
| D.E. Publicado em 21/09/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação autárquica, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003952-45.2012.4.03.6111/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Cuida-se de ação proposta em 30/10/2012 com vistas à concessão de benefício assistencial, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal.
Documentos acostados à exordial (fls. 09-18).
Deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 22).
Citação, em 28/11/2012 (fl. 26).
Mandado de constatação (fls. 48-60)
Laudo médico pericial (fls. 61-66).
Parecer do Ministério Público Federal, opinando pela nomeação de curador especial à autora e, no mérito, pela improcedência do pedido (fls. 83-86).
Termo de compromisso de curador especial (fl. 93).
Decisão na qual foi determinada a realização de novo estudo socioeconômico (fl. 102).
Mandado de constatação (fls. 105-116).
Parecer do Ministério Público Federal, opinando pela procedência do pedido (fl. 162).
A r. sentença, prolatada em 30/11/2016, julgou parcialmente procedente o pedido. Antecipados os efeitos da tutela. Determinado o pagamento do benefício a partir de 22/06/2016. Condenado o réu, ainda, a pagar, de uma única vez, as prestações vencidas desta a data do início do benefício fixada na sentença, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros, a contar da citação, de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução 267, de 10/12/2013, do Conselho da Justiça Federal, em razão da inconstitucionalidade parcial por arrastamento do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 (ADI 4357/DF), em que ficou afastada a aplicação dos "índices oficiais de remuneração básica" da caderneta de poupança como indexador de correção monetária nas liquidações de sentença proferidas contra a Fazenda Pública; os juros incidirão em conformidade com os índices aplicáveis à caderneta de poupança. A correção monetária, a partir de setembro de 2006, pelo INPC/IBGE, em conformidade com a Lei 10.741/2003, MP 316/2006 e Lei 11.430/2006 (fls. 165-171).
Apelação do INSS. No mérito, pugnou, em suma, pela reforma integral do julgado, com a revogação da tutela antecipada, em razão do não atendimento do requisito relativo à miserabilidade. Para o caso de manutenção do decisum, requer que a correção monetária, a partir de 06/2009, da mesma forma que os juros, seja feita com base na utilização da TR, e de acordo com o art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação que lhe fora conferida pelo art. 5º da Lei 11.960/09; Por fim, pleiteia a revogação da tutela antecipada na sentença e a condenação da parte autora a devolver à Autarquia os valores pagos por força da decisão liminar, com ressarcimento nos próprios autos (fls. 177-182).
Com contrarrazões (fls. 186-191), subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
Parecer do Ministério Público Federal, opinando pelo desprovimento da apelação do INSS (fls. 195-196).
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003952-45.2012.4.03.6111/SP
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de recurso interposto pela parte ré contra sentença que julgou procedente pedido de benefício assistencial a pessoa portadora de deficiência.
O benefício de assistência social foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência em que se acham, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias. Neste aspecto está o lastro social do dispositivo inserido no artigo 203, V, da Constituição Federal, que concretiza princípios fundamentais, tais como o de respeito à cidadania e à dignidade humana, ao preceituar o seguinte:
De outro giro, os artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/93, com redação dada pela Lei 12.435, de 06 de julho de 2011, e o art. 34, da Lei 10.741 (Estatuto do Idoso), de 1º de outubro de 2003 rezam, in verbis:
O apontado dispositivo legal, aplicável ao idoso, procedeu a uma forma de limitação do mandamento constitucional, eis que conceituou como pessoa necessitada, apenas, aquela cuja família tenha renda inferior à 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, levando em consideração, para tal desiderato, cada um dos elementos participantes do núcleo familiar, exceto aquele que já recebe o benefício de prestação continuada, de acordo com o parágrafo único, do art. 34, da Lei 10.741/03.
De mais a mais, a interpretação deste dispositivo legal na jurisprudência tem sido extensiva, admitindo-se que a percepção de benefício assistencial, ou mesmo previdenciário com renda mensal equivalente ao salário mínimo, seja desconsiderada para fins de concessão do benefício assistencial previsto na Lei 8.742/93.
