Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0004359-80.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
08/06/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 18/06/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. COMPROVAÇÃO DAS
CONDIÇÕES ESPECIAIS. LAVOURA CANAVIEIRA. AGENTE NOCIVO CALOR. EXPOSIÇÃO
PERMANENTE. IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. DIB. INCOMPATIBILIDADE ENTRE
APOSENTAÇÃO E O EXERCÍCIO DE ATIVIDADE ESPECIAL. TESE FIRMADA. TERMO
INICIAL. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA
FEDERAL.
1. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o
reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua
demonstração.
2. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da
atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no
período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário (a
partir de 11/12/97).
3. É possível o reconhecimento da especialidade do trabalho na lavoura de cana de açúcar, em
se verificando a condição insalubre do trabalho na cultura canavieira.
4. Condição especial de trabalho configurada. Exposição habitual e permanente ao calor acima
dos limites de tolerância estabelecidos pela NR-15, da Portaria nº 3.214/78 (agente nocivo calor -
código 2.0.4 do Decreto nº 3.048/99).
5. A exigência legal de comprovação de exposição a agente insalubre de forma permanente,
introduzida pela Lei nº 9.032/95, que deu nova redação ao § 3º do artigo 57 da Lei nº 8.213, deve
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
ser interpretada como o labor continuado, não eventual ou intermitente, de modo que não
significa a exposição ininterrupta a agente insalubre durante toda a jornada de trabalho.
6. A soma dos períodos redunda no total de mais de 25 anos de tempo de serviço especial, o que
autoriza a concessão da aposentadoria especial, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
7. As diferenças deverão ser pagas desde a data do requerimento administrativo, ainda que a
comprovação da especialidade da atividade tenha surgido em momento posterior. Precedente do
STJ.
8. DIB na data do requerimento administrativo.
9. Optando a parte autora em retornar às atividades especiais, não fará jus à aposentadoria
especial.
10. Termo inicial do benefício fixado na data do requerimento administrativo, ainda que, à época,
desenvolvesse atividade de cunho especial.
11. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a
elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-
se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa
Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947,
tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
12. Sentença corrigida de ofício. Apelação do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
parcialmente provida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0004359-80.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ALTINO MARINHO DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: ANDERSON ROBERTO GUEDES - SP247024-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0004359-80.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ALTINO MARINHO DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: ANDERSON ROBERTO GUEDES - SP247024-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação ordinária em que se objetiva a concessão de aposentadoria especial,
mediante o reconhecimento de período trabalhado em atividades especiais.
A sentença julgou procedente o pedido para determinar ao Instituto Nacional do Seguro Social -
INSS a concessão da aposentadoria especial, com DIB na DER (04/06/2014), condenando-o,
em consequência, ao pagamento das parcelas em atraso, corrigidas monetariamente pelo
IPCA-E a partir de cada mês vencido e acrescidas de juros de mora pelo índice de correção da
caderneta de poupança a partir da citação. Condenou o réu, também, ao pagamento de
honorários de advogado, fixados em 10% (dez por cento) do valor da condenação, considerado
como termo final desta a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do C. STJ.
Foi determinada, ainda, em sede de antecipação de tutela, a implantação imediata do benefício.
Sentença não submetida à remessa necessária.
Foi revogada a antecipação da tutela concedida para implantação do benefício (Id
89857513/111).
Apela o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, alegando que o autor não comprovou o
exercício de atividade especial, sendo insuficiente o conjunto probatório produzido.
Subsidiariamente, requer a reforma da sentença quanto ao termo inicial do benefício, à
determinação expressa para que na hipótese concessão de aposentadoria especial, da
impossibilidade de continuidade de seu exercício, não sendo possível o recebendo o benefício
de aposentadoria nos períodos em que se mantiver em atividade, conforme previsão contida no
Art.57, § 8º, da Lei n°8.213/91 e para fixar a TR como índice de correção monetária, em
cumprimento a decisão com efeito suspensivo proferida pelo STF no RE 870.947, ou alternativa
utilize a TR até o julgamento em Plenário pelo STF e após essa data o INPC.
