
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000956-89.2021.4.03.6105
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: SIDNEI APARECIDO LUCKE
Advogado do(a) APELADO: ROGERIO MOREIRA DA SILVA - SP225095-N
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000956-89.2021.4.03.6105
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: SIDNEI APARECIDO LUCKE
Advogado do(a) APELADO: ROGERIO MOREIRA DA SILVA - SP225095-N
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R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Trata-se de ação ordinária em que se objetiva a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, mediante o reconhecimento de período(s) trabalhado(s) em atividades especiais, sua conversão em tempo comum e cômputo aos demais períodos de trabalho urbano.
A sentença julgou procedente o pedido para reconhecer como laborado(s) em atividade(s) especial(ais) o(s) período(s) de 26/01/1993 a 30/07/1994, 01/02/1995 a 31/12/2003, 01/07/2007 a 31/07/2009, 01/05/2012 a 30/04/2014 e 17/03/2015 a 20/02/2017, determinando ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a concessão da aposentadoria por tempo de serviço integral, com DIB em 17/08/2018, condenando-o, em consequência, ao pagamento das parcelas em atraso, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora, nos termos da Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal. Condenou o réu, também, ao pagamento de honorários de advogado, a ser liquidado oportunamente, no percentual mínimo previsto no inciso I, do § 3º, respeitada tal proporção, em eventual aplicação dos incisos II a V, a teor do § 5º, todos do art. 85, do Código de Processo Civil/2015, cujo percentual deverá incidir sobre a condenação calculada até a presente data. Custas na forma da lei.
Dispensado o reexame necessário, nos termos do § 3º / 4º do artigo 496 do Código de Processo Civil/2015.
Apela o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, alegando que o autor não comprovou o exercício de atividade especial, sendo insuficiente o conjunto probatório produzido. Sustenta, ainda, a ocorrência de erro material quanto ao período laborado de 26/01/1993 a 30/07/1994.
Contrarrazões pela parte apelada, requerendo a manutenção da sentença.
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000956-89.2021.4.03.6105
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: SIDNEI APARECIDO LUCKE
Advogado do(a) APELADO: ROGERIO MOREIRA DA SILVA - SP225095-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
Inicialmente acolho a alegação de erro material com relação ao intervalo de 26/01/1993 a 30/07/1994, tendo em vista que o início do vínculo se deu em 26/07/1993, conforme anotação na CTPS de ID 294384760/3.
Passo ao exame do mérito.
Aposentadoria por tempo de serviço/contribuição – requisitos
A aposentadoria por tempo de serviço, atualmente denominada aposentadoria por tempo de contribuição, admitia a forma proporcional e a integral antes do advento da Emenda Constitucional 20/98, fazendo jus à sua percepção aqueles que comprovem tempo de serviço (25 anos para a mulher e 30 anos para o homem na forma proporcional, 30 anos para a mulher e 35 anos para o homem na forma integral) desenvolvido totalmente sob a égide do ordenamento anterior, respeitando-se, assim, o direito adquirido.
Aqueles segurados que já estavam no sistema e não preencheram o requisito temporal à época da Emenda Constitucional 20 de 15 de dezembro de 1998, fazem jus à aposentadoria por tempo de serviço proporcional desde que atendam às regras de transição expressas em seu art. 9º, caso em que se conjugam o requisito etário (48 anos de idade para a mulher e 53 anos de idade para o homem) e o requisito contributivo (pedágio de 40% de contribuições faltantes para completar 25 anos, no caso da mulher e para completar 30 anos, no caso do homem).
Assim, até a edição da EC 103/2019, eram requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições (30 anos para a mulher e 35 anos para o homem), ressaltando-se que o tempo de serviço prestado anteriormente à referida Emenda equivale a tempo de contribuição, a teor do art. 4º da Emenda Constitucional 20/98.
Aposentadoria Especial
A aposentadoria por tempo de serviço especial teve assento primeiro no artigo 31 da Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960, Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS, que estabeleceu que seria concedida ao segurado que, contando no mínimo 50 (cinquenta) anos de idade e 15 (quinze) anos de contribuições, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, em serviços que, para esse efeito, fossem considerados penosos, insalubres ou perigosos, por Decreto do Poder Executivo.
Prevê ainda o artigo 162 da LOPS o reconhecimento de atividade especial prestada em data anterior à sua edição, na hipótese de seu cômputo ser mais benéfico ao segurado.
