Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5144988-53.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
30/11/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 04/12/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. CARÊNCIA CUMPRIDA.
QUALIDADE DE SEGURADO NÃO COMPROVADA. INCAPACIDADE PREEXISTENTE.
REFILIAÇÃO TARDIA. IMPROCEDÊNCIA MANTIDA POR FUNDAMENTO DIVERSO.
JULGAMENTO SURPRESA NÃO CONFIGURADO. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
HONORÁRIOS DE ADVOGADO MAJORADOS.
1. A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do
benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da
carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade
que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos
nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
2. Na data do requerimento administrativo, 18/04/2016, era exigível o recolhimento de 4 (quatro)
contribuições para permitir o cômputo das contribuições anteriores à perda da qualidade de
segurado, conforme previsão do artigo 24, par. único da Lei nº 8.213/91, em sua redação original,
aplicável no período por não ter sido convertida em oei a Medida Provisória nº 739/2016 dentro
do prazo de 120 dias (05 de novembro de 2016), tendo perdido a eficácia com efeitos retroativos
à data da edição, nos termos do §3º do artigo 62 da Constituição Federal de 1988.
3. O conjunto probatório demonstrou a preexistência da patologia incapacitante ao reingresso da
autora ao RGPS, ocorrido em 02/02/2015 (fls. 21). Ao que se constata do exame pericial, a
limitação funcional da autora decorre exclusivamente do quadro de baixa acuidade visual que a
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
acomete, doença que já afetava gravemente a autora no ano de 2011, conforme constatado no
laudo pericial e nos documentos médicos apresentados pela autora, segundo os quais a autora já
vinha realizando tratamento médico para a doença incapacitante na ocasião.
3. Em se tratando de doença preexistente à refiliação ao RGPS, nos termos do art. 42, § 2°, da
Lei n° 8.213/91, não preencheu a parte autora um dos requisitos legais exigidos pela legislação
de regência para a concessão dos benefícios por incapacidade, a tornar inviável a concessão do
benefício de auxílio doença ou aposentadoria por invalidez postulados, pelo que de rigor a
manutenção do decreto de improcedência do pedido inicial.
4. Violação ao postulado que veda a decisão surpresa não ocorrida, na medida em que a
alteração no fundamento da improcedência do pedido se deu nos limites do conjunto fático-
probatório discutido no processo, acerca do qual as partes puderam exercer o contraditório em
sua plenitude, limitando-se o presente julgamento a conferir enquadramento jurídico diverso aos
mesmos fatos já constantes do processo. (Precedentes no C. STJ).
5. Aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015, com a majoração, a título de
sucumbência recursal, dos honorários de advogado arbitrados na sentença em 2%, cuja
exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi concedida, condicionada à
hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
6. Apelação da parte autora não provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5144988-53.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: JOSEFA DAS NEVES LIMA
Advogado do(a) APELANTE: DAIANE BARROS SPINA - SP226103-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5144988-53.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: JOSEFA DAS NEVES LIMA
Advogado do(a) APELANTE: DAIANE BARROS SPINA - SP226103-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício de auxílio-doença ou aposentadoria por
invalidez a partir do indeferimento administrativo, 18/04/2016.
A sentença julgou improcedente o pedido, reconhecendo não ter sido cumprido o período de
carência previsto no art. 25, I da Lei de Benefícios, tendo em vista que o último vínculo laboral foi
mantido por tempo inferior a 12 meses. Condenou a parte autora ao pagamento de honorários
advocatícios fixados em 10% sobre o valor da c ausa, observada a gratuidade concedida.
Apela a autora, sustentando terem sido preenchidos os requisitos para a concessão do benefício
por incapacidade postulado, comprovada a incapacidade no laudo médico pericial, assim como a
qualidade de segurada na data do requerimento administrativo, 18/04/2016, pois o último vínculo
laboral anotado na CTPS teve saída registrada em 17/07/2015. No que se refere à carência,
alega que na data do requerimento vigorava a exigência de 4 contribuições para recuperar as
contribuições anteriores à perda da qualidade de segurado, que restou cumprida no tempo de
duração do último vínculo laboral.
