Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0009121-42.2009.4.03.6103
Relator(a)
Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO
Órgão Julgador
2ª Turma
Data do Julgamento
05/07/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 12/07/2021
Ementa
E M E N T A
APELAÇÃO. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PROCESSO ADMINISTRATIVO
DISCIPLINAR. EXCESSO DE PRAZO. IMPARCIALIDADE. SUSPEIÇÃO DE TESTEMUNHAS.
PROVAS POR AMOSTRAGEM. DUPLA PENALIZAÇÃO PELO MESMO FATO. DESTITUIÇÃO
DE FUNÇÃO COMISSIONADA. DEMISSÃO. VIOLAÇÃO A ISONOMIA.
- A jurisprudência do E.STJ étorrencial e uniforme quanto aos limites da atuação do Poder
Judiciário no controle do processo administrativo, o qual restringe-se à verificação de vícios
capazes de ensejar a sua nulidade, sendo-lhe defeso incursionar no mérito administrativo, salvo
patente infração a garantias processuais ou princípios da ordem jurídica, como a razoabilidade ou
a proporcionalidade.
- A extrapolação do prazo de 60 dias previsto no art. 152 da Lei nº 8.112/1990 para conclusão do
PAD não constitui, por si só, causa de nulidade do processo, devendo ser demonstrado no caso
concreto os prejuízos advindos ao servidor investigado diante do irrazoável alargamento de
prazo. Nesse sentido, a Súmula nº 592 do STJ.
- A suspeição de testemunhas tem que ser concretamente fundamentada, não bastando
alegações genéricas de desafetos pessoais, sem qualquer elemento que demonstre o lastro de
tal suspeição. Verifica-se que, no caso concreto, a autora também não apresentou contradita
antes dos depoimentos.
- A suposta atuação de servidores na produção de provas no PAD e a incompatibilidade de que
servissem como testemunhas também não ficou demonstrada, pois as pesquisas por eles feitas
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
foram no âmbito do Censo Previdenciário determinado pela Gerência Executiva do INSS, e após
seus dados utilizados pela comissão processante; não foram designados para produzir provas
específicas para instrução do PAD e nem compunham a comissão.
- A amostragem verificada não fundamentou de maneira única a condenação da parte-autora,
mas foi apenas um dos meios de prova – e de caráter apenas suplementar, pelo que se tem dos
dados do PAD – na elaboração da conclusão de que a servidora atuou de maneira ilícita junto à
autarquia.
- A autora não foi destituída da função comissionada que ocupava em razão de penalidade, mas
em decorrência da própria natureza precária da função, que é que de livre nomeação e
exoneração. A dispensa de função comissionada, assim como sua designação, não precisa ser
motivada, dá-se ad nutum, e foi nesses termos que ocorreram tanto a designação quanto a
dispensa, não havendo se falar em dupla penalização pelo mesmo fato.
- A análise aqui feita versa exclusivamente sobre a legalidade do PAD em relação à autora, sendo
vedado, inclusive, a incursão em aspectos de mérito de seu próprio julgamento, na esteira do já
consignado nesta decisão, quanto mais transportar conclusões de mérito em relação a outro
servidor que respondeu a inquérito semelhante, uma vez que cada conduta deve ser avaliada de
modo individualizado.
- Apelação desprovida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0009121-42.2009.4.03.6103
RELATOR:Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
APELANTE: SHEILA MARA ROSA BARBOSA FERREIRA
Advogado do(a) APELANTE: ELAYNE DOS REIS NUNES PEREIRA - SP209872-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: ANA PAULA PEREIRA CONDE - RJ97139
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0009121-42.2009.4.03.6103
RELATOR:Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
APELANTE: SHEILA MARA ROSA BARBOSA FERREIRA
Advogado do(a) APELANTE: ELAYNE DOS REIS NUNES PEREIRA - SP209872-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: ANA PAULA PEREIRA CONDE - RJ97139
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXMO SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Trata-se de
apelação interposta por Sheila Mara Rosa Barbosa Ferreira contra sentença que julgou
improcedente o pedido de declaração de nulidade do processo administrativo disciplinar nº
5437.000372/2007-75, no qual foi aplicada a penalidade de demissão à servidora pública.
