
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5075899-98.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. MARCOS MOREIRA
APELANTE: MARILZA DOS SANTOS DIAS
Advogado do(a) APELANTE: EDNEI MARCOS ROCHA DE MORAIS - SP149014-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5075899-98.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. MARCOS MOREIRA
APELANTE: MARILZA DOS SANTOS DIAS
Advogado do(a) APELANTE: EDNEI MARCOS ROCHA DE MORAIS - SP149014-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou improcedente o pedido inicial em demanda ajuizada para concessão de aposentadoria por incapacidade permanente, ou, alternativamente, de auxílio-doença, em face a falta de qualidade de segurada.
Em suas razões recursais, a parte autora alega que a data fixada como início da incapacidade (24/01/2021) foi estabelecida de forma equivocada, prejudicando sua qualidade de segurada, pois já apresentava incapacidade permanente desde o pedido administrativo de concessão do benefício junto ao INSS, conforme os laudos médicos anexados aos autos. Afirma ainda que, ao contrário do que atesta o laudo pericial que constatou incapacidade total e temporária, sua incapacidade é permanente, pois não possui condições de exercer suas atividades habituais, fazendo jus ao benefício de aposentadoria por incapacidade permanente (invalidez).
Sem contrarrazões de recurso, subiram os autos a esta Corte Regional.
É o relatório.
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5075899-98.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. MARCOS MOREIRA
APELANTE: MARILZA DOS SANTOS DIAS
Advogado do(a) APELANTE: EDNEI MARCOS ROCHA DE MORAIS - SP149014-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Prefacialmente, necessário abordar o tema dos benefícios previdenciários por incapacidade para o trabalho.
A redação original do artigo 201, I, da Constituição Federal estabelecia que os regimes de previdência abrangeriam a cobertura de eventos como invalidez e doença, entre outros. Com a Emenda Constitucional 103, de 13 de novembro de 2019, o texto constitucional adotou uma nova terminologia para designar os eventos cobertos pela previdência, referindo-se às contingências de incapacidade permanente ou temporária, anteriormente denominadas invalidez ou doença, conforme a nova redação do artigo 201, I, da CF:
Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019) I - cobertura dos eventos de incapacidade temporária ou permanente para o trabalho e idade avançada; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019).
Observando o princípio tempus regit actum, a concessão dos benefícios por incapacidade deve seguir os requisitos previstos na legislação vigente à época.
A aposentadoria por incapacidade permanente está prevista nos artigos 42 a 47 da Lei 8.213/1991 (Lei de Benefícios da Previdência Social – LBPS), bem como nos artigos 43 a 50 do Decreto 3.048, de 6 de maio de 1999 (Regulamento da Previdência Social – RPS), com suas alterações, sempre em conformidade com as mudanças trazidas pela EC 103/2019. Por oportuno, confira-se o caput do artigo 42 da LBPS:
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
O respectivo benefício de aposentadoria é destinado aos segurados da Previdência Social cuja incapacidade para o trabalho seja considerada permanente e sem possibilidade de recuperação da capacidade laboral, ou de reabilitação para o exercício de atividades que assegurem sua subsistência.
Embora a aposentadoria por incapacidade permanente não tenha caráter vitalício, o benefício torna-se definitivo quando, após não ser constatada a possibilidade de reabilitação profissional, o segurado é dispensado de realizar perícias médicas periódicas. Essa situação ocorre quando o segurado: I) completa 55 (cinquenta e cinco) anos de idade e tenham decorridos 15 (quinze) anos de gozo da aposentadoria por incapacidade e/ou auxílio por incapacidade provisória; ou II) implementa os 60 (sessenta) anos de idade, conforme preceitua o artigo 101, I e II, da LBPS, com as alterações da Lei 13.457/2017.
