
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001912-84.2021.4.03.6112
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARINALVA GUIMARAES MARCIANO
Advogados do(a) APELADO: NEIVA QUIRINO CAVALCANTE BIN - SP171587-N, TAMIRES MARINHEIRO SILVA - SP357476-N
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001912-84.2021.4.03.6112
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARINALVA GUIMARAES MARCIANO
Advogados do(a) APELADO: NEIVA QUIRINO CAVALCANTE BIN - SP171587-N, TAMIRES MARINHEIRO SILVA - SP357476-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Trata-se de ação objetivando a concessão de aposentadoria por idade a trabalhador rural.
A sentença julgou procedente o pedido para condenar o INSS a conceder aposentadoria por idade à Autora, nos termos do art. 48, § 1º, da LBPS, com data de início de benefício fixada em 6.10.2015, com antecipação de tutela. Determinou que os atrasados sofrerão correção monetária e juros moratórios nos termos do Manual de Orientação de Procedimento para os Cálculos da Justiça Federal aprovado vigente por ocasião da liquidação (Resolução nº 784, de 2022, e eventuais sucessoras). Condenou ainda o INSS ao pagamento de honorários advocatícios no montante de 10% do valor da condenação, nos termos do art. 85, § 3º, I, do CPC/2015, que deverão incidir sobre as diferenças apuradas até a sentença (STJ, Súmula nº 111). Custas ex lege.
Dispensado o reexame necessário, nos termos do §3º do artigo 496 do CPC/15.
O INSS apelou, sustentando que o fato de o marido da autora receber auxílio-doença de 15/12/2009 a 23/03/2011, e aposentadoria por invalidez desde 24/03/2011 impossibilita a concessão do benefício em questão. Caso mantida a condenação, requer que o termo inicial do benefício seja fixado na data da citação.
Com contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001912-84.2021.4.03.6112
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARINALVA GUIMARAES MARCIANO
Advogados do(a) APELADO: NEIVA QUIRINO CAVALCANTE BIN - SP171587-N, TAMIRES MARINHEIRO SILVA - SP357476-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
Com efeito, consoante o disposto no artigo 48, § 1º da Lei n.º 8213, de 24 de julho de 1991, para a obtenção da aposentadoria rural por idade, é necessário que o homem tenha completado 60 anos e a mulher, 55 anos.
No artigo 142 da mencionada lei consta uma tabela relativa à carência, considerando-se o ano em que o rurícola implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício.
Por sua vez, o artigo 143 do mesmo diploma legal, com redação determinada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995, estabelece que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
A Lei nº 11.718/2008 prorrogou o termo final do prazo para 31 de dezembro de 2010, aplicando-se esta disposição, inclusive, para o trabalhador rural enquadrado na categoria de segurado contribuinte individual que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego (art. 2º, caput e parágrafo único).
Observe-se que após o período a que se referem esses dispositivos, além do requisito etário, será necessário o cumprimento da carência de 180 meses, a teor do que dispõe o artigo 25, inciso II, da Lei n.º 8.213/1991.
O legislador, para promover esta transição ao sistema contributivo, possibilitou ao empregado rural e contribuinte individual, na concessão da aposentadoria por idade, para efeito de carência, que cada mês comprovado de emprego, de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, seja multiplicado por 3, limitado a 12 dentro do mesmo ano e no período de janeiro de 2016 a dezembro de 2020, que cada mês de emprego seja multiplicado por 2, limitado a 12 meses dentro do mesmo ano.
Assim, para os empregados rurais (boias-frias/volantes), o exercício de atividade rural será computado para efeito de carência nos moldes do art. 143 da Lei de Benefícios, até 31/12/2010. Após esta data, se não atingido o número de meses necessário, deverá atender ao art. 3º, incisos II e III, da Lei nº 11.718/2008.
Em relação aos segurados especiais, não incidem as limitações acima.
O artigo 39 da Lei n.º 8.213/91 prevê os benefícios devidos ao segurado especial. Estabelece, ainda, que para a obtenção da aposentadoria por idade, o segurado especial deverá comprovar o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência, conforme preceitua o artigo 39, inciso I, da lei mencionada. Em outras palavras, não é exigido o cumprimento de carência do segurado especial, mas o efetivo exercício de atividade rural, na forma especificada no dispositivo em comento.
O conceito de segurado especial é dado pelo artigo 11, inciso VII, da Lei n.º 8.213/91. A Lei n.º 11.718, de 20 de junho de 2008, estendeu ao seringueiro ou extrativista vegetal (que labore na forma do art. 2º, caput, inciso XII da Lei n.º 9.985/2000), bem como ao pescador artesanal ou a este assemelhado a condição de segurado especial.
