
| D.E. Publicado em 14/08/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa necessária, dar provimento à apelação autárquica, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0037924-06.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Cuida-se de ação previdenciária proposta em 11/06/2013 com vistas à concessão de benefício assistencial, previsto no inciso V, do artigo 203 da Constituição Federal.
Documentos acostados à exordial (fls. 13-33).
Citação, em 22/10/2013 (fl. 37 v.).
Cota do Ministério Público do Estado de São Paulo (fl. 64).
Deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 66).
Estudo socioeconômico (fls. 77-89).
Laudo médico pericial (fls. 100-110).
A r. sentença, prolatada em 27/01/2016, julgou procedente o pedido, condenando o réu ao pagamento do benefício, no valor de um salário mínimo mensal, desde a data do requerimento administrativo, 27/08/2012 (fls. 16/17). Antecipados os efeitos jurídicos da tutela. Sentença submetida ao reexame necessário (fls. 123-131).
Embargos de declaração opostos pelo réu (fls. 139-144), aos quais foi negado provimento (fl. 145).
Apelação do INSS. No mérito, pugna pela reforma integral do julgado, por não ter sido preenchido um dos requisitos essenciais para a obtenção do benefício, o da hipossuficiência (fls. 146-149).
Parecer do Ministério Público do Estado de São Paulo (fls. 153-156), opinando pelo desprovimento do recurso autárquico.
Sem contrarrazões (fl. 151), subiram os autos a este Tribunal, sobrevindo parecer do Ministério Público Federal, que opinou pelo desprovimento do recurso autárquico (fls. 159-160).
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0037924-06.2017.4.03.9999/SP
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Ab initio, insta salientar que em virtude da alteração legislativa decorrente da entrada em vigor do novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/15), a remessa oficial a qual foi submetida a r. sentença pelo douto Juiz a quo, não há de ser conhecida, consoante as seguintes considerações.
DA REMESSA NECESSÁRIA
O novo Estatuto processual trouxe inovações no tema da remessa ex officio, mais especificamente, estreitou o funil de demandas cujo transito em julgado é condicionado ao reexame pelo segundo grau de jurisdição, para tanto elevou o valor de alçada, verbis:
Convém recordar que no antigo CPC, dispensava do reexame obrigatório a sentença proferida nos casos CPC, art. 475, I e II sempre que a condenação, o direito controvertido, ou a procedência dos embargos em execução da dívida ativa não excedesse a 60 (sessenta) salários mínimos. Contrario sensu, aquelas com condenação superior a essa alçada deveriam ser enviadas à Corte de segundo grau para que pudesse receber, após sua cognição, o manto da coisa julgada.
Pois bem. A questão que se apresenta, no tema Direito Intertemporal, é de se saber se as demandas remetidas ao Tribunal antes da vigência do Novo Diploma Processual - e, consequentemente, sob a égide do antigo CPC -, vale dizer, demandas com condenações da União e autarquias federais em valor superior a 60 salários mínimos, mas inferior a 1.000 salários mínimos, se a essas demandas aplicar-se-ia o novel Estatuto e com isso essas remessas não seriam conhecidas (por serem inferiores a 1.000 SM), e não haveria impedimento - salvo recursos voluntários das partes - ao seu trânsito em julgado; ou se, pelo contrário, incidiria o antigo CPC (então vigente ao momento em que o juízo de primeiro grau determinou envio ao Tribunal) e persistiria, dessa forma, o dever de cognição pela Corte Regional para que, então, preenchida fosse a condição de eficácia da sentença.
Para respondermos, insta ser fixada a natureza jurídica da remessa oficial.
Natureza Jurídica Da Remessa Oficial
Cuida-se de condição de eficácia da sentença, que só produzirá seus efeitos jurídicos após ser ratificada pelo Tribunal.
Portanto, não se trata o reexame necessário de recurso, vez que a legislação não a tipificou com essa natureza processual.
Apenas com o reexame da sentença pelo Tribunal haverá a formação de coisa julgada e a eficácia do teor decisório.
