Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0003593-08.2011.4.03.6119
Relator(a)
Desembargador Federal RENATA ANDRADE LOTUFO
Órgão Julgador
2ª Turma
Data do Julgamento
03/07/2024
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 09/07/2024
Ementa
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REGRESSIVA. INSS. ACIDENTE DE TRABALHO. ARTS. 120 E 121
DA LEI N. 8.213/91. CULPA DA VÍTIMA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. NEGLIGÊNCIA DA
EMPRESA APELADA. SENTENÇA REFORMADA.
-Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS) em
face de sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Federal de Guarulhos/SP que julgou
parcialmente procedente o pedido formulado em ação de regresso ajuizada pelo apelante,
objetivando o ressarcimento por despesas advindas do pagamento de auxílio-doença decorrente
de acidente de trabalho ocorrido nas dependências da empresa apelada.
- O ajuizamento da ação regressiva é dever do INSS decorrente da previsão do art. 120 da Lei n.
8.213/1991 nas hipóteses de: i) negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do
trabalho indicadas para a proteção individual e coletiva; e ii) violência doméstica e familiar contra
a mulher, nos termos da Lei n. 11.340/2006. Anote-se que esta última circunstância decorre da
inovação trazida pela Lei n. 13.846/2019.
- A indenização correspondente ao direito de regresso do INSS será devida pelo empregador ou
tomador de serviço quando se demonstrar nos autos a negligência do empregador, da qual tenha
decorrido, diretamente, o acidente.
- Ajuizada a ação, a prova do mencionado nexo de causalidade dar-se-á na forma do art. 373 do
Código de Processo Civil, cabendo ao INSS a produção de provas quanto ao fato constitutivo de
seu direito e à parte ré a comprovação de eventual culpa exclusiva ou concorrente de seu
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
empregado, vítima do acidente, ou de outra hipótese de exclusão de sua responsabilidade.
- O regular recolhimento de SAT ou FAP/RAT pelo empregador não o exime do dever de
indenizar, nas hipóteses legalmente previstas. Precedentes do STJ.
- A constitucionalidade do art. 120 da Lei nº 8.213/91 já foi reconhecida por este E. TRF-3ª
Região.
- Não há provas nos autos de que a vítima tenha sido corretamente informada sobre os
procedimentos de segurança que deveriam ser observados nas dependências da empresa, não
se devendo presumir que tenha sido comunicada sobre o risco de se posicionar entre o caminhão
e o local de descarregamento dos tubos de aço.
- Configurada a conduta negligente da apelada com o depósito inadequado de tubos de aço no
chão do galpão da empresa através do uso de caibros de madeira, os quais não impediram o
indevido deslocamento do material.
- Condenação da apelada ao ressarcimento da integralidade dos valores despendidos pela
autarquia federal com o pagamento do benefício previdenciário de auxílio-doença,com aplicação
da taxa Selic, -queabrange juros moratórios e correção monetária-, a partir do evento danoso
(Súmula 54/STJ), qual seja, o desembolso das prestações correspondentes ao benefício de
auxílio-doença acidentário.
- Apelação provida
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0003593-08.2011.4.03.6119
RELATOR:Gab. 42 - DES. FED. RENATA LOTUFO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: ALESSANDER JANNUCCI - SP183511-A
APELADO: LAMINACAO SATELITE LTDA
Advogado do(a) APELADO: GILMAR NOVELINI - SP75391
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região2ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0003593-08.2011.4.03.6119
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Advogado do(a) APELADO: GILMAR NOVELINI - SP75391
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Exma. Senhora Desembargadora Federal Renata Lotufo (Relatora):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS) em
face de sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Federal de Guarulhos que, com fundamento
no art. 269, inciso I do CPC/73, julgou parcialmente procedente pedido formulado em ação de
regresso ajuizada pela autarquia federal em face de LAMINAÇÃO SATÉLITE LTDA, objetivando
o ressarcimento por despesas advindas do pagamento de auxílio-doença (NB 31/530.124.769-
3) ao segurado Antônio Carlos de Souza no período compreendido entre 06/06/2008 à
12/05/2009, em razão de acidente do trabalho ocorrido nas dependências da ré, ora apelada (ID
94382444 - pp. 148/160).
A sentença reconheceu a sucumbênciarecíproca, condenando cada parte ao pagamento de
honorários advocatícios dispendidos com seu patrono.
