
| D.E. Publicado em 10/05/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar arguida, e no mérito, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007604-70.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Cuida-se de ação proposta em 21/05/2013 com vistas à concessão de benefício assistencial, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal.
Documentos acostados à exordial (fls. 12-23).
Deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 54).
Citação, em 25/03/2014 (fl. 54).
Estudo socioeconômico (fls. 63-67).
A r. sentença, prolatada em 30/03/2016, julgou improcedente o pedido (fls. 120-123).
Apelação da parte autora. Preliminarmente, aduz a ocorrência de cerceamento de defesa. No mérito, pugna pela reforma integral do julgado (fls. 127-145).
Com contrarrazões (fl. 149-150), subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007604-70.2017.4.03.9999/SP
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de recurso interposto pela parte autora contra sentença que julgou improcedente pedido de benefício assistencial a pessoa portadora de deficiência.
Inicialmente, a análise da matéria preliminar.
Quanto à alegação de cerceamento de defesa por ausência de perícia médica, entendo que os requisitos necessários à obtenção do benefício assistencial devem ser cumulativamente atendidos, de tal sorte que a não-observância de um deles (in casu, a hipossuficiência da parte autora e de seu núcleo familiar) prejudica a análise do pedido relativamente à exigência subsequente. Não se há falar em cerceamento de defesa ou de omissão do julgado. Pela mesma razão, indefiro a conversão do julgamento em diligência para realização de exames médicos complementares e o pleito de expedição de ofícios para os hospitais e prefeituras indicadas, bem como para o INSS, para fornecimento de documentação médica da parte autora, ressaltando que tal providência caberia inicialmente à parte autora. Somente com a comprovação da impossibilidade de obtenção dos documentos pelo interessado tal responsabilidade poderia ser transferida ao Juízo da ação.
Também não procede alegação do estudo social estar incompleto, porquanto a parte autora especificou o valor das despesas que julgou ser mais relevantes (energia elétrica e medicamentos) e informou que o restante da renda familiar era utilizada "para os demais itens de sobrevivência" (g.n.). Assim, basta descontar-se da renda familiar as despesas de energia elétrica e medicamentos para concluir-se que o valor sobejante (superior a dois salários mínimos) era exaurido com despesas essenciais, quais sejam, alimentação, água e gás. Em suma, restou plenamente esclarecido o valor dispendido pela parte autora com despesas essenciais à sobrevivência digna.
Por fim, incabível o pleito de declaração de nulidade da sentença e retorno do feito à Vara de origem para que seja realizada audiência de instrução para a oitiva de testemunhas.
Face ao exposto, rejeito a preliminar arguida.
O benefício de assistência social foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência em que se acham, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias. Neste aspecto está o lastro social do dispositivo inserido no artigo 203, V, da Constituição Federal, que concretiza princípios fundamentais, tais como o de respeito à cidadania e à dignidade humana, ao preceituar o seguinte:
De outro giro, os artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/93, com redação dada pela Lei 12.435, de 06 de julho de 2011, e o art. 34, da Lei 10.741 (Estatuto do Idoso), de 1º de outubro de 2003 rezam, in verbis:
O apontado dispositivo legal, aplicável ao idoso, procedeu a uma forma de limitação do mandamento constitucional, eis que conceituou como pessoa necessitada, apenas, aquela cuja família tenha renda inferior à 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, levando em consideração, para tal desiderato, cada um dos elementos participantes do núcleo familiar, exceto aquele que já recebe o benefício de prestação continuada, de acordo com o parágrafo único, do art. 34, da Lei 10.741/03.
De mais a mais, a interpretação deste dispositivo legal na jurisprudência tem sido extensiva, admitindo-se que a percepção de benefício assistencial, ou mesmo previdenciário com renda mensal equivalente ao salário mínimo, seja desconsiderada para fins de concessão do benefício assistencial previsto na Lei 8.742/93.
Ressalte-se, por oportuno, que os diplomas legais acima citados foram regulamentados pelo Decreto nº 6.214/07, o qual em nada alterou a interpretação das referidas normas, merecendo destacamento o art. 4º, inc. VI e o art. 19, caput e parágrafo único do referido decreto, in verbis:
A inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da mencionada Lei 8.742/93 foi arguida na ADIN nº 1.232-1/DF que, pela maioria de votos do Plenário do Supremo Tribunal Federal, foi julgada im procedente. Para além disso, nos autos do agravo regimental interposto na reclamação n.º 2303-6, do Rio Grande do Sul, interposta pelo INSS, publicada no DJ de 01.04.2005, p. 5-6, Rel. Min. Ellen Gracie, o acórdão do STF restou assim ementado:
Evidencia-se que o critério fixado pelo parágrafo 3º do artigo 20 da LOAS é o único apto a caracterizar o estado de necessidade indispensável à concessão da benesse em tela. Em outro falar, aludida situação de fato configuraria prova inconteste de necessidade do benefício constitucionalmente previsto, de modo a tornar dispensáveis elementos probatórios outros.
Assim, deflui dessa exegese o estabelecimento de presunção objetiva absoluta de estado de penúria ao idoso ou deficiente cuja partilha da renda familiar resulte para si montante inferior a 1/4 do salário mínimo.
