
| D.E. Publicado em 24/04/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar arguida, e, no mérito, dou provimento à apelação autárquica, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000605-67.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Cuida-se de ação proposta com vistas em 02/02/2015 à concessão de benefício assistencial, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal.
Documentos ofertados (fls. 08-21).
Deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 22).
Citação, em 03/03/2015 (fl. 28).
Laudo médico elaborado por perito judicial (fls. 73-82).
Estudo socioeconômico (fls. 91-99).
Parecer do Ministério Público do Estado de São Paulo (fls. 110-112), opinando pela improcedência da ação.
A r. sentença prolatada em 11/04/2017, julgou procedente o pedido. Antecipados os efeitos da tutela. Condenado o réu ao pagamento do benefício, no valor de um salário mínimo mensal, desde a data do pedido administrativo, 19/08/2013. As parcelas vencidas deverão ser pagas de uma única vez. Os juros de mora e a correção monetária deverão ser aplicados na forma prevista no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, em vigor na data da prolação da sentença. Condenada ainda a autarquia federal ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) do valor da condenação, excetuadas as vincendas (Súmula 111 do C. STJ). (fls. 114-115).
Apelação do INSS. Preliminarmente, requer a submissão da sentença ao reexame oficial. Para o caso de manutenção do decisum, requer, quanto à correção monetária e juros de mora incidentes sobre as prestações vencidas, que seja observada a aplicação do art. 1º da 9.494/97, com a redação dada pela Lei 11.960/2009, e os juros fixados no percentual de 0,5% (meio por cento) ao mês a contar da citação. Ainda, em caso de desprovimento do recurso, requer que a alíquota dos honorários de sucumbência fixados contra a Fazenda Pública seja objeto de majoração em grau mínimo, em atenção ao interesse público subjacente à demanda, respeitados os limites de cada faixa do § 3º do art. 85 do CPC/2015 (fls. 124-133).
Sem contrarrazões da parte autora (fls. 140), subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000605-67.2018.4.03.9999/SP
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
DA REMESSA NECESSÁRIA
Quanto ao pleito formulado pelo réu, de submissão do decisum ao reexame necessário, seguem as seguintes considerações:
O novo Estatuto processual trouxe inovações no tema da remessa ex officio, mais especificamente, estreitou o funil de demandas cujo transito em julgado é condicionado ao reexame pelo segundo grau de jurisdição, para tanto elevou o valor de alçada, verbis:
Convém recordar que no antigo CPC, dispensava do reexame obrigatório a sentença proferida nos casos CPC, art. 475, I e II sempre que a condenação, o direito controvertido, ou a procedência dos embargos em execução da dívida ativa não excedesse a 60 (sessenta) salários mínimos. Contrario sensu, aquelas com condenação superior a essa alçada deveriam ser enviadas à Corte de segundo grau para que pudesse receber, após sua cognição, o manto da coisa julgada.
Pois bem. A questão que se apresenta, no tema Direito Intertemporal, é de se saber se as demandas remetidas ao Tribunal antes da vigência do Novo Diploma Processual - e, consequentemente, sob a égide do antigo CPC -, vale dizer, demandas com condenações da União e autarquias federais em valor superior a 60 salários mínimos, mas inferior a 1.000 salários mínimos, se a essas demandas aplicar-se-ia o novel Estatuto e com isso essas remessas não seriam conhecidas (por serem inferiores a 1.000 SM), e não haveria impedimento - salvo recursos voluntários das partes - ao seu trânsito em julgado; ou se, pelo contrário, incidiria o antigo CPC (então vigente ao momento em que o juízo de primeiro grau determinou envio ao Tribunal) e persistiria, dessa forma, o dever de cognição pela Corte Regional para que, então, preenchida fosse a condição de eficácia da sentença.
Para respondermos, insta ser fixada a natureza jurídica da remessa oficial.
Natureza Jurídica Da Remessa Oficial
Cuida-se de condição de eficácia da sentença, que só produzirá seus efeitos jurídicos após ser ratificada pelo Tribunal.
Portanto, não se trata o reexame necessário de recurso, vez que a legislação não a tipificou com essa natureza processual.
Apenas com o reexame da sentença pelo Tribunal haverá a formação de coisa julgada e a eficácia do teor decisório.
Ao reexame necessário aplica-se o principio inquisitório (e não o principio dispositivo, próprio aos recursos), podendo a Corte de segundo grau conhecer plenamente da sentença e seu mérito, inclusive para modificá-la total ou parcialmente. Isso ocorre por não ser recurso, e por a remessa oficial implicar efeito translativo pleno, o que, eventualmente, pode agravar a situação da União em segundo grau.
Finalidades e estrutura diversas afastam o reexame necessário do capítulo recursos no processo civil.
Em suma, constitui o instituto em "condição de eficácia da sentença", e seu regramento será feito por normas de direito processual.
Direito Intertemporal
Como vimos, não possuindo a remessa oficial a natureza de recurso, na produz direito subjetivo processual para as partes, ou para a União. Esta, enquanto pessoa jurídica de Direito Público, possui direito de recorrer voluntariamente. Aqui temos direitos subjetivos processuais. Mas não os temos no reexame necessário, condição de eficácia da sentença que é.
A propósito oportuna lição de Nelson Nery Jr.:
Por consequência, como o Novo CPC modificou o valor de alçada para causas que devem obrigatoriamente ser submetidas ao segundo grau de jurisdição, dizendo que não necessitam ser confirmadas pelo Tribunal condenações da União em valores inferiores a 1.000 salários mínimos, esse preceito tem incidência imediata aos feitos em tramitação nesta Corte, inobstante remetidos pelo juízo a quo na vigência do anterior Diploma Processual.
Passo ao mérito.