Em suas razões recursais, o INSS alega a culpa exclusiva da apelada. Aduz, que diversamente
do entendido pela sentença recorrida, não há que se presumir que a vítima conhecia as rotinas
e os riscos da atividade, porque já havia prestado serviço em outras ocasiões à empresa.
Ressalta que é provável que as informações acerca do risco da atividade, bem como quais
medidas de segurança que deveria adotar nunca tenham sido informadas ao segurado
acidentado. Destaca que a pilha de aço não foi estabilizada. Aponta que o segurado atingido
pelo tubo de aço não havia sido alertado sobre a zona de risco e sobre o procedimento de
trabalho adequado. Salienta que apesar da vítima não ser empregado da empresa, deveria ter
sido avisada sobre qualquer perigo decorrente da atividade empresarial. Aponta que se o local
de trabalho se cuidasse de ambiente seguro, existissem condições adequadas de
armazenamento do material e treinamento adequado do operador de ponte rolante, o acidente
jamais teria acontecido. Pugna pela provimento da apelação, condenando-se a empresa
apelada ao pagamento da integralidade do benefício de auxílio-doença e condenação em
honorários advocatícios em percentual arbitrado, nos termos do art. 20,§3º do CPC/73, bem
como custas e outros ônus de sucumbência (ID 94382444 - pp. 164/173).
Com contrarrazões de LAMINAÇÃO SATÉLITE LTDA. Alega a inconstitucionalidade do art. 120
da Lei nº 8.213/91, ressaltando que as empresas já são obrigadas a pagar a contribuições
sociais para o financiamento da seguridade social. Aponta conduta imprudente da vítima, ao se
posicionar em local de manifesto risco. Requer a manutenção da sentença apelada (ID
94382444 - pp. 176/179).
Subiram os autos a esta E. Corte.
É o relatório.
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OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Exma. Senhora Desembargadora Federal Renata Lotufo (Relatora):
Diante da assunção do acervo correspondente ao presente recurso em 13.04.2023 (ATO PRES
n. 4733, de 13.04.2023), procedo à sua análise, considerando a data da respectiva interposição,
ocorrida em 19.11.2014.
O caso em apreço cuida-se de ação regressiva ajuizada pelo INSTITUTO NACIONAL DO
SEGURO SOCIAL (INSS) em face de LAMINAÇÃO SATÉLITE LTDA., objetivando o
ressarcimento do erário em razão do pagamento do benefício previdenciário de auxílio-doença
(NB 31/ 530.124.769-3) ao segurado Antônio Carlos de Souza no período compreendido entre
06/06/2008 à 12/05/2009, em razão de acidente do trabalho ocorrido em 25/04/2008 no pátio do
galpão industrial da empresa ré.
Narra a autarquia federal que o segurado desempenhava a atividade de transportador
autônomo, enquadrando-se na condição de contribuinte individual.
Relata que o trabalhador acidentado foi vítima das condições inseguras de trabalho presentes
na demandada, a qual havia adquirido uma carga de tubos de aço da empresa Impacto Ferro e
Aço.
Esclarece que a referida fornecedora contratou os serviços de frete de Antônio Carlos de
Souza, com a finalidade de entregar a mercadoria à LAMINAÇÃO SATÉLITE.
Aponta que a fatalidade aconteceu no momento de descarregamento da carga devido à culpa
da parte ré, ora apelada, a qual descumpriu normas de segurança do trabalho indicadas para
proteção individual e coletiva do trabalho.
Destaca que o segurado ao estacionar o seu caminhão na empresa esperou que os
empregados da LAMINAÇÃO SATÉLITE efetuassem a descarga dos tubos de aço.
Aduz que essa tarefa é realizada por duas pessoas, com o emprego de ponte rolante, a qual é
controlada por um dos obreiros da sociedade empresária demandada.
Acrescenta que os tubos de aço foram empilhados de maneira insegura, em ponto próximo ao
caminhão e que "Em determinado momento, o segurado acidentado deslocou-se até a parte
traseira do caminhão, a fim de recolher as cintas do caminhão, pois faltavam apenas dois tubos
de aço a serem descarregados. Nesse momento, o operador da ponte rolante descarregou um
dos últimos tubos de aço na pilha, porém em razão das condições inapropriadas de
empilhamento um tubo de aço que se encontrava na pilha rolou e atingiu o pé esquerdo do
segurado. Seu membro foi amputado."