Sem contrarrazões.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5144988-53.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: JOSEFA DAS NEVES LIMA
Advogado do(a) APELANTE: DAIANE BARROS SPINA - SP226103-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
O artigo 42 da Lei nº 8.213/91 estabelece os requisitos necessários para a concessão do
benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da
carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade
que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos
nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
É dizer: a incapacidade total e permanente para o exercício de atividade que garanta a
subsistência enseja a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez; a incapacidade
total e temporária para o exercício de atividade que garanta a subsistência justifica a concessão
do benefício de auxílio-doença e a incapacidade parcial e temporária somente legitima a
concessão do benefício de auxílio-doença se impossibilitar o exercício do labor ou da atividade
habitual por mais de 15 (quinze) dias pelo segurado.
O artigo 15 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre as hipóteses de manutenção da qualidade de
segurado, independentemente de contribuições; trata-se do denominado período de graça,
durante o qual remanesce o direito a toda a cobertura previdenciária. Confira-se:
“Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem
remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de
segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para
prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver
pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da
qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado
desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério
do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a
Previdência Social."
A doutrina e a jurisprudência são pacíficas no sentido de que não flui o período de graça, não
perdendo a qualidade de segurado o trabalhador que deixou de contribuir para o RGPS por se
encontrar impossibilitado de exercer atividades laborativas em decorrência da sua condição de
saúde, e que teve seu benefício de auxílio doença ou aposentadoria por invalidez cessado
indevidamente, ou ainda negada a sua concessão, quando comprovadamente se encontrava
incapacitado.
No que toca à prorrogação do período de graça ao trabalhador desempregado, não obstante a
redação do §2º do artigo 15 da Lei nº. 8.213/1991 mencionar a necessidade de registro perante o
Ministério do Trabalho e da Previdência Social para tanto, o Superior Tribunal de Justiça, em
sede de Incidente de Uniformização de Interpretação de Lei Federal (Pet. 7.115), firmou
entendimento no sentido de que a ausência desse registro poderá ser suprida quando outras
provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal, se revelarem aptas a comprovar a situação
de desemprego.
A perda da qualidade de segurado está disciplinada no §4º desse dispositivo legal, ocorrendo no
dia seguinte ao do término do prazo para recolhimento da contribuição referente ao mês de
competência imediatamente posterior ao final dos prazos para manutenção da qualidade de
segurado.
Depreende-se, assim, que o segurado mantém essa qualidade por mais um mês e meio após o
término do período de graça, independente de contribuição, mantendo para si e para os seus
dependentes o direito aos benefícios previdenciários.
Quanto à carência, a redação original do artigo 25, inciso I, da Lei de Benefícios exige o
cumprimento de 12 (doze) contribuições mensais para a concessão de aposentadoria por
invalidez ou auxílio-doença, in verbis: “Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do
Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o
disposto no art. 26:I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições
mensais;”;.
Na hipótese de perda da qualidade de segurado, o parágrafo único do artigo 24 da mencionada
lei previa que as contribuições anteriores a essa data só seriam computadas para efeito de
carência depois que o segurado contasse, a partir da nova filiação à Previdência Social, com, no
mínimo, 1/3 (um terço) do número de contribuições /exigidas para o cumprimento da carência
definida para o benefício a ser requerido.
Tal disposição foi revogada pela Medida Provisória nº 739/2016, de 07 de julho de 2016, que
incluiu o parágrafo único no artigo 27 da Lei nº 8.213/91, dispondo que “No caso de perda da
qualidade de segurado, para efeito de carência para a concessão dos benefícios de auxílio-
doença, de aposentadoria por invalidez e de salário-maternidade, o segurado deverá contar, a
partir da nova filiação à Previdência Social, com os períodos previstos nos incisos I e III do caput
do art. 25”.
Todavia, essa norma não foi convertida em lei dentro do prazo de 120 dias (05 de novembro de
2016), tendo perdido a eficácia com efeitos retroativos à data da edição, nos termos do §3º do
artigo 62 da Constituição Federal de 1988, voltando, portanto, a viger a norma anterior.
Anote-se que não tendo sido editado o decreto legislativo previsto no mencionado §3º, apenas as
relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados sob a sua vigência conservar-se-
ão por ela regidas, conforme disposto no §11 do mesmo artigo 62 da Lei Maior.
