
| D.E. Publicado em 24/04/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0041101-12.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Cuida-se de ação proposta em 25/06/2013 com vistas à concessão de benefício assistencial, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal.
Documentos acostados à exordial (fls. 13-39).
Deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 40).
Citação, em 20/08/2013 (fl. 44).
Estudo socioeconômico (fls. 88-89).
Laudo médico elaborado por perito judicial (fls. 104-105).
Parecer do Ministério Público do Estado de São Paulo (fls. 128-130).
A r. sentença, prolatada em 11/02/2016, julgou improcedente o pedido (fls. 131-135).
Apelação da parte autora, pela reforma integral do julgado (fls. 140-145).
Sem contrarrazões (fl. 150), subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
Parecer do Ministério Público Federal, opinando pelo não provimento do recurso da parte autora (fls. 154-156).
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0041101-12.2016.4.03.9999/SP
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de recurso interposto pela parte autora contra sentença que julgou improcedente pedido de benefício assistencial a pessoa portadora de deficiência.
O benefício de assistência social foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência em que se acham, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias. Neste aspecto está o lastro social do dispositivo inserido no artigo 203, V, da Constituição Federal, que concretiza princípios fundamentais, tais como o de respeito à cidadania e à dignidade humana, ao preceituar o seguinte:
De outro giro, os artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/93, com redação dada pela Lei 12.435, de 06 de julho de 2011, e o art. 34, da Lei 10.741 (Estatuto do Idoso), de 1º de outubro de 2003 rezam, in verbis:
O apontado dispositivo legal, aplicável ao idoso, procedeu a uma forma de limitação do mandamento constitucional, eis que conceituou como pessoa necessitada, apenas, aquela cuja família tenha renda inferior à 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, levando em consideração, para tal desiderato, cada um dos elementos participantes do núcleo familiar, exceto aquele que já recebe o benefício de prestação continuada, de acordo com o parágrafo único, do art. 34, da Lei 10.741/03.
De mais a mais, a interpretação deste dispositivo legal na jurisprudência tem sido extensiva, admitindo-se que a percepção de benefício assistencial, ou mesmo previdenciário com renda mensal equivalente ao salário mínimo, seja desconsiderada para fins de concessão do benefício assistencial previsto na Lei 8.742/93.
Ressalte-se, por oportuno, que os diplomas legais acima citados foram regulamentados pelo Decreto nº 6.214/07, o qual em nada alterou a interpretação das referidas normas, merecendo destacamento o art. 4º, inc. VI e o art. 19, caput e parágrafo único do referido decreto, in verbis:
A inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da mencionada Lei 8.742/93 foi arguida na ADIN nº 1.232-1/DF que, pela maioria de votos do Plenário do Supremo Tribunal Federal, foi julgada im procedente. Para além disso, nos autos do agravo regimental interposto na reclamação n.º 2303-6, do Rio Grande do Sul, interposta pelo INSS, publicada no DJ de 01.04.2005, p. 5-6, Rel. Min. Ellen Gracie, o acórdão do STF restou assim ementado:
Evidencia-se que o critério fixado pelo parágrafo 3º do artigo 20 da LOAS é o único apto a caracterizar o estado de necessidade indispensável à concessão da benesse em tela. Em outro falar, aludida situação de fato configuraria prova inconteste de necessidade do benefício constitucionalmente previsto, de modo a tornar dispensáveis elementos probatórios outros.
Assim, deflui dessa exegese o estabelecimento de presunção objetiva absoluta de estado de penúria ao idoso ou deficiente cuja partilha da renda familiar resulte para si montante inferior a 1/4 do salário mínimo.
Não se desconhece notícia constante do Portal do Supremo Tribunal Federal, de que aquela Corte, em recente deliberação, declarou a inconstitucionalidade dos dispositivos legais em voga (Plenário, na Reclamação 4374, e Recursos Extraordinários - REs 567985 e 580963, estes com repercussão geral, em 17 e 18 de abril de 2013, reconhecendo-se superado o decidido na ADI 1.232-DF), do que não mais se poderá aplicar o critério de renda per capita de ¼ do salário mínimo para fins de aferição da miserabilidade.
Também restou consolidado no colendo Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que a comprovação do requisito da renda familiar per capita não-superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo não exclui outros fatores que tenham o condão de aferir a hipossuficiência econômica da parte:
Em outras palavras: deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante a renda informada, caso a caso.
Na hipótese enfocada, depreende-se do laudo médico relativo a perícia realizada em 27/05/2015 (fls. 104-105) que a parte autora é "(...) portadora de Esquizofrenia residual há longa data, parcialmente controlada com medicações anti-psicóticas, tendo se detectado comprometimento grave das funções conativas de memória, senso percepção, linguagem, juízo crítico e etc, (...) portanto incapaz para o trabalho, para a vida independente e para os atos da vida civil (...)" (g.n.).
