
| D.E. Publicado em 24/04/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0021478-25.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Cuida-se de ação proposta em 24/08/2016 com vistas à concessão de benefício assistencial, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal.
Documentos acostados à exordial (fls. 09-50).
Deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 51).
Citação, em 02/12/2016 (fls.139-140).
Laudo médico pericial (fls. 63-68).
Estudo socioeconômico (fls. 71-77).
Parecer do Ministério Público do Estado de São Paulo (fls. 110-112).
Sentença prolatada em 23/02/2017, julgando improcedente o pedido (fls. 114-117).
Apelação da parte autora. Pugna pela reforma integral do julgado (fls. 120-131).
Sem contrarrazões (fl. 142), subiram os autos a este Egrégio Tribunal, sobrevindo parecer do Ministério Público Federal, que opinou pelo desprovimento da apelação da parte autora (fls. 176-180).
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0021478-25.2017.4.03.9999/SP
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de recurso interposto pela parte autora contra sentença que julgou improcedente pedido de benefício assistencial a pessoa portadora de deficiência.
O benefício de assistência social foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência em que se acham, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias. Neste aspecto está o lastro social do dispositivo inserido no artigo 203, V, da Constituição Federal, que concretiza princípios fundamentais, tais como o de respeito à cidadania e à dignidade humana, ao preceituar o seguinte:
De outro giro, os artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/93, com redação dada pela Lei 12.435, de 06 de julho de 2011, e o art. 34, da Lei 10.741 (Estatuto do Idoso), de 1º de outubro de 2003 rezam, in verbis:
O apontado dispositivo legal, aplicável ao idoso, procedeu a uma forma de limitação do mandamento constitucional, eis que conceituou como pessoa necessitada, apenas, aquela cuja família tenha renda inferior à 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, levando em consideração, para tal desiderato, cada um dos elementos participantes do núcleo familiar, exceto aquele que já recebe o benefício de prestação continuada, de acordo com o parágrafo único, do art. 34, da Lei 10.741/03.
De mais a mais, a interpretação deste dispositivo legal na jurisprudência tem sido extensiva, admitindo-se que a percepção de benefício assistencial, ou mesmo previdenciário com renda mensal equivalente ao salário mínimo, seja desconsiderada para fins de concessão do benefício assistencial previsto na Lei 8.742/93.
Ressalte-se, por oportuno, que os diplomas legais acima citados foram regulamentados pelo Decreto nº 6.214/07, o qual em nada alterou a interpretação das referidas normas, merecendo destacamento o art. 4º, inc. VI e o art. 19, caput e parágrafo único do referido decreto, in verbis:
A inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da mencionada Lei 8.742/93 foi arguida na ADIN nº 1.232-1/DF que, pela maioria de votos do Plenário do Supremo Tribunal Federal, foi julgada im procedente. Para além disso, nos autos do agravo regimental interposto na reclamação n.º 2303-6, do Rio Grande do Sul, interposta pelo INSS, publicada no DJ de 01.04.2005, p. 5-6, Rel. Min. Ellen Gracie, o acórdão do STF restou assim ementado:
Evidencia-se que o critério fixado pelo parágrafo 3º do artigo 20 da LOAS é o único apto a caracterizar o estado de necessidade indispensável à concessão da benesse em tela. Em outro falar, aludida situação de fato configuraria prova inconteste de necessidade do benefício constitucionalmente previsto, de modo a tornar dispensáveis elementos probatórios outros.
Assim, deflui dessa exegese o estabelecimento de presunção objetiva absoluta de estado de penúria ao idoso ou deficiente cuja partilha da renda familiar resulte para si montante inferior a 1/4 do salário mínimo.
Não se desconhece notícia constante do Portal do Supremo Tribunal Federal, de que aquela Corte, em recente deliberação, declarou a inconstitucionalidade dos dispositivos legais em voga (Plenário, na Reclamação 4374, e Recursos Extraordinários - REs 567985 e 580963, estes com repercussão geral, em 17 e 18 de abril de 2013, reconhecendo-se superado o decidido na ADI 1.232-DF), do que não mais se poderá aplicar o critério de renda per capita de ¼ do salário mínimo para fins de aferição da miserabilidade.
Também restou consolidado no colendo Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que a comprovação do requisito da renda familiar per capita não superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo não exclui outros fatores que tenham o condão de aferir a hipossuficiência econômica da parte:
Em outras palavras: deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante a renda informada, caso a caso.
Na hipótese enfocada, depreende-se do laudo médico-pericial elaborado em 22/09/2016 (fls. 63-68) que a parte autora é portadora de "retardo mental leve", e que a referida patologia provoca incapacidade parcial e permanente para o labor.
Entretanto, o Sr. perito esclareceu que a demandante "Pode exercer atividade braçal repetitiva (embaladeira, colhedora de fruta) sob supervisão."
Considerando-se a conclusão da perícia médica, aliada a idade da autora, que nasceu no ano de 1988 (portanto trata-se de pessoa jovem) e seu grau de instrução (afirmou ter concluído o antigo 3º ano do colegial, portanto possui ensino médio completo), conclui-se que não se trata de um caso de invalidez, mas sim de incapacidade parcial e permanente, com limitações para realizar apenas algumas espécies de atividades laborais.