Contrarrazões pela parte apelada, pugnando pela manutenção da sentença.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0004359-80.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ALTINO MARINHO DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: ANDERSON ROBERTO GUEDES - SP247024-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
Passo ao exame do mérito.
Aposentadoria Especial
A aposentadoria por tempo de serviço especial teve assento primeiro no artigo 31 da Lei nº
3.807, de 26 de agosto de 1960, Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS, que estabeleceu
que seria concedida ao segurado que, contando no mínimo 50 (cinquenta) anos de idade e 15
(quinze) anos de contribuições, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e
cinco) anos, conforme a atividade profissional, em serviços que, para esse efeito, fossem
considerados penosos, insalubres ou perigosos, por Decreto do Poder Executivo.
Prevê ainda, o mencionado diploma legal, no art. 162, o reconhecimento de atividade especial
prestada em data anterior à sua edição, na hipótese de seu cômputo ser mais benéfico ao
segurado.
Como assentado pelas Cortes Superiores "tal hipótese, apesar de similar, não se confunde com
a questão da legislação aplicável ao caso de concessão de aposentadoria, tampouco com
aquela que diz respeito à possibilidade de aplicação retroativa da lei nova que estabeleça
restrição ao cômputo do tempo de serviço. (...) Interpretação diversa levaria à conclusão de que
o segurado, sujeito a condições insalubres de trabalho, só teria direito à aposentadoria especial
após 15, 20 e 25 anos de trabalho exercida depois da Lei nº 3.807/60, desconsiderando,
portanto, todo o período de labor, também exercido em tal situação, porém em data anterior à
lei de regência" (Ag Rg no REsp nº 1015694, Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza Assis de
Moura, DJe 01/02/2011)
Essa norma foi expressamente revogada pela Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973, que passou
a discipliná-la no artigo 9º, alterando, em efeitos práticos, apenas o período de carência de 15
(quinze) anos para 5 (cinco) anos de contribuição, mantendo no mais a redação original.
Sobreveio, então, o Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, reclassificando as atividades
profissionais segundo os agentes nocivos e os grupos profissionais tidos por perigosos,
insalubres ou penosos, com os respectivos tempos mínimos de trabalho.
Importante ressaltar que os Decretos nºs. 53.831/64 e 83.080/79 tiveram vigências simultâneas,
de modo que, conforme reiteradamente decidido pelo C. STJ, havendo colisão entre as
mencionadas normas, prevalece a mais favorável ao segurado. (REsp nº 412351, 5ª Turma,
Rel. Min. Laurita Vaz, j. 21/10/2003, DJ 17/11/2003, pág. 355).
As atividades insalubres previstas nas aludidas normas são meramente exemplificativas,
podendo outras funções ser assim reconhecidas, desde que haja similitude em relação àquelas
legalmente estatuídas ou, ainda, mediante laudo técnico-pericial demonstrativo da nocividade
da ocupação exercida. Nesse sentido, o verbete 198 da Súmula do TFR.
Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, a matéria passou a ser prevista no inciso
II do artigo 202 e disciplinada no artigo 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação original previa que o
benefício de aposentadoria especial seria devido ao segurado que, após cumprir a carência
exigida, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme
a atividade profissional, sujeito a condições especiais que prejudicassem a saúde ou a
integridade física, restando assegurada, ainda, a conversão do período trabalhado no exercício
de atividades danosas em tempo de contribuição comum (§3º).
Em seguida, foi editada a Lei nº 9.032/95, alterando o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, dispondo
que a partir desse momento não basta mais o mero enquadramento da atividade exercida pelo
segurado na categoria profissional considerada especial, passando a ser exigida a
demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e
biológicos, que poderá se dar por meio da apresentação de informativos e formulários, tais
como o SB-40 ou o DSS-8030.
Posteriormente, com a edição do Decreto n.º 2.172, de 05/03/1997, que estabeleceu requisitos
mais rigorosos para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos,
passou-se a exigir-se a apresentação de laudo técnico para a caracterização da condição
especial da atividade exercida. Todavia, por se tratar de matéria reservada à lei, tal exigência
apenas tem eficácia a partir da edição da Lei n.º 9.528, de 10/12/1997.
