
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001689-08.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. MARCOS MOREIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MANOEL CEZARIO CABRAL
Advogado do(a) APELADO: VALDIR SEGURA JUNIOR - SP343480-N
OUTROS PARTICIPANTES:
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001689-08.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. MARCOS MOREIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MANOEL CEZARIO CABRAL
Advogado do(a) APELADO: VALDIR SEGURA JUNIOR - SP343480-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença que julgou procedente o pedido inicial para conceder à parte autora o benefício de prestação continuada em razão da idade, a partir do requerimento administrativo ocorrido em 01/06/2021.
Determinou-se que a correção monetária de débitos previdenciários, por se tratar de obrigação alimentar e, inclusive, dívida de valor, incide a partir do vencimento de cada parcela, segundo o disposto no § 1º do art. 1º da Lei nº 6.899/81, pelo índice da SELIC (art. 3° da Emenda Constitucional 13/2021). E os juros de mora, conforme art. 1º-F, da Lei 9.494/97, incidirão até a data da expedição do precatório/RPV e a partir de então deve ser observada a Súmula Vinculante 17.
Em suas razões recursais, o INSS sustenta que a DIB seja fixada na data da intimação do laudo social, pois a situação apresentada é diversa daquela presente no momento do requerimento administrativo. Requer, ainda, a revisão quanto aos consectários legais.
Com contrarrazões.
Parecer do Ministério Público Federal pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001689-08.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. MARCOS MOREIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MANOEL CEZARIO CABRAL
Advogado do(a) APELADO: VALDIR SEGURA JUNIOR - SP343480-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A questão controversa refere-se à fixação do termo inicial do benefício de prestação continuada na data do requerimento administrativo, firmado em 01/06/2021 pela r. sentença.
A Constituição da República, no artigo 203, inciso V, prevê o benefício de amparo social no valor de um salário mínimo, nos seguintes termos:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
A Lei 8.742/1993, denominada Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), conferiu eficácia às normas constitucionais, instituindo o benefício de prestação continuada (BPC), também denominado benefício assistencial, na forma de seu artigo 20:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei 12.435/2011)
A LOAS está regulamentada pelo Decreto 6.214/2007. O artigo 20 da LOAS e o artigo 1º de seu decreto regulamentar estabelecem que são requisitos à concessão do amparo assistencial, a comprovação: (1) alternativamente, ser idoso com idade igual ou superior a 65 anos ou ser pessoa com deficiência; e (2) estar em situação de hipossuficiência econômica (miserabilidade), que se caracteriza pela ausência de condições para prover a própria subsistência ou tê-la provida pela família.
A respeito da data de início do benefício (DIB), é cediço que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que a implantação do benefício tem como termo inicial a data do requerimento administrativo.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO DEFICIENTE. TERMO INICIAL. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. ENTENDIMENTO PACÍFICO DO STJ.
1. Cuida-se de inconformismo com acórdão do Tribunal de origem que entendeu devida a concessão do benefício assistencial ao deficiente, considerando como termo inicial o requerimento administrativo.
2. É assente o entendimento do STJ no sentido de que, na existência de requerimento administrativo, este deve ser o marco inicial para o pagamento do benefício discutido, sendo irrelevante que tenha a comprovação da implementação dos requisitos se verificado apenas em âmbito judicial.
3. A propósito: "Nos termos da jurisprudência do STJ, o benefício previdenciário de cunho acidental ou o decorrente de invalidez deve ser concedido a partir do requerimento administrativo e, na sua ausência, a partir da citação. A fixação do termo a quo a partir da juntada do laudo em juízo estimula o enriquecimento ilícito do INSS, visto que o benefício é devido justamente em razão de incapacidade anterior à própria ação judicial." (REsp 1.411.921/SC, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 15/10/2013, DJe 25/10/2013). No mesmo sentido: AgInt no REsp 1.611.325/RN, Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 24/03/2017; AgInt no REsp 1.601.268/SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 30/6/2016; AgInt no REsp 1.790.912/PR, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 17/10/2019. REsp 1.731.956/PE, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 29/5/2018.
4. Recurso Especial não provido.
(REsp 1851145/SE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/02/2020, DJe 13/05/2020)
PREVIDENCIÁRIO. APLICABILIDADE DO ART. 557 DO CPC. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. TERMO INICIAL. DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO QUANDO JÁ PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
I - O presente feito decorre de ação de concessão de benefício de prestação continuada objetivando a concessão do benefício previsto no art. 203, V, da Constituição Federal de 1988, sob o fundamento de ser pessoa portadora de deficiência e não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. Na sentença, julgou-se improcedente o pedido. No Tribunal Regional Federal da 3ª Região, a sentença foi reformada.
II - Esta Corte consolidou o entendimento de que havendo requerimento administrativo, como no caso, este é o marco inicial dos efeitos financeiros do benefício assistencial. Nesse sentido: REsp n. 1610554/SP, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 18/4/2017, DJe 2/5/2017; REsp n. 1615494/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 1/9/2016, DJe 6/10/2016 e Pet n. 9.582/RS, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, julgado em 26/8/2015, DJe 16/9/2015.
III - Correta, portanto, a decisão que deu provimento ao recurso especial do Ministério Público Federal.
IV - Agravo interno improvido.