Por sua vez, o auxílio por incapacidade temporária (auxílio-doença) está previsto nos artigos 59 a 63 da LBPS e sua regulamentação disposta nos artigos 71 a 80 do RPS, sendo que a premissa básica para concessão se encontra no caput do artigo 59 da LBPS:
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando foro caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalhou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
O benefício é destinado aos segurados da Previdência Social que estejam temporariamente incapacitados para o trabalho ou sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, em razão de doença, acidente de qualquer natureza ou por prescrição médica, desde que constatada a possibilidade de reabilitação para o exercício de atividade que lhes garanta a subsistência.
Por sua natureza temporária, o auxílio por incapacidade temporária (auxílio-doença) pode, posteriormente, ser: (I) transformado em aposentadoria por incapacidade permanente (aposentadoria por invalidez), caso se constate incapacidade total e permanente; (II) convertido em auxílio-acidente, se houver comprovação de sequela permanente que reduza a capacidade laboral; ou (III) cessado, em razão da recuperação da capacidade laboral com retorno ao trabalho, ou devido à reabilitação profissional.
Assim, superadas as distinções assinaladas, analisam-se os requisitos para a concessão do benefício por incapacidade (aúxilio acidênte ou aposentadoria por invalidez), sendo basicamente três: 1) a qualidade de segurado; 2) o cumprimento da carência, quando aplicável; e 3) a comprovação da incapacidade laborativa.
O primeiro requisito é a qualidade de segurado, conforme o artigo 11 da LBPS, cuja manutenção tem como fundamento principal o pagamento de contribuições ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS). Dessa forma, considerando o caráter contributivo da Previdência Social, a qualidade de segurado será mantida mediante a regular contribuição. No entanto, a LBPS prevê uma exceção expressa por meio do denominado período de graça, que consiste no intervalo em que, mesmo sem o recolhimento de contribuições, o indivíduo mantém a condição de segurado, conforme as situações previstas no artigo 15 da mesma lei. Vejamos:
Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.
No que se refere ao trabalhador rural, não há necessidade de recolhimento de contribuições, bastando a comprovação do efetivo exercício da atividade rural pelo número de meses correspondentes à carência do benefício requerido, conforme disposto no artigo 39, I, e no artigo 25, I, da Lei 8.213/91.
Ademais, na hipótese de perda da qualidade de segurado, o art. 27-A da Lei 8.213/91 dispõe que, para a obtenção do benefício, o trabalhador “deverá contar, a partir da data da nova filiação à Previdência Social, com metade dos períodos previstos nos incisos I, III e IV do caput do art. 25 desta Lei."
O segundo requisito (carência) para a obtenção de benefícios por incapacidade, como regra geral, exige a comprovação do pagamento de 12 (doze) contribuições mensais, conforme o artigo 25 da LBPS. A carência é definida como o "número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário tenha direito ao benefício, contadas a partir do primeiro dia dos meses de suas competências", conforme o caput do artigo 24 da LBPS.
Entretanto, necessário mencionar, existem hipóteses previstas em que a concessão do benefício independe de carência, como nos casos de acidente de qualquer natureza ou causa, doença profissional ou do trabalho, bem como para o segurado que, após filiar-se ao RGPS, for acometido por doenças listadas nos artigos 26, inciso II, e 151 da LBPS.
No que diz respeito ao terceiro requisito para a obtenção da aposentadoria, que é a incapacidade para o trabalho, esta deve ser permanente e irreversível, sem possibilidade de recuperação ou reabilitação para outra atividade que assegure a subsistência (aposentadoria por invalidez). Já para o auxílio por incapacidade temporária (auxílio-doença), a incapacidade deve persistir por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
Ressalta-se que, para a avaliação da incapacidade, é necessário demonstrar que, no momento da filiação ao RGPS, o segurado não era portador da enfermidade, exceto quando a incapacidade for resultante da progressão ou agravamento da doença ou lesão, conforme estabelecido nos artigos 42, § 2º, e 59, § 1º, da LBPS:
Art. 42. (...) § 2º A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão. (...)