Afirma que o montante dispendido com o pagamento do benefício previdenciário correspondia a
quantia de R$ 6.601,14.
- Da ação regressiva ajuizada pelo INSS:
Cumpre esclarecer que o ajuizamento da ação regressiva é dever do INSS decorrente da
previsão do art. 120 da Lei n. 8.213/1991 nas hipóteses de: i) negligência quanto às normas
padrão de segurança e higiene do trabalho indicadas para a proteção individual e coletiva; e ii)
violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da Lei n. 11.340/2006. Anote-se que
esta última circunstância decorre da inovação trazida pela Lei n. 13.846/2019.
O contexto legislativo apontado decorre da previsão do art. 7º da Constituição da República,
que prevê aos trabalhadores urbanos e rurais os direitos à redução dos riscos inerentes ao
trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (inciso XXII) e ao seguro contra
acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está
obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa (inciso XXVIII).
Sob tal prisma, a jurisprudência desta Corte tem interpretado o aludido art. 120 da Lei n.
8.213/1991 na perspectiva do art. 945 do Código Civil, o qual estabelece que a culpa
concorrente da vítima será levada em consideração na condenação do autor do dano à
correspondente indenização. Assim, na hipótese de restar demonstrado nos autos que o
empregado tenha concorrido para o evento danoso, tem-se determinado que o custeio do
benefício decorrente do acidente seja suportado pelo INSS em conjunto com o empregador ou
tomador de serviço (in TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000954-
64.2017.4.03.6104, Rel. Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO, julgado em
14/07/2022, DJEN DATA: 20/07/2022; e TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL -
5001141-42.2017.4.03.6114, Rel. Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM
GUIMARAES, julgado em 12/11/2020, Intimação via sistema DATA: 20/11/2020).
De tal modo, depreende-se que a indenização correspondente ao direito de regresso será
devida pelo empregador ou tomador de serviço quando se demonstrar nos autos a negligência
do empregador, da qual tenha decorrido, diretamente, o acidente.
Outrossim, ajuizada a ação, a prova do mencionado nexo de causalidade dar-se-á na forma do
art. 373 do Código de Processo Civil, cabendo ao INSS a produção de provas quanto ao fato
constitutivo de seu direito e à parte ré a comprovação de eventual culpa exclusiva ou
concorrente de seu empregado, vítima do acidente, ou de outra hipótese de exclusão de sua
responsabilidade.
Insta frisar, também, que o regular recolhimento de SAT ou FAP/RAT pelo empregador, não o
exime do dever de indenizar nas hipóteses legalmente previstas. No mesmo sentido, registrem-
se os seguintes precedentes do Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO
ESPECIAL. AÇÃO DE REGRESSO. ACIDENTE DE TRABALHO. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022
DO CPC/2015. NÃO OCORRÊNCIA. DENUNCIAÇÃO DA LIDE. REJEIÇÃO DO PEDIDO.
ANÁLISE CONTRATUAL. SÚMULA 5/STJ. CULPA DO EMPREGADOR. ALTERAÇÃO DO
JULGADO. INVIABILIDADE. REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ.
CONTRIBUIÇÃO PARA O SAT QUE NÃO EXIME O EMPREGADOR DA CULPA. ACÓRDÃO
EM CONSONÂNCIA COM A ORIENTAÇÃO DO STJ. AGRAVO INTERNO DE CSE MECÂNICA
E INSTRUMENTAÇÃO LTDA A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. O Tribunal a quo dirimiu, fundamentadamente, as questões que lhe foram submetidas no
recurso de apelação, de modo que o não acolhimento da tese da agravante não se confunde
com omissão, obscuridade ou contradição do julgado.
2. A Corte de origem, soberana na análise do acervo fático-probatório dos autos, concluiu pela
comprovação da negligência das empresas, de forma solidária, quanto às normas de segurança
e higiene no ambiente de trabalho, tendo em vista que ambas contribuíram para o acidente que
vitimara o empregado. Assim, não há como afastar o óbice da Súmula 7/STJ ao conhecimento
do recurso especial, uma vez que o entendimento firmado pela Corte regional encontra-se
amparado nos fatos e provas contidos nos autos.