Em 06 de janeiro de 2017, entrou em vigor a Medida Provisória nº 767/2017, que novamente
revogou o parágrafo único do artigo 24, disciplinando a matéria por meio da inclusão do artigo 27-
A na Lei nº 8.213/91, repetindo o texto da Medida Provisória nº 739/2016.
Convertida na Lei nº 13.457/2017, a norma do art. 27-A foi modificada para exigir o recolhimento
de metade das contribuições exigidas para a carência dos benefícios por incapacidade (para
todos os segurados) e do salário-maternidade (para as seguradas contribuinte individual e
facultativa).
Na seqüência, houve nova alteração do texto do artigo 27-A pela Medida Provisória nº 871/2019,
de 18 de janeiro de 2019, que retomou a necessidade do cumprimento dos períodos integrais de
carência previstos nos incisos I, III e IV do caput do art. 25. Por fim, convertida na Lei nº 13.846,
de 2019, houve o restabelecimento da exigência da metade das contribuições, conforme
anteriormente fixado na Lei nº 13.457/2017.
Em resumo, na hipótese de perda da qualidade de segurado, para readquirir a carência
necessária para fins da concessão dos benefícios de auxílio-doença, e de aposentadoria por
invalidez, o segurado deverá, quando da data do requerimento administrativo, ter vertido: I) até
05/01/2017, 4 contribuições; II) de 06/01/2017 a 26/06/2017 (MP 767/2017), 12 contribuições; III)
27/06/2017 a 17/01/2019 (Lei 13.457/2017), 6 contribuições; IV) de 18/01/2019 a 17/06/2019 (MP
871/2019), 12 contribuições; e V) a partir de 18/06/2019, 6 contribuições.
No caso dos autos.
No caso dos autos, a sentença julgou improcedente o pedido inicial, reconhecendo como não
cumprida a carência de 12 contribuições do benefício, conforme prevista no art. 25, I da Lei de
Benefícios.
No entanto, razão assiste à autora em afirmar o cumprimento da carência do benefício.
Na data do requerimento administrativo, 18/04/2016, era exigível o recolhimento de 4 (quatro)
contribuições para permitir o cômputo das contribuições anteriores à perda da qualidade de
segurado, conforme previsão do artigo 24, par. único da Lei nº 8.213/91, em sua redação original,
aplicável no período nos termos da fundamentação já exposta.
No entanto, afigura-se inviável a reforma da sentença e o acolhimento do pedido inicial, mantida
sua improcedência por fundamento diverso.
O conjunto probatório demonstrou a preexistência da patologia incapacitante ao reingresso da
autora ao RGPS, ocorrido em 02/02/2015 (fls. 21).
O laudo médico pericial, exame realizado em 25/08/2017 (fls. 90), constatou que a autora, então
aos 59 anos de idade, apresenta quadro de diabetes mellitus insulino dependente, glaucoma,
retinopatia diabética, hipertensão arterial e depressão recorrente, além de queixas esqueléticas
ainda não esclarecidas, doenças crônicas, concluindo pela existência de incapacidade total e
permanente para a atividade habitual de empregada doméstica em decorrência do quadro de
retinopatia diabética, que provoca baixa acuidade visual, doença oftalmológica irreversível,
encontrando-se estabilizado o quadro de transtorno depressivo, além de possuir conteúdo
emocional o quadro de dores esqueléticas, sem possibilidade de fixar a data de início da
incapacidade e da doença, mas estimando existir incapacidade na época do requerimento
Ao que se constata do exame pericial, a limitação funcional da autora decorre exclusivamente do
quadro de baixa acuidade visual que a acomete, em relação à qual o laudo afirma que em
24/02/2011 a doença já se manifestava (retinografia).
Consta ainda de fls. 32 dos autos o atestado médico juntado pela própria autora, emitido em
27/04/2011 pela Secretaria Municipal de Saúde do município de Palhoça-SC, do qual se infere
que a doença oftalmológica já se manifestava gravemente na ocasião, pois o documento afirma in
verbis “ ...é portadora de diabetes melitos, nefropatia diabética e retinopatia diabética,
acompanhada por especialistas, e hipertensão arterial, hipercolestorolemia. Ter baixa aquidade
visual é totalmente dependente dos filhos e vizinhos. Solicito avaliação.”