Art. 59. (...) § 1º Não será devido o auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, exceto quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão. (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019).
A identificação de incapacidade, seja total ou parcial, é feita por meio de perícia médica conduzida por perito designado pelo Juízo, conforme estabelecido no Código de Processo Civil. No entanto, importante ressaltar, o juiz não está restrito apenas às conclusões da perícia, podendo considerar outros elementos presentes nos autos para formar sua convicção, como aspectos pessoais, sociais e profissionais do segurado.
Oportuno registrar alguns enunciados da Turma Nacional de Uniformização (TNU) que tratam desse assunto:
Súmula 47 da TNU: Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez.
Súmula 53 da TNU: Não há direito a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a incapacidade para o trabalho é preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de Previdência Social.
Súmula 77 da TNU: O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual.
É possível extrair do artigo 43, § 1º, da LBPS, que a concessão da aposentadoria por invalidez depende da comprovação de incapacidade total e permanente para o trabalho, por meio de exame médico-pericial realizado pela Previdência Social. A jurisprudência consolidou o entendimento de que a incapacidade parcial e permanente para o trabalho também dá direito ao benefício, desde que comprovada por perícia médica, que impossibilite o segurado de exercer sua ocupação habitual e inviabilize sua readaptação. Esse entendimento reflete o princípio da universalidade da cobertura e do atendimento da Seguridade Social.
A respeito da data de início do benefício (DIB), é cediço que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que a implantação do benefício tem como termo inicial a data do requerimento administrativo. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO DEFICIENTE. TERMO INICIAL. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. ENTENDIMENTO PACÍFICO DO STJ.
1. Cuida-se de inconformismo com acórdão do Tribunal de origem que entendeu devida a concessão do benefício assistencial ao deficiente, considerando como termo inicial o requerimento administrativo.
2. É assente o entendimento do STJ no sentido de que, na existência de requerimento administrativo, este deve ser o marco inicial para o pagamento do benefício discutido, sendo irrelevante que tenha a comprovação da implementação dos requisitos se verificado apenas em âmbito judicial.
3. A propósito: "Nos termos da jurisprudência do STJ, o benefício previdenciário de cunho acidental ou o decorrente de invalidez deve ser concedido a partir do requerimento administrativo e, na sua ausência, a partir da citação. A fixação do termo a quo a partir da juntada do laudo em juízo estimula o enriquecimento ilícito do INSS, visto que o benefício é devido justamente em razão de incapacidade anterior à própria ação judicial." (REsp 1.411.921/SC, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 15/10/2013, DJe 25/10/2013). No mesmo sentido: AgInt no REsp 1.611.325/RN, Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 24/03/2017; AgInt no REsp 1.601.268/SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 30/6/2016; AgInt no REsp 1.790.912/PR, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 17/10/2019. REsp 1.731.956/PE, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 29/5/2018.
4. Recurso Especial não provido.
(REsp 1851145/SE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/02/2020, DJe 13/05/2020)
PREVIDENCIÁRIO. APLICABILIDADE DO ART. 557 DO CPC. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. TERMO INICIAL. DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO QUANDO JÁ PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
I - O presente feito decorre de ação de concessão de benefício de prestação continuada objetivando a concessão do benefício previsto no art. 203, V, da Constituição Federal de 1988, sob o fundamento de ser pessoa portadora de deficiência e não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. Na sentença, julgou-se improcedente o pedido. No Tribunal Regional Federal da 3ª Região, a sentença foi reformada.
II - Esta Corte consolidou o entendimento de que havendo requerimento administrativo, como no caso, este é o marco inicial dos efeitos financeiros do benefício assistencial. Nesse sentido: REsp n. 1610554/SP, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 18/4/2017, DJe 2/5/2017; REsp n. 1615494/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 1/9/2016, DJe 6/10/2016 e Pet n. 9.582/RS, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, julgado em 26/8/2015, DJe 16/9/2015.
