Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5000036-49.2016.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
24/09/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 27/09/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ RURAL. QUALIDADE DE
SEGURADO ESPECIAL NÃO COMPROVADA. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. RECURSO
PROVIDO.
1. Não faz jus a parte autora à concessão de aposentadoria por invalidez rural postulada, pois
comprovado o labor rural afirmado na inicial unicamente pela prova testemunhal, insuficiente para
a comprovação do trabalho campesino nos termos da Súmula nº 149 do STJ, segundo a qual é
necessário que a prova testemunhal venha acompanhada de início razoável de prova
documental: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade
rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
2. Invertido o ônus da sucumbência e condenada a parte autora ao pagamento de honorários de
advogado fixados em R$ 1.000,00 (um mil reais), de acordo com o §8º do artigo 85 do Código de
Processo Civil/2015, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi
concedida, fica condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo
Civil/2015.
3.Apelação do INSS provida.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000036-49.2016.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARCIO ROBERTO PERACOLI
Advogado do(a) APELADO: VALDIR SEGURA - SP303265-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000036-49.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARCIO ROBERTO PERACOLI
Advogado do(a) APELADO: VALDIR SEGURA - SP303265-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez a
trabalhadora rural segurado especial, prevista no artigo 42 e seguintes da Lei 8213/91.
A sentença proferida em 11/05/2015 julgou procedente o pedido e condenou o INSS a conceder
aposentadoria por invalidez rural ao autor, reconhecendo como comprovada sua condição de
trabalhador rural segurada especial, bem como a incapacidade laboral total e permanente para o
trabalho, com DIB na data do requerimento administrativo, 21/09/2012, com o pagamento dos
valores em atraso de uma só vez, corrigidos monetariamente com base no INPC até a vigência
da Lei nº 11.960/2009, quando deverá se dar nos termos do art. 1º-F da Lei 9.494/97, bem como
juros de mora a partir da citação, à razão de 1% a.m. até o advento da Lei nº 11.969/09, após o
que seguem o que neste definido. Condenou o INSS ao pagamento de honorários advocatícios
fixados em 10% sobre o valor da condenação, observada a Súmula nº 111/STJ. Não houve a
concessão de tutela antecipada. Sentença não submetida a reexame necessário.
Apela o INSS, sustentando o não preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício,
por não ter restado comprovada nos autos a qualidade de segurado especial do autor, ausente
início de prova material acerca da condição de trabalhador rural no regime de economia familiar à
época do início da incapacidade e por período equivalente à carência do benefício. Alega que o
autor apresenta onze recolhimentos no período de 09/2011 a 07/2012, como contribuinte
individual, de forma que não cumprida a carência para o benefício. Alega ainda que o
indeferimento administrativo foi fundado na preexistência da patologia ao ingresso no RGPS,
sendo que o laudo pericial não fixou a data de início da incapacidade.
Com contrarrazões.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000036-49.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARCIO ROBERTO PERACOLI
Advogado do(a) APELADO: VALDIR SEGURA - SP303265-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Considerando que a sentença foi proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 1973,
passo ao exame da admissibilidade da remessa necessária prevista no seu artigo 475.
Embora não seja possível, de plano, aferir-se o valor exato da condenação, pode-se concluir, pelo
termo inicial do benefício (21/09/2012), seu valor aproximado e a data da sentença (11/05/2015),
que o valor total da condenação não alcançaa importância de 60 (sessenta) salários mínimos
estabelecida no § 2º.
Assim, é nítida a inadmissibilidade, na hipótese em tela, da remessa necessária.
A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do
benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da
carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade
que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos
nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
É dizer: a incapacidade total e permanente para o exercício de atividade que garanta a
subsistência enseja a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez; a incapacidade
total e temporária para o exercício de atividade que garanta a subsistência justifica a concessão
do benefício de auxílio-doença e a incapacidade parcial e temporária somente legitima a
concessão do benefício de auxílio-doença se impossibilitar o exercício do labor ou da atividade
habitual por mais de 15 (quinze) dias pelo segurado.
A condição de segurado (obrigatório ou facultativo) decorre da inscrição no regime de previdência
pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes.
O artigo 15 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre as hipóteses de manutenção da qualidade de
segurado, independentemente de contribuições; trata-se do denominado período de graça,
durante o qual remanesce o direito a toda a cobertura previdenciária. Também é considerado
segurado aquele que trabalhava, mas ficou impossibilitado de recolher contribuições
previdenciárias em razão de doença incapacitante.
Nesse passo, acresça-se que no que toca à prorrogação do período de graça ao trabalhador
desempregado, não obstante a redação do §2º do artigo 15 da Lei nº. 8.213/1991 mencionar a
necessidade de registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social para tanto, o
Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Interpretação de Lei
Federal (Pet. 7.115), firmou entendimento no sentido de que a ausência desse registro poderá ser
suprida quando outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal, se revelarem aptas
a comprovar a situação de desemprego.