Conclui-se do conjunto probatório produzido a preexistência da patologia incapacitante à
refiliação da autora à previdência social, pois no reingresso ao RGPS já se encontrava acometida
das patologias incapacitantes invocadas para a concessão dos benefícios postulados.
Ora, é sabido que a Previdência Social é ramo da seguridade social assemelhado ao seguro, vez
que possui caráter eminentemente contributivo. O custeio do sistema pressupõe o recolhimento
de contribuições para o fundo que será revertido àqueles que, preenchidos os requisitos,
padecerem em eventos previstos e por ele cobertos.
Para outras situações de desamparo social, previu o constituinte benefícios assistenciais que
dispensam contribuições regulares (art. 6º c/c art. 203, CF).
A doença ou invalidez são contingências futuras e incertas, todavia, as doenças degenerativas,
evolutivas, próprias do envelhecer devem ser analisadas com parcimônia, já que filiações
extemporâneas e reingressos tardios afrontam a lógica do sistema, causando desequilíbrio
financeiro e atuarial.
Nesse sentido, os seguintes julgados: TRF3, AC 0034800-49.2016.403.9999SP, Décima Turma,
Des. Fed. NELSON PORFIRIO, Julgamento: 20/06/2017, e-DJF3 Judicial I: 29/06/2017; TRF3,
AC 0000986-12.2017.403.9999 SP, Oitava Turma, Des. Fed. TANIA MARANGONI, Julgamento:
06/03/2017, e-DJF3 Judicial I: 20/03/2017.
Ademais, é condição imprescindível para concessão da aposentadoria por invalidez, que no
momento do surgimento da incapacidade laboral, estejam preenchidos os requisitos de qualidade
de segurado e carência, conforme previsto no artigo 42, § 2º:
“Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida,
será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado
incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a
subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
(...)
§ 2º A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de
Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a
incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.”
Logo, tratando-se de doença preexistente à refiliação ao RGPS, nos termos do art. 42, § 2°, da
Lei n° 8.213/91, não preencheu a parte autora um dos requisitos legais exigidos pela legislação
de regência para a concessão dos benefícios por incapacidade, a tornar inviável a concessão do
benefício pleiteado.
Por fim, não se afigura aplicável ao caso o princípio da não surpresa, consagrado no artigo 10,c/c
o artigo 933, caput, ambos do CPC/15, com o teor seguinte:
“Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a
respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate
de matéria sobre a qual deva decidir de ofício.”
“Art. 933. Se o relator constatar a ocorrência de fato superveniente à decisão recorrida ou a
existência de questão apreciável de ofício ainda não examinada que devam ser considerados no
julgamento do recurso, intimará as partes para que se manifestem no prazo de 5 (cinco) dias.”
No caso presente, verifica-se que a alteração no fundamento da improcedência do pedido se deu
nos limites do conjunto fático-probatório discutido no processo, acerca do qual as partes puderam
exercer o contraditório em sua plenitude, limitando-se o presente julgamento a conferir
enquadramento jurídico diverso aos mesmos fatos constantes do processo.
Nesse sentido a orientação jurisprudencial do C. Superior Tribunal de Justiça:“O Superior Tribunal
de Justiça manifesta-se no sentido de que "não há que se falar em violação à vedação da decisão
surpresa quando o julgador, examinando os fatos expostos na inicial, juntamente com o pedido e
a causa de pedir, aplica o entendimento jurídico que considerada coerente para a causa" (AgInt
no AREsp 1.468.820/MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, DJe de 27/09/2019).
((AgInt no AREsp 1532266/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em
15/06/2020, DJe 01/07/2020)
Considerando o não provimento do recurso, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do
CPC/2015, pelo que condeno o apelante, a título de sucumbência recursal, ao pagamento de
honorários de advogado à parte contrária, arbitrados em 2% do valor da condenação, observados
os termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação.
É o voto.
DECLARAÇÃO DE VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA: Com fundamento na
preexistência da incapacidade, o Ilustre Relator votou no sentido de manter a improcedência do
pedido.
E, a par do respeito e da admiração que nutro pelo Ilustre Relator, dele divirjo.
