D.E. Publicado em 23/08/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dou provimento à apelação autárquica, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | DAVID DINIZ DANTAS:10074 |
Nº de Série do Certificado: | 11A217051057D849 |
Data e Hora: | 07/08/2017 18:18:28 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0043796-75.2012.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Cuida-se de ação proposta em 11/05/2011 com vistas à concessão de benefício assistencial, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal.
Documentos acostados à exordial (fls. 14-20).
Deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 21).
Citação, em 29/03/2010 (fl. 24 v.).
Estudo socioeconômico (fls. 40-41).
Laudo médico pericial (fls. 50-51).
Sentença de procedência, prolatada em 12/12/2011. Antecipados os efeitos jurídicos da tutela (fls. 57-58).
Parecer do Ministério Público Federal (fls. 92-100).
Apelação do réu (fls. 64-86).
Decisão proferida por esta E. Corte, anulando a r. sentença prolatada, e determinando a devolução dos autos ao Juízo de origem, para realização de perícia socioeconômica (fls. 120-121).
Baixa dos autos a Instância inferior (fls. 123).
Estudo socioeconômico (fls. 128-132).
Parecer do Ministério Público do Estado de São Paulo (fls. 154).
A r. sentença, prolatada em 29/03/2016, julgou procedente o pedido. Determinado o pagamento do benefício desde a data do pedido administrativo. Afastada expressamente a submissão da sentença ao reexame necessário (fls. 155-157).
Apelação do INSS. No mérito, pugnou, em suma, pela reforma integral do julgado, em razão do não atendimento do requisito relativo à miserabilidade. Para o caso de manutenção do decisum, requer seja fixado o termo inicial do benefício na data da juntada do laudo médico pericial (fls. 161-178).
Com contrarrazões da parte autora (fls. 183-194), subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
Parecer do Ministério Público Federal (fls. 197-199).
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | DAVID DINIZ DANTAS:10074 |
Nº de Série do Certificado: | 11A217051057D849 |
Data e Hora: | 07/08/2017 18:18:22 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0043796-75.2012.4.03.9999/SP
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de recurso interposto pela parte ré contra sentença que julgou procedente pedido de benefício assistencial a pessoa portadora de deficiência.
O benefício de assistência social foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência em que se acham, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias. Neste aspecto está o lastro social do dispositivo inserido no artigo 203, V, da Constituição Federal, que concretiza princípios fundamentais, tais como o de respeito à cidadania e à dignidade humana, ao preceituar o seguinte:
De outro giro, os artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/93, com redação dada pela Lei 12.435, de 06 de julho de 2011, e o art. 34, da Lei 10.741 (Estatuto do Idoso), de 1º de outubro de 2003 rezam, in verbis:
O apontado dispositivo legal, aplicável ao idoso, procedeu a uma forma de limitação do mandamento constitucional, eis que conceituou como pessoa necessitada, apenas, aquela cuja família tenha renda inferior à 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, levando em consideração, para tal desiderato, cada um dos elementos participantes do núcleo familiar, exceto aquele que já recebe o benefício de prestação continuada, de acordo com o parágrafo único, do art. 34, da Lei 10.741/03.
De mais a mais, a interpretação deste dispositivo legal na jurisprudência tem sido extensiva, admitindo-se que a percepção de benefício assistencial, ou mesmo previdenciário com renda mensal equivalente ao salário mínimo, seja desconsiderada para fins de concessão do benefício assistencial previsto na Lei 8.742/93.
Ressalte-se, por oportuno, que os diplomas legais acima citados foram regulamentados pelo Decreto nº 6.214/07, o qual em nada alterou a interpretação das referidas normas, merecendo destacamento o art. 4º, inc. VI e o art. 19, caput e parágrafo único do referido decreto, in verbis:
A inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da mencionada Lei 8.742/93 foi arguida na ADIN nº 1.232-1/DF que, pela maioria de votos do Plenário do Supremo Tribunal Federal, foi julgada im procedente. Para além disso, nos autos do agravo regimental interposto na reclamação n.º 2303-6, do Rio Grande do Sul, interposta pelo INSS, publicada no DJ de 01.04.2005, p. 5-6, Rel. Min. Ellen Gracie, o acórdão do STF restou assim ementado:
Evidencia-se que o critério fixado pelo parágrafo 3º do artigo 20 da LOAS é o único apto a caracterizar o estado de necessidade indispensável à concessão da benesse em tela. Em outro falar, aludida situação de fato configuraria prova inconteste de necessidade do benefício constitucionalmente previsto, de modo a tornar dispensáveis elementos probatórios outros.
