
| D.E. Publicado em 22/06/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002166-94.2011.4.03.6112/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Cuida-se de ação proposta em 05/04/2011 com vistas à concessão de benefício assistencial, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal.
Documentos acostados à exordial (fls. 13-55).
Deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 59 v.).
Citação em 13/05/2011 (fl. 63).
Auto de constatação (fls. 65-66).
Laudo médico pericial (fls. 94-104).
A r. sentença, prolatada em 05/04/2013, julgou procedente o pedido (fls. 125-128).
Apelação do INSS e contrarrazões (fls. 135-139 e 143-147).
Subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
Decisão proferida por esta E. Corte, anulando a r. sentença prolatada, e determinando a devolução dos autos ao Juízo de origem, para realização de novo estudo socioeconômico (fls. 153-154).
Baixa dos autos a Instância inferior, em 20/02/2015 (fls. 157).
Estudo socioeconômico (fls. 164-169).
Prova oral (fls. 182-189).
Parecer do Ministério Público Federal, opinando pela procedência da ação (fls. 226-233).
A r. sentença, prolatada em 23/08/2016, julgou improcedente o pedido (fls. 239-240).
Apelação da parte autora. Pugna pela reforma integral do julgado (fls. 245-251).
Sem contrarrazões (fl. 258), subiram os autos a esta E. Corte.
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002166-94.2011.4.03.6112/SP
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de recurso interposto pela parte autora contra sentença que julgou improcedente pedido de benefício assistencial a pessoa portadora de deficiência.
O benefício de assistência social foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência em que se acham, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias. Neste aspecto está o lastro social do dispositivo inserido no artigo 203, V, da Constituição Federal, que concretiza princípios fundamentais, tais como o de respeito à cidadania e à dignidade humana, ao preceituar o seguinte:
De outro giro, os artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/93, com redação dada pela Lei 12.435, de 06 de julho de 2011, e o art. 34, da Lei 10.741 (Estatuto do Idoso), de 1º de outubro de 2003 rezam, in verbis:
O apontado dispositivo legal, aplicável ao idoso, procedeu a uma forma de limitação do mandamento constitucional, eis que conceituou como pessoa necessitada, apenas, aquela cuja família tenha renda inferior à 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, levando em consideração, para tal desiderato, cada um dos elementos participantes do núcleo familiar, exceto aquele que já recebe o benefício de prestação continuada, de acordo com o parágrafo único, do art. 34, da Lei 10.741/03.
De mais a mais, a interpretação deste dispositivo legal na jurisprudência tem sido extensiva, admitindo-se que a percepção de benefício assistencial, ou mesmo previdenciário com renda mensal equivalente ao salário mínimo, seja desconsiderada para fins de concessão do benefício assistencial previsto na Lei 8.742/93.
Ressalte-se, por oportuno, que os diplomas legais acima citados foram regulamentados pelo Decreto nº 6.214/07, o qual em nada alterou a interpretação das referidas normas, merecendo destacamento o art. 4º, inc. VI e o art. 19, caput e parágrafo único do referido decreto, in verbis:
A inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da mencionada Lei 8.742/93 foi arguida na ADIN nº 1.232-1/DF que, pela maioria de votos do Plenário do Supremo Tribunal Federal, foi julgada im procedente. Para além disso, nos autos do agravo regimental interposto na reclamação n.º 2303-6, do Rio Grande do Sul, interposta pelo INSS, publicada no DJ de 01.04.2005, p. 5-6, Rel. Min. Ellen Gracie, o acórdão do STF restou assim ementado:
Evidencia-se que o critério fixado pelo parágrafo 3º do artigo 20 da LOAS é o único apto a caracterizar o estado de necessidade indispensável à concessão da benesse em tela. Em outro falar, aludida situação de fato configuraria prova inconteste de necessidade do benefício constitucionalmente previsto, de modo a tornar dispensáveis elementos probatórios outros.
Assim, deflui dessa exegese o estabelecimento de presunção objetiva absoluta de estado de penúria ao idoso ou deficiente cuja partilha da renda familiar resulte para si montante inferior a 1/4 do salário mínimo.
Não se desconhece notícia constante do Portal do Supremo Tribunal Federal, de que aquela Corte, em recente deliberação, declarou a inconstitucionalidade dos dispositivos legais em voga (Plenário, na Reclamação 4374, e Recursos Extraordinários - REs 567985 e 580963, estes com repercussão geral, em 17 e 18 de abril de 2013, reconhecendo-se superado o decidido na ADI 1.232-DF), do que não mais se poderá aplicar o critério de renda per capita de ¼ do salário mínimo para fins de aferição da miserabilidade.
Também restou consolidado no colendo Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que a comprovação do requisito da renda familiar per capita não-superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo não exclui outros fatores que tenham o condão de aferir a hipossuficiência econômica da parte:
Em outras palavras: deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante a renda informada, caso a caso.