Os benefícios por incapacidade, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que,
após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (artigo 25, inciso I), sejam acometidos por
incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no caso
de aposentadoria por invalidez (artigo 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual por mais
de 15 (quinze) dias consecutivos, no caso de auxílio-doença (artigo 59).
No tocante ao auxílio-doença, especificamente, vale destacar que se trata de um benefício
provisório, que cessa com o término da incapacidade, no caso de ser temporária, ou com a
reabilitação do segurado para outra atividade que lhe garanta a subsistência, se a incapacidade
for definitiva para a atividade habitual, podendo, ainda, ser convertido em aposentadoria por
invalidez, caso o segurado venha a ser considerado insusceptível de reabilitação.
Em relação à carência, nos termos do artigo 26, inciso II, da Lei nº 8.213/91, dela está
dispensado o requerente nos casos em que a incapacidade é decorrente de acidente de qualquer
natureza ou causa, de doença profissional ou do trabalho, ou ainda das doenças e afecções
elencadas no artigo 151 da mesma lei.
Como se vê, para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o
preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da carência,
quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral.
No caso dos autos, o exame realizado pelo perito oficial, concluiu que a parte autora está
incapacitada de forma total e permanente para o exercício da atividade laboral, como se vê do
laudo oficial.
"A pericianda apresenta diversas patologias crônicas e se encontra em tratamento clínico.
São elas: Diabetes Mellitus Insulino Dependente, Glaucoma, Retinopatia Diabética, Hipertensão
Arterial, Depressão recorrente, além de queixas esqueléticas ainda não esclarecidas.
A principal patologia, que afeta a sua capacidade laboral, é a Retinopatia Diabética - que provoca
baixa acuidade visual confirmada por aferição oftalmológica. Essa baixa acuidade visual não é
passível de recuperação.
O quadro depressivo recorrente, aparenta estar atualmente estabilizado, controlado - por
medicamentos.
Tem queixas de dores esqueléticas, ainda não investigadas por reumatologista - mas que
suspeito conter significativo componente emocional (compõe o rol de sintomas do quadro
depressivo).
Com base nos elementos expostos e analisados, concluo: está incapacitada de forma definitiva
para a sua atividade habitual de empregada doméstica e para atividade que possa lhe garantir a
subsistência." (pág. 02)
Assim, ainda que o magistrado não esteja adstrito às conclusões do laudo pericial, conforme
dispõem o artigo 436 do CPC/1973 e o artigo 479 do CPC/2015, estas devem ser consideradas,
por se tratar de prova técnica, elaborada por profissional da confiança do Juízo e equidistante das
partes.
O laudo em questão foi realizado por profissional habilitado, equidistante das partes, capacitado,
especializado em perícia médica, e de confiança do r. Juízo, cuja conclusão encontra-se lançada
de forma objetiva e fundamentada, não havendo que se falar em realização de nova perícia
judicial.
Outrossim, o laudo pericial atendeu às necessidades do caso concreto, possibilitando concluir
que o perito realizou minucioso exame clínico, respondendo aos quesitos formulados. Além disso,
levou em consideração, para formação de seu convencimento, a documentação médica
colacionada aos autos.
Desse modo, demonstrada, através do laudo elaborado pelo perito judicial, a incapacidade total e
permanente para o exercício da atividade laboral, é possível conceder a aposentadoria por
invalidez, até porque preenchidos os demais requisitos legais.
Restou comprovado, nos autos, que a parte autora é segurada da Previdência Social e cumpriu a
carência de 12 (doze) contribuições, exigida pelo artigo 25, inciso I, da Lei nº 8.213/91, como se
vê dos documentos constantes do ID13029051 (CTPS anotada).
Constam, desse documento, alguns vínculos empregatícios, os últimos deles relativos aos
períodos de 03/11/2010 a 01/04/2011 e de 02/02/2015 a 17/07/2015.
A presente ação foi ajuizada em 31/08/2016.
Embora o perito judicial não tenha fixado a data de início da incapacidade, há documento médico,
datado de 27/04/2011, emitido pela Secretaria de Saúde do Município, atestando que, naquela
ocasião, quando ainda mantinha a condição de segurado, a parte autora já possuía baixa
acuidade visual e dependia totalmente de filhos e vizinhos (ID13029057, pág. 11).
