
| D.E. Publicado em 24/04/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa necessária, e dar provimento à apelação autárquica, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0040917-22.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Cuida-se de ação proposta em 23/09/2013 com vistas à concessão de benefício assistencial, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal.
Documentos acostados à exordial (fls. 09-38).
Deferidos à parte autora os benefícios da justiça gratuita e concedida a tutela antecipada (fl. 44).
Estudo socioeconômico (fls. 85-87), complemento fls. 99-100.
A r. sentença, prolatada em 29/08/2017, julgou procedente o pedido. Condenou, ainda, a autarquia, ao pagamento das parcelas em atraso com correção monetária e juros de mora, além dos honorários advocatícios, a serem apurados em fase de liquidação (fls. 143-144).
Sentença submetida ao reexame necessário.
Apelação do INSS em que sustenta não ter sido comprovado o requisito da miserabilidade, pelo que requer a reforma da r. sentença. Se não for o entendimento, pugna pela alteração do termo inicial do benefício e pela observância da Lei n. 11.960/2009 no tocante à correção monetária e juros de mora.
Com contrarrazões (fls. 127-134), subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
Parecer do Ministério Público Federal, opinando pelo provimento da apelação do INSS (fls. 139-140).
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0040917-22.2017.4.03.9999/SP
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de recurso interposto pela parte ré contra sentença que julgou procedente pedido de benefício assistencial a pessoa portadora de deficiência.
Ab initio, insta salientar que em virtude da alteração legislativa decorrente da entrada em vigor do novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/15), a remessa oficial a qual foi submetida a r. sentença pelo douto Juiz a quo, não há de ser conhecida, consoante as seguintes considerações.
DA REMESSA NECESSÁRIA
O novo Estatuto processual trouxe inovações no tema da remessa ex officio, mais especificamente, estreitou o funil de demandas cujo transito em julgado é condicionado ao reexame pelo segundo grau de jurisdição, para tanto elevou o valor de alçada, verbis:
Convém recordar que no antigo CPC, dispensava do reexame obrigatório a sentença proferida nos casos CPC, art. 475, I e II sempre que a condenação, o direito controvertido, ou a procedência dos embargos em execução da dívida ativa não excedesse a 60 (sessenta) salários mínimos. Contrario sensu, aquelas com condenação superior a essa alçada deveriam ser enviadas à Corte de segundo grau para que pudesse receber, após sua cognição, o manto da coisa julgada.
Pois bem. A questão que se apresenta, no tema Direito Intertemporal, é de se saber se as demandas remetidas ao Tribunal antes da vigência do Novo Diploma Processual - e, consequentemente, sob a égide do antigo CPC -, vale dizer, demandas com condenações da União e autarquias federais em valor superior a 60 salários mínimos, mas inferior a 1.000 salários mínimos, se a essas demandas aplicar-se-ia o novel Estatuto e com isso essas remessas não seriam conhecidas (por serem inferiores a 1.000 SM), e não haveria impedimento - salvo recursos voluntários das partes - ao seu trânsito em julgado; ou se, pelo contrário, incidiria o antigo CPC (então vigente ao momento em que o juízo de primeiro grau determinou envio ao Tribunal) e persistiria, dessa forma, o dever de cognição pela Corte Regional para que, então, preenchida fosse a condição de eficácia da sentença.
Para respondermos, insta ser fixada a natureza jurídica da remessa oficial.
Natureza Jurídica Da Remessa Oficial
Cuida-se de condição de eficácia da sentença, que só produzirá seus efeitos jurídicos após ser ratificada pelo Tribunal.
Portanto, não se trata o reexame necessário de recurso, vez que a legislação não a tipificou com essa natureza processual.
Apenas com o reexame da sentença pelo Tribunal haverá a formação de coisa julgada e a eficácia do teor decisório.
Ao reexame necessário aplica-se o principio inquisitório (e não o principio dispositivo, próprio aos recursos), podendo a Corte de segundo grau conhecer plenamente da sentença e seu mérito, inclusive para modificá-la total ou parcialmente. Isso ocorre por não ser recurso, e por a remessa oficial implicar efeito translativo pleno, o que, eventualmente, pode agravar a situação da União em segundo grau.
Finalidades e estrutura diversas afastam o reexame necessário do capítulo recursos no processo civil.
Em suma, constitui o instituto em "condição de eficácia da sentença", e seu regramento será feito por normas de direito processual.
Direito Intertemporal
Como vimos, não possuindo a remessa oficial a natureza de recurso, na produz direito subjetivo processual para as partes, ou para a União. Esta, enquanto pessoa jurídica de Direito Público, possui direito de recorrer voluntariamente. Aqui temos direitos subjetivos processuais. Mas não os temos no reexame necessário, condição de eficácia da sentença que é.
A propósito oportuna lição de Nelson Nery Jr.:
Por consequência, como o Novo CPC modificou o valor de alçada para causas que devem obrigatoriamente ser submetidas ao segundo grau de jurisdição, dizendo que não necessitam ser confirmadas pelo Tribunal condenações da União em valores inferiores a 1.000 salários mínimos, esse preceito tem incidência imediata aos feitos em tramitação nesta Corte, inobstante remetidos pelo juízo a quo na vigência do anterior Diploma Processual.
