Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5001907-46.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
30/03/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 01/04/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR
RURAL. RECOLHIMENTOS COMO AUTÔNOMO. COMPANHEIRA CADASTRADA COMO
EMPRESÁRIA. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR DESCARACTERIZADO. INVERSÃO DO
ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. TUTELA ANTECIPADA REVOGADA.
1. Descaracterizado regime de economia familiar, considerando que o autor possui vários
recolhimentos como autônomo, e que sua companheira exerce atividade como empresária.
2. Inversão do ônus da sucumbência. Exigibilidade condicionada à hipótese do §3º do artigo 98
do CPC/2015.
3. Tutela antecipada revogada. A questão referente à eventual devolução dos valores recebidos a
este título deverá ser analisada e decidida em sede de execução, nos termos do artigo 302, I, e
parágrafo único, do CPC/2015, e de acordo com o que restar decidido no julgamento do Tema
692, pelo C. Superior Tribunal de Justiça.
4. Apelação provida para julgar improcedente o pedido.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001907-46.2018.4.03.9999
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PARASSU MORAES
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRO GARCIA GOMES NARCIZO ALVES - MS8638-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001907-46.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PARASSU MORAES
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRO GARCIA GOMES NARCIZO ALVES - MS8638-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de aposentadoria por idade a trabalhador rural.
A sentença julgou procedente o pedido para condenar o INSS a pagar à parte autora o benefício
de aposentadoria por idade rural, a partir do requerimento administrativo, com antecipação de
tutela, acrescido de correção monetária de acordo com o INPC, e de juros de mora de acordo
com os juros aplicados à caderneta de poupança. Os honorários de advogado foram fixados nas
porcentagens mínimas sobre o valor da condenação, previstas nos incisos do artigo 85, § 3º, do
CPC/15, excetuadas as prestações vincendas (Súmula 111, STJ).
Dispensado o reexame necessário, nos termos do §2º do artigo 475 do CPC/73.
O INSS apelou, sustentando que não restou comprovado o exercício de atividade rural no período
imediatamente anterior ao requerimento do benefício/implemento do requisito etário, e que restou
descaracterizado o regime de economia familiar, tendo em vista que o autor possuir vários
recolhimentos como contribuinte individual, requerendo a improcedência da ação. Caso mantida a
condenação, requer que a correção monetária seja fixada nos termos da Lei nº 11.960/2009.
Com contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001907-46.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PARASSU MORAES
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRO GARCIA GOMES NARCIZO ALVES - MS8638-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
Com efeito, consoante o disposto no artigo 48, § 1º da Lei n.º 8213, de 24 de julho de 1991, para
a obtenção da aposentadoria rural por idade, é necessário que o homem tenha completado 60
anos e a mulher, 55 anos.
No artigo 142 da mencionada lei consta uma tabela relativa à carência, considerando-se o ano
em que o rurícola implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício.
Por sua vez, o artigo 143 do mesmo diploma legal, com redação determinada pela Lei n.º 9.063,
de 28.04.1995, estabelece que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório
no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII
do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo,
durante 15 (quinze) anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o
exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
A Lei nº 11.718/2008 prorrogou o termo final do prazo para 31 de dezembro de 2010, aplicando-
se esta disposição, inclusive, para o trabalhador rural enquadrado na categoria de segurado
contribuinte individual que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a uma ou mais
empresas, sem relação de emprego (art. 2º, caput e parágrafo único).
Observe-se que após o período a que se referem esses dispositivos, além do requisito etário,
será necessário o cumprimento da carência de 180 meses, a teor do que dispõe o artigo 25,
inciso II, da Lei n.º 8.213/1991.
O legislador, para promover esta transição ao sistema contributivo, possibilitou ao empregado
rural e contribuinte individual, na concessão da aposentadoria por idade, para efeito de carência,
que cada mês comprovado de emprego, de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, seja
multiplicado por 3, limitado a 12 dentro do mesmo ano e no período de janeiro de 2016 a
dezembro de 2020, que cada mês de emprego seja multiplicado por 2, limitado a 12 meses dentro
do mesmo ano.
Assim, para os empregados rurais (bóias-frias/volantes), o exercício de atividade rural será
computado para efeito de carência nos moldes do art. 143 da Lei de Benefícios, até 31/12/2010.
Após esta data, se não atingido o número de meses necessário, deverá atender ao art. 3º, incisos
II e III, da Lei nº 11.718/2008.
Em relação aos segurados especiais, não incidem as limitações acima.
O artigo 39 da Lei n.º 8.213/91 prevê os benefícios devidos ao segurado especial. Estabelece,
ainda, que para a obtenção da aposentadoria por idade, o segurado especial deverá comprovar o
exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior
ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência, conforme
preceitua o artigo 39, inciso I, da lei mencionada. Em outras palavras, não é exigido o
cumprimento de carência do segurado especial, mas o efetivo exercício de atividade rural, na
forma especificada no dispositivo em comento.
O conceito de segurado especial é dado pelo artigo 11, inciso VII, da Lei n.º 8.213/91. A Lei n.º
11.718, de 20 de junho de 2008, estendeu ao seringueiro ou extrativista vegetal (que labore na
forma do art. 2º, caput, inciso XII da Lei n.º 9.985/2000), bem como ao pescador artesanal ou a
este assemelhado a condição de segurado especial.