Assim, considerando que a parte autora, após abril de 2011, deixou de trabalhar em razão da sua
incapacidade laboral, não há que se falar em perda da condição de segurada e, se não houve
perda dessa condição, não restou configurada nova filiação e preexistência da incapacidade.
Nesse sentido, é o entendimento pacificado no Egrégio Superior Tribunal de Justiça:
A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça é firme no sentido de que o segurado que deixa
de contribuir para a Previdência Social, por estar incapacitado para o labor, não perde a
qualidade de segurado.
(AgRg no REsp nº 1.245.217/SP, 5ª Turma, Relator Ministro Gilson Dipp, DJe 20/06/2012)
"O segurado, que deixa de contribuir por período superior a 12 meses para a Previdência Social,
perde a sua condição de segurado. No entanto, para efeito de concessão de aposentadoria por
invalidez, desde que preenchidos todos os requisitos legais, faz jus ao benefício, por força do
artigo 102 da Lei 8.213/91. Precedentes." (REsp nº 233.725/PE, da minha Relatoria, in DJ
5/6/2000).
(AgRg no REsp nº 866.116/SP, 6ª Turma, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJe 01/09/2008)
No mesmo sentido, é o entendimento firmado por esta Egrégia Corte Regional:
Ainda que, entre a data em que a parte autora deixou de contribuir para a Previdência Social e o
ajuizamento da ação, tenha decorrido período superior ao prazo previsto no inciso II do artigo 15
da Lei nº 8.213/91, não há que se falar na perda da qualidade de segurada, vez que restou
comprovado, nos autos, que ela não mais contribuiu para a Previdência Social em razão de sua
incapacidade laborativa.
(AC nº 2017.03.99.009063-0/SP, 7ª Turma, Relatora Juíza Federal Giselle França, DE
14/03/2018)
O segurado não perde a qualidade de segurado se deixar de contribuir por período igual ou
superior a 12 (doze) meses, se em decorrência de incapacidade juridicamente comprovada.
Precedentes do C. STJ.
(AC nº 0037265-94.2017.4.03.9999/SP, 8ª Turma, Relator Desembargador Federal David Dantas,
DE 09/02/2018)
É pacífico o entendimento no sentido de que não perde a qualidade de segurado a pessoa que
deixou de trabalhar em virtude de doença. Veja-se a respeito: STJ, RESP 84152, DJ 19/12/02, p.
453, Rel. Min. Hamilton Carvalhido.
(AC nº 0032952-90.2017.4.03.9999/MS, 10ª Turma, Relator Desembargador Federal Sérgio
Nascimento, DE 19/02/2018)
O termo inicial do benefício, em regra, deveria ser fixado à data do requerimento administrativo
ou, na sua ausência, à data da citação (Súmula nº 576/STJ) ou, ainda, na hipótese de auxílio-
doença cessado indevidamente, no dia seguinte ao da cessação indevida do benefício.
No caso, o termo inicial do benefício é fixado em 18/04/2016, data do requerimento
administrativo.
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices previstos
no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo
Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de 2009, período
em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-e, critério
estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Recurso
Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, e
confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração opostos pelo INSS.
Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária
diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte
alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos
Tribunais Superiores.
Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% do
valor das prestações vencidas até a data do presente julgamento (Súmula nº 111/STJ).
No que se refere às custas processuais, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, tanto no
âmbito da Justiça Federal (Lei nº 9.289/96, art. 4º, I) como da Justiça Estadual de São Paulo (Lei
nº 9.289/96, art. 1º, I, e Leis Estaduais nºs 4.952/85 e 11.608/2003).
Tal isenção, decorrente de lei, não exime o INSS do reembolso das custas recolhidas pela parte
autora (artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/96), inexistentes, no caso, tendo em conta a
gratuidade processual que foi concedida à parte autora.
Também não o dispensa do pagamento de honorários periciais ou do seu reembolso, caso o
pagamento já tenha sido antecipado pela Justiça Federal, devendo retornar ao erário (Resolução
CJF nº 305/2014, art. 32).