Cumpre observar que a Lei nº 9528/97 também passou a aceitar o Perfil Profissiográfico
Previdenciário - PPP, documento que busca retratar as características de cada emprego do
segurado, de forma a facilitar a futura concessão de aposentadoria especial. Assim, identificado
no documento o perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, é possível a sua
utilização para comprovação da atividade especial em substituição ao laudo pericial.
Ressalto que no tocante ao reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e
à forma da sua demonstração, deve ser observada a legislação vigente à época da prestação
do trabalho, conforme jurisprudência pacificada da matéria (STJ - Pet 9.194/PR, Rel. Ministro
ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
A extemporaneidade do documento comprobatório das condições especiais de trabalho não
prejudica o seu reconhecimento como tal, "pois a situação em época remota era pior ou ao
menos igual a constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do
ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica." (Des. Fed. Fausto De
Sanctis, AC nº 2012.61.04.004291-4, j. 07/05/2014)
Especificamente em relação ao ruído, o Decreto nº 53.831/64 considerava insalubre o labor
desempenhado com exposição permanente a ruído acima de 80 dB; já o Decreto nº 83.080/79
fixava a pressão sonora em 90 dB. Na medida em que as normas tiveram vigência simultânea,
prevalece disposição mais favorável ao segurado (80 dB).
Com a edição do Decreto nº 2.172/97, a intensidade de ruído considerada para fins de
reconhecimento de insalubridade foi elevada para 90 dB, mas, em 2003, essa medida foi
reduzida para 85 dB, por meio do Decreto nº 4.882, de 18 de novembro de 2003.
Até 09 de outubro de 2013, os Tribunais adotavam o enunciado pela Súmula nº 32 da TNU.
Contudo, esta Súmula foi cancelada em decorrência do julgamento da PET 9059 pelo Superior
Tribunal de Justiça (Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJe
09/09/2013) cujo entendimento foi sufragado no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Ministro
Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), sob a sistemática dos
recursos repetitivos.
Em relação ao agente ruído, vigora o princípio do tempus regit actum. Considera-se especial a
atividade desenvolvida acima do limite de 80dB até 05/03/1997, quando foi editado o Decreto nº
2.172/97, a partir de então deve-se considerar especial a atividade desenvolvida acima de 90dB
até 18/11/2003, quando foi editado o Decreto nº 4882/2003. A partir de 19/11/2003 o limite
passou a ser de 85 dB.
Saliente-se que a especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento
legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou
formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil profissiográfico
previdenciário (a partir de 11/12/97).
É corrente em nossos tribunais a tese de que sempre se exigiu laudo técnico para comprovar a
exposição do trabalhador aos agentes físicos ruído e calor em níveis superiores aos limites
máximos de tolerância. Entretanto, no tocante às atividades profissionais exercidas até 10/12/97
– quando ainda não havia a exigência legal de laudo técnico –, essa afirmação deve ser
compreendida, não na literalidade, mas no sentido de ser necessário o atesto efetivo e seguro
dos níveis de intensidade dos agentes nocivos a que o trabalhador esteve exposto durante sua
jornada laboral.
Logo, para as atividades profissionais exercidas até 10/12/97, é suficiente que os documentos
apresentados façam expressa menção aos níveis de intensidade dos agentes nocivos.
Uso de equipamento de proteção individual - EPI, como fator de descaracterização do tempo de
serviço especial
A questão foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do ARE nº 664335, da
relatoria do E. Ministro Luiz Fux, com reconhecimento de repercussão geral, na data de
04.12.2014, em que restou decidido que o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva
exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente
capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional ao reconhecimento das
atividades especiais.
Restou assentado também que, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos
limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico
Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não
descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
O fato de a empresa fornecer equipamento de proteção individual - EPI para neutralização dos
agentes agressivos não afasta, por si só, a contagem do tempo especial, pois cada caso deve
ser examinado em suas peculiaridades, comprovando-se a real efetividade do aparelho e o uso
permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho. Precedentes do Superior Tribunal
de Justiça (REsp 1428183/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em
25/02/2014, DJe 06/03/2014).
