
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5732267-83.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: JOSE BRAZ CORREA
Advogados do(a) APELANTE: EDER WAGNER GONCALVES - SP210470-N, FRANCO RODRIGO NICACIO - SP225284-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5732267-83.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: JOSE BRAZ CORREA
Advogados do(a) APELANTE: EDER WAGNER GONCALVES - SP210470-N, FRANCO RODRIGO NICACIO - SP225284-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença.
A sentença proferida em 04/09/2018 (ID68648716) julgou improcedente o pedido, sob o fundamento de ausência de qualidade de segurado. Honorários advocatícios fixados em 10% do valor da causa, observada a gratuidade da justiça.
A parte autora apela, sustenta, em síntese, que preenche os requisitos legais e pede a reforma do julgado, para a concessão do benefício, bem como a concessão da antecipação da tutela.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5732267-83.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: JOSE BRAZ CORREA
Advogados do(a) APELANTE: EDER WAGNER GONCALVES - SP210470-N, FRANCO RODRIGO NICACIO - SP225284-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
É dizer: a incapacidade total e permanente para o exercício de atividade que garanta a subsistência enseja a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez; a incapacidade total e temporária para o exercício de atividade que garanta a subsistência justifica a concessão do benefício de auxílio-doença e a incapacidade parcial e temporária somente legitima a concessão do benefício de auxílio-doença se impossibilitar o exercício do labor ou da atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias pelo segurado.
A condição de segurado (obrigatório ou facultativo) decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes.
O artigo 15 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre as hipóteses de manutenção da qualidade de segurado, independentemente de contribuições; trata-se do denominado período de graça, durante o qual remanesce o direito a toda a cobertura previdenciária. Também é considerado segurado aquele que trabalhava, mas ficou impossibilitado de recolher contribuições previdenciárias em razão de doença incapacitante.
Nesse passo, acresça-se que no que toca à prorrogação do período de graça ao trabalhador desempregado, não obstante a redação do §2º do artigo 15 da Lei nº. 8.213/1991 mencionar a necessidade de registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social para tanto, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Interpretação de Lei Federal (Pet. 7.115), firmou entendimento no sentido de que a ausência desse registro poderá ser suprida quando outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal, se revelarem aptas a comprovar a situação de desemprego.
A perda da qualidade de segurado está disciplinada no §4º desse dispositivo legal, ocorrendo no dia seguinte ao do término do prazo para recolhimento da contribuição referente ao mês de competência imediatamente posterior ao final dos prazos para manutenção da qualidade de segurado.
Depreende-se, assim, que o segurado mantém essa qualidade por mais um mês e meio após o término do período de graça, independente de contribuição, mantendo para si e para os seus dependentes o direito aos benefícios previdenciários.
Anote-se que a eventual inadimplência das obrigações trabalhistas e previdenciárias acerca do tempo trabalhado como empregado deve ser imputada ao empregador, responsável tributário, conforme preconizado na alínea a do inciso I do artigo 30 da Lei nº 8.213/91, não sendo cabível a punição do empregado urbano pela ausência de recolhimentos, computando-se, assim, o período laborado para fins de verificação da qualidade de segurado.
Quanto à carência, exige-se o cumprimento de 12 (doze) contribuições mensais para a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, conforme prescreve a Lei n.º 8.213/91, em seu artigo 25, inciso I, in verbis: "Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;".
Por fim, não será devido o auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, exceto quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão (art. 42, § 2º e 59, § 1º da Lei 8213/91).
No caso concreto.
O autor, queimador de forno (olaria), com 64 anos de idade no momento da perícia médica judicial, informa que é portador de problemas psiquiátricos, condição que o torna incapaz para o trabalho.
O laudo pericial elaborado em 09/05/2018 (ID6868707) atesta que o autor é portador de transtornos mentais e físicos decorrentes de alcoolismo crônico há 42 anos, tendo sido apurado no exame físico deterioração das principais funções conativas relacionadas a memória, orientação, linguagem e comprovando tratamentos e acompanhamento por médico da família. Apresenta também profunda astenia decorrente provavelmente das neuropatias etílicas e conforme apurado a doença teria se agravado desde meados de 2013, a ponto do autor manifestar desorientação de trajeto, dificuldade de concentração e etc. Conclui pela incapacidade total e permanente para o trabalho. Indica a DID: meados de 2013 por agravação e DII: 27/07/15, conforme relatório médico.
O restante do conjunto probatório trazidos aos autos exames, receituários e relatórios médicos (ID68648682) corrobora a conclusão da perícia médica judicial no sentido da existência de incapacidade da parte autora.
Por sua vez, o INSS não logrou trazer quaisquer elementos aptos a ilidir a prova produzida pelo autor e a conclusão da perícia judicial, limitando-se a reafirmar a inexistência de incapacidade com base no laudo médico produzido na esfera administrativa, cuja presunção de veracidade não é absoluta.
O extrato do sistema Dataprev (ID68648689) indica que o autor ingressou no RGPS em 1985, mantendo vínculos empregatício, de forma descontínua, entre 02/09/1985 a 18/07/1995, e de forma ininterrupta, no período de 01/04/1996 a 31/01/2014, recebeu auxílio previdenciário de 05/06/1994 a 21/06/1994, de 06/03/2008 a 24/03/2008 e efetuou recolhimento como facultativo no período de 01/07/2016 a 31/07/2016.
Considerando o último vínculo empregatício encerrado em 31/01/2014, tem-se que o autor manteve a qualidade de segurado até 15/03/2017, já considerada a extensão do período de graça em razão do desemprego e pelo recolhimento de mais de 120 contribuições ininterruptas, nos termos do art. 15, § 1° e 2º, da Lei nº 8.213/91, assim detinha a qualidade de segurado na data dos requerimentos administrativos (29/07/2015 e 15/08/2016) e na data de início da incapacidade (27/07/2015).