III - Correta, portanto, a decisão que deu provimento ao recurso especial do Ministério Público Federal.
IV - Agravo interno improvido.
(AgInt no REsp 1662313/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/03/2019, DJe 27/03/2019)
Entretanto, observa-se que cada caso deve ser analisado conforme sua particularidade, atentando-se para a necessidade de ajuste quanto à fixação da data de início do benefício (DIB). Na ausência de um pedido administrativo, seja ele novo ou um primeiro pedido, deve-se considerar a data de citação da autarquia como referência para a concessão do benefício. Vejamos:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE INCAPACIDADE PERMANENTE. CONCESSÃO EM SEDE RECURSAL. REQUISITOS LEGAIS PRESENTES. AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO NA DATA DE INÍCIO DA INCAPACIDADE. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. CITAÇÃO DO INSS. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. HIPÓTESES DO ARTIGO 1.022 DO CPC. ERRO MATERIAL, OMISSÃO, CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE. NÃO CONFIGURAÇÃO. REDISCUSSÃO DO MÉRITO DO ACÓRDÃO EMBARGADO. INADMISSIBILIDADE.
- Os embargos de declaração são cabíveis para esclarecer obscuridade, eliminar contradição, corrigir erro material ou suprir omissão de ponto ou questão sobre a qual o magistrado não se manifestou de ofício ou a requerimento das partes, nos termos do artigo 1.022 do Código de Processo Civil (CPC).
- O referido recurso não tem por mister reformar o julgado, porquanto o seu escopo precípuo é dissipar contradições e obscuridades, tendo em vista que a atribuição de eventuais efeitos infringentes, quando cabível, é excepcional.
- No caso em tela, não se apresentam os pressupostos legais para acolhimento dos embargos opostos, porquanto não há ponto omisso, obscuro ou contraditório no julgado, do qual exsurge o exame das controvérsias apresentadas pelas partes, mediante a aplicação da disciplina normativa incidente à hipótese dos autos.
- À luz da jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça, "os benefícios de incapacidade têm por data de início do benefício (DIB) o requerimento administrativo ou, na ausência deste, a citação do INSS". Tal compreensão está consolidada no Tema 626/STJ, segundo o qual “a citação válida informa o litígio, constitui em mora a autarquia previdenciária federal e deve ser considerada como termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida na via judicial quando ausente a prévia postulação administrativa” (REsp n. 1.369.165/SP, relator Ministro Benedito Gonçalves, DJe de 7/3/2014). De acordo com o verbete da Súmula 576/STJ, “ausente requerimento administrativo no INSS, o termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida judicialmente será a data da citação válida”, (j. 22/06/2016, DJe 27/06/2016).
- No caso em análise, ainda que o INSS, em seu apelo, tenha requerido que os efeitos financeiros da condenação à concessão do benefício de incapacidade temporária incidissem a partir do ajuizamento da demanda, com reforma da r. sentença, concedeu-se à parte autora benefício diverso, qual seja, aposentadoria por incapacidade permanente, cujo termo inicial não está vinculado à benesse concedida pela r. sentença e que foi objeto de impugnação pela Autarquia Previdenciária.
- Inexistindo requerimento administrativo formulado à época do início da incapacidade, consoante o entendimento sufragado pela Colenda Corte Superior, o benefício de aposentadoria por incapacidade permanente deve ser concedido a partir da data da citação do INSS.
- As alegações recursais denotam o intuito de rediscussão do mérito, diante do inconformismo com o resultado do julgamento, o que não se amolda às hipóteses que autorizam o cabimento dos embargos de declaração.
- Ainda, o propósito de prequestionamento da matéria tampouco autoriza o acolhimento do recurso, por ausência dos vícios previstos no artigo 1.022 do CPC.
- Embargos de declaração opostos pela parte autora rejeitados.
