Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5003019-38.2017.4.03.6102
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
22/10/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 27/10/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. PRELIMINAR DE SUJEIÇÃO
DA REMESSA NECESSÁRIA REJEITADA. AUTÔNOMO. POSSIBILIDADE DE
RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL. COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES
ESPECIAIS. ENQUADRAMENTO PROFISSIONAL. AGENTES BIOLÓGICOS. EXPOSIÇÃO
PERMANENTE. PRÉVIO CUSTEIO. SUCUMBÊNCIA RECURSAL. HONORÁRIOS DE
ADVOGADO MAJORADOS.
1. Valor da condenação inferior a 1.000 salários mínimos. Preliminar rejeitada.
2. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o
reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua
demonstração.
3. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da
atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no
período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário (a
partir de 11/12/97).
4. É possível o reconhecimento do exercício de atividades especiais pelo trabalhador autônomo
(REsp nº 1.436.794-SC), desde que comprovado o recolhimento das contribuições
previdenciárias no período, o efetivo exercício da profissão e a insalubridade da atividade, nos
termos exigidos pela legislação previdenciária nos variados períodos de sua evolução.
5. A atividade de dentista pode ser enquadrada como especial, a teor do código 2.1.3 do Decreto
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
nº 53.831/64 e 2.1.3 do Decreto 83.080/79.
6. Condição especial de trabalho configurada. Exposição habitual e permanente a agentes
biológicos (microrganismos e secreções orais), enquadrando-se no código 1.3.2 do Decreto nº
53.831/64, item 1.3.4 do Decreto nº 83.080/79 e item 3.0.1 do Decreto n° 2.172/97.
7. A exigência legal de comprovação de exposição a agente insalubre de forma permanente,
introduzida pela Lei nº 9.032/95, que deu nova redação ao § 3º do artigo 57 da Lei nº 8.213, deve
ser interpretada como o labor continuado, não eventual ou intermitente, de modo que não
significa a exposição ininterrupta a agente insalubre durante toda a jornada de trabalho.
8. Inexiste vinculação do ato de reconhecimento de tempo de atividade perigosa/nociva ao
eventual pagamento de encargos tributários com alíquotas diferenciadas, pois o empregado não
pode ser por isso prejudicado.
9. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na
sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015.
10. Preliminar rejeitada. No mérito, apelação do INSS não provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5003019-38.2017.4.03.6102
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARLEI APARECIDA SECCANI
Advogado do(a) APELADO: ANDREA ROSA DA SILVA BRITO - SP156263-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5003019-38.2017.4.03.6102
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARLEI APARECIDA SECCANI
Advogado do(a) APELADO: ANDREA ROSA DA SILVA BRITO - SP156263-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação ordinária em que se objetiva a concessão de aposentadoria por tempo de
serviço/contribuição, mediante o reconhecimento de período trabalhado em atividades especiais,
sua conversão em tempo comum e cômputo aos demais períodos de trabalho urbano.
A sentença julgou procedente o pedido para reconhecer como laborado(s) em atividade(s)
especial(ais) o(s) período(s) de 01/06/1985 a 30/09/1990, 01/04/1996 a 30/06/1996, 01/08/1996 a
05/03/1997, 06/03/1997 a 30/06/1999 e 01/01/2015 a 30/11/2015, determinando ao Instituto
Nacional do Seguro Social - INSS a averbação dos períodos. Condenou o réu, também, ao
pagamento de honorários de advogado, fixados em percentual a ser definido em liquidação de
sentença, art. 85, § 4º, II, do CPC.
Sentença não submetida ao reexame necessário.
Apela o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, requerendo, preliminarmente, a sujeição da
sentença ao reexame necessário. No mérito, alega que o autor não comprovou o exercício de
atividade especial, sendo insuficiente o conjunto probatório produzido, notadamente em razão do
uso do EPI e a ausência de prévio custeio total.