As razões da apelação são: o prazo de duração do processo administrativo extrapolou o limite
legal; houve quebra de imparcialidade na condução dos trabalhos, pois foram designados para
refazer pesquisas, supostamente não feitas pela autora, servidores que tinham desafetos
pessoais com ela; foram admitidas provas ilícitas nos autos, por terem sido produzidas por
pessoas impedidas ou suspeitas; não houve busca da verdade real e material dos fatos; as
testemunhas funcionaram também como agentes produtores de provas; a comissão deveria ter
verificado todas as supostas pesquisas não feitas pela autora, e não apenas uma pequena
amostragem; violação ao princípio “non bis in idem”, pois a autora foi duplamente penalizada
pelo mesmo fato.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0009121-42.2009.4.03.6103
RELATOR:Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
APELANTE: SHEILA MARA ROSA BARBOSA FERREIRA
Advogado do(a) APELANTE: ELAYNE DOS REIS NUNES PEREIRA - SP209872-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: ANA PAULA PEREIRA CONDE - RJ97139
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Versa o
presente feito sobre a anulação de penalidade de demissão imposta a servidor público federal
em razão de alegados vícios no Processo Administrativo Disciplinar.
Consta dos autos que o Processo Administrativo Disciplinar nº 5437.000372/2007-75 foi
instaurado para apurar supostos fatos ilícitos cometidos no recadastramento obrigatório de
segurados da Previdência Social, pois houve denúncias de que os servidores designados para
realizar visitas presenciais a estes segurados não as realizavam e, mesmo assim, recebiam a
remuneração prevista para tanto. Após conclusão do processo, a servidora Sheila foi
condenada à penalidade de demissão, tendo sua conduta sido enquadrada no art. 117, inciso
IX, da Lei nº 8.112/90 (“Ao servidor é proibido valer-se do cargo para lograr proveito pessoal ou
de outrem, em detrimento da dignidade da função pública”).
A sentença julgou improcedente o pedido de reconhecimento de nulidades no processo
administrativo, e, em apelação, a autora alega, em síntese, os seguintes pontos:
a) prazo de duração do processo administrativo extrapolou o limite legal;
b) quebra de imparcialidade na condução dos trabalhos e uso de provas ilícitas nos autos;
c) não houve busca da verdade real e material dos fatos, sendo vedado o uso de “amostragem”
d) violação ao princípio “non bis in idem”, pois a autora foi duplamente penalizada pelo mesmo
fato.
Imperioso salientar que a jurisprudência do STJ é rigorosamente torrencial e uniforme quanto
aos limites da atuação do Poder Judiciário no controle do processo administrativo, o qual
restringe-se à verificação de vícios capazes de ensejar a sua nulidade, sendo-lhe defeso
incursionar no mérito administrativo, salvo patente infração a garantias processuais ou primados
da ordem jurídica, como a razoabilidade ou a proporcionalidade.
Nesse sentido, confira-se o entendimento do e. STJ:
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. REITOR DE UNIVERSIDADE FEDERAL.
PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR (PAD). PENA DE DEMISSÃO. PRESCRIÇÃO.
INOCORRÊNCIA. IMPARCIALIDADE DOS MEMBROS DA COMISSÃO DE PAD QUE
PARTICIPARAM DE OUTRAS COMISSÕES. CONTROLE JURISDICIONAL DO PROCESSO
ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. EXAME DA REGULARIDADE DO PROCEDIMENTO E DA
LEGALIDADE DO ATO. IMPOSSIBILIDADE DE INCURSÃO DO MÉRITO DO ATO
ADMINISTRATIVO. FUNDAMENTAÇÃO.
PROPORCIONALIDADE.
1. Processo administrativo disciplinar (PAD) que aplicou penalidade de demissão ao impetrante,
professor e ex-Reitor de Universidade Federal, por concluir que o impetrante valeu-se do cargo
que ocupava junto à Universidade para lograr proveito pessoal ou de outrem, em detrimento da
dignidade da função pública, ao assinar contrato com o Governo do Distrito Federal e
subcontratos com Fundações ligadas à Universidade, utilizadas em desvio de finalidade, para
que recursos do Distrito Federal fossem destinados a particulares, sem a realização de
licitação. 2. O impetrante respondeu a quatro PADs por irregularidades constatadas ao tempo
em que foi Reitor, sendo cada qual decorrente de um Relatório de Demandas Especiais (RDE)
elaborado pela CGU (Controladoria-Geral da União). Embora os fatos sejam conexos e
pudessem ser apurados em um único PAD, foram agrupados em 4 PADs por uma questão de
eficiência, operando-se a interrupção da prescrição relativa a cada grupo de fatos com a
abertura do respectivo PAD. Art. 142, parágrafo 3º, da Lei 8.112/90.
