
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5078908-34.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 49 - DES. FED. ERIK GRAMSTRUP
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANA PATRICIO DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELADO: DARIO SERGIO RODRIGUES DA SILVA - SP163807-N
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5078908-34.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 49 - DES. FED. ERIK GRAMSTRUP
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANA PATRICIO DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELADO: DARIO SERGIO RODRIGUES DA SILVA - SP163807-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ERIK GRAMSTRUP (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação ajuizada por ANA PATRICIO DE OLIVEIRA, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.
A r. sentença (ID 283934113) julgou procedente o pedido e condenou o INSS à concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, a partir da data do requerimento administrativo 27/09/2021 (ID 283934079), acrescidas as parcelas em atraso de correção monetária e juros de mora na forma prevista pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal. Honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença (Súmula 111/STJ). Concedida tutela antecipada.
Em razões recursais de ID 283934121, o INSS requer o recebimento do apelo em seu duplo efeito e pugna pela reforma da sentença, ao argumento de que restou descaracterizada a condição de segurada especial da autora ante o recebimento de outro benefício previdenciário em valor superior a um salário mínimo, conforme vedação do art. 11, VII, §9º da Lei 8213/91.
A parte autora apresentou contrarrazões (ID 283934127).
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5078908-34.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 49 - DES. FED. ERIK GRAMSTRUP
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANA PATRICIO DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELADO: DARIO SERGIO RODRIGUES DA SILVA - SP163807-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ERIK GRAMSTRUP (RELATOR):
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
Inicialmente, considerando a ausência de efeito suspensivo dos recursos (caput do art. 995, do CPC), bem como que a suspensão ou manutenção da tutela antecipada é matéria intrínseca ao pedido, tenho que a análise de seus requisitos será efetuada juntamente com o mérito das questões trazidas a debate pelo recurso de apelação.
DA APOSENTADORIA RURAL POR IDADE
Estabelece a Constituição Federal, em seu art. 201, §7º, II, que:
“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a:
(...)
§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, para os trabalhadores rurais e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal.”
No mesmo sentido, dispõe a Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991, em seu art. 48, § 1º, que o benefício da aposentadoria por idade dos trabalhadores rurais é devido ao segurado que completar 60 (sessenta) anos de idade, se homem, ou 55 (cinquenta e cinco) anos, se mulher.
O artigo 142 do mesmo diploma legal, por sua vez, traz em seu bojo a tabela relativa à carência, considerando-se o ano em que o rurícola implementou todas as condições necessárias à concessão da benesse.
Já a regra transitória contida no art. 143, com redação determinada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995, estabelece que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
Vale dizer, ainda, que houve a prorrogação do termo final do prazo para 31.12.2010, conforme o disposto no art. 2º, caput e parágrafo único da Lei n.º 11.718/2008, sendo aplicada a mencionada disposição aos trabalhadores rurais inseridos na categoria de contribuintes individuais que prestam labor de natureza campesina a um ou mais empregadores, ainda que sem relação de emprego.
Por fim, a EC nº 103/2019 dispõe que para os trabalhadores rurais, estão mantidos o tempo de contribuição de 15 anos e as idades mínimas de aposentadoria de 55 anos para as mulheres e 60 anos para os homens.
CARÊNCIA
No tocante ao cumprimento do requisito da carência, observa-se que, após 31.12.2010, além da idade mínima necessária, será preciso o implemento da carência de 180 meses, a teor do que dispõe o artigo 25, inciso II, da Lei n.º 8.213/1991.
A fim de se assegurar esta transição ao sistema contributivo, o legislador possibilitou ao empregado rural e contribuinte individual, na concessão da aposentadoria por idade, para efeito de carência, que cada mês comprovado de emprego, de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, seja multiplicado por 3, limitado a 12 dentro do mesmo ano e no período de janeiro de 2016 a dezembro de 2020, que cada mês de emprego seja multiplicado por 2, limitado a 12 meses dentro do mesmo ano.
Desta feita, para os rurícolas, o desempenho do labor campesino será computado para efeito de carência nos moldes do art. 143 da Lei de Benefícios, até 31/12/2010 e, após tal marco, caso não atingido o número de meses necessário, deverá atender ao art. 3º, incisos II e III, da Lei nº 11.718/2008. Em relação aos segurados especiais, não incidem as limitações em comento.