Ainda, conforme a jurisprudência citada, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído,
desde que em níveis acima dos limites legais, constata-se que, apesar do uso de Equipamento
de Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável,
até no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao
organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas.
Caso concreto - elementos probatórios
De início, verifica-se que a controvérsia cinge-se à especialidade das atividades trabalhadas
no(s) período(s) de 18/10/1969 a 03/11/1975, 18/03/1976 a 18/06/1976, 19/06/1976 a
18/04/1981, 01/05/1981 a 15/08/1981, 05/01/1983 a 17/05/1986, 18/06/1986 a 24/06/1986,
26/06/1986 a 02/10/1986, 03/10/1986 a 13/12/1986, 26/01/1987 a 04/05/1987, 06/05/1987 a
06/11/1987, 23/11/1987 a 03/08/1989, 01/09/1989 a 15/04/1991, 08/05/1991 a 27/08/1991,
20/04/1992 a 18/12/1992, 16/03/1993 a 30/11/1993, 16/03/1994 a 14/12/1994, 07/02/1995 a
28/04/1995, 29/04/1995 a 11/05/1995, 15/05/1995 a 01/12/1995, 02/01/1996 a 12/04/1996,
15/04/1996 a 06/12/1996, 10/12/1996 a 11/04/1997, 14/04/1997 a 11/12/1997, 12/01/1998 a
07/04/1998, 09/04/1998 a 30/11/1998, 18/01/1999 a 31/03/1999, 05/04/1999 a 23/11/1999,
10/01/2000 a 19/04/2000, 24/04/2000 a 06/11/2000, 08/01/2001 a 12/04/2001, 23/04/2001 a
06/11/2001, 03/12/2001 a 15/04/2002, 02/05/2002 a 18/11/2002 e 04/12/2002 a 04/06/2014.
Neste contexto, do exame dos autos verifico que o período de 18/10/1969 a 03/11/1975 não
pode ser reconhecido como exercido em atividade especial, porquanto sequer foi comprovado
seu vínculo empregatício.
Verifico que a declaração do proprietário do imóvel rural, onde o autor teria atuado, não possui
valor probante, visto que não foi produzida contemporaneamente ao período que se deseja
provar, sendo datada do ano de 2004 (Id 89857512/128).
No pertinente aos períodos de 26/06/1986 a 02/10/1986, 06/05/1987 a 06/11/1987 e 07/02/1995
a 28/04/1995, verifica-se que o autor exerceu atividades em serviços agrícolas diversos na
lavoura canavieira: corte, plantio, carpa, entre outras, utilizando técnicas e ferramentas
adequadas, conforme o PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário (Id 89857512/60-67).
No julgamento do Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei n.º 452/PE, o Superior
Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de não ser possível equiparar a categoria
profissional de agropecuária, constante no item 2.2.1 do Anexo ao Decreto n.º 53.831/1964, à
atividade exercida pelo empregado rural na lavoura da cana-de-açúcar:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE
ESPECIAL. EMPREGADO RURAL. LAVOURA DA CANA-DE-AÇÚCAR. EQUIPARAÇÃO.
CATEGORIA PROFISSIONAL. ATIVIDADE AGROPECUÁRIA. DECRETO 53.831/1964.
IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES.
1. Trata-se, na origem, de Ação de Concessão de Aposentadoria por Tempo de Contribuição
em que a parte requerida pleiteia a conversão de tempo especial em comum de período em que
trabalhou na Usina Bom Jesus (18.8.1975 a 27.4.1995) na lavoura da cana-de-açúcar como
empregado rural.
2. O ponto controvertido da presente análise é se o trabalhador rural da lavoura da cana-de-
açúcar empregado rural poderia ou não ser enquadrado na categoria profissional de trabalhador
da agropecuária constante no item 2.2.1 do Decreto 53.831/1964 vigente à época da prestação
dos serviços.
