
| D.E. Publicado em 26/07/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0028513-41.2014.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Cuida-se de ação proposta em 29/10/2012 com vistas à concessão de benefício assistencial, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal.
Documentos ofertados (fls. 22-37).
Deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 38).
Citação, em 05/11/2012 (fl. 39).
Laudo médico pericial (fls. 84-88).
A r. sentença, prolatada em 11/02/2014, julgou improcedente o pedido (fls. 101-103).
Apelação da parte autora. Pugnou pela reforma integral do julgado (fls. 107-121).
Decisão anulatória da sentença prolatada, emanada desta Corte (fls. 126-127).
Estudo socioeconômico (fls. 135-144).
Parecer do Ministério Público do Estado de São Paulo, opinando pela improcedência do pedido (fls. 154-157).
A r. sentença, prolatada em 30/09/2015, julgou improcedente o pedido da autora (fls. 160-163).
Apelação da parte autora. Pugnou pela reforma integral do julgado (fls. 165-171).
Sem contrarrazões, subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0028513-41.2014.4.03.9999/SP
VOTO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de recurso interposto pela parte autora contra sentença que julgou improcedente pedido de benefício assistencial a pessoa portadora de deficiência.
O benefício de assistência social foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência em que se acham, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias. Neste aspecto está o lastro social do dispositivo inserido no artigo 203, V, da Constituição Federal, que concretiza princípios fundamentais, tais como o de respeito à cidadania e à dignidade humana, ao preceituar o seguinte:
De outro giro, os artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/93, com redação dada pela Lei 12.435, de 06 de julho de 2011, e o art. 34, da Lei 10.741 (Estatuto do Idoso), de 1º de outubro de 2003 rezam, in verbis:
O apontado dispositivo legal, aplicável ao idoso, procedeu a uma forma de limitação do mandamento constitucional, eis que conceituou como pessoa necessitada, apenas, aquela cuja família tenha renda inferior à 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, levando em consideração, para tal desiderato, cada um dos elementos participantes do núcleo familiar, exceto aquele que já recebe o benefício de prestação continuada, de acordo com o parágrafo único, do art. 34, da Lei 10.741/03.
De mais a mais, a interpretação deste dispositivo legal na jurisprudência tem sido extensiva, admitindo-se que a percepção de benefício assistencial, ou mesmo previdenciário com renda mensal equivalente ao salário mínimo, seja desconsiderada para fins de concessão do benefício assistencial previsto na Lei 8.742/93.
Ressalte-se, por oportuno, que os diplomas legais acima citados foram regulamentados pelo Decreto nº 6.214/07, o qual em nada alterou a interpretação das referidas normas, merecendo destacamento o art. 4º, inc. VI e o art. 19, caput e parágrafo único do referido decreto, in verbis:
A inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da mencionada Lei 8.742/93 foi arguida na ADIN nº 1.232-1/DF que, pela maioria de votos do Plenário do Supremo Tribunal Federal, foi julgada im procedente. Para além disso, nos autos do agravo regimental interposto na reclamação n.º 2303-6, do Rio Grande do Sul, interposta pelo INSS, publicada no DJ de 01.04.2005, p. 5-6, Rel. Min. Ellen Gracie, o acórdão do STF restou assim ementado:
Evidencia-se que o critério fixado pelo parágrafo 3º do artigo 20 da LOAS é o único apto a caracterizar o estado de necessidade indispensável à concessão da benesse em tela. Em outro falar, aludida situação de fato configuraria prova inconteste de necessidade do benefício constitucionalmente previsto, de modo a tornar dispensáveis elementos probatórios outros.
Assim, deflui dessa exegese o estabelecimento de presunção objetiva absoluta de estado de penúria ao idoso ou deficiente cuja partilha da renda familiar resulte para si montante inferior a 1/4 do salário mínimo.
Não se desconhece notícia constante do Portal do Supremo Tribunal Federal, de que aquela Corte, em recente deliberação, declarou a inconstitucionalidade dos dispositivos legais em voga (Plenário, na Reclamação 4374, e Recursos Extraordinários - REs 567985 e 580963, estes com repercussão geral, em 17 e 18 de abril de 2013, reconhecendo-se superado o decidido na ADI 1.232-DF), do que não mais se poderá aplicar o critério de renda per capita de ¼ do salário mínimo para fins de aferição da miserabilidade.
Também restou consolidado no colendo Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que a comprovação do requisito da renda familiar per capita não-superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo não exclui outros fatores que tenham o condão de aferir a hipossuficiência econômica da parte:
Em outras palavras: deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante a renda informada, caso a caso.
Na hipótese enfocada, depreende-se do laudo médico-pericial realizado em 23/09/2013 (fls. 84-88) que a parte autora apresenta incapacidade para o labor, tendo sido considerado como fator limitante a idade da demandante: "(...) 3. HISTÓRIA Refere ser portadora de Artrite Reumatóide, por sentir dor no corpo, nas articulações e dor nos pés, Refere ter também bronquite asmática (...) 4. EXAME OBJETIVO Alterações involutivas próprias da idade, mais envelhecida que o esperado. Não há deformação articular de mãos que tipifique Artrite Reumatóide. Não há sinais de uma doença incapacitante para a atividade laboral. 5. ANÁLISE Entende este perito que não tem mais vigor físico nem mental para a atividade braçal. O fator limitante é a idade, o tempo longo de afastamento da atividade laboral, a falta de qualificação profissional e o fato de ser analfabeta (...)" (g.n.).
