
| D.E. Publicado em 21/03/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação autárquica, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0043211-81.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Cuida-se de ação proposta em 20/05/2013 com vistas à concessão de benefício assistencial, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal.
Documentos acostados à exordial (fls. 11-34).
Deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 35).
Citação, em 01/08/2013 (fl. 36).
Estudo socioeconômico (fls. 88-89).
Laudo médico elaborado por jusperito (fls. 96-99).
Parecer do Ministério Público do Estado de São Paulo (fl. 104).
A r. sentença, prolatada em 23/08/2016, julgou procedente o pedido. Determinado o pagamento do benefício desde a data da citação. Quanto aos consectários legais, a fixação deve adequar-se ao novo panorama jurídico defino pelo Supremo Tribunal Federal, ao modular os efeitos da decisão proferida no julgamento das ADIs nºs 4.357 e 4.425, que, em sede de controle concentrado de constitucionalidade declarou a inconstitucionalidade por arrastamento do art. 5º da Lei 11.960/09, que dera nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, que trata sobre a correção monetária (fls. 105-108).
Apelação do INSS. No mérito, pugna pela reforma integral do julgado. Para o caso de manutenção do decisum, requer que sejam atendidos os termos da Lei 11.960/09 para os consectários legais para todo o período de cálculo dos valores liquidados, até a expedição do precatório (fls. 111-120).
Com contrarrazões (fls. 124-126), subiram os autos a esta Egrégia Corte.
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0043211-81.2016.4.03.9999/SP
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de recurso interposto pela parte ré contra sentença que julgou procedente pedido de benefício assistencial a pessoa portadora de deficiência.
O benefício de assistência social foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência em que se acham, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias. Neste aspecto está o lastro social do dispositivo inserido no artigo 203, V, da Constituição Federal, que concretiza princípios fundamentais, tais como o de respeito à cidadania e à dignidade humana, ao preceituar o seguinte:
De outro giro, os artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/93, com redação dada pela Lei 12.435, de 06 de julho de 2011, e o art. 34, da Lei 10.741 (Estatuto do Idoso), de 1º de outubro de 2003 rezam, in verbis:
O apontado dispositivo legal, aplicável ao idoso, procedeu a uma forma de limitação do mandamento constitucional, eis que conceituou como pessoa necessitada, apenas, aquela cuja família tenha renda inferior à 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, levando em consideração, para tal desiderato, cada um dos elementos participantes do núcleo familiar, exceto aquele que já recebe o benefício de prestação continuada, de acordo com o parágrafo único, do art. 34, da Lei 10.741/03.
De mais a mais, a interpretação deste dispositivo legal na jurisprudência tem sido extensiva, admitindo-se que a percepção de benefício assistencial, ou mesmo previdenciário com renda mensal equivalente ao salário mínimo, seja desconsiderada para fins de concessão do benefício assistencial previsto na Lei 8.742/93.
Ressalte-se, por oportuno, que os diplomas legais acima citados foram regulamentados pelo Decreto nº 6.214/07, o qual em nada alterou a interpretação das referidas normas, merecendo destacamento o art. 4º, inc. VI e o art. 19, caput e parágrafo único do referido decreto, in verbis:
A inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da mencionada Lei 8.742/93 foi arguida na ADIN nº 1.232-1/DF que, pela maioria de votos do Plenário do Supremo Tribunal Federal, foi julgada im procedente. Para além disso, nos autos do agravo regimental interposto na reclamação n.º 2303-6, do Rio Grande do Sul, interposta pelo INSS, publicada no DJ de 01.04.2005, p. 5-6, Rel. Min. Ellen Gracie, o acórdão do STF restou assim ementado:
Evidencia-se que o critério fixado pelo parágrafo 3º do artigo 20 da LOAS é o único apto a caracterizar o estado de necessidade indispensável à concessão da benesse em tela. Em outro falar, aludida situação de fato configuraria prova inconteste de necessidade do benefício constitucionalmente previsto, de modo a tornar dispensáveis elementos probatórios outros.
Assim, deflui dessa exegese o estabelecimento de presunção objetiva absoluta de estado de penúria ao idoso ou deficiente cuja partilha da renda familiar resulte para si montante inferior a 1/4 do salário mínimo.
Não se desconhece notícia constante do Portal do Supremo Tribunal Federal, de que aquela Corte, em recente deliberação, declarou a inconstitucionalidade dos dispositivos legais em voga (Plenário, na Reclamação 4374, e Recursos Extraordinários - REs 567985 e 580963, estes com repercussão geral, em 17 e 18 de abril de 2013, reconhecendo-se superado o decidido na ADI 1.232-DF), do que não mais se poderá aplicar o critério de renda per capita de ¼ do salário mínimo para fins de aferição da miserabilidade.