Assim, deflui dessa exegese o estabelecimento de presunção objetiva absoluta de estado de penúria ao idoso ou deficiente cuja partilha da renda familiar resulte para si montante inferior a 1/4 do salário mínimo.
Não se desconhece notícia constante do Portal do Supremo Tribunal Federal, de que aquela Corte, em recente deliberação, declarou a inconstitucionalidade dos dispositivos legais em voga (Plenário, na Reclamação 4374, e Recursos Extraordinários - REs 567985 e 580963, estes com repercussão geral, em 17 e 18 de abril de 2013, reconhecendo-se superado o decidido na ADI 1.232-DF), do que não mais se poderá aplicar o critério de renda per capita de ¼ do salário mínimo para fins de aferição da miserabilidade.
Também restou consolidado no colendo Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que a comprovação do requisito da renda familiar per capita não-superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo não exclui outros fatores que tenham o condão de aferir a hipossuficiência econômica da parte:
Em outras palavras: deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante a renda informada, caso a caso.
Quanto à alegada incapacidade, depreende-se do laudo médico pericial, relativo a perícia médica realizada em 23/08/2011 (fls. 50-51), que o expert concluiu que a demandante é portadora de Esquizofrenia, "estando incapacitada a qualquer atividade que lhe possa garantir o sustento.", de forma permanente ("Definitiva").
Por sua vez, estudo social concernente a visita realizada em 16/10/2015 (fls. 128-132) revela que o núcleo familiar era constituído pela própria autora, com 26 anos de idade (D.N.: 22/05/1989); por sua genitora, Nadir Elias da Silva, 48 anos de idade (D.N.: 16/04/1967), trabalhadora rural; pelo padrasto, Miguel Henrique Paes, 65 anos de idade (D.N.: 23/10/1949), aposentado; pelo filho (menor impúbere) da autora, Alisson Henrique da Silva, 6 anos (D.N.: 12/06/2009); pela irmã Daiane da Silva Almeida, 19 anos (D.N.: 14/01/1996), solteira, desempregada, e pelo sobrinho (menor impúbere), filho de Daiane, Thiago Henrique de Almeida, 4 anos de idade (D.N.: 03/03/2011).
Cumpre ressaltar que o sobrinho da autora não pode ser considerado integrante do seu núcleo familiar, à inteligência do disposto no § 1º do art. 20, da Lei 8.742/93, in verbis:
O núcleo familiar residia em casa própria, construída em alvenaria, constituída por cinco cômodos, cobertos com telhas de barro, sem forro, chão revestido com piso cerâmico na cozinha e na sala; demais cômodos de cimento queimado vermelhão; paredes revestidas com reboco e pintura; as paredes apresentavam rachaduras, infiltrações, pinturas deterioradas e sujas, além disso chovia dentro do imóvel; local com infraestrutura urbana, abastecida com água, energia elétrica, pavimentação asfáltica e iluminação pública, porém não tem rede de esgoto no local.
A residência encontrava-se guarnecida com a seguinte mobília: dois conjuntos de sofás de 3 e 2 lugares cada um, duas mesas, pia, fogão de quatro bocas, geladeira, armário, dois raques, aparelho DVD, televisão de 29 polegadas, duas estantes, quatro camas de casal, três guarda-roupas e um rádio portátil.
Os móveis se encontravam em estado "muito ruim" de conservação, antigos, alguns quebrados, deteriorados por corrosões e cupins.
A família era beneficiada pelo programa "Bolsa Família", com o valor de R$ 237,00 por mês.
Esclareço que, por expressa disposição legal (art. 4º, § 2º, II, do Decreto nº 6.214/07), o valor percebido pela família da autora, proveniente de programa de transferência de renda (Bolsa-Família) não pode ser considerado para fins de apuração da renda per capta.
