
| D.E. Publicado em 09/03/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação autárquica, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0030866-83.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Cuida-se de ação proposta em 22/01/2014 com vistas à concessão de benefício assistencial, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal.
Documentos acostados à exordial (fls. 15-19).
Deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 21).
Citação, em 06/02/2014 (fl. 24 v.).
Laudo médico elaborado por jusperito (fls. 89-101 e 112-115).
Estudo socioeconômico (fls. 131-141).
Parecer do Ministério Público do Estado de São Paulo, opinando pelo indeferimento do benefício (fls. 152-154).
A r. sentença, prolatada em 25/01/2016, julgou procedente o pedido. Antecipados os efeitos da tutela. Determinado o pagamento do benefício desde a data do requerimento administrativo, 14/08/2013 (fls. 155-158).
Apelação do INSS. No mérito, pugna pela reforma integral do julgado. Aduz que não restou atendido pela parte autora o requisito concernente à hipossuficiência, previsto no art. 20 da Lei 8.741/93. Para o caso de manutenção do decisum, requer seja o termo inicial do benefício fixado na data da juntada do laudo pericial aos autos (fls. 163-170).
Com contrarrazões (fls. 174-181).
Decisão na qual foi sustada a antecipação da tutela determinada na r. sentença, em razão da proibição de cumulação do benefício sub judice com o de pensão por morte percebido pela parte autora e sua genitora (fl. 187).
Decisão em que foi cancelada a sustação da tutela antecipada, em razão da comprovação da cessação do benefício de pensão por morte (fl. 196).
Subiram os autos a este Tribunal, sobrevindo parecer do Ministério Público Federal, que opinou pela manutenção da sentença, quanto ao mérito (fl. 211-217).
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0030866-83.2016.4.03.9999/SP
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de recurso interposto pela parte ré (INSS) contra sentença que julgou procedente pedido de benefício assistencial a pessoa portadora de deficiência.
O benefício de assistência social foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência em que se acham, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias. Neste aspecto está o lastro social do dispositivo inserido no artigo 203, V, da Constituição Federal, que concretiza princípios fundamentais, tais como o de respeito à cidadania e à dignidade humana, ao preceituar o seguinte:
De outro giro, os artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/93, com redação dada pela Lei 12.435, de 06 de julho de 2011, e o art. 34, da Lei 10.741 (Estatuto do Idoso), de 1º de outubro de 2003 rezam, in verbis:
O apontado dispositivo legal, aplicável ao idoso, procedeu a uma forma de limitação do mandamento constitucional, eis que conceituou como pessoa necessitada, apenas, aquela cuja família tenha renda inferior à 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, levando em consideração, para tal desiderato, cada um dos elementos participantes do núcleo familiar, exceto aquele que já recebe o benefício de prestação continuada, de acordo com o parágrafo único, do art. 34, da Lei 10.741/03.
De mais a mais, a interpretação deste dispositivo legal na jurisprudência tem sido extensiva, admitindo-se que a percepção de benefício assistencial, ou mesmo previdenciário com renda mensal equivalente ao salário mínimo, seja desconsiderada para fins de concessão do benefício assistencial previsto na Lei 8.742/93.
Ressalte-se, por oportuno, que os diplomas legais acima citados foram regulamentados pelo Decreto nº 6.214/07, o qual em nada alterou a interpretação das referidas normas, merecendo destacamento o art. 4º, inc. VI e o art. 19, caput e parágrafo único do referido decreto, in verbis:
A inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da mencionada Lei 8.742/93 foi arguida na ADIN nº 1.232-1/DF que, pela maioria de votos do Plenário do Supremo Tribunal Federal, foi julgada im procedente. Para além disso, nos autos do agravo regimental interposto na reclamação n.º 2303-6, do Rio Grande do Sul, interposta pelo INSS, publicada no DJ de 01.04.2005, p. 5-6, Rel. Min. Ellen Gracie, o acórdão do STF restou assim ementado:
Evidencia-se que o critério fixado pelo parágrafo 3º do artigo 20 da LOAS é o único apto a caracterizar o estado de necessidade indispensável à concessão da benesse em tela. Em outro falar, aludida situação de fato configuraria prova inconteste de necessidade do benefício constitucionalmente previsto, de modo a tornar dispensáveis elementos probatórios outros.
Assim, deflui dessa exegese o estabelecimento de presunção objetiva absoluta de estado de penúria ao idoso ou deficiente cuja partilha da renda familiar resulte para si montante inferior a 1/4 do salário mínimo.
Não se desconhece notícia constante do Portal do Supremo Tribunal Federal, de que aquela Corte, em recente deliberação, declarou a inconstitucionalidade dos dispositivos legais em voga (Plenário, na Reclamação 4374, e Recursos Extraordinários - REs 567985 e 580963, estes com repercussão geral, em 17 e 18 de abril de 2013, reconhecendo-se superado o decidido na ADI 1.232-DF), do que não mais se poderá aplicar o critério de renda per capita de ¼ do salário mínimo para fins de aferição da miserabilidade.
Também restou consolidado no colendo Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que a comprovação do requisito da renda familiar per capita não-superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo não exclui outros fatores que tenham o condão de aferir a hipossuficiência econômica da parte:
Em outras palavras: deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante a renda informada, caso a caso.