Vale ressaltar, ainda, que a lei deu tratamento diferenciado ao trabalhador rural dispensando-o do período de carência por meio do recolhimento das contribuições previdenciárias, bastando, tão-somente, a comprovação do exercício da atividade rural pelo número de meses previsto na tabela progressiva do art. 142 da Lei de Benefícios.
Neste sentido, trago à colação a ementa dos seguintes julgados:
“PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. TRABALHADOR RURAL. ATIVIDADE CAMPESINA COMPROVADA. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO. ACÓRDÃO EM CONFLITO COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. RECURSO ESPECIAL DO PARTICULAR PROVIDO.
1. No caso dos autos, a Corte de origem reformou a sentença, afirmando a necessidade de recolhimento de contribuição para o reconhecimento da aposentadoria rural, ao fundamento de que o autor preencheu o requisito etário após ter passado o prazo de 15 (quinze) anos estabelecido na norma transitória do art. 143 da Lei 8.213/1991, com a redação dada pela Lei 11.718/2008.
2. Tal entendimento, contraria, contudo a jurisprudência desta Corte que é uníssona ao reconhecer que os rurícolas foram dispensados do recolhimento das contribuições relativas ao exercício do trabalho no campo, substituindo a carência pela comprovação do efetivo desempenho do labor agrícola (arts. 26, III e 39, I da Lei 8.213/1991).
3. A norma transitória do art. 143 da Lei 8.213/1991 não prejudica os Segurados Especiais, para os quais há previsão legal específica nos termos do artigo 39, inciso I, da Lei 8.213/1991, que assegura a concessão do benefício de aposentadoria por idade no valor de um salário mínimo sem que seja exigido o recolhimento das contribuições, bastando a comprovação da atividade campesina.
4. No caso dos autos, a autora completou o requisito etário e o período de labor rural exigido em período imediatamente anterior ao requerimento do benefício da aposentadoria por idade, conforme reconhecido na sentença, impondo-se, assim, a concessão do benefício.
5. Recurso Especial do Particular provido para restaurar a sentença concessiva em todos os seus termos.”
(REsp n. 1.558.242/SP, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 13/12/2018, DJe de 4/2/2019.).
“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIAPORIDADERURAL. TRABALHADOR RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
(...)
- Em relação às contribuições previdenciárias, é assente o entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de atividade no meio rural. Precedentes do STJ.
- Conjunto probatório suficiente à comprovação de atividade rural no período juridicamente relevante. Benefício devido.
- Fica mantida a condenação do INSS a pagar honorários de advogado, cujo percentual majoro para 12% (doze por cento) sobre a condenação, excluindo-se as prestações vencidas após a data da sentença, consoante Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça e critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 11, do CPC.
- Apelação desprovida.”
(TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5003384-31.2023.4.03.9999, Rel. Desembargadora Federal Daldice Maria Santana de Almeida, julgado em 31/08/2023, DJEN DATA: 06/09/2023).
SEGURADO ESPECIAL
Dispõe a Lei n.º 8.213/91 acerca do tema que:
“Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
VII - como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeirooutorgados,comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade:
1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais;
2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos doinciso XII do caput do art. 2º da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal meio de vida;
b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal meio de vida; e
c) cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a ebdeste inciso, que, comprovadamente, trabalhem com o grupo familiar respectivo.”
Destaco, ainda, o que preconiza o art. 39, I do mesmo diploma legal:
“Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII docaputdo art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:
I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, e de auxílio-acidente, conforme disposto no art. 86 desta Lei, desde que comprovem o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido, observado o disposto nos arts. 38-A e 38-B desta Lei; ou.”
Extrai-se do texto legal, portanto, que a aposentadoria por idade é devida ao segurado especial que comprovar o exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, pelo número de meses correspondentes à carência necessária ao se deferimento.
REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR
A definição de regime de economia familiar encontra respaldo no art. 11, §1º, da Lei de Benefícios, o qual estabelece que: “Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes”.
Extrai-se do normativo legal ser possível a utilização, pelo segurado especial, de empregados contratados, sendo certo que o §7º do mesmo artigo, limita a sua contratação a prazo determinado. No mesmo sentido, o §8º elenca as atividades que não descaracterizam a condição de segurado especial e, por fim, o §9º dispõe acerca dos rendimentos que podem ser auferidos pelos membros do grupo familiar, sem que reste descaracterizado o regime de subsistência.
REUNIÃO DOS REQUISITOS
O C. STJ, quando do julgamento do Recurso Especial n.º 1.354.908/SP, processado sob o rito dos recursos repetitivos, firmou entendimento no sentido de exigir que o segurado especial esteja laborando no campo quando completar a idade mínima para se aposentar, ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, tenha preenchido de forma concomitante os requisitos no passado.