Como assentado pelas Cortes Superiores "tal hipótese, apesar de similar, não se confunde com a questão da legislação aplicável ao caso de concessão de aposentadoria, tampouco com aquela que diz respeito à possibilidade de aplicação retroativa da lei nova que estabeleça restrição ao cômputo do tempo de serviço. (...) Interpretação diversa levaria à conclusão de que o segurado, sujeito a condições insalubres de trabalho, só teria direito à aposentadoria especial após 15, 20 e 25 anos de trabalho exercida depois da Lei nº 3.807/60, desconsiderando, portanto, todo o período de labor, também exercido em tal situação, porém em data anterior à lei de regência" (Ag Rg no REsp nº 1015694, Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza Assis de Moura, DJe 01/02/2011)
Essa norma foi expressamente revogada pela Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973, que passou a discipliná-la no artigo 9º, alterando, em efeitos práticos, apenas o período de carência de 15 (quinze) anos para 5 (cinco) anos de contribuição, mantendo no mais a redação original.
Sobreveio, então, o Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, reclassificando as atividades profissionais segundo os agentes nocivos e os grupos profissionais tidos por perigosos, insalubres ou penosos, com os respectivos tempos mínimos de trabalho.
Importante ressaltar que os Decretos nºs. 53.831/64 e 83.080/79 tiveram vigências simultâneas, de modo que, conforme reiteradamente decidido pelo C. STJ, havendo colisão entre as mencionadas normas, prevalece a mais favorável ao segurado. (REsp nº 412351, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 21/10/2003, DJ 17/11/2003, pág. 355).
As atividades insalubres previstas nas aludidas normas são meramente exemplificativas, podendo outras funções ser assim reconhecidas, desde que haja similitude em relação àquelas legalmente estatuídas ou, ainda, mediante laudo técnico-pericial demonstrativo da nocividade da ocupação exercida. Nesse sentido, o verbete 198 da Súmula do TFR.
Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, a matéria passou a ser prevista no inciso II do artigo 202 e disciplinada no artigo 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação original previa que o benefício de aposentadoria especial seria devido ao segurado que, após cumprir a carência exigida, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, sujeito a condições especiais que prejudicassem a saúde ou a integridade física, restando assegurada, ainda, a conversão do período trabalhado no exercício de atividades danosas em tempo de contribuição comum (§3º).
Em seguida, foi editada a Lei nº 9.032/95, alterando o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, dispondo que a partir desse momento não basta mais o mero enquadramento da atividade exercida pelo segurado na categoria profissional considerada especial, passando a ser exigida a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, que poderá se dar por meio da apresentação de informativos e formulários, tais como o SB-40 ou o DSS-8030.
Posteriormente, com a edição do Decreto n.º 2.172, de 05/03/1997, que estabeleceu requisitos mais rigorosos para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, passou-se a exigir-se a apresentação de laudo técnico para a caracterização da condição especial da atividade exercida. Todavia, por se tratar de matéria reservada à lei, tal exigência apenas tem eficácia a partir da edição da Lei n.º 9.528, de 10/12/1997.
Cumpre observar que a Lei nº 9528/97 também passou a aceitar o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, documento que busca retratar as características de cada emprego do segurado, de forma a facilitar a futura concessão de aposentadoria especial. Assim, identificado no documento o perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, é possível a sua utilização para comprovação da atividade especial em substituição ao laudo pericial.
Ressalto que no tocante ao reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e à forma da sua demonstração, deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho, conforme jurisprudência pacificada da matéria (STJ - Pet 9.194/PR, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
Nos termos da Súmula nº 68 da TNU, “o laudo pericial não contemporâneo ao período trabalhado é apto à comprovação da atividade especial do segurado”. A extemporaneidade do documento comprobatório das condições especiais de trabalho não prejudica o seu reconhecimento como tal, "pois a situação em época remota era pior ou ao menos igual a constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica." (Des. Fed. Fausto De Sanctis, AC nº 2012.61.04.004291-4, j. 07/05/2014); “inexiste exigência legal de contemporaneidade dos documentos técnicos que comprovam o exercício de labor especial” (8ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5008647-15.2021.4.03.6119, Rel. Desembargador Federal DAVID DINIZ DANTAS, julgado em 09/08/2022, DJEN DATA: 12/08/2022).