3. Não há parcialidade de membro da Comissão Processante apenas por compor outra
Comissão Processante, que apura outros fatos pelos quais é investigado o mesmo servidor
público. Precedente: MS 21859.
4. O exame da prova produzida no PAD foi feito de forma fundamentada pela autoridade
impetrada, que concluiu pela participação dolosa do impetrante nos atos a ele imputados a
partir dos elementos de prova indicados e sopesados no Relatório Final da Comissão
processante, adotado pela autoridade impetrada.
5. O servidor acusado no processo administrativo disciplinar defende-se dos fatos a ele
imputados e não da tipificação legal relacionada. O valimento do cargo (art. 117, IX) ou a
improbidade administrativa já levariam por si só à imposição da penalidade de demissão (art.
132, IV e XIII, da Lei 8.112/90), não havendo que se falar em nulidade se não houve prejuízo à
ampla defesa do impetrante.
6. A avaliação da gravidade da infração efetuada em sede de Processo Administrativo
Disciplinar, se não ultrapassa a esfera do proporcional e do razoável, como nos presentes
autos, não se sujeita à revisão judicial.
7. Ordem denegada.
(MS 21.773/DF, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em
23/10/2019, DJe 28/10/2019)
ADMINISTRATIVO. PROCESSO DISCIPLINAR. INCURSÃO NO MÉRITO ADMINISTRATIVO.
IMPOSSIBILIDADE. PENA APLICADA. PROPORCIONALIDADE.
PARÂMETROS. MAGISTRADO. CONDUTA INCOMPATÍVEL COM A DIGNIDADE, HONRA E
DECORO DAS FUNÇÕES. SANÇÃO. ADEQUAÇÃO.
1. No controle jurisdicional do processo administrativo, a atuação do Poder Judiciário limita-se
ao campo da regularidade do procedimento, bem como à legalidade do ato, não sendo possível
nenhuma incursão no mérito administrativo a fim de aferir o grau de conveniência e
oportunidade.
2. É firme o entendimento de que é possível o exame da penalidade imposta, acerca da
proporcionalidade e da razoabilidade na aplicação da pena, já que estaria relacionada com a
própria legalidade do ato administrativo.
3. Nos termos do art. 2º da Lei n. 9.784/1999, a Administração obedecerá, entre outros, aos
princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade,
ampla defesa e contraditório, devendo os referidos postulados ser observados inclusive na
aplicação dos atos sancionatórios.
4. Especificamente em relação à proporcionalidade, alguns parâmetros devem ser adotados,
sendo três as balizas a serem observadas: i) adequação - verificando-se se a medida adotada é
eficaz para alcançar o resultado pretendido; ii) necessidade - devendo ser observado se o fim
almejado pode ser atingido por meio menos gravoso ou oneroso; iii) proporcionalidade em
sentido estrito - consubstanciada na relação custo-benefício, ponderando-se se a providência
acatada não irá sacrificar bem de categoria jurídica mais elevada do que aquele que se
pretende resguardar.
5. Do magistrado exige-se comportamento ético, moral, ilibado e probo tanto na vida pública
como na particular, devendo agir sempre de forma compatível com a relevante função que
exerce, conforme inteligência do Código de Ética da Magistratura, aprovado pelo Conselho
Nacional de Justiça em agosto de 2008, que estabeleceu preceitos complementares aos
deveres funcionais dos juízes que emanam da Constituição Federal, do Estatuto da
Magistratura e das demais disposições legais.
6. Hipótese em que mostra-se correta a aplicação da pena de aposentadoria compulsória com
proventos proporcionais à magistrada ante a prática de conduta gravísssima, incompatível com
a dignidade, honra e decoro de suas funções, qual seja, a determinação de busca e apreensão
de armas que estariam em poder, supostamente, de um morador do condomínio no qual ela
residia, sem provocação do Ministério Público ou de autoridade policial, diligência que ela
conduziu pessoalmente, e, ainda, o confisco de câmera fotográfica e a voz de prisão dada à
empregada doméstica da residência. Aplicação do art. 56, II, da LC 73/1979.
