
| D.E. Publicado em 18/01/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar arguida, e, no mérito, dar provimento à apelação autárquica, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004196-37.2013.4.03.6111/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Cuida-se de ação proposta em 05/11/2013 com vistas à concessão de benefício assistencial, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal.
Documentos acostados à exordial (fls. 08-29).
Deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 134).
Mandado de constatação (fls. 136-144).
Parecer do Ministério Público Federal (fls. 167-169).
A r. sentença, prolatada em 25/11/2014, julgou procedente o pedido. Antecipados os efeitos da tutela. Determinado o pagamento do benefício desde a data do requerimento administrativo, 16/04/2012 (fl. 149). As prestações deverão ser corrigidas monetariamente de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução 134, de 21/12/2010, do Conselho da Justiça Federal, e acrescidas de juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês, calculados de forma globalizada e decrescente a partir da citação, ao teor do art. 406 do Código Civil combinado com o art. 161, § 1º, do Código Tributário; inaplicável o disposto no art. 1º-F da lei 9,494/97, para fins de atualização monetária e juros, considerando sua inconstitucionalidade reconhecida pelo E. STF. Afastada expressamente a necessidade de reexame necessário (fls. 180-183).
Apelação do INSS. Preliminarmente, requer seja a sentença submetida ao reexame necessário. No mérito, pugna pela reforma integral do julgado. Aduz que não restou atendido pela parte autora o requisito concernente à hipossuficiência, previsto no art. 20 da Lei 8.741/93. Para o caso de manutenção do decisum, requer a incidência da correção monetária e dos juros de mora observando-se o disposto no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei 11.960/09 (fls. 191-197).
Noticiado o óbito da parte autora, ocorrido em 01/04/2015 (fls. 200-201).
Deferimento do pedido de habilitação dos sucessores da autora (fls. 248-248 v.).
Com contrarrazões (fls. 204-208), subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004196-37.2013.4.03.6111/SP
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de recurso interposto pela parte ré contra sentença que julgou procedente pedido de benefício assistencial a pessoa idosa.
Quanto ao pleito de submissão do decisum ao reexame necessário, seguem as seguintes considerações:
O novo Estatuto processual trouxe inovações no tema da remessa ex officio, mais especificamente, estreitou o funil de demandas cujo transito em julgado é condicionado ao reexame pelo segundo grau de jurisdição, para tanto elevou o valor de alçada, verbis:
Convém recordar que no antigo CPC, dispensava do reexame obrigatório a sentença proferida nos casos CPC, art. 475, I e II sempre que a condenação, o direito controvertido, ou a procedência dos embargos em execução da dívida ativa não excedesse a 60 (sessenta) salários mínimos. Contrario sensu, aquelas com condenação superior a essa alçada deveriam ser enviadas à Corte de segundo grau para que pudesse receber, após sua cognição, o manto da coisa julgada.
Pois bem. A questão que se apresenta, no tema Direito Intertemporal, é de se saber se as demandas remetidas ao Tribunal antes da vigência do Novo Diploma Processual - e, consequentemente, sob a égide do antigo CPC -, vale dizer, demandas com condenações da União e autarquias federais em valor superior a 60 salários mínimos, mas inferior a 1.000 salários mínimos, se a essas demandas aplicar-se-ia o novel Estatuto e com isso essas remessas não seriam conhecidas (por serem inferiores a 1.000 SM), e não haveria impedimento - salvo recursos voluntários das partes - ao seu trânsito em julgado; ou se, pelo contrário, incidiria o antigo CPC (então vigente ao momento em que o juízo de primeiro grau determinou envio ao Tribunal) e persistiria, dessa forma, o dever de cognição pela Corte Regional para que, então, preenchida fosse a condição de eficácia da sentença.
Para respondermos, insta ser fixada a natureza jurídica da remessa oficial.
Natureza Jurídica Da Remessa Oficial
Cuida-se de condição de eficácia da sentença, que só produzirá seus efeitos jurídicos após ser ratificada pelo Tribunal.
Portanto, não se trata o reexame necessário de recurso, vez que a legislação não a tipificou com essa natureza processual.
Apenas com o reexame da sentença pelo Tribunal haverá a formação de coisa julgada e a eficácia do teor decisório.
Ao reexame necessário aplica-se o principio inquisitório (e não o principio dispositivo, próprio aos recursos), podendo a Corte de segundo grau conhecer plenamente da sentença e seu mérito, inclusive para modificá-la total ou parcialmente. Isso ocorre por não ser recurso, e por a remessa oficial implicar efeito translativo pleno, o que, eventualmente, pode agravar a situação da União em segundo grau.