Ao reexame necessário aplica-se o principio inquisitório (e não o principio dispositivo, próprio aos recursos), podendo a Corte de segundo grau conhecer plenamente da sentença e seu mérito, inclusive para modificá-la total ou parcialmente. Isso ocorre por não ser recurso, e por a remessa oficial implicar efeito translativo pleno, o que, eventualmente, pode agravar a situação da União em segundo grau.
Finalidades e estrutura diversas afastam o reexame necessário do capítulo recursos no processo civil.
Em suma, constitui o instituto em "condição de eficácia da sentença", e seu regramento será feito por normas de direito processual.
Direito Intertemporal
Como vimos, não possuindo a remessa oficial a natureza de recurso, na produz direito subjetivo processual para as partes, ou para a União. Esta, enquanto pessoa jurídica de Direito Público, possui direito de recorrer voluntariamente. Aqui temos direitos subjetivos processuais. Mas não os temos no reexame necessário, condição de eficácia da sentença que é.
A propósito oportuna lição de Nelson Nery Jr.:
Por consequência, como o Novo CPC modificou o valor de alçada para causas que devem obrigatoriamente ser submetidas ao segundo grau de jurisdição, dizendo que não necessitam ser confirmadas pelo Tribunal condenações da União em valores inferiores a 1.000 salários mínimos, esse preceito tem incidência imediata aos feitos em tramitação nesta Corte, inobstante remetidos pelo juízo a quo na vigência do anterior Diploma Processual.
Passo ao julgamento do mérito.
Trata-se de recurso interposto pelo INSS, contra sentença que julgou procedente pedido de benefício assistencial a pessoa portadora de deficiência.
O benefício de assistência social foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência em que se acham, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias. Neste aspecto está o lastro social do dispositivo inserido no artigo 203, V, da Constituição Federal, que concretiza princípios fundamentais, tais como o de respeito à cidadania e à dignidade humana, ao preceituar o seguinte:
De outro giro, os artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/93, com redação dada pela Lei 12.435, de 06 de julho de 2011, e o art. 34, da Lei 10.741 (Estatuto do Idoso), de 1º de outubro de 2003 rezam, in verbis:
O apontado dispositivo legal, aplicável ao idoso, procedeu a uma forma de limitação do mandamento constitucional, eis que conceituou como pessoa necessitada, apenas, aquela cuja família tenha renda inferior à 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, levando em consideração, para tal desiderato, cada um dos elementos participantes do núcleo familiar, exceto aquele que já recebe o benefício de prestação continuada, de acordo com o parágrafo único, do art. 34, da Lei 10.741/03.
De mais a mais, a interpretação deste dispositivo legal na jurisprudência tem sido extensiva, admitindo-se que a percepção de benefício assistencial, ou mesmo previdenciário com renda mensal equivalente ao salário mínimo, seja desconsiderada para fins de concessão do benefício assistencial previsto na Lei 8.742/93.
Ressalte-se, por oportuno, que os diplomas legais acima citados foram regulamentados pelo Decreto nº 6.214/07, o qual em nada alterou a interpretação das referidas normas, merecendo destacamento o art. 4º, inc. VI e o art. 19, caput e parágrafo único do referido decreto, in verbis:
A inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da mencionada Lei 8.742/93 foi arguida na ADIN nº 1.232-1/DF que, pela maioria de votos do Plenário do Supremo Tribunal Federal, foi julgada im procedente. Para além disso, nos autos do agravo regimental interposto na reclamação n.º 2303-6, do Rio Grande do Sul, interposta pelo INSS, publicada no DJ de 01.04.2005, p. 5-6, Rel. Min. Ellen Gracie, o acórdão do STF restou assim ementado:
Em outras palavras: deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante a renda informada, caso a caso.
Na hipótese enfocada, depreende-se do laudo médico relativo a perícia realizada em 31/03/2015 (fls. 100-110) que a parte autora é portadora "de surdez bilateral, com prejuízo no dialogo e/ou conversação."