7. Recurso desprovido.
(RMS 33.671/RJ, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, Rel. p/ Acórdão Ministro GURGEL
DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/02/2019, DJe 14/03/2019)
Portanto, ressalte-se que a análise dos pontos elencados pela parte-autora partirá dessa
premissa, e apreciados segundo o respeito pela Administração aos princípios
constitucionalmente garantidos.
Passa-se a analisar cada um dos tópicos pertinentes para deslinde do presente recurso.
a) Prazo de duração do processo administrativo extrapolou o limite legal
Dispõe a Lei nº 8.112/90 sobre o prazo de duração do processo administrativo disciplinar:
Art. 152. O prazo para a conclusão do processo disciplinar não excederá 60 (sessenta) dias,
contados da data de publicação do ato que constituir a comissão, admitida a sua prorrogação
por igual prazo, quando as circunstâncias o exigirem.
§ 1º Sempre que necessário, a comissão dedicará tempo integral aos seus trabalhos, ficando
seus membros dispensados do ponto, até a entrega do relatório final.
§ 2º As reuniões da comissão serão registradas em atas que deverão detalhar as deliberações
adotadas.
Entretanto, a extrapolação do prazo de 60 dias previsto em lei não constitui, por si só, causa de
nulidade do processo, devendo ser demonstrado no caso concreto os prejuízos advindos ao
servidor investigado diante do irrazoável alargamento de prazo. Nesse sentido, a Súmula nº 592
do STJ: “O excesso de prazo para a conclusão do processo administrativo disciplinar só causa
nulidade se houver demonstração de prejuízo à defesa”.
No caso dos autos, o processo administrativo em comento iniciou-se no dia 03/04/2008 e teve
seu relatório final, que marca o fim da fase de inquérito e encaminhamento para decisão, em
09/04/2009. A parte-autora alega que as prorrogações empreendidas foram ilegais e que a
instauração de uma nova comissão processante não poderia servir como substrato a
fundamentar o desbordamento de prazo, pois o art. 169, caput, da Lei nº 8.112/90 só autoriza
tal ato uma única vez, e isso teria ocorrido mais vezes do que o permitido.
Ocorre que as portarias indicadas pela autora não se prestaram a constituir novas comissões
com o pretexto de alongar o prazo. Verifica-se do teor delas que, após memorandos expedidos
no sentido de noticiar a impossibilidade de conclusão dos trabalhos no prazo legal, foram
editadas para dilatar o prazo de apuração dos fatos. Isso se mostra plenamente justificável
diante do volume de provas coligidas aos autos do processo, como tomada de diversos
depoimentos e juntada de documentos.
Ademais, a parte-autora não demonstrou em que consistiria o suposto prejuízo alegado, o que é
imprescindível para se reconhecer eventual nulidade referente ao excesso de prazo.
b) Quebra de imparcialidade na condução dos trabalhos e uso de provas ilícitas nos autos
A parte-autora alega que houve quebra de imparcialidade nos trabalhos e uso de provas ilícitas.
Sustenta sua alegação afirmando que servidores que foram testemunhas também atuaram na
produção de outras provas (que, por isso, se tornaram ilícitas), bem como duas testemunhas –
Carla Vanessa Sanches e Alexander Ramos de Aquina – seriam seus desafetos pessoais e,
portanto, não poderiam atuar em qualquer instância do processo, seja como testemunhas, seja
produzindo outras provas.
Quanto à alegação de que os servidores Carla e Alexander seriam seus desafetos e não
poderiam ser ouvidos como testemunhas, verifica-se dos depoimentos colacionados sob id
90390480 - Pág. 87/90, id 90390562 - Pág. 97/98, id 90390481 - Pág. 11/16 e id 90390562 -
Pág. 107/108 que a parte-autora não apresentou contradita antes da colheita dos testemunhos,
declinando os motivos pelos quais acredita que não poderiam ser ouvidos. Tampouco, nestes
autos, indica de maneira objetiva as razões pelas quais tais testemunhas seriam suspeitas,
limitando-se a fazer alegações genéricas sobre perseguições e outros processos
administrativos anteriores. Não trouxe, de efetivamente concreto, qualquer elemento que
permita dizer que essas testemunhas teriam algum interesse pessoal em prejudicá-la, motivo
pelo qual afasto tais alegações.
No que se refere à alegação de que servidores que atuaram como testemunhas foram
designados para atuar no processo, é necessário verificar o tipo de atuação que foi realizada.