O referido recurso restou assim ementado:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIAPORIDADERURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoriaporidaderural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.
2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil."
(REsp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016).
CONCLUSÃO: REQUISITOS
Desta feita, para a concessão da aposentadoria por idade rural faz-se necessário que o segurado comprove o cumprimento da idade mínima necessária, bem como o exercício da atividade laborativa pelo período previsto em lei, em momento imediatamente anterior ao implemento do primeiro requisito ou do requerimento do benefício na esfera administrativa.
INÍCIO DE PROVA MATERIAL
Conforme art. 55, §3º, da Lei de benefícios e, nos termos da Súmula de nº 149 do STJ, é necessário que a prova testemunhal venha acompanhada de início razoável de prova documental:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
A comprovação do exercício da atividade campesina pelo período correspondente ao da carência exigida deve obedecer ao disposto no art. 106, e suas alterações, da Lei nº 8.213/91.
Entretanto, o rol inserto no referido artigo não é exaustivo (STJ, AgInt no AREsp n. 1.372.590/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 21/3/2019, DJe de 28/3/2019), cabendo ao Juízo, com respaldo no princípio do livre convencimento motivado, valer-se de documentos para além dos ali elencados.
Ademais, considerando as precárias condições de trabalho dos lavradores, bem como as dificuldade na obtenção das provas materiais de seu labor, o C. STJ, quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR (Tema nº 554), realizado sob a sistemática dos recursos repetitivos, amenizou a exigência da prova, admitindo-se o início de prova material sobre parte do lapso temporal requerido, desde que corroborado por prova testemunhal robusta.
Impende observar, ainda, que não se exige que a prova material se estenda por todo o período de carência, mas é imprescindível que a prova testemunhal faça referência à época em que foi constituído o documento (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5003274-32.2023.4.03.9999, Rel. Desembargadora Federal Inês Virginia Prado Soares, julgado em 10/08/2023, DJEN DATA: 17/08/2023).
No mesmo sentido, os documentos considerados como início de prova material devem ser contemporâneos ao lapso que se pretende ver reconhecido, vale dizer, devem ter sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Destaco, também, que o C. STJ, no julgamento do REsp n.º 1.348.633/SP, do REsp n.º 1.348.130/SP e do REsp n.º1.348.382/SP, submetidos ao regime dos recursos repetitivos (Tema n.º 638), firmou a seguinte tese: “Mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob contraditório.”.
Neste sentido é a ementa do julgado (REsp n.º 1.348.633/SP):
“PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/91. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. RECONHECIMENTO A PARTIR DO DOCUMENTO MAIS ANTIGO. DESNECESSIDADE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONJUGADO COM PROVA TESTEMUNHAL. PERÍODO DE ATIVIDADE RURAL COINCIDENTE COM INÍCIO DE ATIVIDADE URBANA REGISTRADA EM CTPS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. A controvérsia cinge-se em saber sobre a possibilidade, ou não, de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao documento mais antigo juntado como início de prova material.
2. De acordo com o art. 400 do Código de Processo Civil "a prova testemunhal é sempre admissível, não dispondo a lei de modo diverso". Por sua vez, a Lei de Benefícios, ao disciplinar a aposentadoria por tempo de serviço, expressamente estabelece no § 3º do art. 55 que a comprovação do tempo de serviço só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, "não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento" (Súmula 149/STJ).
3. No âmbito desta Corte, é pacífico o entendimento de ser possível o reconhecimento do tempo de serviço mediante apresentação de um início de prova material, desde que corroborado por testemunhos idôneos. Precedentes.
4. A Lei de Benefícios, ao exigir um "início de prova material", teve por pressuposto assegurar o direito à contagem do tempo de atividade exercida por trabalhador rural em período anterior ao advento da Lei 8.213/91 levando em conta as dificuldades deste, notadamente hipossuficiente.
5. Ainda que inexista prova documental do período antecedente ao casamento do segurado, ocorrido em 1974, os testemunhos colhidos em juízo, conforme reconhecido pelas instâncias ordinárias, corroboraram a alegação da inicial e confirmaram o trabalho do autor desde 1967.
6. No caso concreto, mostra-se necessário decotar, dos períodos reconhecidos na sentença, alguns poucos meses em função de os autos evidenciarem os registros de contratos de trabalho urbano em datas que coincidem com o termo final dos interregnos de labor como rurícola, não impedindo, contudo, o reconhecimento do direito à aposentadoria por tempo de serviço, mormente por estar incontroversa a circunstância de que o autor cumpriu a carência devida no exercício de atividade urbana, conforme exige o inc. II do art. 25 da Lei 8.213/91.
