Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5003330-41.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
24/08/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 01/09/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR
RURAL. RESTABELECIMENTO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL INSUFICIENTE. EXTINÇÃO
SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. RESP REPETITIVO 1352721/SP. HONORÁRIOS DE
ADVOGADO.
1. O STJ, no RE 1352721/SP, decidiu que nos processos em que se pleiteia a concessão de
aposentadoria por idade, a ausência de prova material apta a comprovar o exercício da atividade
rural caracteriza carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo a
ensejar a extinção da ação sem exame do mérito.
2. Honorários de advogado. Fixação em 2% sobre o valor da causa. Exigibilidade condicionada à
hipótese do § 3º do artigo 98 do CPC/2015.
3. De ofício, processo extinto sem resolução de mérito. Apelação prejudicada.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5003330-41.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: IZOLETA ALVES DE SOUZA
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Advogado do(a) APELANTE: LUIS HENRIQUE DOS SANTOS PEREIRA - SP323572-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5003330-41.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: IZOLETA ALVES DE SOUZA
Advogado do(a) APELANTE: LUIS HENRIQUE DOS SANTOS PEREIRA - SP323572-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando o restabelecimento de aposentadoria rural por idade, a partir da
data da cassação do benefício, com pedido de antecipação de tutela.
A tutela foi indeferida e a sentença julgou improcedente o pedido. Não houve condenação em
honorários advocatícios.
A parte autora apelou, requerendo a procedência da ação.
Sem contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5003330-41.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: IZOLETA ALVES DE SOUZA
Advogado do(a) APELANTE: LUIS HENRIQUE DOS SANTOS PEREIRA - SP323572-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
A autora completou 55 anos em 09/03/87, na época em que os benefícios previdenciários dos
trabalhadores rurais eram disciplinados pela Lei Complementar nº 11/71. De acordo com tal
diploma legal, o rurícola, homem ou mulher, tinha direito à aposentadoria por idade quando
completasse 65 anos, desde que comprovasse o exercício da atividade rural pelo menos nos três
últimos anos anteriores ao requerimento do benefício, bem como a sua condição de chefe ou
arrimo de família, nos termos do artigo 4º da mencionada lei, e artigo 5º da Lei Complementar nº
16/73.
A partir da vigência da Lei nº 8.213/91, o rurícola deve comprovar 60 anos de idade, se homem, e
55, se mulher, além do exercício da atividade rural, de acordo com o disposto no seu artigo 142.
A autora completou 65 anos na vigência da Lei nº 8.213/91. Assim, faz jus à aposentadoria por
idade, de acordo com as novas regras - 60 anos de idade, se homem, e 55, se mulher - a partir
da vigência do mencionado diploma legal, considerando-se que já havia implementado o requisito
etário nessa data.
Em outras palavras, se o exercício da atividade rural se deu no prazo determinado na Lei nº
8.213/91 e o implemento da idade ocorrer na mesma época, as situações fáticas que importem na
aquisição de direito a benefício previdenciário, ainda que constituídas antes de sua vigência, se
subsumem aos seus efeitos jurídicos.
Portanto, a autora deve comprovar que exerceu atividade rural pelo período de 60 (sessenta)
meses, prazo considerado em 1991, ano em que a Lei nº 8.213/91 passou a vigorar, devendo
apresentar início de prova material do exercício de tal atividade, que deve ser corroborado por
prova testemunhal.
O artigo 39 da Lei n.º 8.213/91 prevê os benefícios devidos ao segurado especial. Estabelece,
ainda, que para a obtenção da aposentadoria por idade, o segurado especial deverá comprovar o
exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior
ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência, conforme
preceitua o artigo 39, inciso I, da lei mencionada. Em outras palavras, não é exigido o
cumprimento de carência do segurado especial, mas o efetivo exercício de atividade rural, na
forma especificada no dispositivo em comento.
O conceito de segurado especial é dado pelo artigo 11, inciso VII, da Lei n.º 8.213/91. A Lei n.º
11.718, de 20 de junho de 2008, estendeu ao seringueiro ou extrativista vegetal (que labore na
forma do art. 2º, caput, inciso XII da Lei n.º 9.985/2000), bem como ao pescador artesanal ou a
este assemelhado a condição de segurado especial.
O §1º do artigo 11 da Lei n.º 8.213/91 define o regime de economia familiar. É possível ao
segurado especial valer-se de empregados contratados, em épocas de safra, por no máximo 120
(cento e vinte) dias, nos termos do §7º do artigo acima referido. Por outro laudo, o §8º descreve
determinadas atividades que não descaracterizam a condição de segurado especial, enquanto os
incisos do §9º trazem um rol dos rendimentos que podem ser auferidos por membro do grupo
familiar, sem que este perca sua condição de segurado especial.
Ressalte-se que o entendimento atual do STJ, expresso no Recurso Especial n. 1.354.908/SP,
processado sob o rito dos recursos repetitivos, é no sentido de exigir que o segurado especial
esteja laborando no campo quando completar a idade mínima para se aposentar, ressalvada a
hipótese do direito adquirido, em que embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade
rural, tenha preenchido de forma concomitante os requisitos no passado.