Ressalte-se, por oportuno, que os diplomas legais acima citados foram regulamentados pelo Decreto nº 6.214/07, o qual em nada alterou a interpretação das referidas normas, merecendo destacamento o art. 4º, inc. VI e o art. 19, caput e parágrafo único do referido decreto, in verbis:
A inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da mencionada Lei 8.742/93 foi arguida na ADIN nº 1.232-1/DF que, pela maioria de votos do Plenário do Supremo Tribunal Federal, foi julgada im procedente. Para além disso, nos autos do agravo regimental interposto na reclamação n.º 2303-6, do Rio Grande do Sul, interposta pelo INSS, publicada no DJ de 01.04.2005, p. 5-6, Rel. Min. Ellen Gracie, o acórdão do STF restou assim ementado:
Evidencia-se que o critério fixado pelo parágrafo 3º do artigo 20 da LOAS é o único apto a caracterizar o estado de necessidade indispensável à concessão da benesse em tela. Em outro falar, aludida situação de fato configuraria prova inconteste de necessidade do benefício constitucionalmente previsto, de modo a tornar dispensáveis elementos probatórios outros.
Assim, deflui dessa exegese o estabelecimento de presunção objetiva absoluta de estado de penúria ao idoso ou deficiente cuja partilha da renda familiar resulte para si montante inferior a 1/4 do salário mínimo.
Não se desconhece notícia constante do Portal do Supremo Tribunal Federal, de que aquela Corte, em recente deliberação, declarou a inconstitucionalidade dos dispositivos legais em voga (Plenário, na Reclamação 4374, e Recursos Extraordinários - REs 567985 e 580963, estes com repercussão geral, em 17 e 18 de abril de 2013, reconhecendo-se superado o decidido na ADI 1.232-DF), do que não mais se poderá aplicar o critério de renda per capita de ¼ do salário mínimo para fins de aferição da miserabilidade.
Também restou consolidado no colendo Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que a comprovação do requisito da renda familiar per capita não-superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo não exclui outros fatores que tenham o condão de aferir a hipossuficiência econômica da parte:
Em outras palavras: deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante a renda informada, caso a caso.
Quanto à alegada incapacidade, depreende-se do laudo médico pericial, relativo a perícia médica realizada em 09/11/2013 (fls. 61-66), que o expert concluiu que a demandante, à época com 35 anos de idade, é portadora de patologia classificada no CID 10 F28 "Outros transtornos psicóticos não orgânicos", a qual ocasiona incapacidade total e permanente para o labor.
Por sua vez, o estudo social concernente à visita realizada em 29/10/2013 (fls. 49-66) revela que a autora residia com uma filha (Andressa Cristina Gomes dos Santos, do lar, 19 anos de idade) que convivia (união estável) com Diego Barbosa da Silva, 20 anos de idade, servente de pedreiro, sendo que o casal possuía uma filha, Beatriz Vitória Gomes da Silva, com 01 anos e 8 meses na época. A autora também residia com dois filhos solteiros, Matheus Gomes dos Santos, 13 anos de idade, estudante, e Everton Gomes dos Santos, solteiro, 22 anos de idade, servente de pedreiro. Na ocasião da visita em questão, a assistente social foi informada pela filha da autora que esta mantivera união estável com Genivaldo Jacinto dos Santos até quatro meses atrás, e que seu pai mandava mensalmente aproximadamente R$ 800,00 por mês à família. Na época o salário mínimo mensal estava fixado em R$ 678,00.
Tendo sido realizado novo estudo socioeconômico em 22/06/2016 (fls. 106-116), o Oficial de Justiça foi informado pela filha da requerente, de que sua genitora passou a residir apenas com ela, Andressa Cristina, com o genro Diego, com a neta Beatriz Vitória, e com o filho Matheus, na ocasião com 16 anos de idade. O outro filho da autora (Everton Gomes dos Santos) teria se casado há aproximadamente oito meses e mudado para a casa da sogra; a filha da autora também esclareceu que o irmão supracitado estaria pagando as despesas com alimentação (mercado, açougue e padaria) da casa na qual a autora residia, e seu pai, ex-companheiro da requerente, estaria mandando aproximadamente R$ 500,00 por mês para manutenção da família.