Ruído
O Decreto nº 53.831/64 considerava insalubre o labor desempenhado com exposição permanente a ruído acima de 80 dB; já o Decreto nº 83.080/79 fixava a pressão sonora em 90 dB. Na medida em que as normas tiveram vigência simultânea, prevalece disposição mais favorável ao segurado (80 dB).
Com a edição do Decreto nº 2.172/97, a intensidade de ruído considerada para fins de reconhecimento de insalubridade foi elevada para 90 dB, mas, em 2003, essa medida foi reduzida para 85 dB, por meio do Decreto nº 4.882, de 18 de novembro de 2003.
Até 09 de outubro de 2013, os Tribunais adotavam o enunciado pela Súmula nº 32 da TNU. Contudo, esta Súmula foi cancelada em decorrência do julgamento da PET 9059 pelo Superior Tribunal de Justiça (Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJe 09/09/2013) cujo entendimento foi sufragado no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), sob a sistemática dos recursos repetitivos.
Em relação ao agente ruído, vigora o princípio do tempus regit actum. Considera-se especial a atividade desenvolvida acima do limite de 80dB até 05/03/1997, quando foi editado o Decreto nº 2.172/97, a partir de então deve-se considerar especial a atividade desenvolvida acima de 90dB até 18/11/2003, quando foi editado o Decreto nº 4882/2003. A partir de 19/11/2003 o limite passou a ser de 85 dB.
Saliente-se que a especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil profissiográfico previdenciário (a partir de 11/12/97).
É corrente em nossos tribunais a tese de que sempre se exigiu laudo técnico para comprovar a exposição do trabalhador aos agentes físicos ruído e calor em níveis superiores aos limites máximos de tolerância. Entretanto, no tocante às atividades profissionais exercidas até 10/12/97 - quando ainda não havia a exigência legal de laudo técnico -, essa afirmação deve ser compreendida, não na literalidade, mas no sentido de ser necessário o atesto efetivo e seguro dos níveis de intensidade dos agentes nocivos a que o trabalhador esteve exposto durante sua jornada laboral.
Logo, para as atividades profissionais exercidas até 10/12/97, é suficiente que os documentos apresentados façam expressa menção aos níveis de intensidade dos agentes nocivos.
A legislação de regência não exige que a nocividade do ambiente de trabalho seja aferida a partir de uma determinada metodologia. O artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91, exige que a comprovação do tempo especial seja feita por formulário, ancorado em laudo técnico elaborado por engenheiro ou médico do trabalho, o qual, portanto, pode se basear em qualquer metodologia científica. Não tendo a lei determinado que a aferição só poderia ser feita por meio de uma metodologia específica, não se pode deixar de reconhecer o labor especial pelo fato de o empregador ter utilizado uma técnica diversa daquela indicada na Instrução Normativa do INSS, pois isso representaria uma extrapolação do poder regulamentar da autarquia.
Na sessão de julgamento de 08/02/2017, sob a sistemática dos recursos especiais repetitivos (Tema 1083), o STJ estabeleceu a tese de que o exercício de atividades sob condições especiais pela exposição a ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido através do Nível de Exposição Normalizado (NEN), que indica a média ponderada de ruído. Na ausência deste, deverá ser adotado o critério de nível máximo (pico) de ruído, desde que comprovada a habitualidade e permanência da exposição, através de perícia judicial.
Contudo, acerca da habitualidade e permanência da exposição ao agente ruído, entendo aplicável à hipótese a norma prevista no artigo 375 do CPC/2015, considerando que o cotejo das provas carreadas aos autos, em especial as descrições das atividades desenvolvidas pelo segurado, permite concluir que o segurado ficava habitual e permanentemente exposto ao agente nocivo indicado nos formulários previdenciários/PPP durante a jornada de trabalho, não se fazendo necessário, portanto, a conversão do feito em diligência para a produção de laudo pericial, em observância aos princípios da celeridade e economia processuais.
Saliente-se que de acordo com o definido pelo C. STJ a informação de inserção do NEN, no PPP ou LTCAT, somente tornou-se exigível a partir da edição do Decreto 4.882/2003.
Uso de equipamento de proteção individual - EPI, como fator de descaracterização do tempo de serviço especial
A questão foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do ARE nº 664335, da relatoria do E. Ministro Luiz Fux, com reconhecimento de repercussão geral, na data de 04.12.2014, em que restou decidido que o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional ao reconhecimento das atividades especiais.
