
| D.E. Publicado em 21/11/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0028894-78.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Toru Yamamoto (Relator):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora em face da sentença, que julgou improcedente o pedido inicial, nos termos do artigo 269, inciso, I do Código de Processo Civil de 1973, em Ação Previdenciária na qual pleiteia o pagamento do benefício de auxílio-reclusão, cujo instituidor é Flávio Aparecido Rodrigues.
Inconformada, a apelante sustenta, em síntese, que faz jus ao benefício, tendo em vista que o detento se encontrava desempregado no momento da prisão 3 (três) meses. Assim, requer que seja conhecido e provido o presente recurso, a fim de julgar procedente o pedido inicial.
O Ministério Público Federal ofereceu parecer pelo provimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Desembargador Federal Toru Yamamoto (Relator):
A título introdutório, passo a transcrever a legislação que rege a matéria (auxílio-reclusão).
Disciplina o artigo 80 da Lei nº. 8.213, de 24 de julho de 1991:
Os dependentes, para fins de concessão de benefícios previdenciários, são aqueles elencados no artigo 16 da Lei nº. 8.213/1991, in verbis:
Compulsando os autos, verifico constar cópia dos seguintes documentos, juntados pela parte autora, quando da propositura da ação, visando comprovar o alegado:
1) Certidão de Recolhimento prisional (fls. 11);
2) Certidão de casamento da autora (fls. 12);
3) Carteira de trabalho do recluso (fls. 13/4);
4) Carteira de identidade da parte autora (fls. 18);
5) Carteira de identidade do recluso (fls.18);
6) Certidão de nascimento dos 4 filhos (fls. 22/7);
7) Requerimento administrativo junto ao INSS (fls. 35).
Portanto, os autores possuem a qualidade de dependentes do segurado-recluso comprovada por intermédio dos documentos supramencionados.
Cumpre observar que, após a edição da Emenda Constitucional nº. 20/98, o auxílio-reclusão passou a ser devido unicamente aos segurados de baixa renda (artigo 201, IV, da CF), estabelecendo o artigo 13 da EC referida que, enquanto não houvesse legislação infraconstitucional que esclarecesse quais são os segurados que se enquadrariam na definição "de baixa renda", deveriam ser assim considerados aqueles com renda bruta mensal igual ou inferior a R$ 360,00.
O Decreto nº. 3.048/1999, que aprovou o Regulamento da Previdência Social, regulamentou o artigo 80 da Lei nº. 8.213/1991 da seguinte forma:
Oportuno salientar que a renda bruta mensal máxima a que se referem os dispositivos acima mencionados é a renda do segurado preso, e não a de seus dependentes. Nesse sentido, os seguintes precedentes do Supremo Tribunal Federal:
Com relação especificamente ao valor máximo de renda bruta do recluso, cumpre esclarecer que não se manteve congelado desde então. Tem sido, na verdade, atualizado por diversas portarias do Ministério da Previdência e Assistência Social, a saber:
Verifica-se, do acima exposto, que o auxílio reclusão é devido a dependentes do segurado recluso, desde que este possua "baixa renda" ao tempo do encarceramento, nos termos acima delineados, ou então esteja desempregado ao tempo da prisão (desde que não tenha perdido a qualidade de segurado, nos termos do artigo 15, inciso II, da Lei nº. 8.213/91).
Verifica-se que ao tempo do encarceramento, ocorrido em 30.10.2013 (fls. 11), o detento Flavio Aparecido Rodrigues possuía a condição de segurado tendo em vista que trabalhou no mês de julho de 2013. Percebe-se, no entanto, que estava desempregado há 3 (três) meses, conforme CNIS de fls. 51.
O salário-de-contribuição do recluso, referente ao mês de julho de 2013, quando foi contratado, foi de 1.000,00 (mil reais), conforme cópia de sua carteira de trabalho (fls. 14) juntado aos autos, portanto, maior do que o valor, estabelecido pela Portaria nº. 15 de 01.01.2013, que estabeleceu o teto em R$ 971,78, para o período. Esclareça-se que o salário a ser considerado é o total de seus vencimentos.
