
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000144-61.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: FERNANDO PEREIRA
Advogado do(a) APELANTE: RENATO VIEIRA BASSI - SP118126-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000144-61.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: FERNANDO PEREIRA
Advogado do(a) APELANTE: RENATO VIEIRA BASSI - SP118126-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença ou benefício assistencial a partir da citação.
A sentença julgou improcedente o pedido, reconhecendo não ter sido comprovada a qualidade de segurado para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, ante a cessação do último vínculo laboral em 01/09/2012 e a data de início da incapacidade fixada, outubro/2013, reconhecendo ainda não ter sido comprovada a hipossuficiência econômica necessária à concessão do benefício assistencial. Condenou o autor em honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa, observada a gratuidade concedida.
Apela a parte autora, sustentando o preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez postulado, uma vez comprovado nos autos se encontrar acometido de paralisia irreversível incapacitante e cardiopatia grave, patologias previstas no art. 151 da Lei de Benefícios como hipótese de dispensa do cumprimento da carência, pugnando seja concedido o beneficio a partir do requerimento administrativo do benefício assistencial, 15/07/2013. Subsidiariamente, alega ter ocorrido a concessão administrativa do benefício assistencial a partir do ano de 2016, cabível sua concessão a partir de 15/07/2013, sob o entendimento de que o critério da renda per capita familiar não pode ser interpretado de forma absoluta, além de ter sido reconhecido pelo réu o direito do autor ao benefício. Por fim, pede a condenação do INSS em honorários advocatícios de 15% sobre o valor da condenação ou até a data do acórdão.
Sem contrarrazões.
No parecer, o Ministério Público Federal opinou pelo improvimento do recurso, por não ter sido evidenciada a situação de miserabilidade necessária à concessão do benefício assistencial, conforme laudo de estudo social apontando renda per capita superior ao limite legalmente previsto. Alega ainda o não preenchimento dos requisitos par a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000144-61.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: FERNANDO PEREIRA
Advogado do(a) APELANTE: RENATO VIEIRA BASSI - SP118126-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
É dizer: a incapacidade total e permanente para o exercício de atividade que garanta a subsistência enseja a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez; a incapacidade total e temporária para o exercício de atividade que garanta a subsistência justifica a concessão do benefício de auxílio-doença e a incapacidade parcial e temporária somente legitima a concessão do benefício de auxílio-doença se impossibilitar o exercício do labor ou da atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias pelo segurado.
A condição de segurado (obrigatório ou facultativo) decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes.
O artigo 15 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre as hipóteses de manutenção da qualidade de segurado, independentemente de contribuições; trata-se do denominado período de graça, durante o qual remanesce o direito a toda a cobertura previdenciária. Confira-se:
“Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social."
A doutrina e a jurisprudência são pacíficas no sentido de que não flui o período de graça, não perdendo a qualidade de segurado o trabalhador que deixou de contribuir para o RGPS por se encontrar impossibilitado de exercer atividades laborativas em decorrência da sua condição de saúde, e que teve seu benefício de auxílio doença ou aposentadoria por invalidez cessado indevidamente, ou ainda negada a sua concessão, quando comprovadamente se encontrava incapacitado.
No que toca à prorrogação do período de graça ao trabalhador desempregado, não obstante a redação do §2º do artigo 15 da Lei nº. 8.213/1991 mencionar a necessidade de registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social para tanto, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Interpretação de Lei Federal (Pet. 7.115), firmou entendimento no sentido de que a ausência desse registro poderá ser suprida quando outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal, se revelarem aptas a comprovar a situação de desemprego.
A perda da qualidade de segurado está disciplinada no §4º desse dispositivo legal, ocorrendo no dia seguinte ao do término do prazo para recolhimento da contribuição referente ao mês de competência imediatamente posterior ao final dos prazos para manutenção da qualidade de segurado.
Depreende-se, assim, que o segurado mantém essa qualidade por mais um mês e meio após o término do período de graça, independente de contribuição, mantendo para si e para os seus dependentes o direito aos benefícios previdenciários.
No caso dos autos:
Nascido em 01/07/1989, o autor alegou a persistência das patologias incapacidades que motivaram a concessão do benefício de auxílio-doença no período de 21/06/2013 a 23/08/2017.
A fls. 19 consta cópia da CTPS do autor com a anotação do último vínculo laboral mantido pelo autor, cessado em 01/09/2009, na função de colhedor.
Consta atestado médico datado de 30/10/2013 apontando incapacidade laboral por seqüela de AVC. A fls. 78 consta atestado datado de 04/02/2015 afirmando encontrar-se acometido de hemiplegia a direita, na condição de cadeirante, em decorrência de seqüela de AVC.
O autor apresentou requerimento administrativo de concessão de benefício assistencial em 07/06/2013, indeferido por não atender requisito de impedimento de longo prazo e por não atender exigências formuladas.