3. Está pacificado no STJ o entendimento de que a lei que rege o tempo de serviço é aquela
vigente no momento da prestação do labor. Nessa mesma linha: REsp 1.151.363/MG, Rel.
Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 5.4.2011; REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro Herman
Benjamin, Primeira Seção, DJe 19.12.2012, ambos julgados sob o regime do art. 543-C do CPC
(Tema 694 - REsp 1398260/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe
5/12/2014).
4. O STJ possui precedentes no sentido de que o trabalhador rural (seja empregado rural ou
segurado especial) que não demonstre o exercício de seu labor na agropecuária, nos termos do
enquadramento por categoria profissional vigente até a edição da Lei 9.032/1995, não possui o
direito subjetivo à conversão ou contagem como tempo especial para fins de aposentadoria por
tempo de serviço/contribuição ou aposentadoria especial, respectivamente. A propósito: AgInt
no AREsp 928.224/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 8/11/2016; AgInt
no AREsp 860.631/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe
16/6/2016; REsp 1.309.245/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 22/10/2015;
AgRg no REsp 1.084.268/SP, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJe 13/3/2013;
AgRg no REsp 1.217.756/RS, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, DJe 26/9/2012; AgRg
nos EDcl no AREsp 8.138/RS, Rel. Ministro Og Fernandes, Sexta Turma, DJe 9/11/2011; AgRg
no REsp 1.208.587/RS, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 13/10/2011; AgRg no
REsp 909.036/SP, Rel. Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, DJ 12/11/2007, p. 329; REsp 291.
404/SP, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJ 2/8/2004, p. 576.
5. Pedido de Uniformização de Jurisprudência de Lei procedente para não equiparar a categoria
profissional de agropecuária à atividade exercida pelo empregado rural na lavoura da cana-de-
açúcar."
(STJ, 1ª Seção, PUIL 452, relator Ministro Herman Benjamin, j. 08.05.2019, DJe 14.06.2019)
Assim, incabível o reconhecimento da atividade especial do trabalhador da lavoura de cana com
base exclusivamente na categoria profissional.
Contudo, ainda é possível o reconhecimento da especialidade do trabalho na lavoura de cana
de açúcar, em se verificando a condição insalubre do trabalho na cultura canavieira.
Essa atividade, descrita no Código 6221-10 da Classificação Brasileira de Ocupações, engloba
tarefas diversificadas e extenuantes. E é do senso comum que o plantio e a colheita de cana-
de-açúcar, assim como o trato posterior, requerem intensa atividade física do rurícola, que está
associada a riscos ergonômicos e a riscos de acidentes na operação de equipamentos, bem
como na manipulação de insumos, além da factível exposição habitual e permanente a agentes
químicos (pesticidas, herbicidas e inseticidas), o que autoriza o enquadramento no código
1.2.11 do Decreto nº 53.831/64.
Reconheço, assim a especialidade do(s) período(s) compreendido(s) entre 26/06/1986 a
02/10/1986, 06/05/1987 a 06/11/1987 e 07/02/1995 a 28/04/1995.
Quanto aos períodos de 18/03/1976 a 18/06/1976, 19/06/1976 a 18/04/1981, 01/05/1981 a
15/08/1981, 05/01/1983 a 17/05/1986, 18/06/1986 a 24/06/1986, 03/10/1986 a 13/12/1986,
26/01/1987 a 04/05/1987, 23/11/1987 a 03/08/1989, 01/09/1989 a 15/04/1991, 08/05/1991 a
27/08/1991, 20/04/1992 a 18/12/1992, 16/03/1993 a 30/11/1993, 16/03/1994 a 14/12/1994,
29/04/1995 a 11/05/1995, 15/05/1995 a 01/12/1995, 02/01/1996 a 12/04/1996, 15/04/1996 a
06/12/1996, 10/12/1996 a 11/04/1997, 14/04/1997 a 11/12/1997, 12/01/1998 a 07/04/1998,
09/04/1998 a 30/11/1998, 18/01/1999 a 31/03/1999, 05/04/1999 a 23/11/1999, 10/01/2000 a
19/04/2000, 24/04/2000 a 06/11/2000, 08/01/2001 a 12/04/2001, 23/04/2001 a 06/11/2001,
03/12/2001 a 15/04/2002, 02/05/2002 a 18/11/2002 e 04/12/2002 a 04/06/2014, devem ser
reconhecidos como especiais, porquanto restou comprovada a exposição habitual e
permanente ao calor acima dos limites de tolerância estabelecidos pela NR-15 (anexo 3), da
Portaria nº 3.214/78, conforme os laudos periciais (Ids 89857512/130-142, 89857513/11-14, 46-
69, 73-76 e 89-91), o que autoriza o enquadramento, nos termos do código 2.0.4 do Decreto nº
3.048/99.
