D.E. Publicado em 26/07/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação autárquica, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0016925-66.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Cuida-se de ação proposta em 26/09/2014 com vistas à concessão de benefício assistencial, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal.
Documentos ofertados (fls. 18-38).
Deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 39).
Citação, em 26/01/2015 (fl. 47).
Estudo socioeconômico (fls. 104-109).
Laudo médico elaborado por perito judicial (fls. 118-121).
Parecer do Ministério Público do Estado de São Paulo (fls. 152-156).
A r. sentença, prolatada em 14/01/2016, julgou procedente o pedido, e condenou o réu ao pagamento do benefício, no valor de um salário mínimo mensal, desde a data da citação (fls. 160-162).
Apelação do INSS. No mérito, pugna pela reforma integral do julgado. Aduz que não restou atendido pela parte autora o requisito concernente à hipossuficiência, previsto no art. 20 da Lei 8.741/93. Para o caso de manutenção do decisum, requer a redução da verba honorária limitando sua incidência somente sobre as prestações devidas até a data da prolação da sentença, a fim de conformar-se à Súmula 111 do C. STJ (fls. 166-175).
Embargos de declaração opostos pela parte autora (fls. 179-181 183) os quais restaram acolhidos, tendo sido antecipados os efeitos da tutela e fixado o termo inicial do benefício na data do pedido administrativo, 08/05/2014.
Contrarrazões da parte autora (fls. 190-198).
Subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0016925-66.2016.4.03.9999/SP
VOTO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de recurso interposto pela parte ré contra sentença que julgou procedente pedido de benefício assistencial a pessoa portadora de deficiência.
O benefício de assistência social foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência em que se acham, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias. Neste aspecto está o lastro social do dispositivo inserido no artigo 203, V, da Constituição Federal, que concretiza princípios fundamentais, tais como o de respeito à cidadania e à dignidade humana, ao preceituar o seguinte:
De outro giro, os artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/93, com redação dada pela Lei 12.435, de 06 de julho de 2011, e o art. 34, da Lei 10.741 (Estatuto do Idoso), de 1º de outubro de 2003 rezam, in verbis:
O apontado dispositivo legal, aplicável ao idoso, procedeu a uma forma de limitação do mandamento constitucional, eis que conceituou como pessoa necessitada, apenas, aquela cuja família tenha renda inferior à 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, levando em consideração, para tal desiderato, cada um dos elementos participantes do núcleo familiar, exceto aquele que já recebe o benefício de prestação continuada, de acordo com o parágrafo único, do art. 34, da Lei 10.741/03.
De mais a mais, a interpretação deste dispositivo legal na jurisprudência tem sido extensiva, admitindo-se que a percepção de benefício assistencial, ou mesmo previdenciário com renda mensal equivalente ao salário mínimo, seja desconsiderada para fins de concessão do benefício assistencial previsto na Lei 8.742/93.
Ressalte-se, por oportuno, que os diplomas legais acima citados foram regulamentados pelo Decreto nº 6.214/07, o qual em nada alterou a interpretação das referidas normas, merecendo destacamento o art. 4º, inc. VI e o art. 19, caput e parágrafo único do referido decreto, in verbis:
A inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da mencionada Lei 8.742/93 foi arguida na ADIN nº 1.232-1/DF que, pela maioria de votos do Plenário do Supremo Tribunal Federal, foi julgada im procedente. Para além disso, nos autos do agravo regimental interposto na reclamação n.º 2303-6, do Rio Grande do Sul, interposta pelo INSS, publicada no DJ de 01.04.2005, p. 5-6, Rel. Min. Ellen Gracie, o acórdão do STF restou assim ementado:
Evidencia-se que o critério fixado pelo parágrafo 3º do artigo 20 da LOAS é o único apto a caracterizar o estado de necessidade indispensável à concessão da benesse em tela. Em outro falar, aludida situação de fato configuraria prova inconteste de necessidade do benefício constitucionalmente previsto, de modo a tornar dispensáveis elementos probatórios outros.
Assim, deflui dessa exegese o estabelecimento de presunção objetiva absoluta de estado de penúria ao idoso ou deficiente cuja partilha da renda familiar resulte para si montante inferior a 1/4 do salário mínimo.
Não se desconhece notícia constante do Portal do Supremo Tribunal Federal, de que aquela Corte, em recente deliberação, declarou a inconstitucionalidade dos dispositivos legais em voga (Plenário, na Reclamação 4374, e Recursos Extraordinários - REs 567985 e 580963, estes com repercussão geral, em 17 e 18 de abril de 2013, reconhecendo-se superado o decidido na ADI 1.232-DF), do que não mais se poderá aplicar o critério de renda per capita de ¼ do salário mínimo para fins de aferição da miserabilidade.
Também restou consolidado no colendo Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que a comprovação do requisito da renda familiar per capita não-superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo não exclui outros fatores que tenham o condão de aferir a hipossuficiência econômica da parte:
Em outras palavras: deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante a renda informada, caso a caso.