A respeito da matéria ora em debate, destaco, ainda, os seguintes precedentes:
"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO LEGAL. auxílio reclusão .
Não há que se alegar que, na data da prisão, o segurado estava desempregado, de modo que faria jus ao benefício de auxílio-reclusão, nos termos do §1º do artigo 116 do Decreto 3.048/1999, independentemente de a última remuneração do segurado ter superado o limite de "baixa renda".
Tal alegação não merece prosperar.
A controvérsia travada nos autos diz respeito à melhor interpretação do disposto no §1º do artigo 116 do Decreto nº. 3.048/1999, que regulamenta o art. 80 da Lei nº. 8.213/1991 e assim dispõe:
Considero que a exegese de tal dispositivo deve levar em conta os princípios que norteiam o ordenamento jurídico brasileiro, os quais conduzem à interpretação de que o requisito constitucional da "baixa renda" não pode ser ignorado mesmo que, na data do efetivo recolhimento à prisão, não haja qualquer salário de contribuição, devendo-se levar em conta a última remuneração da qual se tiver notícia.
Ora, de acordo com o art. 80 da Lei nº. 8.213/1991, o auxílio-reclusão é concedido "nas mesmas condições da pensão por morte", a qual é calculada com base no valor da remuneração percebida pelo segurado falecido, ainda que ele estivesse desempregado à época do óbito, de modo que, para efeitos de concessão de auxílio-reclusão, a última remuneração do segurado deverá sim ser apurada e considerada, a despeito de, no momento da prisão, ele se encontrar desempregado.
A interpretação acerca do preenchimento dos requisitos para a concessão de auxílio-reclusão deve ser restritiva, considerando que este benefício se traduz em proteção social gerada pela prática de ato ilícito doloso ou culposo. Atente-se, inclusive, que, se o segurado já não estava mais trabalhando na data em que foi preso, sua família já se encontrava, em tese, desamparada e, graças à prática de um crime, seria recompensada pelo Estado por meio da concessão de benefício previdenciário. Estaria nas mãos do potencial acusado a decisão de concessão do benefício, agindo, pois, como agente provocador da "contingência" social, algo inusitado em qualquer sistema jurídico.
Como não notar a incoerência de um sistema que, em meio a tantas necessidades de assistência governamental aos menos favorecidos, prioriza prestar assistência à família do autor de um delito e não à vítima e/ou sua família? Por que razão priorizar aqueles diretamente ligados a quem justamente quebrou compromisso de pacto social?
Assim, não levar em consideração qualquer critério de remuneração para a concessão de auxílio-reclusão aos dependentes do preso desempregado é postura que se traduz em estímulo à prática ilícita, uma vez que o segurado contaria com a ajuda do Estado a seus familiares na hipótese de prisão.
Cabe ao preso arcar com o que deve à sociedade e não o contrário, daí porque a interpretação restritiva, em que pese o benefício se voltar aos familiares. Válida, nesse passo, a menção do que propugna o jurista Sérgio Pinto Martins em sua obra Direito da Seguridade Social, referindo-se ao benefício de auxílio-reclusão:
"Na verdade, vem a ser um benefício de contingência provocada, razão pela qual não deveria ser pago, pois o preso dá causa, com seu ato, em estar nessa condição. Logo, não deveria a Previdência Social ter de pagar tal benefício. Lembre-se que, se o acidente do trabalho é provocado pelo trabalhador, este não faz jus ao benefício. O mesmo deveria ocorrer aqui" (MARTINS, Sérgio Pinto, Direito da Seguridade Social, 24ª Edição, São Paulo, Editora Atlas, 2007, Pág. 394).