Com contrarrazões, vieram os autos ao Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5003019-38.2017.4.03.6102
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARLEI APARECIDA SECCANI
Advogado do(a) APELADO: ANDREA ROSA DA SILVA BRITO - SP156263-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
Embora não seja possível, de plano, aferir-se o valor exato da condenação, pode-se concluir, pelo
termo inicial do benefício, seu valor aproximado e a data da sentença, que o valor total a
condenação será inferior à importância de 1.000 (mil) salários mínimos estabelecida no inciso I do
§3º do artigo 496 do Código de Processo Civil de 2015.
Afinal, o valor que superaria a remessa oficial é equivalente a 14 anos de benefícios calculados
no valor máximo, o que certamente não será o caso dos autos.
Assim, é nítida a inadmissibilidade, na hipótese em tela, da remessa necessária.
Rejeito, pois, a preliminar arguida pelo INSS.
Passo ao exame do mérito.
Aposentadoria Especial
A aposentadoria por tempo de serviço especial teve assento primeiro no artigo 31 da Lei nº 3.807,
de 26 de agosto de 1960, Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS, que estabeleceu que seria
concedida ao segurado que, contando no mínimo 50 (cinquenta) anos de idade e 15 (quinze)
anos de contribuições, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco)
anos, conforme a atividade profissional, em serviços que, para esse efeito, fossem considerados
penosos, insalubres ou perigosos, por Decreto do Poder Executivo.
Prevê ainda, o mencionado diploma legal, no art. 162, o reconhecimento de atividade especial
prestada em data anterior à sua edição, na hipótese de seu cômputo ser mais benéfico ao
segurado.
Como assentado pelas Cortes Superiores "tal hipótese, apesar de similar, não se confunde com a
questão da legislação aplicável ao caso de concessão de aposentadoria, tampouco com aquela
que diz respeito à possibilidade de aplicação retroativa da lei nova que estabeleça restrição ao
cômputo do tempo de serviço. (...) Interpretação diversa levaria à conclusão de que o segurado,
sujeito a condições insalubres de trabalho, só teria direito à aposentadoria especial após 15, 20 e
25 anos de trabalho exercida depois da Lei nº 3.807/60, desconsiderando, portanto, todo o
período de labor, também exercido em tal situação, porém em data anterior à lei de regência" (Ag
Rg no REsp nº 1015694, Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza Assis de Moura, DJe 01/02/2011)
Essa norma foi expressamente revogada pela Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973, que passou a
discipliná-la no artigo 9º, alterando, em efeitos práticos, apenas o período de carência de 15
(quinze) anos para 5 (cinco) anos de contribuição, mantendo no mais a redação original.
Sobreveio, então, o Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, reclassificando as atividades
profissionais segundo os agentes nocivos e os grupos profissionais tidos por perigosos,
insalubres ou penosos, com os respectivos tempos mínimos de trabalho.
Importante ressaltar que os Decretos nºs. 53.831/64 e 83.080/79 tiveram vigências simultâneas,
de modo que, conforme reiteradamente decidido pelo C. STJ, havendo colisão entre as
mencionadas normas, prevalece a mais favorável ao segurado. (REsp nº 412351, 5ª Turma, Rel.
Min. Laurita Vaz, j. 21/10/2003, DJ 17/11/2003, pág. 355).
As atividades insalubres previstas nas aludidas normas são meramente exemplificativas, podendo
outras funções ser assim reconhecidas, desde que haja similitude em relação àquelas legalmente
estatuídas ou, ainda, mediante laudo técnico-pericial demonstrativo da nocividade da ocupação
exercida. Nesse sentido, o verbete 198 da Súmula do TFR.
Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, a matéria passou a ser prevista no inciso II
do artigo 202 e disciplinada no artigo 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação original previa que o
benefício de aposentadoria especial seria devido ao segurado que, após cumprir a carência
exigida, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a
atividade profissional, sujeito a condições especiais que prejudicassem a saúde ou a integridade
física, restando assegurada, ainda, a conversão do período trabalhado no exercício de atividades
danosas em tempo de contribuição comum (§3º).