O benefício de assistência social foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência em que se acham, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias. Neste aspecto está o lastro social do dispositivo inserido no artigo 203, V, da Constituição Federal, que concretiza princípios fundamentais, tais como o de respeito à cidadania e à dignidade humana, ao preceituar o seguinte:
De outro giro, os artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/93, com redação dada pela Lei 12.435, de 06 de julho de 2011, e o art. 34, da Lei 10.741 (Estatuto do Idoso), de 1º de outubro de 2003 rezam, in verbis:
O apontado dispositivo legal, aplicável ao idoso, procedeu a uma forma de limitação do mandamento constitucional, eis que conceituou como pessoa necessitada, apenas, aquela cuja família tenha renda inferior à 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, levando em consideração, para tal desiderato, cada um dos elementos participantes do núcleo familiar, exceto aquele que já recebe o benefício de prestação continuada, de acordo com o parágrafo único, do art. 34, da Lei 10.741/03.
De mais a mais, a interpretação deste dispositivo legal na jurisprudência tem sido extensiva, admitindo-se que a percepção de benefício assistencial, ou mesmo previdenciário com renda mensal equivalente ao salário mínimo, seja desconsiderada para fins de concessão do benefício assistencial previsto na Lei 8.742/93.
Ressalte-se, por oportuno, que os diplomas legais acima citados foram regulamentados pelo Decreto nº 6.214/07, o qual em nada alterou a interpretação das referidas normas, merecendo destacamento o art. 4º, inc. VI e o art. 19, caput e parágrafo único do referido decreto, in verbis:
A inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da mencionada Lei 8.742/93 foi arguida na ADIN nº 1.232-1/DF que, pela maioria de votos do Plenário do Supremo Tribunal Federal, foi julgada im procedente. Para além disso, nos autos do agravo regimental interposto na reclamação n.º 2303-6, do Rio Grande do Sul, interposta pelo INSS, publicada no DJ de 01.04.2005, p. 5-6, Rel. Min. Ellen Gracie, o acórdão do STF restou assim ementado:
Em outras palavras: deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante a renda informada, caso a caso.
Quanto à alegada incapacidade, foi decretada a interdição por sentença, nos autos do processo n. 0000860-78.2012.8.26.0584.
Infere-se do laudo médico de fls. 17/18 (prova emprestada da ação de interdição) que o demandante, nascido aos 29/06/1991, é portador de transtorno mental não especificado devido a uma lesão e disfunção cerebral e a uma doença física, epilepsia convulsiva e retardo mental moderado, doenças que o incapacitam de forma total e permanente para o trabalho e para os atos da vida civil.
Por sua vez, o estudo social concernente à visita realizada em 01/07/2016 (fls. 73-75), e seu complemento (fls. 99/100) revelam que o autor residia com sua genitora, Marilda de Assis da Silva, pensionista, do lar, 53 anos de idade (D.N. 22/05/1963).
O núcleo familiar residia em casa cedida pelo avô materno, com 7 cômodos: 1 suíte, 2 quartos, sala, cozinha, banheiro e lavanderia, construídos em alvenaria, em razoável estado de conservação, equipada com telefone e utilitários necessários a vida diária.
A família sobrevive da pensão que a genitora recebe do Sr. Waldemir Tavares da Silva, o qual não é o pai do autor, no valor de um salário mínimo.
De outro lado, a despesa mensal fixa do núcleo familiar compreendia gastos, com luz (R$ 213,00), água (R$ 35,00), gás (R$ 55,00), alimentação (500,00), telefone (R$ 75,00), internet (R$ 50,00), e IPTU (R$ 40,00 mês), que totalizavam R$ 968,00 ao mês.
Na área externa havia um carro da marca Chevrolet tipo Chevete estacionado que pertence ao avô materno, porém está quebrado.
Verifica-se que a família possui gastos excessivos com luz, telefone e alimentação, totalmente incompatíveis com a renda dos integrantes das classes sociais a que de fato se destina o benefício sub judice.
Outrossim, também não restou esclarecida a razão de a mãe não acionar o pai judicialmente na busca de alimentos.
Colhe-se do CNIS que o pai possui vínculo empregatício ativo.
À luz do princípio da subsidiariedade, não cabe ao Estado substituir as pessoas em suas respectivas obrigações legais.
Sendo assim, não há, nos autos, elementos o bastante para se afirmar que se trata de família que vive em estado de miserabilidade, ao contrário: verifica-se, in casu, que os recursos obtidos pela família da parte requerente, que deveriam ser suficientes para cobrir os gastos ordinários, bem como tratamentos médicos e cuidados especiais que lhe sejam imprescindíveis.
Ademais, a renda per capita do núcleo familiar ultrapassava sobremaneira o limite legal, e não se verificam outros elementos subjetivos bastantes para se afirmar que se trata de família que viveria em estado de miserabilidade.
Cabe lembrar que a concessão de benefício assistencial não tem caráter de complementação de renda familiar, o que, por certo, traria distorção ao propósito da instituição do benefício no universo da assistência social.
Neste diapasão, não comprovados pela parte autora os requisitos legais necessários, não faz ela jus à concessão do benefício assistencial, tornando imperiosa a reforma da r. sentença, na íntegra.
Por conseguinte, impõe-se a cassação da tutela jurisdicional deferida pelo r. Juízo de Primeira Instância na r. sentença.
Com relação aos valores recebidos pela parte autora, o Colendo Supremo Tribunal Federal decidiu no sentido de ser desnecessária a restituição dos valores recebidos de boa fé, mediante decisão judicial, devido ao seu caráter alimentar, em razão do princípio da irrepetibilidade dos alimentos, conforme aresto abaixo transcrito. Confira-se:
Isso posto, não conheço da remessa necessária, e dou provimento à apelação autárquica. Tutela antecipada revogada.
É COMO VOTO.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 09/04/2018 19:29:07 |