7. Os juros de mora devem incidir em 1% ao mês, a partir da citação válida, nos termos da Súmula n. 204/STJ, por se tratar de matéria previdenciária. E, a partir do advento da Lei 11.960/09, no percentual estabelecido para caderneta de poupança. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do Código de Processo Civil.”
(REsp n. 1.348.633/SP, relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, julgado em 28/8/2013, DJe de 5/12/2014.)
Assim, possível o reconhecimento da atividade campesina do segurado anteriormente ao documento mais antigo, desde que devidamente amparado por prova oral convincente.
Vale dizer, ainda, que a jurisprudência desta E. Corte é firme no sentido de ser possível o reconhecimento da atividade rural a partir dos 12 anos de idade, conforme se verifica da ementa do seguinte julgado:
“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CONCESSÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. DESDE OS 12 ANOS DE IDADE.
(...)
- À comprovação da atividade rural exige-se início de prova material corroborado por robusta prova testemunhal.
- É possível o reconhecimento do tempo rural comprovado desde os 12 (doze) anos de idade.
(...)
- Conjunto probatório suficiente para demonstrar o labor rural desde os 12 (doze) anos de idade da parte autora, independentemente do recolhimento de contribuições, exceto para fins de carência e contagem recíproca (artigo 55, § 2º, e artigo 96, inciso IV, ambos da Lei n. 8.213/1991).
- Matéria preliminar rejeitada.
- Apelação do INSS parcialmente provida.”
(9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5081318-36.2021.4.03.9999, Rel. Desembargadora Federal Daldice Maria Santana de Almeida, julgado em 22/07/2021, DJEN DATA: 29/07/2021)
No tocante à certidão de casamento ou outros assentamentos civis em que restar consignado a profissão de agricultor ou lavrador da parte autora ou de seu cônjuge, tenho que constituem início de prova material da referida atividade rural.
Por sua vez, no que tange à extensão da qualificação do cônjuge ou companheiro à esposa ou convivente, bem como da filha solteira residente na casa paterna, é pacífico o entendimento dos Tribunais no sentido de sua aceitação, dada a vulnerabilidade e as difíceis condições enfrentadas pelo trabalhador rural.
Neste sentido, trago a ementa do julgado proferido por esta Turma:
“PREVIDENCIÁRIO: APOSENTADORIAPORIDADERURAL. ARTIGO 48, §§1º E 2º DA LEI Nº 8.213/91. REQUISITOS SATISFEITOS. COMPROVAÇÃO.
(...)
8. Dúvidas não subsistem sobre a possibilidade de extensão da qualificação de lavrador de um cônjuge ao outro constante de documento apresentado, para fins de comprovação da atividade campesina, que indique, por exemplo, o marido como trabalhador rural (STJ, 3ª Seção, EREsp 1171565, relator Ministro Nefi Cordeiro, DJe 05.03.2015), especialmente quando houver documentos em seu nome que atestem sua condição de rurícola, caso em que se deve considerar todo o acervo probatório.
(...)
16. Recurso desprovido, condenando o INSS ao pagamento de honorários recursais, na forma delineada. De ofício, alterados os critérios de juros de mora e correção monetária.”
(TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001786-76.2022.4.03.9999, Rel. Desembargadora Federal Inês Virginia Prado Soares, julgado em 27/04/2022, Intimação via sistema DATA: 06/05/2022)
CASO CONCRETO
Com essas breves considerações, passo ao exame do mérito recursal.
A parte autora completou a idade necessária de 55 anos em 31/12/2013.
De acordo com o disposto no artigo 142 da Lei de Benefícios, a carência exigida corresponde a 180 meses.