A parte-autora foi acusada de não ter realizado o recadastramento previdenciário com pesquisa
externa dos segurados, isto é, realizando visitas aos segurados para recadastramento de
dados. A Resolução nº 07 INSS/PRES, de 23 de fevereiro de 2006, é a que disciplina a matéria.
Diante da notícia de que a servidora não realizara as pesquisas in loco, tal qual determina a
indigitada resolução, mas mesmo assim percebeu a remuneração para tanto, inicialmente foram
feitas averiguações iniciais, em âmbito interno; havendo indícios de conduta ilícita por parte dos
servidores indicados, foi determinada a abertura do Processo Administrativo Disciplinar nº
5437.000372/2007-75, com designação de comissão processante composta de 3 servidores
estáveis. A Gerência Executiva do INSS, por outro lado, designou servidores para fazer as
pesquisas externas anteriormente designadas à autora, sobre as quais pairava dúvida sobre
sua efetiva realização. Frise-se que esses servidores designados pela Gerência Executiva não
compunham a comissão processante e não estavam ligados ao PAD instaurado –
simplesmente realizaram as pesquisas externas nos termos determinado pela Gerência
Executiva.
Na condução dessas pesquisas, ficou constatado que era a primeira vez que os segurados
eram acionados por funcionários do INSS para efetuar recadastramento. Não foi produzido juízo
de valor pelos servidores, nem foram colhidos dados que não os referentes ao recadastramento
obrigatório sobre eventual conduta ilícita da parte-autora. Esses resultados foram
encaminhados à comissão processante do PAD nº 5437.000372/2007-75, que era quem
estava, de fato, empreendendo apuração sobre a conduta dos servidores denunciados.
Deve-se ter em mente também que a vedação que o art. 18, inciso II, da Lei 9.784/99, impõe na
atuação de servidores no processo administrativo (“É impedido de atuar em processo
administrativo o servidor ou autoridade que tenha participado ou venha a participar como perito,
testemunha ou representante, ou se tais situações ocorrem quanto ao cônjuge, companheiro ou
parente e afins até o terceiro grau”) refere-se à atuação como membro da comissão
processante, o que não foi o caso de nenhum dos servidores designados para refazer as
pesquisas atribuídas à parte-autora.
Na medida em que estas pesquisas não foram refeitas por determinação da comissão
processante, com o fim exclusivo de instruir o PAD, não há se falar em qualquer ofensa aos
dispositivos legais da Lei nº 9.874/99 que determina que, na condução de diligências com fins
probatórios nos autos de processos administrativos, deva ser garantida a presença dos
investigados para acompanhar a produção da prova. As pesquisas foram refeitas no âmbito do
Censo Obrigatório do INSS, para colher dados referentes aos segurados que visavam a instruir
a concessão e manutenção de benefícios, não com o fim de instruir o PAD em tela. Somente
após o refazimento dessa parte do censo é que foram encaminhados dados à comissão que, a
partir de dali, deu vistas aos investigados e continuidade aos trabalhos de apuração dos fatos.
Portanto, não se verifica qualquer irregularidade no fato de que estes mesmos servidores que
refizeram as pesquisas inicialmente designadas aos 3 servidores investigados no PAD fossem
convocados como testemunhas, pois a determinação da Gerência Executiva não foi feita com a
finalidade exclusiva de instruir o PAD e nem contaminou essa instrução.
Assim, não há se falar em utilização de prova ilícita, seja no que se refere à suposta suspeição
das testemunhas, seja no refazimento das pesquisas externas por servidores que também
foram testemunhas no caso dos autos.
c) Não houve busca da verdade real e material dos fatos, sendo vedado o uso de “amostragem”
Alega a parte-autora que foi violado o princípio da busca da verdade real dos fatos, e que a
averiguação das pesquisas atribuídas a ela por amostragem, sem a efetiva verificação junto a
todos os segurados, não pode ser admitida.
Inicialmente, cabe rememorar que a própria parte-autora admitiu que não realizara as pesquisas
determinadas conforme a orientação da Resolução nº 07 INSS/PRES, de 23 de fevereiro de
2006.
A referida resolução dispunha sobre a metodologia de execução do Censo Previdenciário:
Art. 1º Definir que Pesquisa Externa-PE, é o serviço externo que visa à elucidação de fato
verificado por meio de documentação apresentada por beneficiário e/ou contribuinte, ou a
realização de visitas necessárias ao desempenho das atividades de serviço social, perícia
médica, habilitação, reabilitação profissional e o acompanhamento da execução dos contratos
com as unidades pagadoras pelo SAAB, ou para a adoção de medidas, realizada por servidor
das áreas de Benefícios e Orçamento e Finanças, previamente designado.
