
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002332-57.2023.4.03.6100
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: LIDIA VIEIRA DIAS
Advogados do(a) APELANTE: EDGAR MONTEIRO SANTIAGO - SP400665-A, MARIO DE SOUZA FILHO - SP65315-A, SUZANA PREVITALLI - SP347231-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002332-57.2023.4.03.6100
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: LIDIA VIEIRA DIAS
Advogados do(a) APELANTE: EDGAR MONTEIRO SANTIAGO - SP400665-A, MARIO DE SOUZA FILHO - SP65315-A, SUZANA PREVITALLI - SP347231-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Desembargador Federal Jean Marcos (Relator):
Trata-se de ação destinada a viabilizar o restabelecimento do benefício de aposentadoria por invalidez, com a declaração de nulidade do débito referente ao recebimento cumulativo de auxílio-acidente, no período de 01.12.2017 a 30.11.2022.
A r. sentença (ID 281855035) julgou o pedido inicial parcialmente procedente para determinar o recálculo da RMI da aposentadoria por invalidez, computado o valor do auxílio-acidente, facultado o desconto dos valores recebidos indevidamente.
A parte autora, ora apelante (ID 281855042), requer, preliminarmente, o reconhecimento da nulidade da r. sentença, por ausência de fundamentação. No mérito, afirma ser ilegal a cobrança administrativa porque os valores foram recebidos de boa-fé.
Sem contrarrazões.
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002332-57.2023.4.03.6100
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: LIDIA VIEIRA DIAS
Advogados do(a) APELANTE: EDGAR MONTEIRO SANTIAGO - SP400665-A, MARIO DE SOUZA FILHO - SP65315-A, SUZANA PREVITALLI - SP347231-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Desembargador Federal Jean Marcos (Relator):
A Lei nº 8.213/91:
“Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem seqüelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.
§ 1º O auxílio-acidente mensal corresponderá a cinqüenta por cento do salário-de-benefício e será devido, observado o disposto no § 5º, até a véspera do início de qualquer aposentadoria ou até a data do óbito do segurado.
§ 2º O auxílio-acidente será devido a partir do dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença, independentemente de qualquer remuneração ou rendimento auferido pelo acidentado, vedada sua acumulação com qualquer aposentadoria. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 10/12/97)”
A parte autora alega cessação indevida do benefício de aposentadoria por invalidez recebido em razão da natureza alimentar dos valores.
De início, um dos princípios que norteiam a Administração Pública é o do autotutela consubstanciado no poder-dever da Administração em regular seus próprios atos, tornando-os nulos quando eivados de vícios e ilegalidades ou, revogando-os por conveniência ou oportunidade. Tal princípio foi corroborado pela Súmula 473, do Superior Tribunal Federal. Veja:
“A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.”
Contudo, como bem observado na r. sentença e fixado no verbete nº 507, do Superior Tribunal de Justiça: “A acumulação de auxílio-acidente com aposentadoria pressupõe que a lesão incapacitante e a aposentadoria sejam anteriores a 11/11/1997, observado o critério do art. 23 da Lei n. 8.213/1991 para definição do momento da lesão nos casos de doença profissional ou do trabalho” - grifei
Embora a verba recebida a título de auxílio-acidente tenha tido início em 08/11/2002 (ID 281855015), a acumulação dos benefícios se deu somente no ano de 2012, quando passou a receber o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (ID 281855016).
Quanto à devolução dos valores recebidos, tal matéria foi objeto de recurso repetitivo julgado pelo Ministro Relator Benedito Gonçalves no STJ, em Recurso Especial nº 1381734/RN, tema 979, que discutiu a devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social, firmando-se a seguinte tese, cujo trânsito em julgado ocorreu em 17/06/2021:
“Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) de valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido."
Houve modulação dos efeitos da decisão acima:
“Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste representativo da controvérsia, em respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável interesse social que permeia a questão sub examine, e a repercussão do tema que se amolda a centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse modo somente deve atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão (Acórdão publicado no DJe de 23/4/2021).” - grifei
Logo, resta claro que o referido julgado se aplica ao caso concreto aqui tratado em razão da modulação dos efeitos, que fixou a tese a partir de 23/04/2021, considerada a distribuição da presente demanda, em primeira instância, da data de 1º/02/2023.
A boa-fé, no caso, é aplicável porque não se poderia exigir da parte autora o conhecimento da irregularidade havida por ocasião da concessão do benefício, o que, inclusive, somente foi constatado após denúncia.
A toda evidência, a parte autora é pessoa simples e com pouca instrução e, considerando que a acumulação se deu por erro da Administração, resta configurada a boa-fé no recebimento dos valores correspondentes ao período de 29/03/2012 a 1º/1/2023, data de cessação administrativa do benefício (ID 281855016).
Inverto o ônus sucumbencial. Condeno a autarquia ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, observados os termos da Súmula nº 111 e de acordo com o decidido no Tema 1105, ambos do Superior Tribunal de Justiça.
Por tais fundamentos, dou provimento à apelação para declarar inexigível a devolução de valores pela parte autora, nos termos da fundamentação.
É como voto.
E M E N T A
APELAÇÃO PREVIDENCIÁRIO. ACUMULAÇÃO DE BENEFÍCIOS AUXÍLIO-ACIDENTE E APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUTOTUTELA DA ADMINISTRAÇÃO. DEVOLUÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. BOA-FÉ. TEMA 979/STJ. RECURSO DO INSS NÃO PROVIDO.
1. Um dos princípios que norteiam a Administração Pública é o do autotutela consubstanciado no poder-dever da Administração em regular seus próprios atos, tornando-os nulos quando eivados de vícios e ilegalidades ou, revogando-os por conveniência ou oportunidade.
2. A acumulação de auxílio-acidente com aposentadoria pressupõe que a lesão incapacitante e a aposentadoria sejam anteriores a 11/11/1997, observado o critério do art. 23 da Lei n. 8.213/1991 para definição do momento da lesão nos casos de doença profissional ou do trabalho. Inteligência da Súmula 507/stj.
3. Embora a verba recebida a título de auxílio-acidente tenha tido início em 15/11/1995, a acumulação dos benefícios se deu somente no ano de 2015, quando passou a receber o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
4. Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) de valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido (STJ, REsp. 1381734/RN, Rel. Min.Benedito Gonçalves, DJe 23/4/2021)
5. A toda evidência, a parte autora é pessoa simples e com pouca instrução e, considerando que a acumulação se deu por erro da Administração, resta configurada a boa-fé no recebimento dos valores correspondentes ao período de 29/03/2012 a 1º/1/2023, data de cessação administrativa do benefício (ID 281855016).
6. Recurso provido.