Em seguida, foi editada a Lei nº 9.032/95, alterando o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, dispondo que
a partir desse momento não basta mais o mero enquadramento da atividade exercida pelo
segurado na categoria profissional considerada especial, passando a ser exigida a demonstração
da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, que poderá
se dar por meio da apresentação de informativos e formulários, tais como o SB-40 ou o DSS-
8030.
Posteriormente, com a edição do Decreto n.º 2.172, de 05/03/1997, que estabeleceu requisitos
mais rigorosos para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos,
passou-se a exigir-se a apresentação de laudo técnico para a caracterização da condição
especial da atividade exercida. Todavia, por se tratar de matéria reservada à lei, tal exigência
apenas tem eficácia a partir da edição da Lei n.º 9.528, de 10/12/1997.
Cumpre observar que a Lei nº 9528/97 também passou a aceitar o Perfil Profissiográfico
Previdenciário - PPP, documento que busca retratar as características de cada emprego do
segurado, de forma a facilitar a futura concessão de aposentadoria especial. Assim, identificado
no documento o perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, é possível a sua
utilização para comprovação da atividade especial em substituição ao laudo pericial.
Ressalto que no tocante ao reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e à
forma da sua demonstração, deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do
trabalho, conforme jurisprudência pacificada da matéria (STJ - Pet 9.194/PR, Rel. Ministro
ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
A extemporaneidade do documento comprobatório das condições especiais de trabalho não
prejudica o seu reconhecimento como tal, "pois a situação em época remota era pior ou ao
menos igual a constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do
ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica." (Des. Fed. Fausto De Sanctis,
AC nº 2012.61.04.004291-4, j. 07/05/2014)
Especificamente em relação ao ruído, o Decreto nº 53.831/64 considerava insalubre o labor
desempenhado com exposição permanente a ruído acima de 80 dB; já o Decreto nº 83.080/79
fixava a pressão sonora em 90 dB. Na medida em que as normas tiveram vigência simultânea,
prevalece disposição mais favorável ao segurado (80 dB).
Com a edição do Decreto nº 2.172/97, a intensidade de ruído considerada para fins de
reconhecimento de insalubridade foi elevada para 90 dB, mas, em 2003, essa medida foi reduzida
para 85 dB, por meio do Decreto nº 4.882, de 18 de novembro de 2003.
Até 09 de outubro de 2013, os Tribunais adotavam o enunciado pela Súmula nº 32 da TNU.
Contudo, esta Súmula foi cancelada em decorrência do julgamento da PET 9059 pelo Superior
Tribunal de Justiça (Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJe
09/09/2013) cujo entendimento foi sufragado no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Ministro
Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), sob a sistemática dos
recursos repetitivos.
Em relação ao agente ruído, vigora o princípio do tempus regit actum. Considera-se especial a
atividade desenvolvida acima do limite de 80dB até 05/03/1997, quando foi editado o Decreto nº
2.172/97, a partir de então deve-se considerar especial a atividade desenvolvida acima de 90dB
até 18/11/2003, quando foi editado o Decreto nº 4882/2003. A partir de 19/11/2003 o limite
passou a ser de 85 dB.
Saliente-se que a especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento
legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou
formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil profissiográfico
profissional (a partir de 11/12/97).
É corrente em nossos tribunais a tese de que sempre se exigiu laudo técnico para comprovar a
exposição do trabalhador aos agentes físicos ruído e calor em níveis superiores aos limites
máximos de tolerância. Entretanto, no tocante às atividades profissionais exercidas até 10/12/97 -
quando ainda não havia a exigência legal de laudo técnico -, essa afirmação deve ser
compreendida, não na literalidade, mas no sentido de ser necessário o atesto efetivo e seguro
dos níveis de intensidade dos agentes nocivos a que o trabalhador esteve exposto durante sua
jornada laboral.