O laudo médico pericial, exame realizado em 26/05/2015 (fls. 90), constatou que o autor, então aos 25 anos de idade, apresenta quadro de paralisia de membros superior e inferior direito, com seqüela motora importante e cognitiva de acidente vascular cerebral, de natureza irreversível, com impossibilidade de deambulação e dependência de terceiros para as atividades básicas da vida diária, concluindo pela existência de incapacidade total e permanente para as atividades laborais, além de ter se submetido a cirurgia cardíaca para troca de válvulas no ano de2006, fixada a data de início da incapacidade em outubro/2013.
O conjunto probatório demonstrou que o autor não mantinha a qualidade de segurado na data de início da incapacidade estabelecida no laudo pericial, eis que transcorridos na ocasião os doze meses de período de graça desde a data da cessação do ultimo vínculo laboral.
Assim, não havendo prova da existência de incapacidade laboral total e permanente quando da perda da qualidade de segurado, em 16/11/2010, de rigor a manutenção da sentença de improcedência do pedido.
De outra parte, afigura-se incabível a concessão do benefício de amparo social postulado.
O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
Para efeito de concessão do benefício assistencial, considera-se pessoa portadora de deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo, no mínimo de dois anos, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (Lei 12.470/2011, art. 3º).
A respeito, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais editou a Súmula nº 29, que institui: "Para os efeitos do art. 20, § 2º, da Lei nº 8.742, de 1993, incapacidade para a vida independente não só é aquela que impede as atividades mais elementares da pessoa, mas também a impossibilita de prover ao próprio sustento"
No caso presente, restou demonstrada a existência de incapacidade/impedimento de longo prazo, porém não restou comprovada a hipossuficiência do autor.
Por certo que nos termos do § 1o do artigo 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).
Contudo, em que pese a princípio o irmão e a companheira não integrarem o núcleo familiar para fins de aferição de renda per capita, nos termos da legislação específica,o fato é que não se pode negar que habitando na mesma casa, concorrem com os gastos e devem participar com o seu custeio e manutenção.
Não se pode perder de vista que o artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece que o benefício é devido quando o idoso ou deficiente não puder prover o próprio sustento ou tê-lo provido pela família. Por sua vez, a regra do artigo 229 da Lei Maior dispõe que os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, premissa também assentada nos artigos 1694 a 1697 da lei Civil.
Depreende-se assim que o dever de sustento do Estado é subsidiário, não afastando a obrigação da família de prestar a assistência, pelo que o artigo 20, § 3º, da LOAS não pode ser interpretado de forma isolada na apuração da miserabilidade.
Nesse sentido, aliás, a decisão proferida pela Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU), datada de 23 de fevereiro de 2017, em sede de pedido de uniformização de jurisprudência formulado pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS nos autos do processo nº 0517397-48.2012.4.05.8300, que firmou posicionamento no sentido que "o benefício assistencial de prestação continuada pode ser indeferido se ficar demonstrado que os devedores legais podem prestar alimentos civis sem prejuízo de sua manutenção".
Dessa forma, em que pese a ausência de rendimentos do apelante no período anterior a 2016, não há nos autos elementos que permitam reconhecer a composição do grupo familiar em período anterior ao estudo social realizado nos autos e aferir a existência de miserabilidade no período do requerimento administrativo, 07/06/2013, até a concessão administrativa do benefício assistencial.
Desta forma, prevalecem nos autos as conclusões do estudo social, segundo o qual a renda per capita do grupo familiar é superior a ¼ do salário mínimo então vigente, estando as necessidades básicas da família supridas, não havendo relatos de gastos extras com medicamentos ou tratamentos médicos, não se prestando o benefício assistencial à complementação de renda.
Diante do conjunto probatório que se apresenta nos presentes autos, não restaram preenchidos os requisitos necessários à concessão do benefício, ante a ausência do requisito de miserabilidade.
Considerando o não provimento do recurso, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015, pelo que condeno a apelante, a título de sucumbência recursal, ao pagamento de honorários de advogado ao INSS, arbitrados em 2% do valor da condenação, observados os termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. AUXÍLIO-DOENÇA. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO NA DATA DE INÍCIO DA INCAPACIDADE. LOAS. MISERABILIDADE NÃO DEMONSTRADA. DEVER DE SUSTENTO DA FAMÍLIA.SUCUMÊNCIA RECURSAL
1. A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
2. O conjunto probatório não é apto a demonstrar a existência da incapacidade laboral total e permanente em momento anterior ao momento da perda da qualidade de segurado, pelo que de rigor a manutenção da sentença de improcedência do pedido.
3- A concessão do benefício assistencial (LOAS) requer o preenchimento concomitante do requisito de deficiência (ou idade) e de miserabilidade.
4- Miserabilidade não demonstrada. Depreende-se do estudo social que há possibilidade das suas necessidades básicas serem supridas pelo núcleo familiar.
5 - O artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece que o benefício é devido quando o idoso ou deficiente não puder prover o próprio sustento ou tê-lo provido pela família. O dever de sustento do Estado é subsidiário, não afastando a obrigação da família de prestar a assistência, pelo que o artigo 20, § 3º, da LOAS não pode ser interpretado de forma isolada na apuração da miserabilidade.
6 - O benefício assistencial não se presta à complementação de renda.
7. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015.
8. Apelação não provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
