
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0003623-62.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ALICE ROSA DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: NEIDE MACIEL ESTOLASKI - SP277515-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0003623-62.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ALICE ROSA DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: NEIDE MACIEL ESTOLASKI - SP277515-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou restabelecimento de auxílio-doença.
A sentença proferida em 25/05/2018 (fls.138 -ID89849602) julgou improcedente o pedido, sob o fundamento de ausência de incapacidade. Honorários advocatícios fixados em 10% do valor da condenação, observada a gratuidade da justiça.
Apela a parte autora sustenta, em síntese, que preenche os requisitos legais e pede a reforma do julgado, para a concessão do benefício. Requer a concessão da tutela de urgência.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0003623-62.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ALICE ROSA DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: NEIDE MACIEL ESTOLASKI - SP277515-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
É dizer: a incapacidade total e permanente para o exercício de atividade que garanta a subsistência enseja a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez; a incapacidade total e temporária para o exercício de atividade que garanta a subsistência justifica a concessão do benefício de auxílio-doença e a incapacidade parcial e temporária somente legitima a concessão do benefício de auxílio-doença se impossibilitar o exercício do labor ou da atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias pelo segurado.
A condição de segurado (obrigatório ou facultativo) decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes.
O artigo 15 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre as hipóteses de manutenção da qualidade de segurado, independentemente de contribuições; trata-se do denominado período de graça, durante o qual remanesce o direito a toda a cobertura previdenciária. Também é considerado segurado aquele que trabalhava, mas ficou impossibilitado de recolher contribuições previdenciárias em razão de doença incapacitante.
Nesse passo, acresça-se que no que toca à prorrogação do período de graça ao trabalhador desempregado, não obstante a redação do §2º do artigo 15 da Lei nº. 8.213/1991 mencionar a necessidade de registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social para tanto, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Interpretação de Lei Federal (Pet. 7.115), firmou entendimento no sentido de que a ausência desse registro poderá ser suprida quando outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal, se revelarem aptas a comprovar a situação de desemprego.
A perda da qualidade de segurado está disciplinada no §4º desse dispositivo legal, ocorrendo no dia seguinte ao do término do prazo para recolhimento da contribuição referente ao mês de competência imediatamente posterior ao final dos prazos para manutenção da qualidade de segurado.
Depreende-se, assim, que o segurado mantém essa qualidade por mais um mês e meio após o término do período de graça, independente de contribuição, mantendo para si e para os seus dependentes o direito aos benefícios previdenciários.
Anote-se que a eventual inadimplência das obrigações trabalhistas e previdenciárias acerca do tempo trabalhado como empregado deve ser imputada ao empregador, responsável tributário, conforme preconizado na alínea a do inciso I do artigo 30 da Lei nº 8.213/91, não sendo cabível a punição do empregado urbano pela ausência de recolhimentos, computando-se, assim, o período laborado para fins de verificação da qualidade de segurado.
Quanto à carência, exige-se o cumprimento de 12 (doze) contribuições mensais para a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, conforme prescreve a Lei n.º 8.213/91, em seu artigo 25, inciso I, in verbis: "Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;".
Por fim, não será devido o auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, exceto quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão (art. 42, § 2º e 59, § 1º da Lei 8213/91).
No caso concreto.
A autora, doméstica, com 57 anos de idade no momento da primeira perícia médica judicial, informa que é portadora de problemas clínicos e auditivos, condição que a torna incapaz para o trabalho.
O extrato do sistema Dataprev (fls.65 – ID89849602) indica que a parte autora ingressou no RGPS em 1996, vertendo recolhimentos como empregado doméstico, no período de 01/12/1996 a 30/09/2007, recebeu auxílio doença no período de 05/10/2007 a 05/06/2008, o que lhe garantiu a qualidade de segurado até 15/08/2009. Considerando o requerimento administrativo formulado em 29/09/2008, a toda evidência ostentava a qualidade de segurado e o cumprimento da carência.
O laudo médico pericial elaborado em 14/04/2014 (fls.125 – ID89849574), complementado em 20/06/2016 (fls.31 – ID89849602) e 26/08/2016 (fls.40 – ID 89849602) atesta que a autora é portadora de perda auditiva neurossensorial grave, que não pode ser atribuída a sua atividade profissional. Apresenta surdez severa, sem nenhuma possibilidade de tratamento (doença consolidada) e que a limita para algumas atividades laborativas e do dia a dia. Conclui pela incapacidade parcial e permanente para as atividades habituais, podendo ser adaptada para funções compatíveis com sua limitação. Indica o início da incapacidade em 2008.
Por sua vez, o INSS não logrou trazer quaisquer elementos aptos a ilidir a prova produzida pelo autor e a conclusão da perícia judicial, limitando-se a reafirmar a inexistência de incapacidade com base no laudo médico produzido na esfera administrativa, cuja presunção de veracidade não é absoluta.