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5002287-48.2022.4.03.6113, Rel. Desembargador Federal LEILA PAIVA MORRISON, julgado em 12/06/2024, DJEN DATA: 17/06/2024)
PREVIDENCIÁRIO. REEXAME NECESSÁRIO. AGRAVO RETIDO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ARTIGOS 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E 20 DA LEI N.º 8.742/93. PESSOA IDOSA. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA COMPROVADA. BENEFÍCIO DEVIDO. TERMO INCIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. JUROS DE MORA.
1. Considerado o valor do benefício, o termo estabelecido para o seu início e o lapso temporal que se registra de referido termo até a data da sentença, não se legitima o reexame necessário, uma vez que o valor da condenação não excede o limite de 60 (sessenta) salários mínimos, estabelecido pelo § 2º do artigo 475 do Código de Processo Civil, acrescido pela Lei nº 10.352/2001.
2. O prévio requerimento administrativo não é condição para a propositura de ação previdenciária, especialmente em se tratando de pretensão que não tem encontrado acolhida na esfera administrativa. Prevalência do princípio do amplo acesso ao Poder judiciário, estabelecido no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal.
3. Sendo o INSS responsável pela operacionalização dos benefícios de prestação continuada, é parte legítima para figurar no pólo passivo da presente demanda, já tendo, inclusive, sido superada a divergência jurisprudencial a respeito do tema no julgamento, pela Terceira Seção do egrégio Superior Tribunal de Justiça, dos embargos de divergência no Recurso Especial nº 204.998/SP.
4. Preenchido o requisito idade, bem como comprovada a ausência de meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, é devida a concessão do benefício assistencial de que tratam o art. 203, inciso V, da Constituição Federal e a Lei nº 8.742/93.
5. A Lei nº 10.741/2003, além de reduzir o requisito idade para a concessão do benefício assistencial, dispôs no parágrafo único do artigo 34 que "O benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do caput não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a Loas". A lei outra coisa não fez senão deixar claro, em outras palavras, que o benefício mensal de um salário mínimo, recebido por qualquer membro da família, como única fonte de recursos, não afasta a condição de miserabilidade do núcleo familiar, em cuja situação se justifica a concessão de amparo social a outro membro da família que cumpra o requisito idade. Seria de indiscutível contra-senso se entender que o benefício mensal de um salário mínimo, na forma da LOAS, recebido por um membro da família, não impede a concessão de igual benefício a outro membro, ao passo que a concessão de aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, nas mesmas condições, seria obstáculo à concessão de benefício assistencial. Se é de miserabilidade a situação da família com renda de um salário mínimo, consistente em benefício disciplinado pela LOAS, também o é pelo Regime Geral da Previdência Social quando o benefício recebido por um membro da família se restringir ao mínimo legal, pois a aferição da hipossuficiência é eminentemente de cunho econômico. Vai-se mais longe ainda. A renda familiar de um salário mínimo, percebida por um membro da família, independentemente da origem da receita, não poderá ser impedimento para que outro membro, cumprindo os demais requisitos exigidos pela Lei nº 8.742/93, aufira o benefício assistencial, pois a condição econômica para a sobrevivência é exatamente igual àquela situação de que trata o parágrafo único do artigo 34 da Lei nº 10.741/2003. Sob este prisma, ainda que tratando especificamente do idoso, a regra não pode deixar de ser aplicada no caso do "incapaz para a vida independente e para o trabalho", porquanto economicamente não se pode dizer que se defronta com situações distintas. Na hipótese, o fato de o marido da requerente receber benefício previdenciário no valor de um salário mínimo não obsta a concessão do "amparo social" à Autora, como visto.
6. À míngua de comprovação de protocolização de requerimento administrativo de prestação continuada, o benefício deverá ser computado a partir da data da citação do INSS, pois desde então o Instituto foi constituído em mora, nos termos do artigo 219 do Código de Processo Civil.