Logo, para as atividades profissionais exercidas até 10/12/97, é suficiente que os documentos
apresentados façam expressa menção aos níveis de intensidade dos agentes nocivos.
Atividade especial e trabalhador autônomo
Conforme orientação firmada pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº
1.436.794-SC em 17/09/15, de relatoria do Min. Maura Campbell Marques (2ª Turma), é possível
o reconhecimento das atividades especiais do trabalhador autônomo:
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO
ARTIGO 535 DO CPC. NÃO CARACTERIZAÇÃO. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE ESPECIAL.
SEGURADO CONTRIBUINTE INDIVIDUAL NÃO COOPERADO. POSSIBILIDADE.
COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE ESPECIAL. REVISÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO.
SÚMULA 7/STJ. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E NESSA PARTE NÃO
PROVIDO.
1. Não há violação do artigo 535 do Código de Processo Civil, pois in casu o Tribunal Regional
Federal da 4ª Região analisou integralmente todas as questões levadas à sua apreciação,
notadamente, a possibilidade de se reconhecer ao segurado contribuinte individual tempo
especial de serviço, bem como conceder o benefício aposentadoria especial.
2. O caput do artigo 57 da Lei 8.213/1991 não traça qualquer diferenciação entre as diversas
categorias de segurados, elegendo como requisitos para a concessão do benefício aposentadoria
especial tão somente a condição de segurado, o cumprimento da carência legal e a comprovação
do exercício de atividade especial pelo período de 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco)
anos.
3. O artigo 64 do Decreto 3.048/1999, ao limitar a concessão do benefício aposentadoria especial
ao segurado empregado, trabalhador avulso e contribuinte individual cooperado, extrapola os
limites da Lei de Benefícios que se propôs regulamentar, razão pela qual deve ser reconhecida
sua ilegalidade.
4. Tese assentada de que é possível a concessão de aposentadoria especial ao contribuinte
individual não cooperado que cumpra a carência e comprove, nos termos da lei vigente no
momento da prestação do serviço, o exercício de atividade sob condições especiais que
prejudiquem a sua saúde ou sua integridade física pelo período de 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25
(vinte cinco) anos.
5. Alterar a conclusão firmada pelo Tribunal de origem quanto à especialidade do trabalho,
demandaria o necessário reexame no conjunto fático-probatório, prática que esbarra no óbice da
Súmula 7/STJ.
6. Recurso especial parcialmente conhecido e nessa parte não provido."
Uso de equipamento de proteção individual - EPI, como fator de descaracterização do tempo de
serviço especial
A questão foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do ARE nº 664335, da
relatoria do E. Ministro Luiz Fux, com reconhecimento de repercussão geral, na data de
04.12.2014, em que restou decidido que o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva
exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente
capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional ao reconhecimento das
atividades especiais.
Restou assentado também que, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos
limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico
Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não
descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
O fato de a empresa fornecer equipamento de proteção individual - EPI para neutralização dos
agentes agressivos não afasta, por si só, a contagem do tempo especial, pois cada caso deve ser
examinado em suas peculiaridades, comprovando-se a real efetividade do aparelho e o uso
permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho. Precedentes do Superior Tribunal de
Justiça (REsp 1428183/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 25/02/2014,
DJe 06/03/2014).
Ainda, conforme a jurisprudência citada, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído,
desde que em níveis acima dos limites legais, constata-se que, apesar do uso de Equipamento de
Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável, até
no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao
organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas.
Caso concreto - elementos probatórios
De início, verifica-se que a controvérsia cinge-se à especialidade das atividades trabalhadas no(s)
período(s) de 01/06/1985 a 30/09/1990, 01/04/1996 a 30/06/1996, 01/08/1996 a 05/03/1997,
06/03/1997 a 30/06/1999 e 01/01/2015 a 30/11/2015.