3. Quanto à alegada necessidade de denunciação da lide à empresa SKANSKA DO BRASIL
LTDA, a decisão agravada explicitou, de forma clara, a inviabilidade de acolhimento da
pretensão recursal, tendo em vista o fato de que o Tribunal de origem rejeitara a tese da
empresa agravante com base nos termos do contrato juntado aos autos.
Assim, incide na hipótese o óbice da Súmula 5/STJ.
4. Por fim, o acórdão regional está em consonância com o entendimento do STJ de que o
recolhimento do Seguro de Acidente do Trabalho (SAT) não impede a cobrança pelo INSS, por
intermédio de ação regressiva, dos benefícios pagos ao segurado nos casos de acidente do
trabalho decorrentes de culpa da empresa por inobservância das normas de segurança e
higiene do trabalho.
Incidência da Súmula 83/STJ.
5. Agravo interno de CSE MECÂNICA E INSTRUMENTAÇÃO LTDA a que se nega provimento.
(AgInt no AREsp n. 1.604.767/RJ, relator Ministro Manoel Erhardt (Desembargador Convocado
do TRF5), Primeira Turma, julgado em 6/6/2022, DJe de 8/6/2022)
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO EM AGRAVO EM RECURSO
ESPECIAL. INDEFERIMENTO DE PROVA PERICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA.
INEXISTÊNCIA. JULGAMENTO EXTRA OU ULTRA PETITA NÃO CARACTERIZADO.
INTERPRETAÇÃO LÓGICO-SISTEMÁTICA. AÇÃO REGRESSIVA DO INSS CONTRA O
EMPREGADOR. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. PRESCRIÇÃO. CULPA DA EMPRESA
RECONHECIDA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM.
1. Entendendo o Tribunal que a prova acostada aos autos seria suficiente para proporcionar ao
julgador os elementos necessários à análise do caso, essa conclusão somente poderia ser
afastada mediante novo exame do acervo probatório, o que se revela defeso no âmbito de
recurso especial ante o óbice da Súmula n. 7/STJ.
2. Não estando restrito apenas ao que está expresso no capítulo referente aos pedidos, é
permitido ao Tribunal extrair da interpretação lógico-sistemática da peça inicial aquilo que se
pretende obter com a demanda, o que se verifica no caso.
3. Em relação ao prazo prescricional, como exposto na decisão agravada, o acórdão está de
acordo com o entendimento desta Corte de que a prescrição quinquenal é igualmente aplicável
às ações de regresso acidentárias propostas pelo INSS.
4. Esta Corte firmou entendimento de que a contribuição para o SAT não exime o empregador
da responsabilização por culpa em acidente de trabalho, conforme o art. 120 da Lei n.
8.213/1991, estando o acórdão em consonância com o decidido por este Superior Tribunal.
5. Agravo interno a que se nega provimento.
(AgInt no AREsp n. 2.054.226/RJ, relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em
22/8/2022, DJe de 29/8/2022.)
Outrossim, anote-se que esta E. Corte já decidiu em diversas oportunidades pela
constitucionalidade do artigo 120 da lei nº 8.213/91.
DIREITO PRIVADO. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO REGRESSIVA. ARTIGOS 120 E 121
DA LEI Nº 8.213/91. NEGLIGÊNCIA DA EMPRESA COMPROVADA.
I - Quando houver o pagamento de benefício previdenciário decorrente de acidente laboral
causado pelo descumprimento das normas de saúde e segurança do trabalho, cabe ao INSS o
ajuizamento de ação regressiva acidentária, devendo a empresa responsável ser compelida a
reembolsar a autarquia previdenciária pelos valores correspondentes ao benefício
previdenciário implantado. Constitucionalidade dos artigos 120 e 121 da Lei nº 8.213 /1991.
Precedentes.
II - Hipótese em que restou comprovado que a empresa ré não agiu com a diligência e
precaução necessárias, podendo-se concluir que sua negligência deve ser tida como causa
necessária e suficiente para configuração de responsabilidade integral, nos termos do artigo
120 da Lei nº 8.213/91.
III – Agravo retido não conhecido. Recurso e remessa oficial parcialmente providos.
(TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0006175-57.2010.4.03.6105, Rel.