Ante o exposto, divergindo do voto do Ilustre Relator, DOU PROVIMENTO ao apelo da parte
autora, para condenar o Instituto-réu a conceder-lhe a APOSENTADORIA POR INVALIDEZ, nos
termos dos artigos 42 e 44 da Lei nº 8.213/91, a partir de 18/04/2016, data do pedido
administrativo, determinando, ainda, na forma acima explicitada, a aplicação de juros de mora e
correção monetária, bem como o pagamento de encargos de sucumbência.
Independentemente do trânsito em julgado, determino, com base no artigo 497 do CPC/2015, a
expedição de e-mail ao INSS, instruído com cópia dos documentos da segurada JOSEFA DAS
NEVES COSTA, para que, no prazo de 30 dias, sob pena de multa-diária no valor de R$ 100,00,
cumpra a obrigação de fazer consistente na imediata implantação do benefício de
APOSENTADORIA POR INVALIDEZ, com data de início (DIB) em 18/04/2016 (data do
requerimento administrativo), e renda mensal a ser calculada de acordo com a legislação vigente.
OFICIE-SE.
É COMO VOTO.
/gabiv/asato
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. CARÊNCIA CUMPRIDA.
QUALIDADE DE SEGURADO NÃO COMPROVADA. INCAPACIDADE PREEXISTENTE.
REFILIAÇÃO TARDIA. IMPROCEDÊNCIA MANTIDA POR FUNDAMENTO DIVERSO.
JULGAMENTO SURPRESA NÃO CONFIGURADO. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
HONORÁRIOS DE ADVOGADO MAJORADOS.
1. A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do
benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da
carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade
que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos
nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
2. Na data do requerimento administrativo, 18/04/2016, era exigível o recolhimento de 4 (quatro)
contribuições para permitir o cômputo das contribuições anteriores à perda da qualidade de
segurado, conforme previsão do artigo 24, par. único da Lei nº 8.213/91, em sua redação original,
aplicável no período por não ter sido convertida em oei a Medida Provisória nº 739/2016 dentro
do prazo de 120 dias (05 de novembro de 2016), tendo perdido a eficácia com efeitos retroativos
à data da edição, nos termos do §3º do artigo 62 da Constituição Federal de 1988.
3. O conjunto probatório demonstrou a preexistência da patologia incapacitante ao reingresso da
autora ao RGPS, ocorrido em 02/02/2015 (fls. 21). Ao que se constata do exame pericial, a
limitação funcional da autora decorre exclusivamente do quadro de baixa acuidade visual que a
acomete, doença que já afetava gravemente a autora no ano de 2011, conforme constatado no
laudo pericial e nos documentos médicos apresentados pela autora, segundo os quais a autora já
vinha realizando tratamento médico para a doença incapacitante na ocasião.
3. Em se tratando de doença preexistente à refiliação ao RGPS, nos termos do art. 42, § 2°, da
Lei n° 8.213/91, não preencheu a parte autora um dos requisitos legais exigidos pela legislação
de regência para a concessão dos benefícios por incapacidade, a tornar inviável a concessão do
benefício de auxílio doença ou aposentadoria por invalidez postulados, pelo que de rigor a
manutenção do decreto de improcedência do pedido inicial.
4. Violação ao postulado que veda a decisão surpresa não ocorrida, na medida em que a
alteração no fundamento da improcedência do pedido se deu nos limites do conjunto fático-
probatório discutido no processo, acerca do qual as partes puderam exercer o contraditório em
sua plenitude, limitando-se o presente julgamento a conferir enquadramento jurídico diverso aos
mesmos fatos já constantes do processo. (Precedentes no C. STJ).
5. Aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015, com a majoração, a título de
sucumbência recursal, dos honorários de advogado arbitrados na sentença em 2%, cuja
exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi concedida, condicionada à
hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
6. Apelação da parte autora não provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo NO
JULGAMENTO, A SÉTIMA TURMA, POR MAIORIA, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À
APELAÇÃO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, COM QUEM VOTARAM O DES.
FEDERAL CARLOS DELGADO, O DES. FEDERAL TORU YAMAMOTO E O DES. FEDERAL
LUIZ STEFANINI, VENCIDA A DES. FEDERAL INÊS VIRGÍNIA QUE DAVA PROVIMENTO AO
APELO DA PARTE AUTORA. LAVRARÁ O ACÓRDÃO O RELATOR
, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