Neste contexto, do exame dos autos verifico que, não obstante seja possível, "em tese", o
reconhecimento das atividades especiais exercidas pelo trabalhador autônomo (REsp nº
1.436.794-SC), é imprescindível a associação de outras circunstâncias que tornem tal
reconhecimento viável. São elas: a comprovação do recolhimento das contribuições
previdenciárias individuais no período; a comprovação do efetivo exercício da profissão e, por
último, a comprovação da insalubridade da atividade nos termos exigidos pela legislação
previdenciária nos variados períodos de sua evolução.
No caso, restou comprovado o recolhimento das contribuições previdenciárias nos períodos
compreendidos entre 01/06/1985 a 30/09/1990, 01/04/1996 a 30/06/1996, 01/08/1996 a
05/03/1997, 06/03/1997 a 30/06/1999 e 01/01/2015 a 30/11/2015, conforme se verifica dos dados
constantes do sistema CNIS e dos documentos acostados aos autos (ID 19274266, fls. 01/28).
Ademais, foram encaminhados documentos comprovando o exercício da atividade profissional:
- certificado/diploma de cirurgião dentista emitido em 16/12/1983 pela Faculdade de Odontologia
de Ribeirão Preto/SP (ID 19274269, fls. 01);
- certidão do conselho regional de odontologia de São Paulo constando registro em 23/04/1984
emitida em 09/06/2016 (ID 19274272, fls. 01);
- certificado de vistoria do estabelecimento, emitido em 31/08/1987 (ID 19274260, fls. 27);
- declaração de existência de cadastro na Prefeitura do Município de Sertãozinho/SP em nome da
autora, com atividade iniciada em 01/06/1985 como dentista, emitida em 31/08/1987 (ID
19274260, fls. 28/29);
- alvará de licença emitido pela Prefeitura Municipal de Sertãozinho/SP, em nome do
estabelecimento da autora datado de 31/08/1987 (ID 19274260, fls. 30);
- alvará de funcionamento e renovação de alvará emitido pelo escritório Regional de Saúde –
Vigilância Sanitária de Ribeirão Preto/SP, em nome do estabelecimento da autora referente ao
exercício de 1989, 1992, 1993, 1995, 1996 e 2017 (ID 19274260, fls. 36, 39, 44/46, 48 e 52);
- certidão de constatação de autônomo emitida pela Secretaria Municipal da Fazenda, datada de
2016 (ID 19274260, fls. 53);
- comprovante de cadastro da Divisão de Tributação referente ao exercício de 1992 e 1993 (ID
19274260, fls. 41/42);
- guia de recolhimento de contribuição sindical do ano de 1993, em nome da autora (ID
19274260, fls. 43);
Dessa forma, o período de 01/06/1985 a 30/09/1990, em que restou comprovado o exercício da
função de cirurgião-dentista, na condição de autônomo, em consultório particular deve ser
considerado especial, enquadrando-se pela categoria profissional no código 2.1.3 do Decreto nº
53.831/64 e no item 2.1.3 do Decreto nº 83.080/79.
Quanto aos períodos compreendidos entre 01/04/1996 a 30/06/1996, 01/08/1996 a 05/03/1997,
06/03/1997 a 30/06/1999 e 01/01/2015 a 30/11/2015, da mesma forma, possível o
reconhecimento como especial, porquanto o PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário e LTCAT
– Laudo Técnico das Condições Ambientais acostados aos autos (ID 19274341, fls. 01/30)
comprova a exposição aos agentes biológicos lá descritos (microrganismos e secreções orais)
enquadrando-se no código 1.3.2 do Decreto nº 53.831/64, item 1.3.4 do Decreto nº 83.080/79.
A descrição pormenorizada das atividades, constante no PPP, confirma a efetiva exposição, bem
como o contato físico com pacientes e com materiais de trabalho típicos de profissionais da área
da saúde.