Finalidades e estrutura diversas afastam o reexame necessário do capítulo recursos no processo civil.
Em suma, constitui o instituto em "condição de eficácia da sentença", e seu regramento será feito por normas de direito processual.
Direito Intertemporal
Como vimos, não possuindo a remessa oficial a natureza de recurso, na produz direito subjetivo processual para as partes, ou para a União. Esta, enquanto pessoa jurídica de Direito Público, possui direito de recorrer voluntariamente. Aqui temos direitos subjetivos processuais. Mas não os temos no reexame necessário, condição de eficácia da sentença que é.
A propósito oportuna lição de Nelson Nery Jr.:
Por consequência, como o Novo CPC modificou o valor de alçada para causas que devem obrigatoriamente ser submetidas ao segundo grau de jurisdição, dizendo que não necessitam ser confirmadas pelo Tribunal condenações da União em valores inferiores a 1.000 salários mínimos, esse preceito tem incidência imediata aos feitos em tramitação nesta Corte, inobstante remetidos pelo juízo a quo na vigência do anterior Diploma Processual.
O benefício de assistência social foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência em que se acham, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias.
Neste aspecto está o lastro social do dispositivo inserido no artigo 203, V, da Constituição Federal, que concretiza princípios fundamentais, tais como o de respeito à cidadania e à dignidade humana, ao preceituar o seguinte:
De outro giro, os artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/93, com redação dada pela Lei 12.435, de 06 de julho de 2011, e o art. 34, da Lei 10.741 (Estatuto do Idoso), de 1º de outubro de 2003 rezam, in verbis:
O apontado dispositivo legal, aplicável ao idoso, procedeu a uma forma de limitação do mandamento constitucional, eis que conceituou como pessoa necessitada, apenas, aquela cuja família tenha renda inferior à 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, levando em consideração, para tal desiderato, cada um dos elementos participantes do núcleo familiar, exceto aquele que já recebe o benefício de prestação continuada, de acordo com o parágrafo único, do art. 34, da Lei 10.741/2003.
De mais a mais, a interpretação deste dispositivo legal na jurisprudência tem sido extensiva, admitindo-se que a percepção de benefício assistencial, ou mesmo previdenciário com renda mensal equivalente ao salário mínimo, seja desconsiderada para fins de concessão do benefício assistencial previsto na Lei 8.742/93.
Ressalte-se, por oportuno, que os diplomas legais acima citados foram regulamentados pelo Decreto 6.214/07, o qual em nada alterou a interpretação das referidas normas, merecendo destacamento o art. 4º, inc. VI e o art. 19, caput e parágrafo único do referido decreto, in verbis:
A inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da mencionada Lei 8.742/93 foi arguida na ADIN nº 1.232-1/DF que, pela maioria de votos do Plenário do Supremo Tribunal Federal, foi julgada improcedente. Para além disso, nos autos do agravo regimental interposto na reclamação n.º 2303-6, do Rio Grande do Sul, interposta pelo INSS, publicada no DJ de 01.04.2005, p. 5-6, Rel. Min. Ellen Gracie, o acórdão do STF restou assim ementado:
Evidencia-se que o critério fixado pelo parágrafo 3º do artigo 20 da LOAS é o único apto a caracterizar o estado de necessidade indispensável à concessão da benesse em tela. Em outro falar, aludida situação de fato configuraria prova inconteste de necessidade do benefício constitucionalmente previsto, de modo a tornar dispensáveis elementos probatórios outros.
Assim, deflui dessa exegese o estabelecimento de presunção objetiva absoluta de estado de penúria ao idoso ou deficiente cuja partilha da renda familiar resulte para si montante inferior a 1/4 do salário mínimo.
Não se desconhece notícia constante do Portal do Supremo Tribunal Federal, de que aquela Corte, em recente deliberação, declarou a inconstitucionalidade dos dispositivos legais em voga (Plenário, na Reclamação 4374, e Recursos Extraordinários - REs 567985 e 580963, estes com repercussão geral, em 17 e 18 de abril de 2013, reconhecendo-se superado o decidido na ADI 1.232-DF), do que não mais se poderá aplicar o critério de renda per capita de ¼ do salário mínimo para fins de aferição da miserabilidade.
Em outras palavras: deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante a renda informada, caso a caso.
Inicialmente, a parte autora, nascida em 20/10/1940 (fl. 08), logrou comprovar o requisito etário, ao demonstrar possuir 73 anos de idade, já à época do aforamento da demanda.
