
| D.E. Publicado em 10/05/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação autárquica, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007165-59.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Cuida-se de ação proposta em 15/09/2014 com vistas à concessão de benefício assistencial, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal.
Documentos acostados à exordial (fls. 08-14).
Deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 15).
Citação, em 15/10/2014 (fl. 16).
Estudo socioeconômico (fls. 33-36).
Laudo médico elaborado por jusperito (fls. 49-52).
A r. sentença, prolatada em 31/05/2016, julgou procedente o pedido. Determinado o pagamento do benefício desde a data do requerimento administrativo (fls. 64-66).
Apelação do INSS. No mérito, pugna pela reforma integral do julgado (fls. 70-74).
Sem contrarrazões (fl. 80), subiram os autos a esta Egrégia Corte.
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007165-59.2017.4.03.9999/SP
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de recurso interposto pela parte ré contra sentença que julgou procedente pedido de benefício assistencial a pessoa portadora de deficiência.
O benefício de assistência social foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência em que se acham, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias. Neste aspecto está o lastro social do dispositivo inserido no artigo 203, V, da Constituição Federal, que concretiza princípios fundamentais, tais como o de respeito à cidadania e à dignidade humana, ao preceituar o seguinte:
De outro giro, os artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/93, com redação dada pela Lei 12.435, de 06 de julho de 2011, e o art. 34, da Lei 10.741 (Estatuto do Idoso), de 1º de outubro de 2003 rezam, in verbis:
O apontado dispositivo legal, aplicável ao idoso, procedeu a uma forma de limitação do mandamento constitucional, eis que conceituou como pessoa necessitada, apenas, aquela cuja família tenha renda inferior à 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, levando em consideração, para tal desiderato, cada um dos elementos participantes do núcleo familiar, exceto aquele que já recebe o benefício de prestação continuada, de acordo com o parágrafo único, do art. 34, da Lei 10.741/03.
De mais a mais, a interpretação deste dispositivo legal na jurisprudência tem sido extensiva, admitindo-se que a percepção de benefício assistencial, ou mesmo previdenciário com renda mensal equivalente ao salário mínimo, seja desconsiderada para fins de concessão do benefício assistencial previsto na Lei 8.742/93.
Ressalte-se, por oportuno, que os diplomas legais acima citados foram regulamentados pelo Decreto nº 6.214/07, o qual em nada alterou a interpretação das referidas normas, merecendo destacamento o art. 4º, inc. VI e o art. 19, caput e parágrafo único do referido decreto, in verbis:
A inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da mencionada Lei 8.742/93 foi arguida na ADIN nº 1.232-1/DF que, pela maioria de votos do Plenário do Supremo Tribunal Federal, foi julgada im procedente. Para além disso, nos autos do agravo regimental interposto na reclamação n.º 2303-6, do Rio Grande do Sul, interposta pelo INSS, publicada no DJ de 01.04.2005, p. 5-6, Rel. Min. Ellen Gracie, o acórdão do STF restou assim ementado:
Evidencia-se que o critério fixado pelo parágrafo 3º do artigo 20 da LOAS é o único apto a caracterizar o estado de necessidade indispensável à concessão da benesse em tela. Em outro falar, aludida situação de fato configuraria prova inconteste de necessidade do benefício constitucionalmente previsto, de modo a tornar dispensáveis elementos probatórios outros.
Assim, deflui dessa exegese o estabelecimento de presunção objetiva absoluta de estado de penúria ao idoso ou deficiente cuja partilha da renda familiar resulte para si montante inferior a 1/4 do salário mínimo.
Não se desconhece notícia constante do Portal do Supremo Tribunal Federal, de que aquela Corte, em recente deliberação, declarou a inconstitucionalidade dos dispositivos legais em voga (Plenário, na Reclamação 4374, e Recursos Extraordinários - REs 567985 e 580963, estes com repercussão geral, em 17 e 18 de abril de 2013, reconhecendo-se superado o decidido na ADI 1.232-DF), do que não mais se poderá aplicar o critério de renda per capita de ¼ do salário mínimo para fins de aferição da miserabilidade.
Também restou consolidado no colendo Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que a comprovação do requisito da renda familiar per capita não-superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo não exclui outros fatores que tenham o condão de aferir a hipossuficiência econômica da parte:
Em outras palavras: deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante a renda informada, caso a caso.
Na hipótese enfocada, depreende-se do laudo médico-pericial (fls. 49-52), relativo à perícia realizada em 07/12/2015, que a parte autora, à época com 57 anos de idade, era portadora de "1. DIMINUIÇÃO DA FORÇA DO HEMICORPO ESQUERDO 2. HIPERTENSÃO ARTERIAL SISTEMICA (CID I10) 3. HIPOTIREOIDISMO (CID E03.9). O expert esclareceu que: (...) A hipertensão arterial sistêmica e o hipotireoidismo encontram-se controladOs e não geram incapacidade. Não há sinais de dependência de terceiros para atividades da vida diária. Realiza os serviços domésticos, adaptando-se a sua dificuldade de diminuição de força e movimentos do lado esquerdo do corpo." Ao responder o quesito 5 do Juízo a quo o perito asseverou que a parte autora tem condições de desempenhar atividades laborais: "(...) 5) O(a) requerente tem condição de desempenhar alguma atividade? Sim, considerando sua limitação de movimentos com o lado esquerdo do corpo e histórico social: grau de instrução (completou o 4º ano do ensino fundamental), idade (57 anos) e o fato de nunca ter exercido atividade remunerada (...)"