Quanto à alegada incapacidade, depreende-se do laudo médico pericial datado de 03/006/2015 (fls. 104-109), que a autora apresenta "hemiparesia esquerda decorrente de acidente vascular cerebral", e ainda, que tal patologia incapacita a demandante de forma total e permanente para o trabalho.
Por sua vez, o estudo social elaborado em 13/07/2015 (fls. 118-121) revela que o núcleo familiar era constituído pela própria autora, com 57 anos de idade (DN 11/03/1957), por seu cônjuge, José Carlos de Miranda, 55 anos (DN 29/10/1959), funcionário púbico estatutário da Prefeitura de Bom Jesus dos Perdões, onde exerce o cargo de "Auxiliar de Serviços", pelos filhos do casal, ambos desempregados, Fernando Moraes de Miranda, 29 anos (DN 26/01/1986) e Daina Moraes de Miranda, 24 anos (DN 18/06/1991), e pelas netas, menores impúberes, Letícia de Morais Lourenço, 4 anos (DN 20/02/2011) e Sophia de Moraes Lourenço, 02 anos (DN 10/01/2014).
Cumpre ressaltar que não tendo a parte autora comprovado a guarda (provisória ou definitiva) dos netos, eles não podem ser considerados integrantes do núcleo familiar, à inteligência do disposto no § 1º do art. 20, da Lei 8.742/93, in verbis:
A família residia em casa própria, construída em alvenaria, em área próxima ao centro da cidade, constituída por dois quartos, sala, banheiro, e escada dando acesso ao porão onde fica a cozinha, e nos fundos um pequeno quintal. A casa era simples, com portão de metal e interior inacabado, com paredes cimentadas. O imóvel era provido de rede de água e esgoto, com pavimentação asfáltica no logradouro.
Os móveis e eletrodomésticos eram simples (camas, guarda-roupas, duas geladeiras, dois televisores, sendo que um se encontrava quebrado, dois fogões, sofá, mesa) e se encontravam em mal estado de conservação, sendo que alguns móveis vieram da casa da falecida sogra da autora e outros pertenciam à filha Daiana.
A renda familiar era constituída pelo valor proveniente do labor do cônjuge na prefeitura local, valor de R$ 1.752,69 (em maio/2015). Ressalto que o salário base do marido da autora era R$ 992,87, sendo que no valor percebido em maio/2015 incluía adicionais e horas extras. Por ocasião do estudo social o valor do salário-mínimo mensal estava fixado em R$ 788,00.
Já a despesa mensal do núcleo familiar compreendia gastos com alimentação (R$ 200,00), energia elétrica (R$ 85,00), água (R$ 47,00), gás (R$ 47,00), medicamentos (R$ 50,00) e financiamento do terreno (R$ 340,00), totalizando R$ 769,00 por mês.
Os custos do tratamento da autora eram cobertos com dinheiro proveniente do aluguel de uma casa deixada pela sogra falecida da autora. O valor da locação do imóvel não foi declinado pela filha da autora, que teria prestado essa informação.
Observe-se que, mesmo tendo sido incluídos na somatória acima todos os gastos relativos a despesas comuns a todos os cidadãos, essenciais à sobrevivência digna, e ainda, aquelas realizadas com medicamentos (R$ 50,00), verifica-se superávit orçamentário.
Quanto à alegação de desemprego dos filhos da autora, não foi demonstrado qualquer impedimento para o labor em relação a eles, portanto, trata-se de situação temporária. A comprovar a assertiva, pesquisas realizadas no sistema CNIS demonstra que os filhos da demandante possuem vínculos formais de emprego com intervalos de desemprego (fls. 68 e 70).
Sendo assim, não há elementos o bastante para se afirmar que se trata de família que vive em estado de miserabilidade, ao contrário: os recursos obtidos pela família da parte requerente deveriam ser suficientes para cobrir os gastos ordinários, bem como tratamentos médicos e cuidados especiais que lhe são imprescindíveis.
Neste diapasão, não comprovados pela parte autora todos os requisitos necessários, não faz ela jus à concessão do benefício assistencial, devendo ser reformada a r. sentença, na íntegra.
Por conseguinte, impõe-se a cassação da tutela jurisdicional deferida pelo r. Juízo de Primeira Instância. Determino seja remetida esta decisão por via eletrônica à autoridade administrativa, a fim de que seja cessado o pagamento do benefício ora pleiteado, após o trânsito em julgado.
Consoante entendimento firmado pela Terceira Seção desta Corte, deixo de condenar a parte autora ao pagamento de custas, despesas processuais e honorários advocatícios, porquanto beneficiária da assistência judiciária gratuita (TRF - 3ª Seção, AR n.º 2002.03.00.014510-0/SP, Rel. Des. Fed. Marisa Santos, j. 10.05.2006, v.u., DJU 23.06.06, p. 460).
Isso posto, dou provimento à apelação autárquica.
É COMO VOTO.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 11/07/2016 17:55:07 |