Restou assentado também que, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
O fato de a empresa fornecer equipamento de proteção individual - EPI para neutralização dos agentes agressivos não afasta, por si só, a contagem do tempo especial, pois cada caso deve ser examinado em suas peculiaridades, comprovando-se a real efetividade do aparelho e o uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça (AgInt no AREsp n. 1.889.768/MG, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 22/11/2021, DJe de 10/12/2021; REsp n. 1.800.908/RS, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 11/4/2019, DJe de 22/5/2019; REsp 1428183/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 25/02/2014, DJe 06/03/2014).
Ainda, conforme a jurisprudência citada, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído, desde que em níveis acima dos limites legais, constata-se que, apesar do uso de Equipamento de Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável, até no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas.
Agentes químicos
Considera-se especial o labor desempenhado de forma habitual e permanente com exposição a agentes químicos, conforme previsto na legislação previdenciária, entre eles:
- Hidrocarbonetos e derivados e outros tóxicos inorgânicos - no item 1.2.11 do Quadro do Decreto nº 53.831/64; nos itens 1.2.10 e 1.2.11 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79 e do Anexo IV, do Decreto nº 3.048/99;
- Poeiras minerais - no item 1.2.10 do Decreto 53.831/64, item 1.2.12 do Quadro I, do Decreto nº 83.080/79, e do Anexo IV, do Decreto nº 3.048/99;
- Fumos metálicos - no item 1.2.9 do Decreto 53.831/64;
- Agentes cancerígenos previstos no Anexo IV, do Decreto nº 3.048/99.
Consoante estabelecido no Anexo 13 da NR-15 do Ministério do Trabalho, a exposição do trabalhador a agentes químicos tem sua intensidade aferida a partir de análise qualitativa ou quantitativa.
Quanto aos agentes hidrocarbonetos e derivados e outros tóxicos inorgânicos, em que a análise é qualitativa, prescinde, portanto, de quantificação da concentração da substância para caracterização da especialidade da atividade, bastando a comprovação do contato físico com o agente nocivo durante o labor.
Neste sentido: ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5287730-33.2020.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA, julgado em 13/12/2022, Intimação via sistema DATA: 15/12/2022.
No que tange aos agentes químicos sujeitos à análise quantitativa, o reconhecimento da especialidade depende de sua quantificação, nos termos do Anexo IV da Decreto nº 3.048, de 1999.
Vale dizer que a exposição aos agentes cancerígenos prescinde de análise qualitativa ou quantitativa para configurar condição especial de trabalho, vez que a substância integra o rol de agentes cancerígenos, cujo risco potencial de agressão à saúde, impõe o reconhecimento da insalubridade (TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000745-28.2019.4.03.6136, Rel. Desembargador Federal LEILA PAIVA MORRISON, julgado em 16/12/2022, Intimação via sistema DATA: 28/12/2022).
A partir da vigência da Lei n.º 9.732/98, exigiu-se a elaboração de laudo técnico dispondo sobre a existência e utilização de tecnologia de proteção coletiva ou individual, passível de diminuir a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância.
Assim, a partir de 14/12/1998 o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição ao agente nocivo durante o labor; se o uso de EPI for capaz de neutralizar a nocividade do agente, não haverá respaldo legal à percepção da aposentadoria especial.
No julgamento do ARE 664.335/SC com repercussão geral (Relator Ministro Luiz Fux, DJe 12/2/2015), o Plenário do Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sentido de que (I) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (II) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (III) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Consoante jurisprudência desta Corte, a ausência da informação da habitualidade e permanência no PPP (Perfil Profissiográfico Previdenciário) não impede o reconhecimento da especialidade, porquanto o PPP é formulário padronizado pelo próprio INSS, a teor do § 1º do artigo 58 da Lei 8.213/91, sendo de competência da autarquia a adoção de medidas para reduzir as imprecisões no preenchimento do PPP pelo empregador; como os PPPs não apresentam campo específico para indicação de configuração de habitualidade e permanência da exposição ao agente, o ônus de provar a ausência desses requisitos é do INSS (AR 5009211-23.2018.4.03.0000, 3.ª Seção, Relator Desembargador Federal Luiz Stefanini, e-DJF3 1 7/5/2020).