Inicialmente, quanto à elaboração de novo estudo socioeconômico pela simples razão do decurso do tempo, entendo que, se há nova situação a ser analisada, merecedora de reavaliação, traz-se mudança na causa de pedir. In casu, houve nova composição do núcleo familiar e da renda auferida, que restou informada nos autos somente quando da realização do segundo estudo socioeconômico, em 22/06/2016. A nova situação (inexistente quando proposta a ação, no ano de 2012) deve ser aferida perante os balcões previdenciários, ou noutra demanda. Portanto, na presente ação há que se considerar apenas o estudo social realizado em 29/10/2013 (fls. 49-66), em data muito mais próxima à da propositura da ação (30/10/2012).
Cumpre ressaltar que a filha da autora (Andressa Cristina), por conviver em união estável, seu genro Diego e sua neta Beatriz Vitória não podem ser considerados integrantes do seu núcleo familiar, à inteligência do disposto no § 1º do art. 20, da Lei 8.742/93, in verbis:
O núcleo familiar residia em casa própria (financiada), construída em alvenaria, constituída por sete cômodos: três quartos, sala, cozinha e um banheiro; havia também uma edícula, com um cômodo, inacabado. Das fotografias acostadas ao mandado de constatação se depreende que todo o piso da residência encontrava-se revestido por piso cerâmico novo, bem como as paredes do banheiro e da cozinha.
A residência encontrava-se guarnecida com mobília comum, simples, mas em bom estado de conservação; vislumbra-se também a existência de aparelho de televisão grande e moderno na sala, e ainda, aparelho de som.
A renda familiar era constituída pelo valor enviado pelo ex-companheiro da autora, aproximadamente R$ 800,00 por mês, e pela renda auferida pelo filho da requerente (Everton), que trabalhava como servente de pedreiro, R$ 400,00 por mês, totalizando R$ 1.200,00. Consequentemente, a renda per capita do núcleo familiar da autora era de aproximadamente R$ 400,00 por mês. Por ocasião do estudo social o valor do salário-mínimo mensal estava fixado em R$ 788,00.
De outro lado, a despesa mensal fixa do núcleo familiar compreendia gastos com financiamento do imóvel (R$ 345,00), alimentação (R$ 300,00), energia elétrica (R$ 405,00), água (R$ 45,00), gás (R$ 57,00), IPTU (30,00), telefone e celular (R$ 60,00), cigarros (R$ 20,00), e medicamentos (R$ 150,00), totalizando R$ 1.412,00 ao mês.
Merece relevo o fato de que além de não terem sido comprovados os gastos declarados com medicamentos (R$ 150,00 por mês), também não restou esclarecida a razão daqueles de uso contínuo estarem sendo adquiridos em estabelecimentos privados, ao invés de ser acessada a rede pública de saúde para tanto, ou ainda, exigido (ainda que judicialmente) do Estado seu fornecimento gratuito.
Sendo assim, não há, nos autos, elementos o bastante para se afirmar que se trata de família que vive em estado de miserabilidade, ao contrário: verifica-se, in casu, que os recursos obtidos pela família da parte requerente, que deveriam ser suficientes para cobrir os gastos ordinários, bem como tratamentos médicos e cuidados especiais que lhe sejam imprescindíveis, estaria sendo destinada a gastos com serviços de telefonia e cigarros, despesas essas totalmente prescindíveis em situação de penúria econômica extrema.
Neste diapasão, não comprovados pela parte autora os requisitos legais necessários, não faz ela jus à concessão do benefício assistencial, tornando imperiosa a reforma da r. sentença, na íntegra.
Por conseguinte, impõe-se a cassação da tutela jurisdicional deferida pelo r. Juízo de Primeira Instância na r. sentença.
Fica a Autarquia ciente de que sua intimação para o cumprimento da determinação ora lançada ocorre no ato da intimação acerca da presente decisão/despacho, na pessoa de seus Procuradores, nos termos do art. 231, VIII do CPC/2015 e nos termos do Ofício n. 78/2017 - UTU8, datado de 16.05.2017, encaminhado pela Presidência da Oitava Turma à Procuradora Chefe da Procuradoria-Regional Federal da 8ª Região.
Competirá aos Procuradores da Autarquia realizar as comunicações internas e administrativas necessárias ao cumprimento da medida.
Isso posto, dou provimento à apelação autárquica. Tutela antecipada revogada.
É COMO VOTO.
DAVID DANTAS
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