Embora o PPP aponte a eficácia dos equipamentos de proteção individual, tal informação não
obsta a efetiva exposição aos agentes nocivos, notadamente os infecciosos, que deve ser
interpretada como potencialmente insalubre e perigosa, considerando o risco de perfuração do
material protetor no atendimento ambulatorial/hemocentro (Resp 1470537 - RS (2014/0188441-
2).
Observo, ainda, que, não obstante o PPP tenha sido assinado pelo autor, porquanto é trabalhador
autônomo/contribuinte individual, tal documento indica o responsável pelos registros ambientais e
o responsável pela monitoração biológica.
Ademais, observo que a exigência legal de comprovação de exposição a agente insalubre de
forma permanente, introduzida pela Lei nº 9.032/95, que deu nova redação ao § 3º do artigo 57
da Lei nº 8.213, deve ser interpretada como o labor continuado, não eventual ou intermitente, de
modo que não significa a exposição ininterrupta a agente insalubre durante toda a jornada de
trabalho.
Quanto à alegação de necessidade de prévio custeio, ressalto que inexiste vinculação do ato de
reconhecimento de tempo de atividade perigosa/nociva ao eventual pagamento de encargos
tributários com alíquotas diferenciadas, eis que os artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91, não
demandam tal exigência, que constituiria encargo para o empregador, não podendo o empregado
ser por isso prejudicado.
Considerando o não provimento do recurso, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do
CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de
advogado arbitrados na sentença em 2%.
Ante o exposto, rejeito a preliminar e, no mérito, nego provimento à apelação e, com fulcro no
§11º do artigo 85 do Código de Processo Civil, majoro os honorários de advogado em 2% sobre o
valor arbitrado na sentença.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. PRELIMINAR DE SUJEIÇÃO
DA REMESSA NECESSÁRIA REJEITADA. AUTÔNOMO. POSSIBILIDADE DE
RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL. COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES
ESPECIAIS. ENQUADRAMENTO PROFISSIONAL. AGENTES BIOLÓGICOS. EXPOSIÇÃO
PERMANENTE. PRÉVIO CUSTEIO. SUCUMBÊNCIA RECURSAL. HONORÁRIOS DE
ADVOGADO MAJORADOS.
1. Valor da condenação inferior a 1.000 salários mínimos. Preliminar rejeitada.
2. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o
reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua
demonstração.
3. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da
atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no
período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário (a
partir de 11/12/97).
4. É possível o reconhecimento do exercício de atividades especiais pelo trabalhador autônomo
(REsp nº 1.436.794-SC), desde que comprovado o recolhimento das contribuições
previdenciárias no período, o efetivo exercício da profissão e a insalubridade da atividade, nos
termos exigidos pela legislação previdenciária nos variados períodos de sua evolução.
5. A atividade de dentista pode ser enquadrada como especial, a teor do código 2.1.3 do Decreto
nº 53.831/64 e 2.1.3 do Decreto 83.080/79.
6. Condição especial de trabalho configurada. Exposição habitual e permanente a agentes
biológicos (microrganismos e secreções orais), enquadrando-se no código 1.3.2 do Decreto nº
53.831/64, item 1.3.4 do Decreto nº 83.080/79 e item 3.0.1 do Decreto n° 2.172/97.
7. A exigência legal de comprovação de exposição a agente insalubre de forma permanente,
introduzida pela Lei nº 9.032/95, que deu nova redação ao § 3º do artigo 57 da Lei nº 8.213, deve
ser interpretada como o labor continuado, não eventual ou intermitente, de modo que não
significa a exposição ininterrupta a agente insalubre durante toda a jornada de trabalho.
8. Inexiste vinculação do ato de reconhecimento de tempo de atividade perigosa/nociva ao
eventual pagamento de encargos tributários com alíquotas diferenciadas, pois o empregado não
pode ser por isso prejudicado.
9. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na
sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015.
10. Preliminar rejeitada. No mérito, apelação do INSS não provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a preliminar e, no mérito, negar provimento à apelação do INSS, nos
termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