Observo que a exigência legal de comprovação de exposição a agente insalubre de forma
permanente, introduzida pela Lei nº 9.032/95, que deu nova redação ao § 3º do artigo 57 da Lei
nº 8.213, deve ser interpretada como o labor continuado, não eventual ou intermitente, de modo
que não significa a exposição ininterrupta a agente insalubre durante toda a jornada de
trabalho.
Dessa forma, a soma do(s) período(s) especial(ais) aqui reconhecido(s) totaliza mais de 25
anos de tempo de serviço especial, o que autoriza a concessão da aposentadoria especial, nos
termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91, restando mantida a sentença.
Acresça-se que, no pertinente à fixação do termo inicial do benefício, no caso de
reconhecimento de atividades especiais, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente
de Uniformização de Jurisprudência, firmou entendimento no sentido de que a DIB será fixada
na data do requerimento administrativo se nessa data estiverem preenchidos os requisitos,
ainda que a comprovação da especialidade da atividade tenha surgido em momento posterior,
como, por exemplo, após proposta a ação judicial:
"PREVIDENCIÁRIO. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA.
APOSENTADORIA ESPECIAL. TERMO INICIAL: DATA DO REQUERIMENTO
ADMINISTRATIVO, QUANDO JÁ PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO
DO BENEFÍCIO. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA PROVIDO.
1. O art. 57, § 2o., da Lei 8.213/91 confere à aposentadoria especial o mesmo tratamento dado
para a fixação do termo inicial da aposentadoria por idade, qual seja, a data de entrada do
requerimento administrativo para todos os segurados, exceto o empregado.
2. A comprovação extemporânea da situação jurídica consolidada em momento anterior não
tem o condão de afastar o direito adquirido do segurado, impondo-se o reconhecimento do
direito ao benefício previdenciário no momento do requerimento administrativo, quando
preenchidos os requisitos para a concessão da aposentadoria.
3. In casu, merece reparos o acórdão recorrido que, a despeito de reconhecer que o segurado
já havia implementado os requisitos para a concessão de aposentadoria especial na data do
requerimento administrativo, determinou a data inicial do benefício em momento posterior,
quando foram apresentados em juízo os documentos comprobatórios do tempo laborado em
condições especiais.
4. Incidente de uniformização provido para fazer prevalecer a orientação ora firmada."
(STJ - Petição nº 9.582 - RS (2012/0239062-7), Primeira Seção, Rel. Min. Napoleão Nunes
Maia Filho, j. 26/08/15)
Tendo em vista o recente julgado do C. STF no RE 791961/PR, que reafirmou a
constitucionalidade do art. 57, §8º, da Lei de Benefícios, conclui-se que, optando a parte autora
em retornar às atividades especiais, não fará jus à aposentadoria especial.
Quanto ao termo inicial do benefício de aposentadoria especial, deverá ser a data do
requerimento administrativo, ainda que, à época, esteja desenvolvendo atividade de cunho
especial.
Assim, o termo inicial do benefício foi corretamente fixado na data do requerimento
administrativo (04/06/2014), uma vez que a parte autora demonstrou que já havia preenchido os
requisitos necessários à concessão do benefício desde então.