O §1º do artigo 11 da Lei n.º 8.213/91 define o regime de economia familiar. É possível ao segurado especial valer-se de empregados contratados, em épocas de safra, por no máximo 120 (cento e vinte) dias, nos termos do §7º do artigo acima referido. Por outro laudo, o §8º descreve determinadas atividades que não descaracterizam a condição de segurado especial, enquanto os incisos do §9º trazem um rol dos rendimentos que podem ser auferidos por membro do grupo familiar, sem que este perca sua condição de segurado especial.
Ressalte-se que o entendimento atual do STJ, expresso no Recurso Especial n. 1.354.908/SP, processado sob o rito dos recursos repetitivos, é no sentido de exigir que o segurado especial esteja laborando no campo quando completar a idade mínima para se aposentar, ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, tenha preenchido de forma concomitante os requisitos no passado.
Confira-se:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO.REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.
2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil."
(REsp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016)
Conclui-se, portanto, que para a concessão da aposentadoria por idade rural são necessários os requisitos: idade mínima e prova do exercício da atividade laborativa pelo período previsto em lei, no período imediatamente anterior ao que o segurado completa a idade mínima para se aposentar.
Nos termos da Súmula de nº 149 do STJ, é necessário que a prova testemunhal venha acompanhada de início razoável de prova documental: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Não se exige que a prova material se estenda por todo o período de carência, mas é imprescindível que a prova testemunhal faça referência à época em que foi constituído o documento (AR 4.094/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 26/09/2012, DJe 08/10/2012).
A idade mínima exigida para a obtenção do benefício restou comprovada pela documentação pessoal da autora (nascida em 25/07/1954).
Para comprovar as suas alegações, apresentou os seguintes documentos, dentre outros:
- certidão de casamento, realizado em 26/02/74, na qual ela figura como de “prendas domésticas” e o marido como operário;
- certidão de residência e atividade rural expedida pela Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo – ITESP - que atesta que era residente e explorou o lote agrícola nº 55, de 21 ha, do Projeto de Assentamento Novo Horizonte, em Mirante do Paranapanema/SP, de junho de 1996 a julho/2015;
- notas fiscais de produtor em nome do marido, datadas de 1998, 1999, 2001/2015;
- certidão de residência e atividade rural expedida pela Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo – ITESP – que atesta que permaneceu residindo e explorando o mesmo lote agrícola até 01/06/2019.
A certidão de casamento apresentada comprova a união existente entre a autora e Valdemar Marciano.
Em se tratando de segurado especial, é necessário que a atividade seja comprovada através de documentos que demonstrem o efetivo exercício do labor rural em regime de economia familiar, como, por exemplo, aqueles elencados no art. 106 da Lei nº 8.213/91, ou outros que sirvam a tal mister.
Os demais documentos relacionados servem como início de prova da atividade em regime de economia familiar.
Na audiência realizada em 01/06/2023, a testemunha Osvaldo Socossuic declarou que conhece a autora desde 1996, quando ela começou a trabalhar em um lote agrícola, no Assentamento Novo Horizonte, juntamente com o marido e filhos, sem a ajuda de empregados, plantando mandioca, milho, algodão e comida para o gado. Informou que ela trabalhou no lote até 2020.
A testemunha José Aparecido de Carvalho declarou que conhece a autora há mais de 40 anos, da roça, e confirmou que ela trabalhou em um lote agrícola, no Assentamento Novo Horizonte, juntamente com o marido e filhos, sem a ajuda de empregados, de 1996 a 2020.
Portanto, os depoimentos são harmônicos e suficientes para comprovar a atividade rural da autora pelo período exigido em lei.
Considerando-se que o conjunto probatório comprovou a atividade rural, deve ser mantida a concessão do benefício, bem como a antecipação da tutela, tendo em vista o caráter alimentar das prestações vindicadas.
O termo inicial do benefício deve ser mantido na data do requerimento administrativo (06/10/2015 – ID 290363258 - Pág. 10), uma vez que a parte autora demonstrou que já havia preenchido os requisitos necessários à concessão do benefício desde então.
As parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora na forma estabelecida e pelos índices previstos no capítulo 4.2, do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, alterado pela Resolução CJF nº 784/2022, de 08 de agosto de 2022, ou daquele que estiver em vigor na data da liquidação do título executivo judicial, nos termos da sentença recorrida.
Considerando o não provimento do recurso, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de advogado arbitrados na sentença em 2%.
Diante do exposto, nego provimento à apelação do INSS.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. MANUTENÇÃO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. SUCUMBÊNCIA RECURSAL. HONORÁRIOS DE ADVOGADO MAJORADOS.
1. Suficiente o conjunto probatório a demonstrar o exercício da atividade rural.
2. Termo inicial do benefício mantido na data do requerimento administrativo, uma vez que a parte autora demonstrou que já havia preenchido os requisitos necessários à concessão do benefício desde então.
3. Juros e correção monetária de acordo com os critérios do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, nos termos da sentença recorrida.
4. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015.
5. Apelação do INSS não provida.