Forçoso concluir, assim, que o mero preenchimento dos campos constantes do PPP e/ou a menção à utilização de EPI sem comprovação efetiva de seu fornecimento e fiscalização no uso, não tem o condão de descaracterizar a especialidade da atividade exercida sob exposição a agentes nocivos (AC n.º 0009611-62.2012.4.03.6102, Rel. Desembargador Federal Newton De Lucca, e-DJF3 Judicial 1 30/3/2020).
Não se desconhece o julgamento do Tema 298 da TNU, no qual houve a deliberação no sentido de que a indicação genérica de exposição a agentes químicos “hidrocarbonetos” e “óleos e graxas” não é suficiente para caracterizar a especialidade da atividade.
No entanto, remanesce dissenso na jurisprudência desta Corte acerca da matéria, assim, compartilho o entendimento no sentido de que “óleos e graxas” utilizados nos processos industriais são enquadrados como hidrocarbonetos derivados do petróleo, substâncias tidas, inclusive, como potencialmente cancerígenas (Portaria Interministerial MTE/MS/MPS n. 9/2014 – LINACH).
Anoto que o Anexo nº 13 da NR-15, traz como hipótese de insalubridade de grau máximo o exercício de atividade profissional com a manipulação de óleos minerais, tendo em vista a exposição a substâncias que contêm hidrocarbonetos e outros compostos de carbono, restando caracterizada a nocividade para fins de enquadramento especial.
Nesse sentido os seguintes julgados: TRF3, 9ª Turma, ApCiv – APELAÇÃO CÍVEL - 5000088-03.2020.4.03.6120, Rel. Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA, julgado em 19/04/2023, DJEN DATA: 26/04/2023; AC 5004102-82.2019.4.03.6114, Relator Desembargador Federal Toru Yamamoto, 7ª Turma, Intimação via sistema em 29/4/2022; APELREEX nº 0000858-22.2013.4.03.6122, Décima Turma, Rel. Des. Fed. Lucia Ursaia, v.u., j. 19/04/16, DJe 27/04/16.
Eletricidade
Consoante julgamento do Recurso Especial n.º 1.306.113/SC (tema 534/STJ), representativo de controvérsia, pela Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça, é possível reconhecer a especialidade de labor com exposição à tensão elétrica de 250 volts mesmo com a supressão do agente do rol do Decreto n.º 2.172/97.
Com efeito, embora a eletricidade não conste expressamente do rol de agentes nocivos previstos nos Decretos nº 2.172/97 e Decreto nº 3.048/99, sua condição especial permaneceu reconhecida pela Lei nº 7.369/85, pelo Decreto nº 93.412/86, e pela Lei nº 12.740/12.
O nível de eletricidade deve constar expressamente nos documentos comprobatórios, não sendo presumível a exposição à alta tensão, em razão da atividade de eletricista.
A ausência de comprovação do caráter permanente da exposição à eletricidade não impede o reconhecimento da atividade especial. Nesse sentido, já decidiu esta Corte Regional: "Em se tratando de exposição a altas tensões elétricas, que tem o caráter de periculosidade, a caracterização em atividade especial independe da exposição do segurado durante toda a jornada de trabalho, pois que a mínima exposição oferece potencial risco de morte ao trabalhador, justificando o enquadramento especial." (Décima Turma, APELREEX 0001107-72.2014.4.03.6110, Rel. Desembargador Federal SERGIO NASCIMENTO, julgado em 12/04/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/04/2016).
Cito, ainda, acerca desta matéria, recente precedente da Sétima Turma julgadora deste Egrégio Tribunal: “(...) 17 – No mais, importante ser dito que restou superada a questão relacionada à supressão do agente eletricidade do rol do Decreto n.º 2.172/97, nos termos do entendimento adotado no REsp nº 1.306.113/SC, representativo de controvérsia, pela Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça. 18 - Quanto ao período laborado na “IBM Brasil -Indústria de Máquinas e Serviços Ltda." de 01/03/1978 a 05/03/1997, o PPP trazido a juízo (ID 160111683, p. 7/11), com indicação dos responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, demonstra que o requerente estava exposto à tensão elétrica de 85 a 400V, o que permite o reconhecimento da especialidade, com fundamento no item 1.1.8 do Anexo do Decreto nº 53.831/64.19 - A ausência de informação, no Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, acerca da habitualidade e permanência de exposição ao agente nocivo, em nada prejudica o segurado, na medida em que tal campo específico não integra o formulário. Precedente.20 - Ademais, ressalte-se que os requisitos de "habitualidade" e "permanência" devem ser interpretados cumgranus salis. Exigir-se do trabalhador a exposição ininterrupta aos agentes agressivos, por toda a sua jornada de trabalho, ficaria restrita somente àqueles que tivessem sua saúde esmigalhada. Habitualidade pressupõe frequência, que, por sua vez, é atingida com o exercício cotidiano de determinado trabalho ou função. Portanto, o conceito de moderado ou, até mesmo, alternado não são auto-excludentes da ideia de habitualidade. A questão da permanência deve ser encarada da mesma forma. A ideia é de que a exposição seja duradoura, capaz de prejudicar a saúde do trabalhador. Mas não se exige seja ininterrupta, pois, a seguir esse raciocínio, somente faria jus à aposentadoria especial o trabalhador doente. Por esta razão, é que a situação de intermitência não afasta a especialidade do labor, desde que a exposição se dê rotineiramente, de maneira duradoura (...)” (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000675-91.2021.4.03.6119, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 03/03/2023, DJEN DATA: 09/03/2023).