Também restou consolidado no colendo Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que a comprovação do requisito da renda familiar per capita não-superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo não exclui outros fatores que tenham o condão de aferir a hipossuficiência econômica da parte:
Em outras palavras: deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante a renda informada, caso a caso.
Na hipótese enfocada, depreende-se do laudo médico-pericial (fls. 96-99) que a parte autora, à época com 47 anos de idade, é portadora de "Hipertensão arterial sistêmica severa. As complicações da doença poderão causar incapacidades. No caso específico incapacidade de grau moderado - durante os picos hipertensivos (...)"
Em resposta aos quesitos 5 e 6, do INSS, o perito informou que trata-se de "Incapacidade parcial. Nos picos hipertensivos deve procurar tratamento emergencial até a normalização.", (g.n.), e ainda, que a referida incapacidade é temporária.
O expert informou como sendo sinal incapacitante o nível pressórico excessivo da demandante (quesito 4 do INSS), constatado até mesmo durante a perícia, a saber, "PA = 230/160 mmHg"
Depreende-se do laudo ora em análise que a incapacidade parcial e temporária da parte autora para o labor se deve fundamentalmente a questão inerente ao tratamento (aparentemente inadequado) fornecido pelo Estado, porquanto o expert asseverou, respondendo ao quesito 6 do INSS, que a doença da autora "(...) Deve ser melhor acompanhada, inclusive, no relatório da nefrologista do HR (anexados em documentos) foi salientado bem esta cobrança; não com a paciente, mas sim, de profissionais médicos por não seguirem recomendação já estabelecida por associação de medicamentos não recomendados, e o perito concluiu: "Pericianda, portadora de hipertensão arterial severa e que percebe-se um controle insatisfatório após 2013, quando foi realizada - colocação de stent para tratamento de estenose de artéria renal direita. (...)" (g.n.)
Anoto que o fato de a inaptidão da parte requerente ser temporária não impede a concessão de benefício assistencial, que também é temporário e deve ser mantido apenas enquanto presentes os requisitos necessários, devendo ser revisto a cada dois anos.
Ainda, embora tenha sido reconhecida a incapacidade para o labor como sendo parcial, a conclusão pericial conjugada com os fatores relacionados às condições pessoais da parte autora - idade (na ocasião, 47 anos), além de baixa instrução e modesta qualificação profissional, tendo desempenhado a derradeira atividade profissional como varredora de rua, que exige grande esforço físico - levam a crer que a mesma não possui condições de exercer o ofício habitual, comprometendo, inclusive, sua reinserção no mercado de trabalho, em atividades outras.
Por fim, embora a perícia médica tenha concluído que a requerente está incapacitada de forma parcial e temporária para o exercício de atividade laboral, é cediço que o julgador não está adstrito apenas à prova pericial para a formação de seu convencimento, podendo decidir contrariamente às conclusões técnicas, com amparo em outros indicadores vislumbrados nos autos, in casu, a presença de vários atestados e exames médicos (fls. 18-24 e 26-31), relativos ao período de doença aventado pela própria autora.
Por sua vez, o estudo social elaborado em 29/05/2015 (fls. 125-127), revela que o núcleo familiar era formado por 02 pessoas: a própria parte autora, 47 anos de idade, e sua filha, Jaine de Souza, 18 anos de idade, desempregada.
A família residia em casa cedida pela filha, construída em madeira, com dois cômodos, em péssimo estado de conservação, assim como os móveis encontrados na residência.
A renda familiar resumia-se aquela recebida do programa de transferência de renda denominado "Bolsa Família", no valor de R$ 70,00 por mês.
O núcleo familiar não tinha gastos com alimentação, pois recebia ajuda do setor de Assistência e Desenvolvimento Social, consubstanciada numa cesta básica de alimentos.
A despesa mensal fixa compreendia gastos apenas com gás de cozinha, no valor de R$ 57,00. Os medicamentos eram todos adquiridos no Centro de Saúde local.
Sendo assim, há elementos o bastante para se afirmar que se trata de família que vive em estado de miserabilidade. Os recursos obtidos pela família da parte requerente são insuficientes para cobrir os gastos ordinários, bem como tratamentos médicos e cuidados especiais que lhe são imprescindíveis.
E nessas condições, não é possível à parte autora ter vida digna ou, consoante assevera a Constituição Federal, permitir-lhe a necessária dignidade da pessoa humana ou o respeito à cidadania, que são, às expressas, tidos por princípios fundamentais do almejado Estado Democrático de Direito.
Portanto, positivados os requisitos legais, é de se concluir que a parte autora tem direito ao amparo assistencial.
A correção monetária e os juros moratórios incidirão nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal em vigor, por ocasião da execução do julgado.
É COMO VOTO.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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