Ainda que o médico perito tenha concluído pela existência de incapacidade parcial, depreende-se dos relatórios e atestados médicos apresentados que a parte autora está acometida de surdez severa e irreversível, o que torna a recuperação da capacidade laboral remota.
Cumpre salientar que em face da idade da autora, 63 anos atualmente, a incapacidade constatada, embora parcial, é fator relevante para o desenvolvimento de sua profissão de forma segura e eficiente. Nota-se que a parte autora exerce atividade braçal, ao menos desde 1996, e mesmo um eventual processo de reabilitação sofre grande restrição ao considerarmos a idade e o grau de escolaridade da requerente. O competitivo mercado de trabalho certamente dá prioridade à elementos jovens e totalmente aptos ao trabalho, especialmente na profissão exercida pelo autor, e desta forma, trata-se de medida razoável a concessão da aposentadoria por invalidez.
Desse modo, constatada a existência de incapacidade laboral total e permanente para a atividade habitual do requerente, de rigor a concessão do benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez.
O E. Superior Tribunal de Justiça, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil no REsp nº 1.369.165/SP, de relatoria do Ministro Benedito Gonçalves, assentou entendimento no sentido de que a citação válida é o marco inicial correto para a fixação do termo "a quo" de implantação de benefício de aposentadoria por invalidez/auxílio-doença concedido judicialmente, quando ausente prévio requerimento administrativo.
No mesmo sentido o teor da Súmula nº 576 daquela C. Corte Superior: “Ausente requerimento administrativo no INSS, o termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida judicialmente será a data da citação válida. (Súmula 576, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/06/2016, DJe 27/06/2016)”
Afasta-se, assim, a possibilidade de fixação do início do gozo do benefício na data em que realizado o laudo pericial judicial que constata a incapacidade, eis que tal ato constitui apenas prova produzida em juízo com o objetivo de constatar uma situação fática preexistente, não tendo, a princípio, o condão de estabelecer o termo a quo da benesse.
Desta feita, havendo requerimento administrativo e cessação indevida do respectivo benefício, fixo o termo inicial na data da cessação administrativa (05/06/2008), pois comprovado que havia incapacidade naquela data.
Observe-se a necessidade de compensação, no momento da liquidação, de valores referentes a benefícios inacumuláveis, pagos após o termo inicial ora fixado.
Para o cálculo dos juros de mora, aplicam-se os critérios estabelecidos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação. Quanto à correção monetária, acompanho o entendimento firmado pela Sétima Turma no sentido da aplicação do Manual de Cálculos, naquilo que não conflitar como o disposto na Lei nº 11.960/2009, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a partir de 29 de junho de 2009.
Inverto o ônus da sucumbência e condeno o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS ao pagamento de honorários de advogado fixados em 10% do valor da condenação, consoante o entendimento desta Turma e o disposto §§ 2º e 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Por fim, considerando o caráter alimentar das prestações reclamadas e que os recursos aos Tribunais Superiores não são dotados de efeito suspensivo (art. 995 CPC/2015), determino, com apoio nos artigos 300 e 497 do CPC/2015, a imediata implantação do benefício de aposentadoria por invalidez/auxílio doença, com data de início - DIB em 05/06/2008 e renda mensal inicial - RMI a ser apurada pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.
Para tanto, expeça-se ofício àquele órgão, instruído com os documentos do segurado, necessários para o cumprimento da ordem.
Diante do exposto, dou parcial provimento ao apelo da parte autora, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS PREENCHIDOS. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. TUTELA ANTECIPADA. CONCESSÃO IMEDIATA DO BENEFÍCIO.
1.Trata-se de ação objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou restabelecimento do auxílio doença previdenciário.
2.Laudo médico pericial indica a existência de incapacidade laboral total e permanente que enseja a concessão de aposentadoria por invalidez.
3.Carência cumprida. O conjunto probatório indica que a incapacidade apurada teve início enquanto a parte autora mantinha a qualidade de segurado.
4. Havendo requerimento administrativo e cessação indevida do respectivo benefício, fixo o termo inicial na data da cessação administrativa, pois comprovado que havia incapacidade naquela data.
5. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR - Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux, observado quanto a este o termo inicial a ser fixado pela Suprema Corte no julgamento dos embargos de declaração.
6. Honorários de advogado fixados em 10% do valor da condenação, consoante o entendimento desta Turma e o disposto §§ 2º e 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.
7. Apelação da parte autora provida em parte. Prestação de caráter alimentar. Implantação imediata do benefício. Tutela antecipada concedida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento ao apelo da parte autora e determinar a implantação imediata do benefício, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
