamento de serviço de telefonia fixa, gasto totalmente prescindível em situação de penúria econômica extrema, e cujo valor informado à assistente social em dezembro/2015, R$ 51,35 sequer se aproxima do valor real, tendo em vista a juntada aos autos de fatura desse serviço relativa a setembro/2014, no valor de R$ 143,33.
Por fim, na casa alugada onde a autora diz residir há aproximadamente vinte e dois anos não se verificam sinais de miserabilidade: a moradia, embora seja alugada, é espaçosa ("01 sala, 03 quartos, 01 cozinha, 2 banheiros, 01 quarto nos fundos da casa, quintal), com boas condições de habitabilidade: "amplo espaço, com pintura, azulejo em alguns ambientes e móveis compatíveis".
Doravante, passo à análise dos motivos que teriam levado à cessação do pagamento do benefício, iniciado em 01/07/2004, e findo em 31/08/2013.
O cônjuge da autora da presente ação pleiteou benefício de prestação continuada ao INSS, quando já se encontrava aposentado com proventos no valor de um salário mínimo mensal (fl. 26).
Em auditoria realizada no benefício de aposentadoria supracitado pelo Monitoramento Operacional de Benefício (MOB) a autarquia previdenciária constatou, através de visita realizada no domicílio da autora e cônjuge, no dia 06/08/2014 (fls. 31-32), que ela convivia, além do marido, com a filha Valdecy Miranda Bispo, que recebia, desde 13/09/2005, benefício de aposentadoria, em valor superior a um salário mínimo mensal, e ainda, com os filhos Normaildes Miranda Bispo, Vilson Miranda Bispo e Normando Miranda Bispo, todos solteiros, maiores e capazes.
A análise da documentação acima elencada leva a conclusão de que a autarquia previdenciária agiu acertadamente ao cessar o pagamento do benefício assistencial à parte autora, porquanto se conclui que os recursos obtidos pela família da parte requerente encontravam-se suficientes para cobrir os gastos ordinários e os cuidados especiais que lhes fossem imprescindíveis, não estando configurada situação de miserabilidade.
Neste diapasão não tendo comprovado o requisito da hipossuficiência econômica quando da cessação do benefício, a parte autora não poderia ter continuado a se beneficiar do aludido direito, consequentemente não faz ela jus ao restabelecimento do benefício assistencial, devendo ser mantida a r. sentença, na íntegra.
Isso posto, nego provimento à apelação da parte autora.
É COMO VOTO.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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| Data e Hora: | 23/10/2017 18:34:43 |