No que tange aos critérios de atualização do débito, verifico que a sentença desborda do
entendimento firmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de
repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
Assim, tratando-se de matéria cognoscível de ofício (AgRg no AREsp 288026/MG, AgRg no
REsp 1291244/RJ), corrijo a sentença e estabeleço que as parcelas vencidas deverão ser
atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual
de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração
da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em
substituição à TR – Taxa Referencial. Anoto que os embargos de declaração opostos perante o
STF que objetivavam a modulação dos efeitos da decisão supra, para fins de atribuição de
eficácia prospectiva, foram rejeitados no julgamento realizado em 03.10.2019.
Ante a constatação de que o autor já recebe atualmente benefício de aposentadoria por idade
(NB 1791885311 - DIB 12/07/2017), anoto que lhe é assegurado o direito de optar pelo
benefício que entender mais vantajoso, em observância ao ditame do art. 124, Lei nº 8.213/91.
Na hipótese de opção pelo benefício cujo direito foi reconhecido na esfera judicial, obrigatória a
dedução, na fase de liquidação, dos valores eventualmente pagos administrativamente à parte
autora, a mesmo título ou cuja cumulação seja vedada por lei, após o termo inicial ora
assinalado.
Por outro lado, a controvérsia atinente à possibilidade de execução do crédito decorrente das
parcelas vencidas do benefício judicial, na hipótese de escolha por aquele concedido na esfera
administrativa, é matéria cuja análise se encontra suspensa sob a sistemática de apreciação de
recurso especial repetitivo (STJ, Tema afetado nº 1.018), nos termos do § 1º do art. 1.036 do
CPC, pelo que deverá ser apreciada pelo juízo da execução, de acordo com a futura
deliberação do tema pelo E. STJ.
Ante o exposto, de ofício, fixo os critérios de atualização do débito e dou parcial provimento à
apelação do INSS para afastar a especialidade do período de 18/10/1969 a 03/11/1975,
mantendo, no mais, a r. sentença.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. COMPROVAÇÃO DAS
CONDIÇÕES ESPECIAIS. LAVOURA CANAVIEIRA. AGENTE NOCIVO CALOR. EXPOSIÇÃO
PERMANENTE. IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. DIB. INCOMPATIBILIDADE ENTRE
APOSENTAÇÃO E O EXERCÍCIO DE ATIVIDADE ESPECIAL. TESE FIRMADA. TERMO
INICIAL. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA
FEDERAL.
1. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o
reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua
demonstração.
2. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da
atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no
período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário (a
partir de 11/12/97).
3. É possível o reconhecimento da especialidade do trabalho na lavoura de cana de açúcar, em
se verificando a condição insalubre do trabalho na cultura canavieira.
4. Condição especial de trabalho configurada. Exposição habitual e permanente ao calor acima
dos limites de tolerância estabelecidos pela NR-15, da Portaria nº 3.214/78 (agente nocivo calor
- código 2.0.4 do Decreto nº 3.048/99).
5. A exigência legal de comprovação de exposição a agente insalubre de forma permanente,
introduzida pela Lei nº 9.032/95, que deu nova redação ao § 3º do artigo 57 da Lei nº 8.213,
deve ser interpretada como o labor continuado, não eventual ou intermitente, de modo que não
significa a exposição ininterrupta a agente insalubre durante toda a jornada de trabalho.
6. A soma dos períodos redunda no total de mais de 25 anos de tempo de serviço especial, o
que autoriza a concessão da aposentadoria especial, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
7. As diferenças deverão ser pagas desde a data do requerimento administrativo, ainda que a
comprovação da especialidade da atividade tenha surgido em momento posterior. Precedente
do STJ.
8. DIB na data do requerimento administrativo.
9. Optando a parte autora em retornar às atividades especiais, não fará jus à aposentadoria
especial.
10. Termo inicial do benefício fixado na data do requerimento administrativo, ainda que, à
época, desenvolvesse atividade de cunho especial.
11. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a
elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta,
observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR
– Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº
870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
12. Sentença corrigida de ofício. Apelação do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu, de ofício, fixar os critérios de atualização do débito e dar parcial
provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