Ressalte-se que, embora a perícia médica tenha concluído que o requerente encontrava-se incapacitado de forma total e permanente para o exercício de atividade laboral, é cediço que o julgador não está adstrito apenas à prova pericial para a formação de seu convencimento, podendo decidir contrariamente às conclusões técnicas, com amparo em outros indicadores vislumbrados nos autos, in casu, o fato da família do autor exercer atividade rurícola (plantação de café), na qual a patologia do qual o autor é portador não interferiria se o mesmo a ela pretendesse se ativar. Assim, considerando, além das conclusões da perícia médica, a atividade profissional familiar, e também a idade do requerente (nascido em 19/07/1977), e sua escolaridade ("5ª Série"), não vislumbro a incapacidade absoluta do autor para o trabalho.
Logo, é de se concluir que a parte autora não preenche o requisito da incapacidade, nos moldes do quanto exigido na legislação de regência.
Por sua vez, o estudo social, com laudo elaborado em 11/11/2014 (fls. 77-89), revela que o núcleo familiar era constituído pelo próprio autor, com 37 anos de idade (D.N.: 16/07/1977), por seus genitores, Alice Fernandes de Almeida, 54 anos, do lar, e José Fogaça de Almeida, 58 anos, lavrador, e pelo irmão, Giovani Fogaça de Almeida, 29 anos.
A família residia em casa própria, construída em alvenaria, com forro de madeira e piso frio, constituída por três quartos, uma sala, cozinha, banheiro, varanda e garagem.
A residência encontrava-se guarnecida com mobília em bom estado de conservação.
Segundo o laudo social a renda familiar advinha exclusivamente do trabalho desempenhado pelo genitor na lavoura de café (safra sazonal de café), tendo sido declarada a renda total mensal de R$ 500,00, e a renda per capita, no valor de R$ 125,00 por mês.
Já a despesa mensal do núcleo familiar compreendia gastos com alimentação (R$ 350,00), energia elétrica (R$ 30,30), e água encanada (R$ 56,89), totalizando R$ 437,19 por mês.
Entretanto, depreende-se das pesquisas realizadas no Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, e não impugnadas pelas partes (fls. 119-122 e fls. 166-174), que o irmão do demandante, Giovanni Fogaça de Almeida, auferia renda no valor de R$ 1.864,64 por ocasião do pedido administrativo (Agosto/2012), e a partir de então continuou laborando com salários que variaram de R$ 991,34 a R$ 2.631,40 por mês.
Outrossim, verifica-se que, a partir de 08/01/2016, o genitor do autor passou a perceber aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo mensal, que, consoante pontuado acima, não pode ser considerada para apuração da renda per capita.
Constata-se que in casu, a real renda per capita do núcleo familiar. ultrapassava o limite legal, na época, R$ 181,00, e não se verificam outros elementos subjetivos bastantes para se afirmar que se trata de família que viveria em estado de miserabilidade, vez que o valor total das despesas declaradas ficava muito aquém do valor da renda familiar, sendo bastante expressivo o superávit orçamentário.
Também merece relevo o fato de a família do autor ser proprietária de dois imóveis: 1º) um lote de terreno de nº 15, da quadra 002, com área de 150,10 m2, com frente para a rua Jorge de Oliveira, existindo no referido terreno uma casa residencial de tijolos e coberta com telhas, emplacada sob o nº 305, com área construída de 105 m2, localizado na Vila São Salvador, Município de Itaí (fls. 26-29) e, 2º) uma gleba de terras com área de mais ou menos sete hectares e oitenta e sete ares (7,87 ha), situada no imóvel denominado Rincão da Lagoa, no Município de Itaí (fls. 30-33).
Sendo assim, os recursos obtidos pela família da parte requerente aparentemente eram suficientes para cobrir os gastos ordinários, bem como tratamentos médicos e cuidados especiais que lhes fossem imprescindíveis.
Neste diapasão, não comprovados pela parte autora os requisitos legais necessários, não faz ela jus à concessão do benefício assistencial, tornando imperiosa a reforma da r. sentença, na íntegra.
Por conseguinte, impõe-se a cassação da tutela jurisdicional deferida pelo r. Juízo de Primeira Instância.
Isso posto, não conheço da remessa necessária e dou provimento à apelação autárquica. Tutela antecipada revogada.
É COMO VOTO.
DAVID DANTAS
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| Data e Hora: | 30/07/2018 16:55:32 |