Quanto à alegação de desemprego de Daiane da Silva Almeida, 19 anos (D.N.: 14/01/1996), solteira, irmã da autora, perfilho o entendimento de que se trata de situação temporária, pois se trata de pessoa jovem, que estudou até a 7ª série do ensino fundamental, e que não demonstrou qualquer impedimento para o labor, portanto, responsável pela própria manutenção e a de seu filho.
No tocante a renda familiar, mostraram-se inverídicas as informações prestadas à assistente social. A expert foi informada de que a renda familiar resumia-se aos valores relativos ao benefício assistencial percebido pela parte autora, por força de antecipação da tutela na presente ação, e aos proventos de aposentadoria (no valor de um salário mínimo) auferidos pelo padrasto da autora, totalizando R$ 1.576,00 por mês,
Primeiro cumpre ressalvar que, consoante fundamentado acima, a renda de um salário mínimo (R$ 788,00) percebida pelo padrasto da autora (fl. 152), proveniente de benefício previdenciário (aposentadoria por idade) deve ser desconsiderada para fins de apuração da renda per capita, assim como o valor do benefício assistencial percebido pela autora, por força de antecipação da tutela.
Consoantes pesquisas realizadas no CNIS - Cadastro Nacional de Informações Sociais, bem como no PLENUS, e coligidas aos autos pelo réu (fls.147-152) a genitora da demandante, que declarou a expert que deixou de auferir renda por motivo de doença, na realidade, por ocasião da perícia social auferia renda proveniente de labor formal, com salário no valor de R$ 905,00 por mês (fl.151), sendo que o salário-mínimo mensal nacional estabelecido perfazia R$ 788,00.
Considerando que a renda do padrasto da autora destinava-se exclusivamente a sua manutenção, temos que a renda auferida pela genitora da requerente destinava-se apenas a sua própria manutenção e a da filha Tatiane (autora da ação), consequentemente, a renda per capita perfazia R$ 452,50 por mês.
De outro lado, a despesa mensal fixa do núcleo familiar compreendia gastos com alimentação (R$ 550,00), energia elétrica (R$ 75,00), água (R$ 25,00), gás (R$ 55,00), e medicamentos (R$ 160,00), totalizando R$ 865,00 ao mês.
Constata-se, então, que, mesmo tendo sido incluídos na somatória acima todos os gastos relativos a despesas comuns a todos os cidadãos, essenciais a uma sobrevivência digna, e ainda, aquelas realizadas com medicamentos de uso contínuo (R$ 160,00 por mês), cujo fornecimento poderia ser exigido do Estado, ainda assim verifica-se pequeno superávit orçamentário.
Sendo assim, não há, nos autos, elementos o bastante para se afirmar que se trata de família que vive em estado de miserabilidade, ao contrário: os recursos obtidos pela família da parte requerente aparentemente são suficientes para cobrir os gastos ordinários, bem como eventuais tratamentos médicos e cuidados especiais que lhes sejam imprescindíveis.
Neste diapasão, não comprovados pela parte autora os requisitos legais necessários, não faz ela jus à concessão do benefício assistencial, tornando imperiosa a reforma da r. sentença, na íntegra.
Por conseguinte, impõe-se a cassação da tutela jurisdicional deferida pelo r. Juízo de Primeira Instância (fl. 58 v.).
Fica a Autarquia ciente de que sua intimação para o cumprimento da determinação ora lançada ocorre no ato da intimação acerca da presente decisão/despacho, na pessoa de seus Procuradores, nos termos do art. 231, VIII do CPC/2015 e nos termos do Ofício n. 78/2017 - UTU8, datado de 16.05.2017, encaminhado pela Presidência da Oitava Turma à Procuradora Chefe da Procuradoria-Regional Federal da 8ª Região.
Competirá aos Procuradores da Autarquia realizar as comunicações internas e administrativas necessárias ao cumprimento da medida.
Isso posto, dou provimento à apelação autárquica.
É COMO VOTO.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | DAVID DINIZ DANTAS:10074 |
Nº de Série do Certificado: | 11A217051057D849 |
Data e Hora: | 07/08/2017 18:18:25 |