Além disso, nos termos do artigo 245 da Constituição Federal, a lei disporá sobre as hipóteses e condições em que o Poder Público dará assistência aos herdeiros e dependentes carentes de pessoas vitimadas por crime doloso, sem prejuízo da responsabilidade civil do autor do ilícito. Porém, de concreto, o Estado nada fez nesse sentido, privilegiando o pagamento de benefícios diversos, desvirtuando a utilização de seus recursos, que são escassos e limitados, sem qualquer justificativa para esse injustificável desequilíbrio.
Portanto, mesmo que o segurado se encontre desempregado, em período de graça, deverá ser considerado como parâmetro para a concessão ou não do auxílio-reclusão o seu último salário-de-contribuição. Caso este seja maior que o valor estabelecido pela Portaria, o segurado desempregado não fará jus ao benefício.
Inclusive, é isto o que estabelece o art. 334, §2º, inc. II, da Instrução Normativa INSS/PRES nº 45 de 06 de agosto de 2010, in verbis:
(...)
(...)
Por fim, saliento que não se poderia falar que foi afastada a incidência das normas previstas nos artigos 80 da Lei nº. 8.213/1991 e 116, §1º, do Decreto nº. 3.048/1999, isto é, que teria havido, supostamente, ofensa ao disposto na Súmula Vinculante nº 10, do STF.
O teor da Súmula Vinculante 10 (STF) é:
A esse respeito, consigno que não caracteriza ofensa à reserva de plenário a interpretação dispensada por órgão fracionário de Tribunal a dispositivos de lei que, mediante legítimo processo hermenêutico, têm sua aplicação limitada a determinadas hipóteses.
Trata-se de técnica denominada pela doutrina como "interpretação conforme à Constituição", a qual se limita ao exercício hermenêutico, distinguindo-se, portanto, do que se denomina "declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto", em que há efetivo juízo de desvalor da norma.
Nas palavras do Professor Doutor José Levi Mello do Amaral Júnior, "a interpretação conforme à Constituição, por ser técnica hermenêutica que visa à preservação do texto inquinado, pode (e deve) ser procedida por todo e qualquer juízo, monocrático ou colegiado, não necessitando, nesse último caso, de provocação do Plenário"(José Levi Mello do Amaral Júnior; Da necessária distinção entre a interpretação conforme a Constituição e a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto;
http://www.ufrgs.br/ppgd/doutrina/amaralj1.htm).
No caso em questão, fez-se uma interpretação à luz de princípios de status constitucional que orientam as regras da Seguridade Social, tais como o da seletividade e distributividade na prestação de benefícios e serviços (inteligência do art. 194, III, da CF), chegando-se à conclusão de que o objetivo da lei não é amparar a família de preso cuja última remuneração extrapolou o limite de baixa renda, a despeito deste se encontrar desempregado na data da prisão.
Portanto, em nenhum momento se declarou a inconstitucionalidade, ou mesmo se afastou a incidência, de quaisquer dos dispositivos supracitados, mas apenas se interpretou que, no caso concreto, os aludidos dispositivos, embora vigentes e válidos, deveriam ter sua aplicação limitada em face do princípio da seletividade e distributividade na prestação de benefícios e serviços (inteligência do art. 194, III, da CF), com o qual convivem harmonicamente no ordenamento jurídico.
Conforme já se expôs, sendo impossível ao Estado resguardar todas as contingências que causam necessidades (princípio da universalidade), ante a insuficiência de recursos financeiros, é papel do aplicador da lei, mediante processo interpretativo, selecionar (princípio da seletividade) as contingências sociais que melhor se amoldam à previsão legal de concessão do auxílio-reclusão, dentre as quais não está a situação em que o segurado, embora desempregado na data da prisão, percebia remuneração superior ao limite estipulado pelo ordenamento como "baixa renda".
Nesse sentido, confira-se o seguinte julgado:
É o voto.
TORU YAMAMOTO
Desembargador Federal
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