Trata-se de recurso interposto pela parte ré contra sentença que julgou procedente pedido de benefício assistencial a pessoa portadora de deficiência.
O benefício de assistência social foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência em que se acham, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias. Neste aspecto está o lastro social do dispositivo inserido no artigo 203, V, da Constituição Federal, que concretiza princípios fundamentais, tais como o de respeito à cidadania e à dignidade humana, ao preceituar o seguinte:
De outro giro, os artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/93, com redação dada pela Lei 12.435, de 06 de julho de 2011, e o art. 34, da Lei 10.741 (Estatuto do Idoso), de 1º de outubro de 2003 rezam, in verbis:
O apontado dispositivo legal, aplicável ao idoso, procedeu a uma forma de limitação do mandamento constitucional, eis que conceituou como pessoa necessitada, apenas, aquela cuja família tenha renda inferior à 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, levando em consideração, para tal desiderato, cada um dos elementos participantes do núcleo familiar, exceto aquele que já recebe o benefício de prestação continuada, de acordo com o parágrafo único, do art. 34, da Lei 10.741/03.
De mais a mais, a interpretação deste dispositivo legal na jurisprudência tem sido extensiva, admitindo-se que a percepção de benefício assistencial, ou mesmo previdenciário com renda mensal equivalente ao salário mínimo, seja desconsiderada para fins de concessão do benefício assistencial previsto na Lei 8.742/93.
Ressalte-se, por oportuno, que os diplomas legais acima citados foram regulamentados pelo Decreto nº 6.214/07, o qual em nada alterou a interpretação das referidas normas, merecendo destacamento o art. 4º, inc. VI e o art. 19, caput e parágrafo único do referido decreto, in verbis:
A inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da mencionada Lei 8.742/93 foi arguida na ADIN nº 1.232-1/DF que, pela maioria de votos do Plenário do Supremo Tribunal Federal, foi julgada im procedente. Para além disso, nos autos do agravo regimental interposto na reclamação n.º 2303-6, do Rio Grande do Sul, interposta pelo INSS, publicada no DJ de 01.04.2005, p. 5-6, Rel. Min. Ellen Gracie, o acórdão do STF restou assim ementado:
Evidencia-se que o critério fixado pelo parágrafo 3º do artigo 20 da LOAS é o único apto a caracterizar o estado de necessidade indispensável à concessão da benesse em tela. Em outro falar, aludida situação de fato configuraria prova inconteste de necessidade do benefício constitucionalmente previsto, de modo a tornar dispensáveis elementos probatórios outros.
Assim, deflui dessa exegese o estabelecimento de presunção objetiva absoluta de estado de penúria ao idoso ou deficiente cuja partilha da renda familiar resulte para si montante inferior a 1/4 do salário mínimo.
Não se desconhece notícia constante do Portal do Supremo Tribunal Federal, de que aquela Corte, em recente deliberação, declarou a inconstitucionalidade dos dispositivos legais em voga (Plenário, na Reclamação 4374, e Recursos Extraordinários - REs 567985 e 580963, estes com repercussão geral, em 17 e 18 de abril de 2013, reconhecendo-se superado o decidido na ADI 1.232-DF), do que não mais se poderá aplicar o critério de renda per capita de ¼ do salário mínimo para fins de aferição da miserabilidade.
Também restou consolidado no colendo Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que a comprovação do requisito da renda familiar per capita não-superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo não exclui outros fatores que tenham o condão de aferir a hipossuficiência econômica da parte:
Em outras palavras: deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante a renda informada, caso a caso.
Na hipótese enfocada, verifica-se do laudo médico-pericial, elaborado em 16/12/2015 (fls. 73-82) que o autor é portador de deficiência física - "ausência congênita do antebraço direito", tendo esclarecido o expert que a referida deficiência é causa de incapacidade parcial e permanente para o labor, e que o requerente "Não está incapacitado para as atividades laborais que requeiram esforço físico moderado e/ou leve e que não requeira a função do membro superior direito.".
Por sua vez, o estudo social, elaborado em 26/04/2016 (fls. 91-99), revela que o autor, à época com 20 anos de idade (D.N.: 06/10/1995) residia com seus genitores, José Cícero dos Santos, de 46 anos (D.N.: 15/08/1969), trabalhador rural/autônomo, e Givanilda Francisco dos Santos, 42 anos (D.N.: 09/11/1973), do lar.
A família residia em casa alugada, construída em alvenaria, constituída de um quarto, cozinha e banheiro, em mau estado de conservação; piso de cimento queimado e sem forro; com telha romana.
A renda familiar resumia-se ao ganho auferido pelo genitor do autor, no valor de R$ 600,00 por mês. Na época o salário mínimo mensal estabelecido era R$ 880,00.
Já a despesa mensal do núcleo familiar compreendia gastos com alimentação (R$ 200,00), energia elétrica (R$ 70,00), água (R$ 32,00) e serviço de telefonia móvel (R$ 13,00) totalizando R$ 315,00 por mês.
A renda familiar mostrou-se suficiente para suportar as despesas declaradas, e, ademais, não restou demonstrado que a genitora do autor, com 42 anos (nascida em 09/11/1973), ora encontrando-se no auge da idade economicamente produtiva, e que já laborou como empregada doméstica durante o trâmite desta ação, possui impedimentos para o exercício de atividade laboral.
Neste diapasão, não comprovados pela parte autora os requisitos legais necessários, não faz ela jus à concessão do benefício assistencial, tornando imperiosa a reforma da r. sentença, na íntegra.
Por conseguinte, impõe-se a cassação da tutela jurisdicional deferida pelo r. Juízo de Primeira Instância na r. sentença.
É COMO VOTO.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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| Nº de Série do Certificado: | 11A217051057D849 |
| Data e Hora: | 09/04/2018 19:22:26 |