Por sua vez, o estudo social elaborado em 05/05/2014 (fls. 137-144) revela que o núcleo familiar era constituído pela própria autora, à época com 73 anos de idade, por seu cônjuge, José Braos Martins, de 80 anos, aposentado por invalidez, e por um filho do casal, Gilberto da Silva Braos, 44 anos de idade, solteiro, desempregado.
No entanto, não subsistem nos autos elementos caracterizadores de que a autora se encontrasse em situação de absoluta miserabilidade.
Senão, vejamos
A família residia em casa própria, construída em alvenaria, com forro de madeira e piso frio; constituída por de três quartos, sala, cozinha, área de serviço, e dois banheiros, e ainda, uma edícula, tudo em bom estado de conservação.
A residência encontrava-se guarnecida com mobília e eletrodomésticos em quantidade suficiente ao bem estar da família, e em bom estado de conservação, conforme se depreende das fotografias acostadas ao mandado de constatação.
A autora informou à assistente social que a renda familiar resumia-se aos proventos de aposentadoria do seu cônjuge, no valor de R$ 796,00 por mês. Por ocasião do estudo social o valor do salário-mínimo mensal estava fixado em R$ 724,00.
Já a despesa mensal do núcleo familiar compreendia gastos com mercado, açougue e padaria (R$ 450,00), energia elétrica (R$ 64,00), água (R$ 40,00), gás de cozinha (R$ 45,00), telefone (R$ 42,00), Fundo Mútuo (R$ 32,00), IPTU (R$ 300,00) e medicamentos (R$ 150,00), totalizando R$ 1.123,00.
Os comprovantes de despesa de supermercado trazidos aos autos (fls. 16-29) demonstram que o núcleo familiar tinha condições de adquirir todo tipo de alimento in natura considerado saudável (leite, frutas, legumes e verduras), e ainda, produtos supérfluos (tais como refrigerantes, refrescos em pó, mistura para bolo, leite condensado, e creme de leite), e outros, normalmente inacessíveis aos beneficiários da RPC, como carnes, peixes, biscoitos, etc.
Observo ainda que o valor gasto com pagamento de IPTU, R$ 300,00 por mês (não comprovado nos autos) não é compatível com o valor indicado no estudo social realizado em outra ação, no ano de 2010, R$ 20,00 por mês (fl. 81 v.), nem com os valores cobrados nas outras ações em trâmite perante esta Relatoria (considerando-se o padrão da residência), portanto, tendo em vista que geralmente o IPTU é parcelado em dez vezes, considerarei que tal despesa alçaria no máximo R$ 30,00 por mês; consequentemente, as despesas mensais da parte autora na realidade totalizariam aproximadamente R$ 853,00 por mês, e não R$ 1.123,00.
Quanto à alegação de desemprego do filho da autora, não foi demonstrado qualquer impedimento para o labor em relação a ele, portanto, trata-se de situação temporária. A comprovar a assertiva, pesquisa realizada no CNIS - Cadastro Nacional de Informações Sociais, que passa a integrar a presente decisão, demonstra que o filho da demandante possui vários vínculos formais de emprego com intervalos de desemprego.
Outrossim, os recursos obtidos pela família da parte requerente deveriam ser suficientes para cobrir os gastos ordinários, bem como tratamentos médicos e cuidados especiais que lhe sejam imprescindíveis, no entanto, parte da renda familiar estaria sendo destinada a gastos com telefone (R$ 45,00) e fundo mútuo (R$ 32,00), despesas essas totalmente prescindíveis em situação de penúria econômica extrema.
Por fim, in casu, a renda per capita do núcleo familiar, no valor de R$ 265,33 por mês ultrapassava o limite legal, e não se verificam outros elementos subjetivos bastantes para se afirmar que se trata de família que viveria em estado de miserabilidade.
Neste diapasão, não comprovados pela parte autora todos os requisitos necessários, não faz ela jus à concessão do benefício assistencial, devendo ser reformada a r. sentença, na íntegra.
Consoante entendimento firmado pela Terceira Seção desta Corte, deixo de condenar a parte autora ao pagamento de custas, despesas processuais e honorários advocatícios, porquanto beneficiária da assistência judiciária gratuita (TRF - 3ª Seção, AR n.º 2002.03.00.014510-0/SP, Rel. Des. Fed. Marisa Santos, j. 10.05.2006, v.u., DJU 23.06.06, p. 460).
Isso posto, rejeito a preliminar arguida, e, no mérito, dou provimento à apelação autárquica.
É COMO VOTO.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | David Diniz Dantas:10074 |
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| Data e Hora: | 12/12/2016 16:50:56 |