Embora o expert tenha concluído pela incapacidade laboral da requerente, a mesma se daria somente em razão da sua idade, na ocasião, 64 anos.
No entanto, a Lei Orgânica da Assistência Social (art. 20 da Lei 8.742/93) somente presume incapaz em razão da idade, o idoso com idade superior a 65 anos. Logo, é de se concluir que a parte não preenche o requisito da incapacidade.
Outrossim, não subsistem nos autos elementos caracterizadores de que a parte autora se encontrasse em situação de miserabilidade.
Senão, vejamos.
O estudo social, realizado em 28/02/2015 (fls. 135-144) revelou que a parte autora, à época com 66 anos, residia com seu cônjuge, José Daniel Ferreira, também com 66 anos de idade, aposentado.
O núcleo familiar residia em casa própria, construída em alvenaria e constituída de quatro cômodos e um banheiro; "a casa é acabada," com laje; na cozinha, na sala e no banheiro, o piso é frio; as paredes são pintadas, nos demais cômodos da casa o piso é de madeira. O bairro é pavimentado, possui iluminação pública, transporte coletivo, coleta de lixo, abastecimento de água e coleta de esgoto.
A residência se encontrava guarnecida com a seguinte mobília: na sala: dois sofás, 01 rack, uma TV 29 polegadas, e um aparelho DVD; na cozinha: um forno de microondas; um cooktop, geladeira, uma com seis cadeiras, uma TV 32 polegadas, um painel de madeira e um rack; no primeiro quarto, uma cama de casal e um guarda-roupa; um aparelho de ar condicionado de teto; no segundo quarto, uma cama de casal e um guarda-roupa; na área de serviço: uma máquina de lavar e um tanquinho elétrico.
A família possuia também um veículo financiado da marca Chevrolet, modelo Spin, ano 2013.
A renda familiar resumia-se aos proventos de aposentadoria percebidos pelo cônjuge da autora, no valor de dois salários mínimos (R$ 1.576,00 - na época da elaboração do estudo social) e, trabalho extra realizado pelo marido da requerente, no valor de R$ 500,00 por mês, totalizando R$ 2.076,00. Consequentemente, a renda per capta atingia o montante R$ 1.038,00. Por ocasião do estudo social, o salário-mínimo mensal estabelecido era de R$ 788,00.
Já a despesa mensal do núcleo familiar compreendia gastos com alimentação, produtos de limpeza e de higiene pessoal (R$ 800,00); energia elétrica (R$ 84,00), água (R$ 60,00), gás de cozinha (R$ 50,00), medicamentos (R$ 500,00), telefone e celular (R$ 160,00); plano de saúde (R$ 507,00); prestação de óculos - 8 parcelas (R$ 87,50); prestação de veículo (R$ 948,19), totalizando R$ 3.196,69.
Inicialmente, o entendimento supramencionado, no sentido de que se admite que a percepção de benefício assistencial, ou mesmo previdenciário com renda mensal equivalente ao salário mínimo, seja desconsiderada para fins de concessão do benefício assistencial previsto na Lei 8.742/93 não favorece à parte autora, uma vez que, no caso dos autos, ante a percepção de proventos de aposentadoria (dois salários mínimos mensais) equivalente a dois benefícios de renda mínima, ao menos um deles haveria de ser considerado integralmente destinado ao sustento da família, resultando, dessa forma, numa renda per capita superior ao mínimo legal.
Depois, o valor gasto com alimentação, produtos de higiene e limpeza e higiene pessoal, totalizando R$ 800,00 por mês, para duas pessoas, quando o salário-mínimo mensal estabelecido era de R$ 788,00, por si só demonstra que a família possuía hábitos de consumo totalmente incompatíveis com os dos integrantes das classes sociais a que se destina o benefício sub judice, onde se encontram pessoas em situação de vulnerabilidade social tal que seus itens de consumo não superam aqueles que compõem a cesta básica.
De outro lado, parte significativa da renda da família (R$ 948,19) está sendo destinada ao pagamento de prestações de um automóvel de padrão médio, que, se fosse verídica a precariedade econômica aventada na exordial, já teria sido alienado - ou sequer adquirido.
Outra parte significativa da renda declarada era destinada a gastos com a manutenção do automóvel da família (combustível, manutenção, taxas e/ou impostos, e eventuais consertos), cujos valores não foram declinados; com telefone fixo e celular (R$ 160,00), e com plano de saúde (R$ 507,00), despesas essas totalmente prescindíveis em situação de penúria econômica extrema.
Por fim, frise-se que a parte autora faz uso de quinze medicamentos para tratamento contínuo, e seu marido, nove. Todos são comprados, dispendendo a autora com esse item R$ 500,00 por mês. A relação de doenças enumeradas no laudo não são incomuns (artrite, bronquite, problema de tireoide, problema de audição, varizes e problemas cardíacos), portanto, não é crível que a requerente não obtenha na rede pública ao menos parte dos vinte e quatro medicamentos utilizados pelo núcleo familiar.
Sendo assim, não há elementos o bastante para se afirmar que se trata de família que vive em estado de miserabilidade, ao contrário: os recursos obtidos pela família da parte autora deveriam ser suficientes para cobrir os gastos ordinários.
Neste diapasão, não comprovados pela parte autora ambos os requisitos legais, não faz ela jus à concessão do benefício assistencial, tornando imperiosa a manutenção da r. sentença, na íntegra.
Isso posto, nego seguimento à apelação da parte autora, mantendo in totum a r. sentença prolatada.
É COMO VOTO.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 11/07/2016 17:56:45 |