Desembargador Federal GISELLE DE AMARO E FRANCA, julgado em 01/06/2023, Intimação
via sistema DATA: 05/06/2023)
“Inexiste a apontada inconstitucionalidade do art. 120, da Lei nº 8.213/91, eis que a Emenda
Constitucional nº 41/2003 acrescentou o parágrafo 10º ao art. 201: "§ 10º. Lei disciplinará a
cobertura do risco de acidente do trabalho, a ser atendida concorrentemente pelo regime geral
de previdência social e pelo setor privado."
(TRF3, AC n° 00006165-13.2010.4.03.6105. Rel. Des. Fed. José Lunardelli. Primeira Turma, e-
DJF3: 13/06/2014).
2- Não merece prosperar a alegação de inconstitucionalidade do art. 120, da Lei nº 8.213/91.
3- A Emenda Constitucional nº 41/2003 acrescentou o parágrafo 10º ao art. 201, o qual assim
dispõe, in verbis: "§ 10º. Lei disciplinará a cobertura do risco de acidente do trabalho, a ser
atendida concorrentemente pelo regime geral de previdência social e pelo setor privado.".
(TRF3, AC n° 00003064-38.2005.4.03.6106. Rel. Des. Fed. José Lunardelli. Primeira Turma, e-
DJF3: 04/07/2013).
Feito um breve relatório, passo a análise do caso concreto.
A autarquia federal irresignada com a r. sentença de primeira instância, que julgou parcialmente
procedente a demanda formulada em ação de regresso, apela, pugnando pela reforma da
decisão.
Assiste razão ao INSS, devendo a sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Federal de
Guarulhos ser reformada para afastar a culpa da vítima no sinistro trabalhista.
Compulsando os autos e analisando o conjunto probatório produzido no presente feito verifico
que não ficou comprovada a conduta imprudente ou negligente do segurado.
Convém frisar que a apelada possui a obrigação de fornecer instruções específicas aos seus
empregados ou prestadores de serviço sobre as medidas de segurança que devem ser
seguidas nas suas dependências no sentido de evitar a prática de atos inseguros e, por
conseguinte, acidentes laborais, sobretudo, considerando o risco inerente a atividade
desenvolvida na empresa ao utilizar produtos feitos de aço, como trilhos de trem ou correntes
de navio como matéria-prima para fabricar vergalhões de aço.
Em que pese existir informação de que Antônio Carlos de Souza (vítima) já tenha realizado
entregas de materiais no galpão da LAMINAÇÃO SATÉLITE em outras ocasiões, diversamente
do Juízo recorrido, consigno inexistir provas de que a vítima tenha sido comunicada ou
advertida sobre o perigo de se posicionar entre o caminhão e o local de descarregamento dos
tubos de aço.
Depreende-se do autos que a única orientação passada aos condutores de veículos é de
aguardarem do lado de fora do automóvel até a retirada da carga do caminhão (ID 94382444 -
p. 48).
Outrossim, tampouco foi demonstrado ter havido informação expressa à vítima de que não
deveria circular naquela área, não podendo se presumir que conhecia toda a rotina da empresa
e os riscos inerentes a atividade desenvolvida no galpão da apelada.
Dessa forma deve ser afastada a culpa da vítima na ocorrência do acidente detrabalho, uma
vez que não foi comprovado que tinha ciência que se posicionava em local inseguro ou que
tenha sido advertida acerca dos procedimentos de segurança a serem observados no interior
da empresa.
De outro lado, no que diz respeito à conduta negligente da LAMINAÇÃO SATÉLITE LTDA
destaco que restou devidamente demonstrada nos autos. Nesse aspecto, sublinhe-se que
Análise de Acidente do Trabalho elaborada pelos Auditores Fiscais do Trabalho, pontuou as
seguintes causas para a ocorrência do acidente laboral (ID 94382444 - pp.51/52).