Quanto à alegada incapacidade, depreende-se do laudo médico pericial, relativo a perícia realizada em 26/08/2014 (fls. 89-102 e 112-115), que a autora apresenta "retardo mental leve/moderado (CID F70/71)" e "Síndrome de Turner CID Q96", patologias que a incapacitam de forma total e permanente para o trabalho.
Por sua vez, o estudo social realizado em 26/09/2015 (fls. 131-141) revela que o núcleo familiar era constituído pela própria autora, com 34 anos de idade (DN 27/10/1980), por sua genitora e curadora, Maria do Carmo das Graças Fiume, 59 anos (DN 16/07/1956), do lar, viúva, e pelo irmão, Wille Fiume, 21 anos (DN 09/06/1994), solteiro, estudante.
A família residia em casa própria, sendo que na frente do terreno existia um salão comercial. A casa era construída em alvenaria, com 160,84 metros quadrados de área construída, em terreno de 250 metros quadrados, com laje e piso de cerâmica, constituída por dois quartos, sala, cozinha, varanda e dois banheiros, sendo que um dos banheiros não se encontrava em condições de uso; o imóvel necessitava de reparos generalizados em relação ao telhado, parte elétrica e hidráulica, bem como pintura interna e externa.
Quanto à locação do salão comercial de aproximadamente 20 metros quadrados na frente do imóvel, onde se encontrava instalado um comércio de pet shop: "Informou a mãe da Autora que não recebe aluguel referente a esse salão. A prima da Autora Amanda de Souza, 23 anos, solteira, estudante de direito (4º ano), presente no momento da visita domiciliar apresentou a seguinte explicação "O salão foi cedido ao proprietário do pet shop em troca de benfeitorias no bem, em regime de comodato. O comodatário encontra-se há 02 (duas) semanas no imóvel (sem contrato)."
A residência encontrava-se guarnecida com a seguinte mobília e eletrodomésticos: uma cama de casal, duas camas de solteiro, dois guarda-roupas, um jogo de sofá, um aparelho de televisão de 32 polegadas, fogão, geladeira, armário de cozinha, mesa, cadeira, forno de micro-ondas, tanquinho, ventilador e rack, e linha de telefone fixo.
Na residência encontravam-se dois automóveis: um veículo marca Fiat , modelo Uno, ano 2000, de propriedade da mãe da autora, e um veículo marca Ford, modelo Fiesta, ano 2003, adquirido em nome da mãe da demandante, mas de uso da irmã da requente, Vanessa Cristiane Fiume Barbosa, que também é responsável pelo pagamento das prestações.
Segundo o laudo social a renda familiar advinha dos proventos de por morte percebidos pela genitora da autora, no valor de um salário-mínimo por mês (à época R$ 788,00), e da ajuda de custo recebida pelo irmão da requerente, estudante do 4º ano de Direito no Centro Universitário Toledo de Ensino, a título de bolsa auxílio (estágio remunerado em escritório de advocacia), no valor de R$ 400,00 por mês.
Já a despesa mensal do núcleo familiar compreendia gastos com energia elétrica (R$ 118,00), água (R$ 49,00), medicamentos (R$ 250,00), tratamento dentário - parcela 2/8 (R$ 100,00), prestação do FIES (R$ 50,00) totalizando R$ 557,00 por mês.
Merece relevo o fato de que além de não terem sido comprovados os gastos declarados com medicamentos (R$ 250,00 por mês), também não restou esclarecida a razão daqueles de uso contínuo estarem sendo adquiridos em estabelecimentos privados, ao invés de ser acessada a rede pública de saúde para tanto, ou ainda, exigido (ainda que judicialmente) do Estado seu fornecimento gratuito.
Verifica-se, in casu, que os recursos obtidos pela família da parte requerente deveriam ser suficientes para cobrir os gastos ordinários, bem como tratamentos médicos e cuidados especiais que lhe sejam imprescindíveis, no entanto, parte significativa da renda familiar estaria sendo destinada a gastos com manutenção do automóvel da família (combustível, taxas e/ou impostos, e eventuais consertos), e serviço de linha telefônica, cujos valores não foram declinados, despesas essas totalmente prescindíveis em situação de penúria econômica extrema.
Ademais, a renda per capita do núcleo familiar, no valor de R$ 396,00 por mês ultrapassava sobremaneira o limite legal, e não se verificam outros elementos subjetivos bastantes para se afirmar que se trata de família que viveria em estado de miserabilidade.
Por conseguinte, impõe-se a cassação da tutela jurisdicional deferida pelo r. Juízo de Primeira Instância. Determino seja remetida esta decisão por via eletrônica à autoridade administrativa, a fim de que seja cessado o pagamento do benefício ora pleiteado, após o trânsito em julgado.
Consoante entendimento firmado pela Terceira Seção desta Corte, deixo de condenar a parte autora ao pagamento de custas, despesas processuais e honorários advocatícios, porquanto beneficiária da assistência judiciária gratuita (TRF - 3ª Seção, AR n.º 2002.03.00.014510-0/SP, Rel. Des. Fed. Marisa Santos, j. 10.05.2006, v.u., DJU 23.06.06, p. 460).
Isso posto, dou provimento à apelação autárquica.
É COMO VOTO.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 20/02/2017 17:15:41 |