Tendo sido noticiado por procurador de um segurado que este não recebera visita de qualquer
funcionário do INSS, embora nos registros da autarquia constasse que a visita fora feita,
procedeu-se a averiguações preliminares sobre o ocorrido. Já nesta primeira reunião, a
servidora Sheila confessou que não vinha procedendo à distribuição de pesquisas da maneira
determinada (id 90390476 - Pág. 7/8):
“Em reunião, a servidora Sheila Mara Rosa Barbosa confessou ter sido ela quem distribuiu as
pesquisas ao servidor Paulo Roberto Isaac Ferreira, sabendo estar contrariando as regras de
ordem e quantidade para cada pesquisador. Confessou ter feito isto na matrícula da servidora
Rosângela Barbosa Pinto Chinait, sem o conhecimento da mesma. Não apresentou
justificativas para o ato, confessou também que o servidor Paulo e ela dividiam os valores
recebidos pela realização das pesquisas. Por sua vez, a servidora Rosângela Barbosa Pinto
Chinait explicou que, algumas vezes, abria o sistema HIPNET para que a servidora Sheila
pudesse fazer algumas consultas, já que a mesma não tinha acesso liberado por estar
respondendo a processa disciplinar. No entanto, não sabia que a servidora Sheila, ao invés de
apenas consultar, estaria distribuindo pesquisas de forma irregular para o outro colega”.
Já em seu termo de interrogatório (id 90390525 - Pág. 86/91) constam as seguintes
informações prestadas (grifei):
“QUARTA PERGUNTA: Qual era o procedimento e/ou rotina da interrogada para realização e
conclusão de Pesquisa do Censo Previdenciário, emitida pelo sistema HIPNET? RESPOSTA:
Diz a interrogada que as pesquisas eram distribuídas na caixa postal da interrogada, onde a
interrogada imprimia a pesquisa, fazia o roteiro de visitas, se deslocava à casa do segurado,
realizava a pesquisa, retornando alimentava o Sistema, emitia pesquisa concluída e
encaminhava-as ao Serviço de Benefícios da Gerência. Não se recorda se, durante o período
em que realizou pesquisas do censo, anexou a relação com a assinatura da Chefe da APS,
mesmo por que quando do início das realizações das pesquisas do censo não existia a
formalidade desta relação. Acrescenta que a via da pesquisa em que constava a assinatura do
segurado era entregue no Arquivo ou numa pasta que ficava na Retaguarda da Agência.
Esclarece que aproximadamente em setembro de 2006, a interrogada quando consultava sua
caixa postal, verificava os benefícios mais recentes e, a partir daí, fazia consultas nos sistemas
do INSS e da Receita Federal, para confirmar os dados dos segurados, não chegando a realizar
a pesquisa na residência do segurado. Informa que depois de confirmados os dados dos
segurados com os Sistemas, respondia as pesquisas no Sistema HIPNET. Informa que esta
atitude em responder as pesquisas do censo previdenciário, baseada em confirmação de dados
somente através dos Sistemas e não realizando a visita na residência dos segurados, partiu da
própria interrogada e que não constam estes procedimentos das Orientações Internas de
Serviço do INSS. Informa que a partir da conclusão das pesquisas do Sistema HIPNET,
baseada em informações dos Sistemas, imprimia a via da pesquisa concluída e encaminhava
ao Serviço de Benefícios da Gerência para ressarcimento. QUINTA PERGUNTA: A interrogada
tinha conhecimento dos procedimentos que deveriam ser adotados para efetivação das
Pesquisas do Censo Previdenciário, especificamente a Orientação Interna INSS/DIRBEN n°
148, de 10/10/2006, art. 12 e seus Parágrafos que, em suma, tinha a finalidade de comprovar a
vida do beneficiário in loco e a veracidade dos dados cadastrais informados por Procuradores
ou Representantes Legais? RESPOSTA: Diz a interrogada que tinha conhecimento dos
procedimentos que deveriam ser adotados para efetivação das Pesquisas do Censo
Previdenciário, especificamente a Orientação Interna; INSS/DIRBEN n° 148, de 10/10/2006, art.
12 e seus Parágrafos. Informa que mesmo tendo conhecimento da Orientação Interna
INSS/DIRBEN n° 148, de 10/10/2006, agiu da forma como explicou em resposta a quarta
pergunta.