1 - Estocagem de material de maneira insegura e perigosa, especialmente, com o uso de
"caibros de madeirapara calçar apenas a camada de tubos em contato com o solo", pois tal
material não foi suficiente para garantir que os cabos de aço se deslocassem e atingissem o
corpo do segurado. Enfatizou-se que a pilha de tubos de aço não estava separada e apoiada
por estrutura apropriada, com a finalidade de evitar o atrito e movimentação do material;
2 - Modo operatório inadequado a segurança através do posicionamento do motorista entre o
caminhão e a pilha de tubos de aço durante o descarregamento do produto;
3 - Falha na antecipação e detecção de risco, pois os trabalhadores ou a vítima não se deram
conta do risco que esta corria ao se colocar entre o veículo e a pilha de tubos;
4 - Circulação de informações de forma deficiente, já que os empregados da demandada tinham
ordem verbal no sentido de não adentrar a área de descarregamento, enquanto o motorista, o
qual não era empregado da empresa, não havia sido alertado do risco de circular nesta área,
pois "se pressupunha que tal vedação já deveria ser do conhecimento da vítima, uma vez que a
mesma já havia prestado serviço semelhante no interior da empresa anteriormente".
5 - Ausência de isolamento ou outra medida para impedir que qualquer pessoa se posicionasse
na área de descarregamento durante a realização dessa operação.
6 - Tolerância da empresa com o descumprimento de normas de segurança, ao não exercer
vigilância ou tomar providência efetiva no sentido de coibir que a vítima permanecesse na área
de descarregamento;
7 - Procedimento de trabalho inexistentes ou inadequados;
8 - "Fracasso na tentativa de reconduzir a atividade para seu curso rotineiro na ocorrência de
uma variação incidental, que ultrapassa a variabilidade normal da tarefa";
9 - Falha no transporte de materiais, pois a manipulação em um dos tubos da pilha facilitou a
queda de outro;
10 - Falta de treinamento do funcionário João Queiroz à época da fatalidade para operar a
ponte rolante; e
11 - Convocação de trabalhador no gozo de suas férias para executar tarefa.
Da análise do relatório elaborado pelos Auditores Fiscais do Trabalho não há dúvidas que o
depósito inadequado dos tubos de aço no chão do pátio da apelada foi a causa necessária e
indispensável para a ocorrência do acidente de trabalho.
Frise-se que ao serem descarregados do veículo responsável pelo seu transporte, são
acumulados no chão do depósito, próximo ao caminhão, sendo utilizado tijolos ou caibros de
madeira para evitar o deslocamento do material.
Nesse sentido, a prova documental elaborada, especialmente, Análise de Acidente do Trabalho
realizada pelo Ministério do Trabalho demonstrou que a pilha de tubos de aço não estava
estocada e separada por meio de material adequado, não sendo "calçadas por estruturas de
madeira apropriadas, com largura suficiente, para evitar atritos entre eles e eventual
movimentação." (ID 94382444 - p. 51).
Além disso, cumpre salientar que inexistia qualquer barreira física ou placa de advertência que
tivesse como objetivo impedir a aproximação de qualquer pessoa junto a área de
descarregamento no momento de execução dessa operação.
No mais, verificou-se que o empregado João Queiroz, operador da ponte rolante, não possuía
habilitação para o operar o equipamento, tendo o treinamento ocorrido alguns meses após o
acidente (ID 94382444 - p. 52).
Vale lembrar que diante das irregularidades apuradas pela inspeção do Ministério do Trabalho
foram lavrados Autos de Infração diante da violação do art. 157, inciso I e art. 129, ambos da
CLT e itens 11.3.5,11.1.5 da Norma Regulamentadora nº 11.
No que diz respeito à inobservância da NR-11, verificou-se que a sociedade empresária
apelada desobedeceu os requisitos de segurança especiais de armazenamento, bem como
deixou de submeter operador de equipamento de transporte com força motriz a treinamento
específico (ID 94382444 - p. 52).
Com efeito, conclui-se que a empresa apelada atuou de forma negligente em garantir ambiente
laboral seguro, sendo responsável direta pela ocorrência do acidente de trabalho que
vitimousegurado da previdência social.
Cumpre lembrar que a procedência de ação regressiva pressupõe a ocorrência de acidente do
trabalho sofrido por segurado, nexo causal, a concessão de benefício previdenciário e a
constatação de negligência quanto ao cumprimento ou fiscalização das normas de saúde e
segurança do trabalho.
Na hipótese dos autos, verifica-se que em decorrência do sinistro laboral foi implementado o
benefício de auxílio-doença (NB 31/530.124.769-3) em razão de acidente do trabalho, que
vitimou Antônio Carlos de Souza.
A prova produzida demonstrou conduta negligente da empresa apelante na prevenção de
acidentes, nexo de causalidade entre a conduta e o evento acidentário e prejuízo a fazenda
pública.