Na hipótese enfocada, depreende-se do laudo médico-pericial (fls. 94-105), elaborado em 06/03/2012, que o autor, à época com 51 anos de idade, era portador de diabetes mellitus, hipertensão arterial, epilepsia com crises convulsivas, artrose em joelhos e problemas visuais (glaucoma). Esclareceu o expert que "Periciando está incapacitado TOTALMENTE para as atividades laborais. (...) As doenças que acometem o periciando NÃO são passíveis cura, mas são passíveis de controle. Estando apenas TEMPORARIAMENTE incapacitado para as atividades laborais. (...)" (g.n.).
Anoto que o fato de a inaptidão da parte requerente ser temporária não impede a concessão de benefício assistencial, que também é temporário e deve ser mantido apenas enquanto presentes os requisitos necessários, devendo ser revisto a cada dois anos.
Os estudos socioeconômicos, realizados em 23/05/2011 e 25/09/2015 (fls. 65-66 e fls. 164-169), revelaram que o autor, de profissão pedreiro, desempregado, solteiro (separado de fato da companheira há muitos anos, com a qual teve três filhas, todas casadas) residia sozinho, não obstante o fato de que a proprietária residisse em imóvel contíguo, nos fundos do terreno.
O autor residia em casa cedida, "de favor"; na realidade, um espaço em que outrora funcionara um bar; construída em alvenaria, em estado precário, com sinais de infiltração, inacabada, sem reboque nas paredes externas, e sem banheiro. O autor utilizava o banheiro da casa da Sra. Dilza, proprietária do imóvel, sendo que o requerente declarou à assistente social, bem como em depoimento pessoal prestado nesta ação, não ter qualquer relação de parentesco ou marital com a referida pessoa.
A residência encontrava-se guarnecida com móveis simples, consoantes fotografias acostadas ao último laudo socioeconômico elaborado (fls. 167-169).
Inexistente qualquer espécie de renda familiar, porquanto a proprietária do imóvel não possuía parentesco com o requerente, o qual declarou sobreviver somente de doações de amigos e vizinhos, sendo que as suas três filhas não lhe ofereciam qualquer espécie de ajuda.
Verifica-se que, in casu, a inexistência de renda, associada à simplicidade da residência e dos bens que a guarneciam, constituem elementos o bastante para se afirmar que se trata de pessoa que vive em estado de miserabilidade; além disso, se revelam insuficientes os ganhos auferidos para cobrir gastos ordinários, bem como tratamentos médicos e cuidados especiais que lhe sejam imprescindíveis.
Nessas condições, não é possível à parte autora ter vida digna ou, consoante assevera a Constituição Federal, permitir-lhe a necessária dignidade da pessoa humana ou o respeito à cidadania, que são, às expressas, tidos por princípios fundamentais do almejado Estado Democrático de Direito.
Portanto, é de se concluir que tem direito ao amparo assistencial.
O valor do benefício é de 01 (um) salário mínimo, nos termos do artigo 20, caput, da Lei 8.742/93.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data da citação, em 13/05/2011 (fl. 63) - ex vi do art. 219 do CPC, que considera este o momento em que se tornou resistida a pretensão.
Com relação à correção monetária e juros moratórios, ambos incidirão nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal em vigor, por ocasião da execução do julgado.
Quanto à verba honorária, fixo-a em 10% (dez por cento), considerados a natureza, o valor e as exigências da causa, conforme art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC, sobre as parcelas vencidas até a data do presente decisum.
Relativamente às custas processuais, é imperioso sublinhar que o art. 8º da Lei 8.620, de 05.01.93, preceitua o seguinte:
Apesar do STJ entender que o INSS goza de isenção no recolhimento de custas processuais, perante a Justiça Federal, nos moldes do dispositivo legal supramencionado, a Colenda 5ª Turma deste Egrégio Tribunal tem decidido que, não obstante a isenção da autarquia federal, consoante art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93, se ocorreu o prévio recolhimento das custas processuais pela parte contrária, o reembolso é devido, a teor do art. 14, § 4º, da Lei nº 9.289/96, salvo se esta estiver amparada pela gratuidade da Justiça.
De conseguinte, em sendo a parte autora beneficiária da justiça gratuita, deixo de condenar o INSS ao reembolso das custas processuais, porque nenhuma verba a esse título foi paga pela parte, e a autarquia federal é isenta e nada há a restituir.
Quanto às despesas processuais, são elas devidas, à observância do disposto no artigo 11 da Lei 1.060/50, combinado com o artigo 91 do Novo Código de Processo Civil. Porém, a se considerar a hipossuficiência da parte autora e os benefícios que lhe assiste, em razão da assistência judiciária gratuita, a ausência do efetivo desembolso desonera a condenação da autarquia federal à respectiva restituição.
Resta deixar consignado que eventuais pagamentos do benefício já realizados pela autarquia na esfera administrativa deverão ser deduzidos na fase da execução do julgado.
Isso posto, dou provimento à apelação da parte autora, para julgar procedente o pedido, e condenar o INSS ao pagamento do benefício assistencial, a contar da data da citação, no valor de um salário mínimo mensal. Honorários advocatícios, custas, despesas processuais, correção monetária e juros de mora, tudo conforme acima explicitado.
É COMO VOTO.
DAVID DANTAS
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