(...)
DECIMA TERCEIRA PERGUNTA: No Depoimento das Procuradoras: Vera Lúcia de Lima Vieira
(fls. 808/809); Dolores Teixeira dos Santos (fis. 842/843); Idalina de Sousa da Conceição (fis.
844/845) e Maria de Lourdes Ribeiro da Silva (fis. 851/852), em resposta dada à primeira
pergunta, afirmaram que as pesquisas não foram realizadas anteriormente. O que tem a
explicar? RESPOSTA: Diz a interrogada que as pesquisas citadas não foram feitas in loco”.
Não apenas no bojo do processo administrativo, mas mesmo em sua peça de apelação há
admissão pela servidora desses fatos (90390528 - Pág. 139 - grifei):
“A servidora Sheila realizou grande parte das pesquisas conforme determina a instrução interna
e algumas também as realizou, só que de forma virtual, consultando o sistema para obter
informação de renovação de procuração recente e de CPF.
Tanto foi eficaz em suas pesquisas que todos estavam vivos, ou seja, não causou prejuízo
financeiro ao Instituto e se assim não considerado, recebeu por pesquisas que realizou de
forma diversa ao estabelecido nas orientações internas, cujo montante somou R$ 731,63 (sete
centos e trinta e um reais e sessenta e três centavos)”.
Mesmo diante da admissão da servidora quanto à não realização das pesquisas externas
conforme as determinações regulamentares, e de posse das pesquisas refeitas por ordem da
Gerência Executiva do INSS na qual constava o dado de que não fora feito qualquer
recadastramento anterior, a comissão processante selecionou alguns desses segurados para
verificação quanto à eventual pesquisa feita anteriormente, tendo constado no relatório final do
PAD (id 90390531 - Pág. 8):
“Após análise das pesquisas constantes do Anexo II, resolveu este Trio Processante, intimar,
por amostragem, quinze (15) Procuradores ou Representantes Legais, os quais declararam, por
unanimidade, que nenhuma pesquisa foi realizada anteriormente, bem como não reconheceram
nenhum dos servidores envolvidos presentes nas oitivas: (...)”.
Dessa forma, a amostragem verificada não fundamentou de maneira única a condenação da
parte-autora, mas foi apenas um dos meios de prova – e de caráter apenas suplementar, pelo
que se tem dos dados do PAD – na elaboração da conclusão de que a servidora atuou de
maneira ilícita junto à autarquia.
Não verifico, portanto, que haja qualquer vício no que se refere à busca da verdade dos fatos
que viole os princípios que visam à garantia do devido processo legal no caso em comento.
d) Violação ao princípio “non bis in idem”, pois a autora foi duplamente penalizada pelo mesmo
fato.
Alega a parte-autora que teria ocorrido dupla penalização pelo mesmo fato, pois antes da
penalidade de demissão já fora aplicada a penalidade de perda de função comissionada,
expressamente prevista na Lei nº 8.112/90.
Com efeito, o art. 127 da Lei nº 8.112/90 dispõe sobre a destituição de função comissionada
como uma penalidade disciplinar:
Art. 127. São penalidades disciplinares:
I - advertência;
II - suspensão;
III - demissão;
IV - cassação de aposentadoria ou disponibilidade; (Vide ADPF nº 418)
V - destituição de cargo em comissão;
VI - destituição de função comissionada.
Ocorre que a autora não foi destituída da função comissionada que ocupava em razão de
penalidade, mas em decorrência da própria natureza precária da função, que é que de livre
nomeação e exoneração. A dispensa de função comissionada, assim como sua designação,
não precisa ser motivada, dão-se ad nutum, e foi nesses termos que ocorreram tanto a
designação quanto a dispensa, conforme se verifica das portarias INSS/GEXSJC/N° 19, de 10
de abril de 2006 (id 90390476 - Pág. 56) e INSS/GEXSJC/N° 036, de 21 de maio de 2007 (id
90390476 - Pág. 178).
Portanto, não houve violação do princípio non bis in idem no presente caso, pois a dispensa da
função foi feita dentro do âmbito da discricionariedade da Administração, e a demissão foi
aplicada a título de penalidade, após devido processo administrativo.
Conclusão
De todo analisado, não se verificam presentes elementos que justifiquem a declaração de
nulidade do Processo Administrativo Disciplinar em comento.