Confira-se:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE
RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE
TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER
PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º
combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que
estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural,
momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo
48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter
atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo
descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito.
Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os
requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.
2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência.
Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil."
(REsp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado
em 09/09/2015, DJe 10/02/2016)
Conclui-se, portanto, que para a concessão da aposentadoria por idade rural são necessários os
requisitos: idade mínima e prova do exercício da atividade laborativa pelo período previsto em lei,
no período imediatamente anterior ao que o segurado completa a idade mínima para se
aposentar.
Nos termos da Súmula de nº 149 do STJ, é necessário que a prova testemunhal venha
acompanhada de início razoável de prova documental: "A prova exclusivamente testemunhal não
basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Não se exige que a prova material se estenda por todo o período de carência, mas é
imprescindível que a prova testemunhal faça referência à época em que foi constituído o
documento (AR 4.094/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, TERCEIRA
SEÇÃO, julgado em 26/09/2012, DJe 08/10/2012).
A idade mínima exigida para a obtenção do benefício restou comprovada pela documentação
pessoal da autora, nascida em 09/03/87.
Para comprovar as suas alegações, a autora apresentou: I) certidão de casamento, realizado em
1956, na qual não consta a sua qualificação profissional e nem a do marido; II) certidão de óbito
do marido, falecido em 2012, na qual figura como aposentado; III) registros imobiliários; IV) título
de eleitor do marido, datado de 1958, no qual figura como lavrador; V) declarações de ex-
empregadores.
É pacífico o entendimento dos Tribunais, considerando as difíceis condições dos trabalhadores
rurais, admitir a extensão da qualificação do cônjuge ou companheiro à esposa ou companheira.
Contudo, a certidão de casamento não serve como início de prova material da atividade rural,
tendo em vista que nela não consta a qualificação profissional da autora e nem a do marido, mas
serve para comprovar a união existente entre eles.
A certidão de óbito também não serve, pois nela o marido figura como aposentado.
Os registros imobiliários comprovam apenas a propriedade do imóvel rural.
As declarações de ex-empregadores não servem como início de prova material, configurando
apenas testemunhos escritos.
O título de eleitor, por sua vez, serve como início de prova material.
Contudo, observo que não há início de prova material da atividade rural no período
imediatamente anterior ao implemento do requisito etário.
Tendo em vista que o conjunto probatório foi insuficiente para a comprovação da atividade rural
da parte autora pelo período previsto em lei, de acordo com a técnica processual vigente, de rigor
seria a improcedência da ação.
Entretanto, o entendimento atual do STJ, expresso no Recurso Especial n. 1352721/SP,
processado sob o rito dos recursos repetitivos, é no sentido de que a ausência de prova no
processo previdenciário, no qual se pleiteia aposentadoria por idade dos rurícolas, implica em
extinção do processo sem resolução de mérito, proporcionando ao trabalhador rural a
possibilidade de ingressar com nova ação caso obtenha início de prova material suficiente à
concessão do benefício pleiteado.
Confira-se:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR
IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA
ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E
DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO
DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE DOS
ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO ESPECIAL
DO INSS DESPROVIDO.
1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os seus
procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas
previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em conta
os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto social
adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários.
2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais da
Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência
Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a
parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização
dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na hermenêutica
previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna, a fim de que as
normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental à prestação
previdenciária a que faz jus o segurado.
3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística
civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar
prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas
demandas.
4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual
garantido constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir
como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo
certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente
dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura
previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela
via da assistência social.
5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do
CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo,
impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente
possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos
necessários à tal iniciativa.
6. Recurso Especial do INSS desprovido."
Portanto, considerando o entendimento atual do STJ exarado em sede de recurso repetitivo, em
que pese a posição contrária deste relator o processo deve ser extinto sem resolução do mérito.
Tendo em vista o não provimento do recurso, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do
CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a condenação ao valor de 2%
sobre o valor da causa, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi
concedida, fica condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo
Civil/2015.
Diante do exposto, de ofício, julgo extinto o processo sem resolução de mérito, nos termos do
artigo 485, IV, do CPC/2015, ante a insuficiência de início de prova material do labor rural (REsp
1352721/SP), restando prejudicada a apelação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR
RURAL. RESTABELECIMENTO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL INSUFICIENTE. EXTINÇÃO
SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. RESP REPETITIVO 1352721/SP. HONORÁRIOS DE
ADVOGADO.
1. O STJ, no RE 1352721/SP, decidiu que nos processos em que se pleiteia a concessão de
aposentadoria por idade, a ausência de prova material apta a comprovar o exercício da atividade
rural caracteriza carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo a
ensejar a extinção da ação sem exame do mérito.
2. Honorários de advogado. Fixação em 2% sobre o valor da causa. Exigibilidade condicionada à
hipótese do § 3º do artigo 98 do CPC/2015.
3. De ofício, processo extinto sem resolução de mérito. Apelação prejudicada. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu, de ofício, julgar extinto o processo sem resolução de mérito, restando
prejudicada a apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