Para comprovar o exercício da atividade rural, juntou aos autos os seguintes documentos, os quais passo a examinar:
- Certidão de casamento da autora e Ademar Lucas de Oliveira, contraído em 12/07/2013, sem qualificação dos nubentes (ID 283934073);
- Formulário de Autodeclaração de Segurado Especial – Rural – do INSS, no qual a autora declarou o exercício de atividade rural no período de 11/08/2003 a 11/10/2021, na condição de assentada em regime de economia familiar, e no período de 31/12/1968 a 31/12/1996, na condição de diarista/boia-fria (ID 283934074);
- Notas fiscais de compra para industrialização, de leite cru, em nome do marido da autora, emitidas em 31/10/2015, 30/09/2006, 28/02/2007, 29/02/2008, 10/11/2014, 31/10/2015, 29/02/2016, 30/04/2017, 30/09/2018, 30/04/2019, 31/03/2020, 31/01/2021 (ID 283934075, 283934076, 283934079, págs. 14, 16, 23/29, 31);
- Certidão de Residência Rural, emitida pela Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo, na qual certifica que a autora e seu marido residem em lote agrícola, desde 11/08/2003, no Assentamento Bonanza, Município de Rosana/SP, datada de 18/02/2021 (ID 283934078);
- CTPS da autora com registro do seguinte vínculo: 03/05/1999 a 03/06/1999, cargo de safrista em estabelecimento rural (ID 283934079, págs. 9/11);
- Notas fiscais de entrada emitidas por Fiação de Seda BRATAC S.A., referente a comercialização de produção rural, nas quais o marido da autora consta como remetente, datadas de 06/12/2006 e 03/05/2007 (ID 283934079, págs. 13 e 15);
- Notas fiscais de entrada emitidas por Novamix Industrial e Comercial de Alimentos Ltda., referente a comercialização de leite, nas quais o marido da autora consta como remetente, datadas de 31/10/2009, 31/01/2010 e 31/03/2012 (ID 283934079, págs. 17, 18 e 21);
- Nota fiscal de entrada emitida por Laticínios Irmãos Carlucci Ltda., referente a comercialização de leite, na qual o marido da autora consta como remetente, datada de 31/10/2011 (ID 283934079, págs. 19/20);
- Nota fiscal de produtor rural em nome do marido da autora, emitida em 25/01/2022, referente a comercialização de gado, no valor de R$15.200,00 (ID 283934079, págs. 30);
- Nota fiscal de entrada emitida por Indústria e Comércio Laticínios Novo Tempo Ltda., referente a comercialização de leite, na qual o marido da autora consta como remetente, datada de 30/04/2013 (ID 283934079, pág. 22)
- Extrato do CNIS da autora no qual consta o recebimento de pensão por morte com data de início em 29/09/1996; vínculo como empregada no período de 03/05/1999 a 07/1999, recolhimentos como contribuinte individual nos períodos de 01/02/2008 a 30/11/2009 (ocupação motorista de taxi) e 01/01/2010 a 31/08/2012 e percepção de auxílio doença nos períodos de 03/03/2010 a 03/06/2010 e 02/12/2010 a 25/07/2011 (ID 283934079, págs. 38/39);
- Extrato do CNIS do marido da autora, no qual consta período de atividade de segurado especial reconhecido de 01/01/2005 a 24/02/2021, bem como o recebimento de aposentadoria por idade com data de início em 24/02/2021 (ID 283934079, pág. 40).
Referidos documentos constituem, a princípio, início de prova material em nome do marido. Houve, também, prova oral colhida audiência realizada em 29/05/2023, que corroboram o exercício de atividade rural pela autora, no assentamento Bonanza.
No entanto, em que pese a prova testemunhal acima mencionada, tenho que os documentos juntados aos autos não permitem concluir pelo preenchimento dos requisitos exigidos para a concessão da aposentadoria por idade rural.
As notas fiscais acostadas aos autos demonstram volume de produção, em nome do marido da autora, para além da mera subsistência, caracterizando, de fato, atividade rural voltada ao lucro. Organizando os referidos documentos, destaco os seguintes valores de saída declarados, referente à comercialização de leite cru in natura:
- 31/10/2009: R$989,50 (salário mínimo da época R$465,oo);
- 31/01/2010: R$1.298,03 (salário mínimo da época R$510,oo);
- 31/10/2011: R$816,90 (salário mínimo da época R$545,oo);
- 31/03/2012: R$1.056,62 (salário mínimo da época R$622,oo);
- 30/04/2013: R$905,13 (salário mínimo da época R$678,oo);
- 31/10/2014: R$3.093,66 (salário mínimo da época R$724,00);
- 31/10/2015: R$4.190,21;
- 29/02/2016: R$4.430,87;
- 30/04/2017: R$5.987,25;
- 30/09/2018: R$7.079,54;
- 30/04/2019: R$8.502,00;
- 31/03/2020: R$6.490,80;
- 31/01/2021: R$11.294,25.
Há, ainda, a nota fiscal de produtor rural emitida pelo marido da autora, referente à comercialização de gado, no valor de R$15.200,00, em 25/01/2021 (ou 2022, último numeral parcialmente cortado).