Conversão do tempo de serviço especial em comum
Deve ser afastada qualquer tese de limitação temporal de conversão de tempo de serviço especial em comum, seja em períodos anteriores à vigência da Lei nº 6.887, de 10/12/1980, ou posteriores a Lei nº 9.711, de 20/11/1998, permanecendo, assim, a possibilidade legal de conversão, inclusive para períodos posteriores a maio de 1998, uma vez que a norma prevista no artigo 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91 permanece em vigor, tendo em vista que a revogação pretendida pela 15ª reedição da MP 1663 não foi mantida quando da conversão na Lei nº 9.711/98. Nesse sentido decidiu a Terceira Seção do STJ no Resp 1.151.363/MG, Relator Ministro Jorge Mussi, data do julgamento: 23/03/2011.
O Decreto nº 83.080/79 foi renovado pelo Decreto nº 3.048/99 e este, por sua vez, prevê expressamente em seu art. 70 e seguintes (na redação dada pelo Decreto nº 4.827/03), que os fatores de conversão (multiplicadores) nele especificados aplicam-se na conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum ao trabalho prestado em qualquer período.
Fonte de custeio
Quanto à alegação de necessidade de prévio custeio, cumpre ressaltar inexistir vinculação do ato de reconhecimento de tempo de atividade perigosa/nociva ao eventual pagamento de encargos tributários com alíquotas diferenciadas, eis que os artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 não demandam tal exigência, que constituiria encargo para o empregador, não podendo o empregado ser por isso prejudicado. Assim já definiu o C. STF, ao apreciar o tema em repercussão geral ARE nº 664.335/SC, Rel. Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 09/12/2014, DJE 27/03/2015.
Caso concreto - elementos probatórios
Cinge-se a controvérsia acerca da especialidade das atividades trabalhadas no(s) período(s) de 26/07/1993 a 30/07/1994, 01/02/1995 a 31/12/2003, 01/07/2007 a 31/07/2009, 01/05/2012 a 30/04/2014 e 17/03/2015 a 20/02/2017, considerando que em relação aos demais, quais sejam, de 01/11/1990 a 29/11/1991; 01/02/1992 a 07/06/1993 e de 03/08/1994 a 31/01/1995, já houve reconhecimento na esfera administrativa do INSS (ID 294384995/4).
Atividade especial
1 – 26/07/1993 a 30/07/1994
Empresa: Agrícola e Pastoril Santa Cruz S/A
Atividades/funções: auxiliar de eletricista e serviços gerais.
Agente(s) nocivo(s): eletricidade sem menção ao nível
Enquadramento legal: Código Lei nº 7.369/85, pelo Decreto nº 93.412/86, e pela Lei nº 12.740/12.
Prova(s): formulário emitido em 29/07/2003 (ID 294384984/3), juntado ao processo administrativo.
Conclusão: Não ficou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial no período elencado, vez que não expresso o nível de eletricidade ao qual o Autor estaria exposto.
2 - 01/02/1995 a 31/12/2003 (83 a 95 dB), 01/07/2007 a 31/07/2009 (81,2 dB), 01/05/2012 a 30/04/2014 (77,2 dB) e 17/03/2015 a 20/02/2017 (71,4 dB).
Empresa: Raízen Energia S/A
Atividades/funções: eletricista de veículos e mecânico manutenção automotiva
Agente(s) nocivo(s): ruído; hidrocarbonetos derivados de petróleo – benzeno, óleos e graxas.