Assim, restou devidamente demonstrado que as referidas patologias ocasionam incapacidade parcial e permanente da parte autora para o labor.
Não obstante tenha sido reconhecida a incapacidade para o labor como sendo parcial, a conclusão pericial conjugada com os fatores relacionados às condições pessoais da parte autora levam a crer que ela possui condições de exercer, além da atividade habitual de dona de casa, profissões que não exigem esforço físico, porquanto são inúmeras as possibilidades laborais. Podemos citar algumas: bilheteira, controladora de estacionamento, florista, artesã, vigia de guarita, recepcionista, corretora, ascensorista, etc.
De outro lado, o estudo social, elaborado em 11/07/2015 (fls. 33-36), revela que o núcleo familiar era formado por 03 pessoas: a própria parte autora, nascida em 13/01/1958, por sua irmã, Neusa Maria de Oliveira, nascida em 24/11/1963, solteira, desempregada, pensionista, e pelo tio de ambas, Isidoro de Oliveira, nascido em 03/12/1931, solteiro, analfabeto.
A família residia em casa própria, adquirida por meio de herança, "o imóvel é grande, construído em alvenaria, cobertos com telhas de barro e forro de madeira; chão revestido com piso cerâmico tipo taco, paredes externas e internas com pinturas em estado ruim. (...) a residência está abastecida com energia elétrica, água, pavimentação asfáltica, rede de esgoto, iluminação pública e coleta seletiva do lixo." A assistente social informou que no fundo do terreno existia casa com três cômodos que se encontrava alugada.
No interior do imóvel constatou-se a existência da seguinte mobília: sofás de "2,2 e 3 lugares cada", televisão de trinta e duas polegadas, estante, rádio coruja, cômoda de quatro gavetas e uma porta, cinco camas de solteiro, cama de casal, antena parabólica, três guarda-roupas, duas mesas, sofá poltrona, geladeira, armário, fogão e pia.
A renda familiar era composta pelos proventos de pensão por morte percebidos pela irmã da autora, no valor de um salário mínimo, de acordo com pesquisa realizada no CNIS - Cadastro Nacional de Informações Sociais, coligida aos autos pelo INSS (fls. 56-58), - e não benefício de prestação continuada, como constou no laudo social -, bem como pelo benefício de prestação continuada auferido pelo tio da requerente, também no valor de um salário mínimo mensal. Além disso, a família recebia R$ 180,00 por mês (valor não comprovado nos autos) relativos a locação do imóvel supramencionado. Na época o salário mínimo mensal estava fixado em R$ 788,00.
O tio da autora não integra o núcleo familiar, à inteligência do disposto no § 1º do art. 20, da Lei 8.742/93, in verbis:
Consoante fundamentado acima, a renda de um salário mínimo percebida pela irmã da requerente nascida em 24/11/1963 (fl. 33), em razão de não se tratar de pessoa idosa, deve ser considerada para fins de apuração da renda per capita.
Já a despesa mensal do núcleo familiar compreendia gastos com alimentação (R$ 700,00), energia elétrica (R$ 130,00), água (R$ 55,00), gás (R$ 45,00), e medicamentos (R$ 250,00) totalizando R$ 1.180,00 por mês.
Ressalto que o valor gasto com alimentação, totalizando R$ 700,00 por mês, para apenas três pessoas, quando o salário-mínimo mensal estabelecido era de R$ 788,00, por si só demonstra que a família possuía hábitos de consumo totalmente incompatíveis com a renda dos integrantes das classes sociais a que de fato se destina o benefício sub judice, onde se encontram pessoas em situação de vulnerabilidade social tal que seus itens de consumo não superam aqueles que compõem a cesta básica.
Ademais, além de não terem sido comprovados os gastos declarados com medicamentos (R$ 250,00 por mês), também não restou esclarecida a razão daqueles de uso contínuo estarem sendo adquiridos em estabelecimentos privados, ao invés de ser acessada a rede pública de saúde para tanto, ou ainda, exigido do Estado seu fornecimento gratuito.
Assim, in casu, a renda per capita do núcleo familiar (excluindo-se o tio da autora, que aufere renda exclusiva a sua manutenção), no valor de R$ 484,00 por mês ultrapassava sobremaneira o limite legal, e não se verificam outros elementos subjetivos bastantes para se afirmar que se trata de família que viveria em estado de miserabilidade.
É COMO VOTO.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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