Diante disso, verifico que restou configurado o dever da parte ré em ressarcir o erário pelo
pagamento do benefício devido em razão de sinistro trabalhista, não havendo que se falar em
ausência dos requisitos ensejadores da responsabilidade civil.
Nos termos do art. 20, §3º do CPC/73 em atenção especialmente ao grau de zelo profissional,
natureza da causa e trabalho realizado pelo advogado, fixo os honorários sucumbenciais em
10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação do INSS, para condenar LAMINAÇÃO
SATÉLITE LTDAao ressarcimento da integralidade dos valores despendidos pela autarquia
federal relativos ao benefício previdenciário de auxílio-doença (NB 31/530.124.769-3), com
aplicação da taxa Selic, -que abrange juros moratórios e correção monetária-, a partir do evento
danoso (Súmula 54/STJ), qual seja, o desembolso das prestações correspondentes ao
benefício de auxílio-doença acidentário.
É como voto.
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REGRESSIVA. INSS. ACIDENTE DE TRABALHO. ARTS. 120 E
121 DA LEI N. 8.213/91. CULPA DA VÍTIMA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. NEGLIGÊNCIA
DA EMPRESA APELADA. SENTENÇA REFORMADA.
-Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS)
em face de sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Federal de Guarulhos/SP que julgou
parcialmente procedente o pedido formulado em ação de regresso ajuizada pelo apelante,
objetivando o ressarcimento por despesas advindas do pagamento de auxílio-doença
decorrente de acidente de trabalho ocorrido nas dependências da empresa apelada.
- O ajuizamento da ação regressiva é dever do INSS decorrente da previsão do art. 120 da Lei
n. 8.213/1991 nas hipóteses de: i) negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene
do trabalho indicadas para a proteção individual e coletiva; e ii) violência doméstica e familiar
contra a mulher, nos termos da Lei n. 11.340/2006. Anote-se que esta última circunstância
decorre da inovação trazida pela Lei n. 13.846/2019.
- A indenização correspondente ao direito de regresso do INSS será devida pelo empregador ou
tomador de serviço quando se demonstrar nos autos a negligência do empregador, da qual
tenha decorrido, diretamente, o acidente.
- Ajuizada a ação, a prova do mencionado nexo de causalidade dar-se-á na forma do art. 373
do Código de Processo Civil, cabendo ao INSS a produção de provas quanto ao fato
constitutivo de seu direito e à parte ré a comprovação de eventual culpa exclusiva ou
concorrente de seu empregado, vítima do acidente, ou de outra hipótese de exclusão de sua
responsabilidade.
- O regular recolhimento de SAT ou FAP/RAT pelo empregador não o exime do dever de
indenizar, nas hipóteses legalmente previstas. Precedentes do STJ.
- A constitucionalidade do art. 120 da Lei nº 8.213/91 já foi reconhecida por este E. TRF-3ª
Região.
- Não há provas nos autos de que a vítima tenha sido corretamente informada sobre os
procedimentos de segurança que deveriam ser observados nas dependências da empresa, não
se devendo presumir que tenha sido comunicada sobre o risco de se posicionar entre o
caminhão e o local de descarregamento dos tubos de aço.
- Configurada a conduta negligente da apelada com o depósito inadequado de tubos de aço no
chão do galpão da empresa através do uso de caibros de madeira, os quais não impediram o
indevido deslocamento do material.
- Condenação da apelada ao ressarcimento da integralidade dos valores despendidos pela
autarquia federal com o pagamento do benefício previdenciário de auxílio-doença,com
aplicação da taxa Selic, -queabrange juros moratórios e correção monetária-, a partir do evento
danoso (Súmula 54/STJ), qual seja, o desembolso das prestações correspondentes ao
benefício de auxílio-doença acidentário.
- Apelação provida ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma
decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação do INSS, para condenar LAMINAÇÃO
SATÉLITE LTDA ao ressarcimento da integralidade dos valores despendidos pela autarquia
federal relativos ao benefício previdenciário de auxílio-doença (NB 31/530.124.769-3), com
aplicação da taxa Selic, -que abrange juros moratórios e correção monetária-, a partir do evento
danoso (Súmula 54/STJ), qual seja, o desembolso das prestações correspondentes ao
benefício de auxílio-doença acidentário, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