Por sua vez, o estudo social elaborado em 06/11/2014 (fls. 88-89) revela que o núcleo familiar era constituído pela própria autora, à época com 65 anos de idade, incapaz, e por seu cônjuge e curador (fl. 15), Teodoro Batista da Silva, 68 anos (DN 28/10/1946), beneficiário de benefício assistencial (BCP), e dois filhos solteiros do casal, Leandro Batista da Silva, 26 anos, desempregado, e Roniel Batista da Silva, 33 anos, que "trabalha no Açougue do irmão Jose Luiz da Silva,".
A família residia em casa própria, construída em alvenaria. Também possuíam telefone fixo e celulares. Verificada a existência, no quarto dos filhos da autora (Leandro e Roniel), de aparelhagem de som de mais ou menos R$ 1.500,00 e uma TV de 42 polegadas, no valor de aproximadamente R$ 1.500,00.
Constatou-se também que Leandro possuía em seu nome duas motocicletas (CGTitan 2010 e Suzuki 125.EN), e dois automóveis modelo Fiat Uno, não obstante tenha alegado que vendeu os veículos e não transferiu a documentação, e ainda, questionado, "não divulgou o valor".
A renda familiar resumia-se ao valor do benefício assistencial (BCP - Benefício de Prestação Continuada) percebido pelo cônjuge da requerente, no valor de um salário-mínimo mensal (à época R$ 724,00), e pela renda proveniente do salário percebido pelo filho Roniel, cujo valor não foi declarado.
Ressalto que, consoante fundamentado acima, a renda de um salário mínimo percebida pela esposa do autor deve ser desconsiderada para fins de apuração da renda per capita.
Já a despesa mensal do núcleo familiar compreendia gastos com alimentação (R$ 700,00), energia elétrica (R$ 80,00), água (R$ 120,00), medicamentos (R$ 300,00), totalizando R$ 1.200,00 por mês.
Verifica-se que o valor gasto com alimentação, R$ 700,00 por mês, para apenas duas pessoas, quando o salário-mínimo mensal estabelecido era de R$ 788,00, por si só demonstra que a família possuía hábitos de consumo totalmente incompatíveis com a renda dos integrantes das classes sociais a que de fato se destina o benefício sub judice, onde se encontram pessoas em situação de vulnerabilidade social tal que seus itens de consumo não superam aqueles que compõem a cesta básica.
O valor informado (R$ 120,00) relativo à despesa de fornecimento de água certamente refere-se ao consumo de todos os andares do imóvel, o qual é habitado pelo núcleo familiar de um dos filhos da autora, haja vista a média de 43 m2 exibida na fatura juntada aos autos (fl. 39).
Ademais, além de não terem sido comprovados os gastos declarados com medicamentos (R$ 300,00 por mês), também não restou esclarecida a razão daqueles de uso contínuo estarem sendo adquiridos em estabelecimentos privados, ao invés de ser acessada a rede pública de saúde para tanto, ou ainda, exigido do Estado seu fornecimento gratuito.
Quanto à alegação de desemprego de um dos filhos solteiros da autora (Leandro), trata-se de pessoa jovem, estudante de Mecatrônica, e não foi demonstrado qualquer impedimento para labor em relação a ele, portanto, trata-se de situação temporária. A comprovar a assertiva, pesquisa realizada no sistema CNIS - Cadastro Nacional de Informações Sociais e coligida aos autos pelo réu (fls. 118-124) demonstra que o referido filho da demandante possui vários vínculos formais de emprego com pequenos intervalos de desemprego, e que poucos meses após a realização da perícia socioeconômica (em Março/2015) já se encontrava empregado, com salário médio de R$ 1.700,00 por mês.
Por fim, observo também que parte significativa da renda familiar mensal estaria sendo destinada ao pagamento de contas de telefonia fixa e de celulares e com manutenção de veículos (combustível, taxas, impostos, etc). cujos valores não foram especificados, sendo que tais gastos são totalmente prescindíveis em situação de penúria econômica extrema.
Sendo assim, não há elementos nos autos o bastante para se afirmar que se trata, a parte autora, de pessoa que viva em estado de miserabilidade, ao contrário: os recursos por ela obtidos foram suficientes para a aquisição de veículos, e de aparelhagem de som e de imagem de grande valor intrínseco, portanto, também deveriam ser suficientes para cobrir seus gastos ordinários e cuidados especiais que lhes sejam imprescindíveis.
E, se fosse verdadeira a precariedade econômica aventada na exordial, ao menos parte de tais bens já teria sido alienada.
Neste diapasão, não comprovado pela parte autora o requisito legal da hipossuficiência econômica, não faz ela jus à concessão do benefício assistencial, tornando imperiosa a manutenção da r. sentença de improcedência.
Isso posto, nego provimento à apelação da parte autora.
É COMO VOTO.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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