A perda da qualidade de segurado está disciplinada no §4º desse dispositivo legal, ocorrendo no
dia seguinte ao do término do prazo para recolhimento da contribuição referente ao mês de
competência imediatamente posterior ao final dos prazos para manutenção da qualidade de
segurado.
Depreende-se, assim, que o segurado mantém essa qualidade por mais um mês e meio após o
término do período de graça, independente de contribuição, mantendo para si e para os seus
dependentes o direito aos benefícios previdenciários.
Anote-se que a eventual inadimplência das obrigações trabalhistas e previdenciárias acerca do
tempo trabalhado como empregado deve ser imputada ao empregador, responsável tributário,
conforme preconizado na alínea a do inciso I do artigo 30 da Lei nº 8.213/91, não sendo cabível a
punição do empregado urbano pela ausência de recolhimentos, computando-se, assim, o período
laborado para fins de verificação da qualidade de segurado.
Acresça-se, também, que será garantida a condição de segurado ao trabalhador rural que não
tiver vínculo de emprego devidamente registrado em CTPS desde que comprovado o labor
mediante ao menos início de prova documental, consoante estabelecido na Súmula nº 149 do
STJ.
Também é pacífico o entendimento dos Tribunais, considerando as difíceis condições dos
trabalhadores rurais, admitir a extensão da qualificação do cônjuge ou companheiro à esposa ou
companheira, bem como da filha solteira residente na casa paterna. (REsp 707.846/CE, Rel. Min.
LAURITA VAZ, Quinta Turma, DJ de 14/3/2005)
Por fim, quanto à carência, exige-se o cumprimento de 12 (doze) contribuições mensais para a
concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, conforme prescreve a Lei n.º
8.213/91, em seu artigo 25, I, in verbis: "Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do
Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o
disposto no art. 26:I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições
mensais;".
No caso concreto.
O autor, nascido em 23/01/1980, propôs a presente ação em 09/11/2012, alegando ser portador
de doença cardíaca que o incapacita para o labor como trabalhador rural segurado especial, no
regime de economia familiar.
Como prova da incapacidade, apresentou exames e atestados médicos datados de 2003 a 2013.
A perícia médica judicial do autor, ocorrida em 03/04/2014, aos 34 anos de idade, constatou que
o autor realizou cirurgias cardíacas no ano de 2003 e 2012 para implante e troca de prótese
valvar, com quadro de hipertensão arterial sistêmica desde 2003, diabetes e doença cardíaca em
tratamento regular, além de ser sedentário, fazendo uso de medicamento anti-hipetensivo, com
quadro de dores crônicas no corpo, doenças de natureza crônico-degenerativas que podem ser
tratadas e controladas em ambulatório, sem complicações caso o tratamento seja feito
corretamente, concluindo pela existência de incapacidade total e permanente para a atividade de
trabalhador rural, por apresentar limitação para atividade que demande esforço físico, fixando a
data de início da doença no ano de 2003, impossibilitada a fixação da data de início da
incapacidade.
De outra parte e nos termos do art. 25, I, da Lei de Benefícios, a parte autora deveria comprovar o
exercício de atividade rural nos 12 meses anteriores à situação de incapacidade.
O conceito de segurado especial é dado pelo artigo 11, inciso VII, da Lei n.º 8.213/91. A Lei n.º
11.718, de 20 de junho de 2008, estendeu ao seringueiro ou extrativista vegetal (que labore na
forma do art. 2º, caput, inciso XII da Lei n.º 9.985/200), bem como ao pescador artesanal ou a
este assemelhado a condição de segurado especial.
O §1º do artigo 11 da Lei n.º 8.213/91 define o regime de economia familiar. É possível ao
segurado especial valer-se de empregados contratados, em épocas de safra, por no máximo 120
(cento e vinte) dias, nos termos do §7º do artigo acima referido. Por outro laudo, o §8º descreve
determinadas atividades que não descaracterizam a condição de segurado especial, enquanto
que os incisos do §9º trazem um rol dos rendimentos que podem ser auferidos por membro do
grupo familiar, sem que este perca sua condição de segurado especial.
Nesse sentido, para demonstrar o labor rural admite-se a prova testemunhal, porém, é necessário
que venha acompanhada de início razoável de prova documental, conforme preceitua a Súmula
de nº 149 do STJ,: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade
rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Não se exige que a prova material se estenda por todo o período de carência, mas é
imprescindível que a prova testemunhal faça referência à época em que foi constituído o
documento. (AR 4.094/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, TERCEIRA
SEÇÃO, julgado em 26/09/2012, DJe 08/10/2012)
No caso sob exame, não houve a produção de prova documental contemporânea ao período de
carência, pois os documentos apresentados não permitiram a comprovação do exercício da
atividade rural pelo autor, na qualidade de trabalhador rural segurado especial no regime de
economia familiar, cuja produção é voltada para a subsistência do grupo familiar.