7. Honorários advocatícios mantidos em 15% (quinze por cento), incidindo, entretanto, sobre o valor das prestações devidas entre o termo inicial do benefício e a data da sentença, em consonância com a orientação firmada pelo Superior Tribunal de Justiça.
8. Os juros moratórios incidirão à base de 6% (seis por cento) ao ano, de forma decrescente, desde a data da citação até 10/01/2003 (art. 1062 do Código Civil de 1916), e à razão de 1% ao mês, a partir de 11/01/2003, nos termos do artigo 406 do novo Código Civil, combinado com o artigo 161, parágrafo 1.º, do Código Tributário Nacional. Os juros de mora têm incidência até a data da expedição do precatório, desde que este seja pago no prazo estabelecido pelo artigo 100 da Constituição Federal (STF; RE nº 298.616/SP).
9. Reexame necessário não conhecido. Agravo retido do INSS improvido. Apelação do INSS parcialmente provida.
(TRF 3ª Região, DÉCIMA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 920549 - 0008033-91.2004.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JEDIAEL GALVÃO, julgado em 19/10/2004, DJU DATA:08/11/2004 PÁGINA: 676)
Essa compreensão está consolidada no Tema 626 do STJ, segundo o qual “a citação válida informa o litígio, constitui em mora a autarquia previdenciária federal e deve ser considerada como termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida na via judicial, quando ausente a prévia postulação administrativa” (REsp n. 1.369.165/SP, relator Ministro Benedito Gonçalves, DJe de 7/3/2014).
Por fim, conforme dispõe a Súmula 576 do STJ, “ausente requerimento administrativo no INSS, o termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida judicialmente será a data da citação válida” (j. 22/06/2016, DJe 27/06/2016).
Do caso concreto
No caso vertente, a apelante, ex-faxineira, atualmente desempregada, em tese devido a sua condição de saúde, realizou pedido de auxílio-doença em 30.01.2018, o qual restou indeferido (ID 265882395 - fl. 7), porém argumenta que seu estado apresenta limitação funcional e dificuldade para exercer sua profissão ou qualquer outra, acarretando incapacidade total e permanente. Assim, busca a concessão de aposentadoria por invalidez, ou, subsidiariamente, o benefício do auxílio-doença.
A fim de se analisar o real quadro de saúde da parte, o Juízo a quo designou realização de perícia médica, ocasião em que o perito apresentou, em especial, as seguintes conclusões (ID 265882363 - destacamos):
(...)
a) Queixa que o(a) periciando apresenta no ato da perícia. A periciada refere que apresenta problema com bebida há tempos. Refere que está internada desde janeiro de 2021. Nega ter outros problemas de saúde. Nega ter dores pelo corpo, nas articulações.
(...)
f) Doença/moléstia ou lesão torna o(a) periciado(a) incapacitado(a) para o exercício do último trabalho ou atividade habitual? Justifique a resposta, descrevendo os elementos nos quais se baseou a conclusão.
Sim. A periciada está internada para recuperação de alcoolismo.
g) Sendo positiva a resposta ao quesito anterior, a incapacidade do(a) periciado(a) é de natureza permanente ou temporária? Parcial ou total?
Há incapacidade total temporária.
h) Data provável do início da(s) doença/lesão/moléstia(s) que acomete(m)
o(a) periciado(a).
não posso precisar.
i) Data provável de início da incapacidade identificada. Justifique.
24/1/2021 (folha 141)
j) Incapacidade remonta à data de início da(s) doença/moléstia(s) ou decorre de progressão ou agravamento dessa patologia? Justifique.
progressão
k) É possível afirmar se havia incapacidade entre a data de indeferimento ou da cessação do benefício administrativo e a data da realização da perícia judicial? Se positivo, justificar apontando os elementos para esta conclusão.
Não
(...)
n) Qual ou quais são os exames clínicos, laudos ou elementos considerados para o presente ato médico pericial?
Geral – Bom estado geral, corada, hidratada, eupneica e acianótica. Ausculta cardíaca e pulmonar sem alterações.