Assim, a grande produção agrícola indica o caráter lucrativo da atividade, incompatível com a finalidade de subsistência. Não se nega que o segurado especial possa vender parte de sua produção; contudo, a larga produção descaracteriza a comercialização apenas do excedente, demonstrando a intenção de exercício de atividade voltada à comercialização.
Neste sentido, trago à colação a ementa do seguinte julgado:
“PREVIDENCIÁRIO: APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. SEGURADO ESPECIAL. CONDIÇÃO DESCARACTERIZADA.
1. O conjunto probatório dos autos denota não se tratar de segurado especial, como se verifica, exemplificativamente, das notas fiscais nº00021 – 2012. Quantidade: 1975 caixas de laranja no valor de R$ 15.800,00 (ID 126088821, pg. 30); NF 000008 – 2008 – embora não esteja legível a quantidade, depreende-se que a unidade é tonelada e o produto: cana de açúcar, no valor total de R$ 86.901, 91 (ID 126088821, pg. 28)
2. Descaracterizada, portanto, a condição de segurado especial, não se aplica, ao caso concreto, o entendimento consagrado no âmbito do REsp 1352721/SP, julgado sob a sistemática de recursos repetitivos.
3. Desprovido o apelo da parte autora interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados na sentença devem, no caso, ser majorados em 2%, nos termos do art. 85, parágrafo 11, do CPC/2015, observada a suspensão prevista no artigo 98, parágrafo 3º, da mesma lei.
4. Recurso desprovido.”
(TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5182879-40.2020.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 15/06/2020, Intimação via sistema DATA: 19/06/2020)
Aliado a isso, extrai-se dos autos, notadamente do extrato do CNIS (ID 283934079, págs. 38/39) e Declaração de Benefício (ID 283934123), que a requerente percebe benefício de pensão por morte, desde 29/09/1996, em valor muito superior ao salário mínimo (R$3.633,16 em 12/2023, quando o salário mínimo era R$1320,00), o que descaracteriza o regime de economia familiar, nos termos do artigo 11, § 9º, da LB, por ter outra fonte de rendimento.
A esse propósito, destaco o entendimento jurisprudencial externado por essa E. Turma:
PREVIDENCIÁRIO: APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. RENDIMENTOS SUPERIORES AO SALÁRIO MÍNIMO. CONDIÇÃO DE SEGURADO ESPECIAL DESCARACTERIZADA. RECURSO DESPROVIDO.
1. O segurado especial é o pequeno produtor, que produz para própria subsistência, ainda que consiga comercializar uma pequena parte da sua produção.
2. Emerge dos autos que grupo familiar possui outra fonte de rendimento há décadas, já que a esposa do autor era intendente na Academia da Força Aérea desde 1980, tendo se aposentado em 2013, conforme alegado por ele. Em consulta ao CNIS de sua esposa, consta que a sua última remuneração antes da aposentadoria era de R$ 1.923,11, época em que o salário mínimo era de R$ 678,00 (seiscentos e setenta e oito reais), ou seja, significativamente superior a ele, fato que descaracteriza o regime de economia familiar.
3. A condição de segurado especial exige que o labor rural seja imprescindível à manutenção do próprio segurado e de seu grupo familiar, situação não configurada nos autos.
4. Por conseguinte, fica afastada a presunção de que o cultivo de produtos agrícolas para consumo próprio, com a comercialização do excedente, é a principal fonte de renda da família, característica intrínseca do regime de economia familiar.
5. Descaracterizado, portanto, o regime de economia familiar, não se aplica, ao caso concreto, o entendimento consagrado no âmbito do REsp 1352721/SP, julgado sob a sistemática de recursos repetitivos.
6. Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11, como um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os limites estabelecidos na lei, ficando sua exigibilidade condicionada à futura deliberação sobre o Tema nº 1.059/STJ, o que será examinado oportunamente pelo Juízo a quo.
7. Recurso desprovido.
(TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001276-12.2021.4.03.6115, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 20/10/2022, DJEN DATA: 28/10/2022)
Ainda:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. TRABALHADOR RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ART. 11, §9º, I, DA LEI N. 8.213/1991. PENSÃO POR MORTE SUPERIOR A UM SALÁRIO MÍNIMO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- À concessão de aposentadoria por idade ao rurícola, exige-se: a comprovação da idade mínima e o desenvolvimento de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento (REsp Repetitivo n. 1.354.908).