Cabe consignar, por fim, de que as alegações de que haveria quebra de isonomia (feitas
posteriormente à apresentação da apelação, sob id 90390520 - Pág. 31/62), pois a servidora
Rosângela Barbosa Pinto Chinait, indiciada no mesmo PAD, teve posteriormente seu pedido de
reconsideração provido, não pode servir a desconstituir as conclusões alcançadas com relação
à parte-autora nestes autos. Não faz parte do objeto destes autos a análise das imputações
feitas à servidora Rosângela, as provas produzidas em relação a ela e nem a legalidade de sua
condenação. Tampouco é cabível analisar a validade da decisão administrativa que deu
provimento a seu pedido de reconsideração, conforme noticiado. A análise aqui feita versa
exclusivamente sobre a legalidade do PAD em relação à autora, Sheila Mara Rosa Babosa,
sendo vedado, inclusive, a incursão em aspectos de mérito de seu próprio julgamento, na
esteira do já consignado nesta decisão, quanto mais transportar conclusões de mérito em
relação a outro servidor que respondeu a inquérito semelhante, uma vez que cada conduta
deve ser avaliada de modo individualizado.
Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação.
Incabível a majoração de honorários recursais, tendo em vista a data de apresentação do
recurso, anterior à vigência do CPC/2015.
É como voto.
E M E N T A
APELAÇÃO. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PROCESSO ADMINISTRATIVO
DISCIPLINAR. EXCESSO DE PRAZO. IMPARCIALIDADE. SUSPEIÇÃO DE TESTEMUNHAS.
PROVAS POR AMOSTRAGEM. DUPLA PENALIZAÇÃO PELO MESMO FATO. DESTITUIÇÃO
DE FUNÇÃO COMISSIONADA. DEMISSÃO. VIOLAÇÃO A ISONOMIA.
- A jurisprudência do E.STJ étorrencial e uniforme quanto aos limites da atuação do Poder
Judiciário no controle do processo administrativo, o qual restringe-se à verificação de vícios
capazes de ensejar a sua nulidade, sendo-lhe defeso incursionar no mérito administrativo, salvo
patente infração a garantias processuais ou princípios da ordem jurídica, como a razoabilidade
ou a proporcionalidade.
- A extrapolação do prazo de 60 dias previsto no art. 152 da Lei nº 8.112/1990 para conclusão
do PAD não constitui, por si só, causa de nulidade do processo, devendo ser demonstrado no
caso concreto os prejuízos advindos ao servidor investigado diante do irrazoável alargamento
de prazo. Nesse sentido, a Súmula nº 592 do STJ.
- A suspeição de testemunhas tem que ser concretamente fundamentada, não bastando
alegações genéricas de desafetos pessoais, sem qualquer elemento que demonstre o lastro de
tal suspeição. Verifica-se que, no caso concreto, a autora também não apresentou contradita
antes dos depoimentos.
- A suposta atuação de servidores na produção de provas no PAD e a incompatibilidade de que
servissem como testemunhas também não ficou demonstrada, pois as pesquisas por eles feitas
foram no âmbito do Censo Previdenciário determinado pela Gerência Executiva do INSS, e
após seus dados utilizados pela comissão processante; não foram designados para produzir
provas específicas para instrução do PAD e nem compunham a comissão.
- A amostragem verificada não fundamentou de maneira única a condenação da parte-autora,
mas foi apenas um dos meios de prova – e de caráter apenas suplementar, pelo que se tem
dos dados do PAD – na elaboração da conclusão de que a servidora atuou de maneira ilícita
junto à autarquia.
- A autora não foi destituída da função comissionada que ocupava em razão de penalidade,
mas em decorrência da própria natureza precária da função, que é que de livre nomeação e
exoneração. A dispensa de função comissionada, assim como sua designação, não precisa ser
motivada, dá-se ad nutum, e foi nesses termos que ocorreram tanto a designação quanto a
dispensa, não havendo se falar em dupla penalização pelo mesmo fato.
- A análise aqui feita versa exclusivamente sobre a legalidade do PAD em relação à autora,
sendo vedado, inclusive, a incursão em aspectos de mérito de seu próprio julgamento, na
esteira do já consignado nesta decisão, quanto mais transportar conclusões de mérito em
relação a outro servidor que respondeu a inquérito semelhante, uma vez que cada conduta
deve ser avaliada de modo individualizado.
- Apelação desprovida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma
decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