(...)
p) É possível estimar qual tempo e o eventual tratamento necessário para que o(a) periciado(a) se recupere e tenha condições de voltar a exercer seu trabalho ou atividade habitual (data de cessação da incapacidade)?
Estimo que 6 meses a contar de hoje
(...)
5. CONCLUSÃO: Há incapacidade total temporária.
Cabe destacar que, ao responder a um dos quesitos formulados, o perito declarou que a data de início da incapacidade da autora seria 20/01/2021, período em que iniciou o internamento para tratamento contra o alcoolismo.
Posteriormente, a autora impugnou o laudo pericial (ID 265882369), especificamente em relação à fixação da data de início da incapacidade, solicitando a devida consideração dos documentos médicos anexados à inicial, que comprovam a presença das respectivas doenças desde a data do pedido administrativo. Contudo, o perito foi inconclusivo, ao afirmar que (ID 265882395): "Não, a data foi colocada porque foi quando se internou, não foi a data do diagnóstico".
É importante destacar que o simples fato de a pessoa ser acometida por uma doença não a torna, automaticamente, incapaz de exercer atividades laborativas.
Em consulta ao CNIS (ID 265882409), verifica-se que a autora continuou trabalhando após o referido pedido administrativo ao INSS até março de 2019, prejudicando a suposição de que ela se encontrava incapaz de exercer suas atividades habituais.
Dessa forma, não sendo possível determinar com clareza a data exata em que a autora se tornou incapaz, seja total ou temporariamente, e não havendo documentação suficiente para retroagir à data de sua incapacidade ao menos para o momento do pedido administrativo, deve-se adotar, conforme já definido pelo juízo a quo, a data de 24/01/2021 como marco do surgimento da inaptidão provisória para o trabalho e da verificação da qualidade de segurada. Isso implica reafirmar que, nessa data, a autora já não possuía mais o requisito de segurada, conforme o art. 15, § 1º, da Lei 8.213/91, visto que não foi comprovado o cumprimento das 120 contribuições necessárias para a manutenção do período de graça (ID 265882409). Por essa razão, a sentença recorrida deve ser mantida.
Por fim, constatada a ausência de qualidade de segurada da autora, requisito fundamental para eventual concessão de benefício por incapacidade, seja ele por incapacidade total e permanente, ou temporária, desnecessária a avaliação de qual seria aplicável no presente caso.
Ante o exposto, nego provimento à apelação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. BENEFÍCIOS POR INCAPACIDADE. ARTIGOS 42 A 47 E 59 A 63 DA LEI 8.213/91. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. RECURSO NÃO PROVIDO.
1. O auxílio por incapacidade temporária está previsto nos artigos 59 a 63 da Lei 8.213/1991 e é destinado aos segurados da Previdência Social que estejam temporariamente incapacitados para o trabalho ou para sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, seja por doença, acidente de qualquer natureza ou por prescrição médica, desde que constatada a possibilidade de reabilitação para o exercício de atividade que lhes assegure a subsistência.
2. A concessão da aposentadoria por incapacidade total e permanente (aposentadoria por invalidez), regulamentada pelo artigo 43, § 1º, da Lei 8.213/1991, depende da comprovação de incapacidade total e definitiva para o trabalho, por meio de exame médico-pericial a cargo da Previdência Social.
3. A condição de segurado (obrigatório ou facultativo) resulta da inscrição no regime de previdência pública, combinada com o pagamento das contribuições correspondentes. Alternativamente, essa condição pode ser mantida mesmo sem o recolhimento de contribuições, durante o chamado "período de graça", previsto no art. 15 da Lei 8.213/91.
4. Dada a impossibilidade de alteração da data estabelecida como início da incapacidade, o histórico contributivo permite concluir que a autora já não possuía a qualidade de segurada em 24/01/2021, motivo pelo qual a r. sentença deve ser confirmada.
5. Apelação da parte autora desprovida.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