Os documentos apresentados constam do ID nº 15085e consistiram em:
- certidão de nascimento do filho do autor, datada de 21.05.03, da qual consta sua profissão de
agricultor e endereço de residência na chácara Santo Antônio;
- Ficha de associação ao Sindicado dos Trabalhadores Rurais de Ribas do Rio Pardo/MS, datada
de julho de 2006;
- Contrato de aquisição de veículo automotor datado de julho de 2004, em que o autor figura
como comprador do veículo Uno ano 1994, no valor de R$ 8.800,00 e consta como endereço
residencial a Chácara Santo Antônio;
- Diversas duplicatas relativas à compra parcelada em loja de móveis nos anos de 2004, 2005,
2006, 2007, das quais consta como endereço do autor a Chácara Santo Antônio;
- Nota Fiscal de compra de autopeça datada de maio de 2005, da qual consta como endereço do
autor a chácara Santo Antônio;
- Certificado de garantia estendida de telefone celular datado de outubro/2005;
- Extrato do Detran/MS do qual consta como endereço residencial do autor a chácara Santo
Antônio;
- Recibo de entrega de declaração de imposto de renda referente ao ano-base 2006, em que o
autor declara renda de R$ 14.400,00 e consta como endereço a Chácara Santo Antônio;
- Notas fiscais de compra de material de construção datadas de 2008, em que consta como
endereço do autor a chácara Santo Antônio;
- correspondência de cobrança de dívida de cartão de crédito junto ao Banco Bradesco,
endereçada ao autor no endereço da chácara Santo Antônio, datada de 2009;
- Notas Fiscais de balanceamento de rodas de veículo e compra de autopeças, datadas de
abril/2010, referentes ao veículo Gol de propriedade do autor, com endereço na Chácara Santo
Antônio;
- Nota fiscal de impressora multifuncional, datada de 2011, em nome do autor e com endereço na
Chácara Santo Antônio.
Os documentos apresentados não fazem prova do exercício da atividade de trabalhador rural
segurado especial pelo autor, pois se limitam a demonstrar que o autor tem residência na
Chácara Santo Antônio desde o ano de 2003, sem qualquer pertinência com o exercício de
atividade rural no período, como nota fiscal de produtor, contrato de arrendamento, comprovantes
de aquisição de implementos agrícolas, dentre outros, como exemplificativamente enumera o art.
106 da Lei de Benefícios, situação que não é alterada pela ficha de filiação a sindicato rural, pois
a declaração de exercício de atividade rural emitida por sindicato também não configura início de
prova material quando em desacordo com o artigo 106, III, da Lei nº 8.213/91, que em sua
redação original exigia, para sua validade, homologação pelo Ministério Público e após a
alteração legislativa, em 2008, passou a exigir homologação do INSS.
Assim, os documentos apresentados não constituem início de prova material apto a comprovar a
condição da parte autora de trabalhador rural segurado especial, pois não demonstram o labor
rural no período de doze meses anteriores à data do ajuizamento da ação.
Resulta que o labor rural afirmado pela autora foi comprovado unicamente pela prova
testemunhal, insuficiente para a comprovação do trabalho campesino nos termos da Súmula nº
149 do STJ, segundo a qual é necessário que a prova testemunhal venha acompanhada de início
razoável de prova documental: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação
da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação do INSS e julgo improcedente o pedido inicial.
Inverto o ônus da sucumbência e condeno a parte autora ao pagamento de honorários de
advogado que ora fixo em R$ 1.000,00 (um mil reais), de acordo com o §8º do artigo 85 do
Código de Processo Civil/2015, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe
foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo
Civil/2015.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ RURAL. QUALIDADE DE
SEGURADO ESPECIAL NÃO COMPROVADA. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. RECURSO
PROVIDO.
1. Não faz jus a parte autora à concessão de aposentadoria por invalidez rural postulada, pois
comprovado o labor rural afirmado na inicial unicamente pela prova testemunhal, insuficiente para
a comprovação do trabalho campesino nos termos da Súmula nº 149 do STJ, segundo a qual é
necessário que a prova testemunhal venha acompanhada de início razoável de prova
documental: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade
rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
2. Invertido o ônus da sucumbência e condenada a parte autora ao pagamento de honorários de
advogado fixados em R$ 1.000,00 (um mil reais), de acordo com o §8º do artigo 85 do Código de
Processo Civil/2015, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi
concedida, fica condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo
Civil/2015.
3.Apelação do INSS provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu DAR PROVIMENTO à apelação do INSS e julgar improcedente o pedido
inicial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