Enquadramento legal: Código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 (acima de 80 decibéis), Decreto nº 2.172/97 (acima de 90 decibéis) e Decreto nº 4.882/03 (acima de 85 decibéis). Código 1.2.11 do Decreto nº 53.831/64 e código 1.2.10 do Decreto nº 83.080/79.
Prova(s): Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPPs emitidos em 25/05/2018 e 15/09/2014 (ID 294384984/7 e ss), juntados ao processo administrativo.
Conclusão: Ficou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial nos períodos de 01/02/1995 a 31/12/2003, 01/07/2007 a 31/07/2009, 01/05/2012 a 30/04/2014 e 17/03/2015 a 20/02/2017, em decorrência da exposição, de forma habitual e permanente, ao agente ruído acima do limite de tolerância e a agentes químicos.
Destarte, reconheço o labor em condições especiais no(s) período(s) de 01/02/1995 a 31/12/2003, 01/07/2007 a 31/07/2009, 01/05/2012 a 30/04/2014 e 17/03/2015 a 20/02/2017, sendo inviável o reconhecimento como especial(is) do(s) período(s) de 26/07/1993 a 30/07/1994.
Considerando o tempo de serviço especial reconhecido nos autos, bem como o tempo comum com registro em CTPS/constante no CNIS, verifica-se que à época da data do requerimento administrativo a parte autora já havia preenchido o tempo de serviço necessário à concessão do benefício e cumprido a carência mínima exigida pela Lei de Benefícios.
Sendo assim, verifica-se que o autor ultrapassou os 35 anos exigidos para a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço integral, nos termos do art. 201, §7º, I, da Constituição da República.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (17/08/2018), uma vez que a parte autora demonstrou que já havia preenchido os requisitos necessários à concessão do benefício desde então.
Considerando o parcial provimento do recurso, incabível a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015. Precedente do STJ (AgInt nos EREsp n. 1.539.725/DF, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Segunda Seção, julgado em 9/8/2017, DJe de 19/10/2017.)
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS para retificar o erro material apontado e não conhecer a especialidade do intervalo de 26/07/1993 a 30/07/1994, mantida a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, desde o requerimento administrativo, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS. RUÍDO. USO DE EPI. AGENTES QUÍMICOS. ELETRICIDADE. PRÉVIO CUSTEIO. IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. DIB.
1. Erro material retificado.
2. São requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições, ressaltando-se que o tempo de serviço prestado anteriormente à Emenda Constitucional 20/98 equivale a tempo de contribuição, a teor do seu art. 4º.
3. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua demonstração.
4. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário (a partir de 11/12/97).
5. Para o agente ruído, considera-se especial a atividade desenvolvida acima do limite de 80 dB até 05/03/1997, quando foi editado o Decreto nº 2.172/97, a partir de então deve-se considerar especial a atividade desenvolvida acima de 90 dB. A partir da edição do Decreto nº 4882 em 18/11/2003, o limite passou a ser de 85 dB.
6. O uso de Equipamento de Proteção Individual – EPI para o agente nocivo ruído, desde que em níveis acima dos limites legais, não descaracteriza o tempo de serviço especial.
7. Comprovada a exposição habitual e permanente a agentes químicos, possível o enquadramento no código 1.2.11 do Decreto nº 53.831/64 e no item 1.2.10 do Decreto nº 83.080/79.
8. A exposição à tensão elétrica superior a 250 volts enseja o reconhecimento do exercício do trabalho em condições especiais (Resp. nº 1.306.113/SC, Lei nº 7.369/85, Decreto nº 93.412/86 e Lei nº 12.740/12.)
9. O nível de eletricidade deve constar expressamente nos documentos comprobatórios, não sendo presumível a exposição à alta tensão, em razão da atividade de eletricista.
10. Inexiste vinculação do ato de reconhecimento de tempo de atividade perigosa/nociva ao eventual pagamento de encargos tributários com alíquotas diferenciadas, pois o empregado não pode ser por isso prejudicado.
11. O autor cumpriu o requisito temporal e a carência prevista na Lei de Benefícios, fazendo jus à aposentadoria por tempo de serviço integral, nos termos do art. 201, §7º, I, da Constituição da República.
12. DIB na data do requerimento administrativo.
13. Apelação do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS provida em parte.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