- A comprovação de atividade rural deve ser feita por meio de início de prova material corroborado por robusta prova testemunhal (Súmula n. 149 do STJ e Recursos Repetitivos n. 1.348.633 e 1.321.493).
- Em relação às contribuições previdenciárias, é assente o entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de atividade no meio rural. Precedentes do STJ.
- O fato do autor perceber pensão por morte da esposa, superior a um salário mínimo, descaracteriza sua condição de segurado especial, porquanto a atividade agrícola desempenhada por ele não era totalmente essencial para a subsistência da família.
- Conjunto probatório insuficiente à comprovação do período de atividade rural debatido. Benefício indevido.
- Invertida a sucumbência. Condenação da parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do CPC, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo estatuto processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação provida.
(TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5072618-37.2022.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA, julgado em 27/11/2022, DJEN DATA: 30/11/2022)
Portanto, durante o lapso temporal relativo à carência, qual seja, nos 180 meses que antecedem o implemento do requisito etário, os elementos colhidos indicam que a autora possuía rendimento em valor consideravelmente superior ao salário mínimo, bem como desempenhava as lides campesinas com o objetivo de auferir lucro, de forma que não se pode concluir que tal labor era indispensável à subsistência do núcleo familiar.
Desta feita, vê-se que não restou demonstrado o desempenho da atividade campesina em regime de economia familiar em momento anterior ao implemento do requisito etário, razão pela qual não faz jus a parte autora à concessão do benefício pleiteado.
Destaco, por oportuno, que a improcedência do pedido da parte autora não se pautou na ausência de início de prova material e, sim, devido ao conjunto probatório ser desfavorável à sua pretensão. Desta feita, não se aplica ao presente caso o decidido no REsp nº 1.352.721/SP (Tema nº 629) julgado pelo C.STJ.
Neste sentido, colaciono a ementa do seguinte julgado:
“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. PRELIMINAR DE EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO AFASTADA. APOSENTADORIA POR IDADE. LABOR RURAL. ERRO DE FATO E VIOLAÇÃO À NORMA JURÍDICA NÃO CARACTERIZADOS. ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA. PEDIDO IMPROCEDENTE.
- A improcedência do pedido subjacente não se deu por falta de início de prova material, mas, sim, em razão de conjunto probatório desfavorável à pretensão então deduzida, por não caracterização da atividade rural em regime de economia familiar, diante do labor de natureza urbana do cônjuge da autora. Não incidência do Tema Repetitivo n. 629 do Superior Tribunal de Justiça.
- Patenteada a existência de decisão de mérito, a qual pode ser objeto de rescisão nos termos do artigo 966 do Código de Processo Civil, fica afastada a questão preliminar de extinção desta ação rescisória, sem resolução de mérito.
- A controvérsia foi julgada de acordo com os elementos existentes nos autos da ação subjacente e o julgado rescindendo manifestou-se expressamente sobre as provas produzidas, concluindo ser inviável a concessão da aposentadoria por idade rural pretendida, pela descaracterização da atividade rural da parte autora em regime de economia familiar, tendo em conta o labor de natureza urbana desenvolvido pelo esposo da requerente, desde 1996, e da percepção pelo varão da aposentadoria por invalidez, a partir de 2007.
- Evidenciados a controvérsia e o efetivo pronunciamento a respeito da matéria, indevida é a rescisão do julgado com base no artigo 966, inciso VIII, do Código de Processo Civil.
- A interpretação dada pelo julgado rescindendo, aos fatos e fundamentos trazidos a julgamento, não destoa do razoável, na medida em que a solução dada ao caso concreto está pautada na análise do conjunto probatório dos autos, com indicação das razões pelas quais considerou não preenchidos os requisitos necessários à concessão da aposentadoria por idade rural. Hipótese prevista no artigo 966, V, do CPC não configurada.
- Fica condenada a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, os quais arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, na forma do artigo 85 do CPC, ficando, porém, suspensa a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo estatuto processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
- Ação rescisória improcedente.
(TRF 3ª Região, 3ª Seção, AR - AÇÃO RESCISÓRIA - 5017636-68.2020.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA, Relator(a) para Acórdão Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA, por maioria, julgado em 20/03/2023, DJEN DATA: 23/03/2023)
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Inverto o ônus da sucumbência, condenando a parte autora ao pagamento das custas e despesas processuais e dos honorários advocatícios fixados em 10% do valor atualizado da causa, suspensa, no entanto, a sua execução, nos termos do artigo 98, § 3º, do CPC/2015, por ser ela beneficiária da assistência judiciária gratuita.