Por sua vez, o estudo social, elaborado em 11/10/2016 (fls. 71-77), revela que a autora, à época com 27 anos de idade, residia com os avós maternos, Rosalina Maria da Silva, nascida em 11/12/1941, pensionista (recebe pensão decorrente de falecimento de filho), e José Soares Cardoso, nascido em 17/04/1934, aposentado.
Ressalte-se que, tanto por ocasião do pedido administrativo, em 21/01/2016 (fls. 26-27), como por ocasião da propositura da ação (fls. 02, itens 2 e 4), a parte autora informou residir apenas com o cônjuge, Vanderlei Corrêa com o qual continua formalmente casada, consoante certidão de casamento de fl.10, mas a genitora da requerente, Maria José da Silva, cujo estado civil não foi declinado, declarou à assistente social que reside na casa ao lado, e que sua filha "foi casada, mas não deu certo. Marido bebia muito e não gostava de trabalhar. Passava necessidade. Família achou melhor trazê-la de volta." Outrossim, depreende-se do parecer técnico a seguinte observação, feita pela expert: "Cabe ressaltar que faz apenas quatro semanas que a requerente passou a residir na casa dos avós, pois o marido se dispôs a realizar tratamento para dependência química e após, pretendem reatar o casamento, (...)".
A família residia em casa própria, construída em alvenaria, rebocada e pintada, constituída por seis cômodos: dois quartos, duas salas, cozinha e banheiro; com forro de madeira e telhas comuns; o piso das áreas internas da casa possuía revestimento. A casa encontra-se em região urbanizada, com saneamento e infraestrutura básica (rede de água, esgoto, energia elétrica, coleta de lixo, guias, sarjeta, calçada, iluminação pública e asfalto).
A residência encontrava-se guarnecida com todos os móveis e eletrodomésticos básicos e essenciais ao bem estar da família: na cozinha, geladeira, fogão, e mesa de seis lugares; na primeira sala, um jogo de sofás, estante e aparelho de televisão; na segunda sala, estante e tábua de passar roupas; no primeiro quarto, cama de casal, guarda-roupas, rack e televisão; no segundo quarto, colchão de casal, guarda-roupas e cômoda; no banheiro, vaso sanitário, pia e chuveiro, e na área externa, pia, fogão, mesa de quatro lugares, tanque, máquina de lavar roupas, e tanquinho elétrico.
Quanto à renda familiar, a assistente social foi informada de que a mesma resumia-se aos proventos de aposentadoria percebidos pelo avô da autora, no valor de R$ 1.350,00, e pelo benefício de pensão por morte, no valor de um salário mínimo auferido pela avó da requerente. Na época o salário mínimo mensal estava fixado em R$ 880,00 por mês.
A mãe da requerente - que residia em imóvel contíguo, no mesmo terreno, auferia benefício de pensão por morte, no valor de um salário mínimo mensal. A referida genitora, ainda jovem (nascida em 18/07/1968, fl. 158) não esclareceu a razão de não desempenhar atividade laborativa, com vistas a melhorar a condição social e financeira da família.
Ressalto que, consoante fundamentado acima, a renda de um salário mínimo percebida pela avó da autora deve ser desconsiderada para fins de apuração da renda per capita.
Considerando que a avó da parte autora auferia renda destinada exclusivamente a sua mantença, temos que os proventos auferidos pelo avô (R$ 1.525,81 por mês), que, assim como sua esposa (avó da autora), ficou informalmente responsável pela guarda da neta incapaz, destinava-se apenas à manutenção do aposentado e de sua neta, consequentemente, a renda per capita perfazia R$ 762,90 por mês.
Já a despesa mensal do núcleo familiar compreendia gastos com alimentação (R$ 800,00), energia elétrica (R$ 77,00), água (R$ 50,00), gás de cozinha (R$ 56,00), e farmácia (R$ 300,00), totalizando R$ 1.283,00 por mês.
Inicialmente, verifico que o valor gasto com alimentação, totalizando R$ 800,00 por mês, para apenas três pessoas, quando o salário-mínimo mensal estabelecido era de R$ 880,00, por si só demonstra que a família possuía hábitos de consumo totalmente incompatíveis com a renda dos integrantes das classes sociais a que de fato se destina o benefício sub judice, onde se encontram pessoas em situação de vulnerabilidade social tal que seus itens de consumo não superam aqueles que compõem a cesta básica.
Ademais, além de não terem sido comprovados os gastos declarados com medicamentos (R$ 300,00 por mês), também não restou esclarecida a razão daqueles de uso contínuo estarem sendo adquiridos em estabelecimentos privados, ao invés de ser acessada a rede pública de saúde para tanto, ou ainda, exigido do Estado, ainda que judicialmente, seu fornecimento gratuito.
Por fim, a renda per capita do núcleo familiar, no valor de R$ 762,90 por mês ultrapassava sobremaneira o limite legal (R$ 220,00), e não se verificam nestes autos outros elementos subjetivos bastantes para se afirmar que se trata de família que viveria em estado de miserabilidade.
Isso posto, nego provimento à apelação da parte autora.
É COMO VOTO.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 09/04/2018 19:25:02 |