(AgInt no REsp 1662313/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/03/2019, DJe 27/03/2019)
Do Caso Concreto
A r. sentença (ID 293161754 - pp. 33/37) estabeleceu que o benefício concedido há de ser implantado desde a data do pedido administrativo, considerando este ter ocorrido em 01/06/2021.
A Autarquia Previdenciária, contudo, pleiteia que a DIB seja implantada na data da intimação do laudo social, uma vez que na DER a situação apresentada era diversa.
Consta dos autos que, por ocasião do requerimento administrativo, o grupo familiar era composto pelo autor, sua esposa e um filho (Valdemir). O extrato do CNIS comprova que o filho percebia aposentadoria por incapacidade permanente, no valor de um salário mínimo (ID 293161753, pp. 18/25).
Quando realizado o estudo socioeconômico, em 14/11/2023 (ID 293161754, pp. 7/11), constatou-se que a família era composta pelo autor, a esposa, uma filha desempregada (Maria do Nascimento) e um neto (Antony Cabral). O filho Valdemir, cadeirante e aposentado, não mais compunha o núcleo familiar.
Relatou a Assistente Social que:
(...)
Na sequência dos procedimentos, sobre sua vivência comunitária, o autor não participa, se restringe ao contexto doméstico, devido as condições de renda e dos problemas de saúde da esposa, fica com ela em tempo integral.
Ainda em suas historializações, nos disse que do casamento com Sra. Dileuza Gomes, teve quatro filhos, os três moram em outros endereços: César Nascimento, (34 anos - Trabalha em serviços gerais), Valdemir Nascimento, (32 anos cadeirante- após problemas sérios de saúde- aposentado), Tiago Gomes Cabral, (29 anos - serviços gerais em fazendas). Segundo ele, são casados, tem filhos e pessoas pobres, ajuda com a cedência da casa, onde podem cuidar de algumas vacas, plantar ramas e a criança de algumas galinhas, para a subsistência.
Sobre o apoio dos filhos, conta unicamente com a cedência da casa, os filhos são pessoas pobres, um tem sérios problemas de saúde é aposentado e cadeirante. Assim a ajuda é mínima.
Sobre a localização da moradia, se encontra em zona rural, seu entorno é atendida por alguns serviços públicos disponíveis à população local.(água encanada, luz elétrica, sem asfaltamento.
Ainda observou que o autor não possui nenhum imóvel em seu nome e nenhum bem de valor considerado.
(...)
Verifica-se, nesse contexto, que não se evidencia mudança significativa do padrão socioeconômico do grupo familiar, que à época da DER já apresentava condição de vulnerabilidade, pois os integrantes já habitavam na casa, em terreno cedido por um dos filhos do casal, em condições extremamente simples e humildes e não possuíam renda fixa capaz de arcar com as despesas declaradas.
Logo, de rigor a manutenção da sentença nesse tópico.
Dos consectários legais e honorários advocatícios
A correção monetária e os juros de mora incidirão conforme a legislação de regência, observando-se os critérios previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, que se reporta à aplicação da EC 113/2021.
Quanto aos juros, destaque-se que são devidos até a data da expedição do ofício precatório ou da requisição de pequeno valor (RPV), conforme o Tema 96/STF, firmado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 579.431, observando-se, a partir de então, o teor da Súmula Vinculante 17/STF.
A Autarquia Previdenciária é isenta do pagamento de custas e emolumentos no âmbito da Justiça Federal e nas ações processadas perante a Justiça Estadual de São Paulo, por força do artigo 4º, I, da Lei Federal 9.289/1996, e do artigo 6º da Lei Estadual paulista 11.608/2003.
A isenção, porém, não a exime do reembolso das despesas judiciais eventualmente recolhidas pela parte vencedora, desde que devidamente comprovadas nos autos, consoante o parágrafo único do referido artigo 4º da Lei 9.289/1996. Contudo, a parte vencida deverá arcar com as despesas processuais e as custas somente ao final, na forma do artigo 91 do CPC.
Com relação aos honorários advocatícios, tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da verba deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no art. 85, §§ 3º a 5º, todos do CPC; e incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão que reconheceu o direito ao benefício (Súmula 111/STJ).
Deve aplicar-se, também, a majoração dos honorários advocatícios, prevista no art. 85, § 11, do CPC, observados os critérios e percentuais estabelecidos nos §§ 2º e 3º do mesmo artigo.
Dispositivo
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS, fixando, de ofício, os consectários legais e a verba honorária, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. ASSISTENCIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. LOAS. IDADE E MISERABILIDADE CONFIGURADAS. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO (DIB). DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. RECURSO NÃO PROVIDO.
1. O benefício de prestação continuada, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição da República, consiste na "garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família" (art. 20, caput, da Lei 8.742/1993).
2. A implantação do benefício de prestação continuada tem como termo inicial a data do requerimento administrativo, conforme assentou a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.
3. Não se evidencia mudança significativa do padrão socioeconômico do grupo familiar, que à época da DER já apresentava condição de vulnerabilidade, pois os integrantes já habitavam na casa, em terreno cedido por um dos filhos do casal, em condições extremamente simples e humildes e não possuíam renda fixa capaz de arcar com as despesas declaradas.
4. Deve aplicar-se, também, a majoração dos honorários advocatícios, prevista no art. 85, § 11, do CPC, observados os critérios e percentuais estabelecidos nos §§ 2º e 3º do mesmo artigo.
5. Apelação do INSS não provida. Fixados, de ofício, os consectários legais e honorários advocatícios.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