Ressalte-se que, apesar do registro junto ao Ministério do Trabalho e da Previdência Social constituir prova absoluta da situação de desemprego, tal fato também poderá ser comprovado por outros meios de prova, nos termos da Súmula nº 27, da Turma de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais, que dispõe: "A ausência de registro em órgão do Ministério do Trabalho não impede a comprovação de desemprego por outros meios admitidos em Direito".
Assim, o fato de não haver novo vínculo de emprego na CTPS do segurado, bem como no banco de dados da autarquia, é suficiente para presumir a condição de desempregado.
Nesse sentido:
"PREVIDENCIÁRIO. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO. MANUTENÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO. ART. 15 DA LEI 8.213/91. CONDIÇÃO DE DESEMPREGADO. DISPENSA DO REGISTRO PERANTE O MINISTÉRIO DO TRABALHO E DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. COMPROVAÇÃO DA SITUAÇÃO DE DESEMPREGO POR OUTROS MEIOS DE PROVA. 1. Conforme o art. 15, II, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91, é mantida a qualidade de segurado nos 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, podendo ser prorrogado por mais 12 (doze) meses se comprovada a situação por meio de registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social. 2. Segundo entendimento da Terceira Seção desta Corte, a ausência de registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social poderá ser suprido quando for comprovada a situação de desemprego por outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal. 3. Demonstrado na instância ordinária que o segurado era incapaz para o desempenho de qualquer atividade, bem como seu desemprego, é possível a extensão do período de graça por mais 12 meses, nos termos do art. 15, § 2º, da Lei n. 8.213/1991. Precedentes. 4. Agravo regimental improvido."(STJ, AgRg na Pet 8694/PR, Rel. Min. Jorge Mussi, 3ª Seção, DJe 09.10.2012)
"AGRAVO. PENSÃO POR MORTE. REQUISITOS LEGAIS PREENCHIDOS. ART. 74 DA LEI Nº 8.213/91 AGRAVO IMPROVIDO. (...)3. Verificando a condição de segurado do de cujus, no caso dos autos, o documento de fls. 16/23 reconhece trabalho com registro em carteira até 17/02/1988, sendo certo que o falecido foi beneficiário de auxílio-doença de 08/10/1988 a 22/11/1996 (fl. 67), data a partir da qual se presume o desemprego do segurado, ante a ausência de novo vínculo laboral registrado em CTPS. Ressalte-se que a jurisprudência majoritária dispensa o registro do desemprego no Ministério do Trabalho e da Previdência Social para fins de manutenção da qualidade de segurado nos termos do art. 15, §2º, da Lei 8.213/1991, se aquele for suprido por outras provas constantes dos autos. 4. Agravo improvido.(TRF da 3ª Região; AC 14051960919984036113; Sétima Turma; Rel. Des. Federal Roberto Haddad; v.u.; e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/06/2012 )".
Demonstrada a existência de incapacidade total e permanente, a qualidade de segurado e carência, de rigor a concessão/manutenção da aposentadoria por invalidez.
O E. Superior Tribunal de Justiça, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil no REsp nº 1.369.165/SP, de relatoria do Ministro Benedito Gonçalves, assentou entendimento no sentido de que a citação válida é o marco inicial correto para a fixação do termo "a quo" de implantação de benefício de aposentadoria por invalidez/auxílio-doença concedido judicialmente, quando ausente prévio requerimento administrativo.
Desta feita, havendo requerimento administrativo em 29/07/2015 (ID68648683), este é o termo inicial do benefício, eis que a incapacidade já estava presente nessa data.
Para o cálculo dos juros de mora, aplicam-se os critérios estabelecidos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação. Quanto à correção monetária, acompanho o entendimento firmado pela Sétima Turma no sentido da aplicação do Manual de Cálculos, naquilo que não conflitar como o disposto na Lei nº 11.960/2009, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a partir de 29 de junho de 2009.
Inverto o ônus da sucumbência e condeno o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS ao pagamento de honorários de advogado fixados em 10% do valor da condenação, consoante o entendimento desta Turma e o disposto §§ 2º e 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Por fim, considerando o caráter alimentar das prestações reclamadas e que os recursos aos Tribunais Superiores não são dotados de efeito suspensivo (art. 995 CPC/2015), determino, com apoio nos artigos 300 e 497 do CPC/2015, a imediata implantação do benefício de aposentadoria por invalidez, com data de início - DIB em 29/07/2015 e renda mensal inicial - RMI a ser apurada pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.
Para tanto, expeça-se ofício àquele órgão, instruído com os documentos do segurado, necessários para o cumprimento da ordem.
Diante do exposto, dou provimento ao apelo da parte autora, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS PREENCHIDOS. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. TUTELA ANTECIPADA. IMPLANTAÇÃO IMEDIATA DO BENEFÍCIO.
1.Trata-se de ação objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou do auxílio doença previdenciário.
2.Laudo médico pericial indica a existência de incapacidade laboral total e permanente que enseja a concessão de auxílio-doença.
3.Carência cumprida. O conjunto probatório indica que a incapacidade apurada teve início enquanto a parte autora mantinha a qualidade de segurado.
4. Havendo requerimento administrativo este é o termo inicial do benefício.
5. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR - Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux, observado quanto a este o termo inicial a ser fixado pela Suprema Corte no julgamento dos embargos de declaração. Correção de ofício.
6. Honorários de advogado fixados em 10% do valor da condenação, consoante o entendimento desta Turma e o disposto §§ 2º e 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.
7. Apelação da parte autora provida. Prestação de caráter alimentar. Implantação imediata do benefício. Tutela antecipada concedida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu dar provimento ao apelo da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