Não se desconhece notícia constante do Portal do Supremo Tribunal Federal, de que aquela Corte, em recente deliberação, declarou a inconstitucionalidade dos dispositivos legais em voga (Plenário, na Reclamação 4374, e Recursos Extraordinários - REs 567985 e 580963, estes com repercussão geral, em 17 e 18 de abril de 2013, reconhecendo-se superado o decidido na ADI 1.232-DF), do que não mais se poderá aplicar o critério de renda per capita de ¼ do salário mínimo para fins de aferição da miserabilidade.
Também restou consolidado no colendo Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que a comprovação do requisito da renda familiar per capita não-superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo não exclui outros fatores que tenham o condão de aferir a hipossuficiência econômica da parte:
Em outras palavras: deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante a renda informada, caso a caso.
In casu, não subsistem nos autos elementos caracterizadores de que se encontrasse em situação de miserabilidade.
Senão, vejamos.
Na hipótese enfocada, o laudo socioeconômico elaborado em 24/11/2014 (fls. 63-67) revela que o núcleo familiar era formado pelo próprio autor, 52 anos de idade à época (DN 20/08/1961), diarista autônomo, e sua companheira, Zilda Milani (DN 12/01/1956), empregada em um canil.
A família residia em casa cedida ("Conseguiram graças á amizade com o proprietário morar na casa onde vivem... e cuidam para que outros não façam uso inadequado á casa"), construída em alvenaria, "casa sem forro, com chão de cerâmica vitrificada, em condomínio rural, distante do centro da cidade, e que o acesso á ele ainda não foi asfaltado. No condomínio tudo é asfaltado, porém não existe transporte coletivo. O casal usa bicicleta para se dirigir a cidade. A casa possui dois quartos, banheiro, sala e cozinha. Todos os cômodos são amplos e arejados."
A casa encontrava-se guarnecida com a seguinte mobília e eletrodomésticos: na sala, dois sofás e cadeiras de armar, um rack e dois televisores de 29 polegadas; nos quartos existiam camas de casal e armário; no quarto do casal ainda havia mais um aparelho televisor e ar condicionado; na cozinha havia fogão, geladeira e uma mesa com cadeiras.
O autor e sua companheira possuíam telefones celulares.
A renda familiar era constituída pela renda percebida pelo requerente, que trabalhava como diarista em duas chácaras, fazendo jardinagem e cuidando de cães, no valor de R$ 1.000,00 por mês, e pelo salário auferido pela companheira do autor, que laborava num canil existente no condomínio no qual residiam, no valor de um salário-mínimo mensal. Por ocasião do estudo social o valor do salário-mínimo mensal estava fixado em R$ 724,00.
No entanto, pesquisas realizadas pelo réu no CNIS - Cadastro Nacional de Informações Sociais, e no sistema PLENUS (fls. 87-102), demonstram que não é verídica a informação prestada à assistente social, no tocante a renda familiar: por ocasião do estudo social (Novembro/2014), a companheira do requerente percebia salário de R$ 1.494,90 por mês, ou seja, praticamente o dobro do valor declarado à assistente social. Ainda, verifica-se que no mês supracitado o autor recebeu R$ 724,00, a título de benefício de auxílio-doença. Consequentemente, a renda familiar do autor totalizava R$ 2.218,90.
Quanto à despesa mensal declarada, compreendia gastos com energia elétrica (R$ 100,00) e farmácia (R$ 60,00), totalizando R$ 160,00 por mês.
O demandante asseverou que o restante da renda da família era consumida pelos demais itens de sobrevivência (fl. 65).
Conclui-se, portanto, que se descontando da renda familiar (R$ 2.218.90), as despesas especificadas de energia elétrica e farmácia (R$ 160,00), o núcleo familiar ainda dispunha de R$ 2.058,90 para as demais despesas essenciais cujos valores não foram declarados (alimentação, água e gás), valor esse que pode ser considerando exorbitante considerado o parâmetro objetivo determinado legalmente para obtenção do benefício em questão, ¼ do salário mínimo.
Em suma, a renda per capita do núcleo familiar, no valor de aproximadamente R$ 1.109,45 por mês, ultrapassava sobremaneira o limite legal, e não se verificam outros elementos subjetivos bastantes para se afirmar que se trata de família que viveria em estado de miserabilidade.
Frise-se que o requerente foi surpreendido pela assistente social "visivelmente alcoolizado", ao lado de seis latas de cerveja, produto que, além de supérfluo, é inacessível aos integrantes das famílias elegíveis a percepção de qualquer benefício assistencial. Outrossim, o apelante informou à assistente social que não recebia qualquer tipo de ajuda estatal, de instituições ou de parentes e amigos para manter-se, porque "Não é necessário"; restando demonstrado que a parte autora tem todas suas necessidades básicas supridas, não estando configurada situação de miserabilidade.
Logo, é de se concluir que a parte autora não tem direito ao amparo assistencial, uma vez que não preenche o requisito da hipossuficiênica, nos moldes do quanto exigido na legislação de regência.
Neste diapasão, não comprovados pela parte autora todos os requisitos necessários, não faz ela jus à concessão do benefício assistencial, devendo ser mantida a r. sentença, na íntegra.
Isso posto, rejeito a preliminar arguida e, no mérito, nego provimento à apelação da parte autora.
É COMO VOTO.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 25/04/2017 17:03:47 |