O §1º do artigo 11 da Lei n.º 8.213/91 define o regime de economia familiar. É possível ao
segurado especial valer-se de empregados contratados, em épocas de safra, por no máximo 120
(cento e vinte) dias, nos termos do §7º do artigo acima referido. Por outro lado, o §8º descreve
determinadas atividades que não descaracterizam a condição de segurado especial, enquanto
que os incisos do §9º trazem um rol dos rendimentos que podem ser auferidos por membro do
grupo familiar, sem que este perca sua condição de segurado especial.
Ressalte-se que o entendimento atual do STJ, expresso no Recurso Especial n. 1.354.908/SP,
processado sob o rito dos recursos repetitivos, é no sentido de exigir que o segurado especial
esteja laborando no campo quando completar a idade mínima para se aposentar, ressalvada a
hipótese do direito adquirido, em que embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade
rural, tenha preenchido de forma concomitante os requisitos no passado.
Confira-se:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE
RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE
TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER
PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º
combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que
estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural,
momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo
48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter
atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo
descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito.
Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os
requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.
2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência.
Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil."
(REsp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado
em 09/09/2015, DJe 10/02/2016)
Conclui-se, portanto, que para a concessão da aposentadoria por idade rural são necessários os
requisitos: idade mínima e prova do exercício da atividade laborativa pelo período previsto em lei,
no período imediatamente anterior ao que o segurado completa a idade mínima para se
aposentar.
Nos termos da Súmula de nº 149 do STJ, é necessário que a prova testemunhal venha
acompanhada de início razoável de prova documental: "A prova exclusivamente testemunhal não
basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Não se exige que a prova material se estenda por todo o período de carência, mas é
imprescindível que a prova testemunhal faça referência à época em que foi constituído o
documento (AR 4.094/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, TERCEIRA
SEÇÃO, julgado em 26/09/2012, DJe 08/10/2012).
A idade mínima exigida para a obtenção do benefício restou comprovada pela documentação
pessoal do autor, nascido em 03/01/49.
Para comprovar as suas alegações, o autor apresentou os seguintes documentos, dentre outros:
I) escritura pública de união estável, datada de 2011, na qual consta que vive em união estável
com Hélia de Souza Rodovalho, desde 1974; II) notas fiscais de produtor, datadas de 1987, 1991
e 1992, em nome da companheira.
É pacífico o entendimento dos Tribunais, considerando as difíceis condições dos trabalhadores
rurais, admitir a extensão da qualificação do cônjuge ou companheiro à esposa ou companheira.
Assim, a escritura pública de união estável constitui início de prova material.
Em se tratando de segurado especial, é necessário que a atividade seja comprovada através de
documentos que demonstrem o efetivo exercício do labor rural em regime de economia familiar,
como, por exemplo, aqueles elencados no art. 106 da Lei nº 8.213/91, ou outros que sirvam a tal
mister.
As notas fiscais de produtor servem como início de prova do regime de economia familiar.
No entanto, os extratos do CNIS demonstraram que o autor possui vários recolhimentos como
autônomo, e que sua companheira está cadastrada como empresária, no ramo de restaurantes,
desde 2001 (conforme comprovante de inscrição e situação cadastral – ID 1864794, págs. 75/76),
descaracterizando o regime de economia familiar, o qual pressupõe o exercício da atividade rural
em mútua colaboração e a fim de garantir a subsistência do grupo, sendo de rigor, portanto, a
improcedência do pedido.
Inverto o ônus da sucumbência e condeno a parte autora ao pagamento de honorários de
advogado, que ora fixo em 10% (dez por cento) do valor da causa atualizado, de acordo com o
§6º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, cuja exigibilidade, diante da assistência
judiciária gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98
do Código de Processo Civil/2015.
Revogo a antecipação de tutela anteriormente concedida. A questão referente à eventual
devolução dos valores recebidos a este título deverá ser analisada e decidida em sede de
execução, nos termos do artigo 302, I, e parágrafo único, do CPC/2015, e de acordo com o que
restar decidido no julgamento do Tema 692, pelo C. Superior Tribunal de Justiça.
Diante do exposto, dou provimento à apelação do INSS para julgar improcedente o pedido. Em
consequência, revogo a tutela antecipada.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR
RURAL. RECOLHIMENTOS COMO AUTÔNOMO. COMPANHEIRA CADASTRADA COMO
EMPRESÁRIA. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR DESCARACTERIZADO. INVERSÃO DO
ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. TUTELA ANTECIPADA REVOGADA.
1. Descaracterizado regime de economia familiar, considerando que o autor possui vários
recolhimentos como autônomo, e que sua companheira exerce atividade como empresária.
2. Inversão do ônus da sucumbência. Exigibilidade condicionada à hipótese do §3º do artigo 98
do CPC/2015.
3. Tutela antecipada revogada. A questão referente à eventual devolução dos valores recebidos a
este título deverá ser analisada e decidida em sede de execução, nos termos do artigo 302, I, e
parágrafo único, do CPC/2015, e de acordo com o que restar decidido no julgamento do Tema
692, pelo C. Superior Tribunal de Justiça.
4. Apelação provida para julgar improcedente o pedido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