REVOGAÇÃO DE TUTELA ANTECIPADA E DEVOLUÇÃO: TEMA Nº 692
Revogo a antecipação da tutela anteriormente concedida e, consoante decidido no julgamento do Tema n.º 692 pelo C. Superior Tribunal de Justiça (Tese: A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago), determino a devolução dos valores recebidos a esse título, cuja execução deverá se dar nestes autos.
Ante o exposto, dou provimento ao apelo do INSS para julgar improcedente o pedido, condenando a parte autora ao pagamento das custas e despesas processuais e dos honorários advocatícios fixados em 10% do valor atualizado da causa, suspensa, no entanto, a sua execução, nos termos do artigo 98, § 3º, do CPC/2015, revogando a tutela antecipada anteriormente deferida.
Comunique-se ao INSS.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR IDADE TRABALHADOR RURAL. CONCESSÃO. CARÊNCIA. IDADE IMPLEMENTADA. ATIVIDADE AGRÍCOLA VOLTADA À COMERCIALIZAÇÃO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO SUPERIOR AO SALÁRIO MÍNIMO. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR DESCARACTERIZADO. BENEFÍCIO INDEVIDO. PEDIDO JULGADO IMPROCEDENTE. INAPLICABILIDADE DO DECIDIDO NO RESP Nº 1.352.727/SP (TEMA Nº 629). INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA.
- O artigo 48, § 1º da Lei n.º 8213, de 24 de julho de 1991 dispõe que, para a obtenção da aposentadoria rural por idade, é necessário que o homem tenha completado 60 anos e a mulher, 55 anos.
- O artigo 142 do mesmo diploma legal traz em seu bojo a tabela relativa à carência, considerando-se o ano em que o rurícola implementou todas as condições necessárias à concessão da benesse.
- A lei deu tratamento diferenciado ao trabalhador rural dispensando-o do período de carência por meio do recolhimento das contribuições previdenciárias, bastando, tão-somente, a comprovação do exercício da atividade rural pelo número de meses previsto na tabela progressiva do art. 142 da Lei de Benefícios.
- O art. 11, VII, da Lei de Benefícios contempla os segurados especiais.
- A definição de regime de economia familiar encontra respaldo no §1º do mesmo artigo, o qual estabelece que: “Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes”.
- No tocante aos requisitos necessários à concessão dos benefícios previdenciários, o C. STJ, quando do julgamento do Recurso Especial n. 1.354.908/SP, processado sob o rito dos recursos repetitivos, firmou posicionamento no sentido de exigir que o segurado especial esteja laborando no campo quando completar a idade mínima para se aposentar, ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, tenha preenchido de forma concomitante os requisitos no passado.
- A concessão da aposentadoria por idade rural é devida, portanto, ao segurado que comprove o cumprimento da idade mínima necessária, bem como o exercício da atividade laborativa pelo período previsto em lei, em momento imediatamente anterior ao implemento do primeiro requisito.
- Conforme art. 55, §3º, da Lei de benefícios e, nos termos da Súmula de nº 149 do STJ, é necessário que a prova testemunhal venha acompanhada de início razoável de prova documental.
- A parte autora completou 55 anos em 31/12/2013. De acordo com o disposto no artigo 142 da LB, a carência exigida corresponde a 180 meses.
- O conjunto probatório demonstra grande comercialização agrícola, incompatível com a finalidade de subsistência.
- A requerente percebe benefício de pensão por morte, desde 29/09/1996, em valor muito superior ao salário mínimo o que descaracteriza o regime de economia familiar, nos termos do artigo 11, § 9º, da Lei de Benefícios, por ter outra fonte de rendimento.
- Não restou demonstrado o desempenho da atividade campesina em regime de economia familiar em momento anterior ao implemento do requisito etário, razão pela qual não faz jus a parte autora à concessão do benefício pleiteado.
- A improcedência do pedido da parte autora não se pautou na ausência de início de prova material e, sim, devido ao conjunto probatório ser desfavorável à sua pretensão. Desta feita, não se aplica ao presente caso o decidido no REsp nº 1.352.721/SP (Tema nº 629) julgado pelo C.STJ.
- Inversão do ônus da sucumbência. Condenação da parte ao pagamento das custas e despesas processuais e dos honorários advocatícios fixados em 10% do valor atualizado da causa. Exigibilidade condicionada à hipótese artigo 98, § 3º, do CPC/2015.
- Tutela antecipada revogada.
-Apelação provida. Pedido julgado improcedente.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
