Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5000041-52.2017.4.03.6114
Data do Julgamento
06/12/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 10/12/2019
Ementa
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
AO PORTADOR DE DEFICIÊNCIA. ENQUADRAMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO.
REQUISITOS PREENCHIDOS. APELAÇÃO AUTÁRQUICA CONHECIDA E NÃO PROVIDA.
APELAÇÃO DA PARTE AUTORA CONHECIDA E PROVIDA.
- Discute-se o atendimento das exigências à concessão de aposentadoria por tempo de
contribuição ao portador de deficiência, após reconhecimento de vínculos especiais.
- Insta frisar não ser o caso de ter por interposta a remessa oficial, por ter sido proferida a
sentença na vigência do Novo CPC, cujo artigo 496, § 3º, I, afasta a exigência do duplo grau de
jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1000 (mil) salários-
mínimos.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim
enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo",
independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
- Em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista no artigo
28 da Lei n. 9.711/98, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e
conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/80.
- Até a entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei n.
9.032/95, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação de
laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário
preenchido pelo empregador (SB-40 ou DSS-8030), para atestar a existência das condições
prejudiciais. Contudo, para o agente agressivo o ruído, sempre houve necessidade da
apresentação de laudo técnico.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997. Nesse sentido: Recurso
Especial n. 1.398.260, sob o regime do artigo 543-C do CPC, do C. STJ.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
- Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/98 (convertida na Lei n. 9.732/98), foi inserida na
legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do
trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
- Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover
o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
- Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em
regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a
nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto,
divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a
nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição
do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade
do agente.
- Sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico
Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou
não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de
preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à
real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
- Quanto aos intervalos de 14/03/1988 a 05/03/1997 e 19/11/2003 a 19/2/2015, consta Perfil
Profissiográfico Previdenciário, o qual anota a exposição, habitual e permanente, a ruído superior
aos limites de tolerância previstos na norma em comento e agentes químicos deletérios.
- Os períodos citados devem ser enquadrados como atividade especial.
- Para a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição ao portador de
deficiência, nos termos da Lei Complementar n. 142/2013, devem ser preenchidos os requisitos
fixados no artigo 3º.
- Nos termos do § 1º do artigo 70-F do Decreto 3048/99, é garantida a conversão do tempo de
contribuição cumprido em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física
do segurado, inclusive da pessoa com deficiência, para fins da aposentadoria de que trata o art.
70-B, se resultar mais favorável ao segurado, conforme tabela, ajustando a aposentadoria de 25
anos de atividade (especial) para 33 anos (deficiência em grau leve), através do fator 1,32.
- Não se confunde o regra do artigo 70-F, que proíbe a cumulação das reduções, a qual, in casu,
seria aplicar o fator 1,4 ao tempo especial desempenhado na condição de portador de deficiência
em grau leve.
- Feitos os ajustes nos termos do Artigo 70-E e 70-F, e parágrafos do Decreto n. 3.048/99, o autor
contava mais de 34 anos de tempo de serviço, necessários para a concessão do benefício em
contenda, visto ser portador de deficiência em grau leve.
- Apelação do INSS conhecida e não provida.
- Apelação da parte autora conhecida e provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000041-52.2017.4.03.6114
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: SANTOS JOSE DOS REIS
Advogados do(a) APELADO: ERON DA SILVA PEREIRA - SP208091-A, ERON DA SILVA
PEREIRA JUNIOR - SP334172-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO (198) Nº 5000041-52.2017.4.03.6114
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: SANTOS JOSE DOS REIS
Advogados do(a) APELADO: ERON DA SILVA PEREIRA JUNIOR - SP180712-A, ERON DA
SILVA PEREIRA - SP208091-A
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de ação de conhecimento
proposta em face do INSS, na qual a parte autora busca o enquadramento de atividade especial,
com vistas à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição ao portador de deficiência.
A r. sentença julgou parcialmente procedente o pedido, para (i) reconhecer o tempo especial nos
períodos de 14/03/1988 a 05/03/1997 e 19/11/2003 a 06/03/2010; (ii) considerar a deficiência em
grau leve no período de 07/03/2010 a 20/05/2015; e (iii) conceder o benefício de aposentadoria
por tempo de contribuição a pessoa com deficiência (grau leve), desde a DER feita em
03/06/2016, acrescida de juros de mora, correção monetária e honorários advocatícios a serem
fixados na liquidação da sentença.
Inconformada, a autarquia interpôs apelação na qual alega, em síntese, a improcedência dos
pedidos.
Por seu turno, apela a parte autora requerendo o enquadramento do interstício de 7/3/2010 a
20/5/2015.
Com as contrarrazões, os autos subiram a esta E. Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO (198) Nº 5000041-52.2017.4.03.6114
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: SANTOS JOSE DOS REIS
Advogados do(a) APELADO: ERON DA SILVA PEREIRA JUNIOR - SP180712-A, ERON DA
SILVA PEREIRA - SP208091-A
V O T O
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço dos recursos, porquanto
presentes os requisitos de admissibilidade.
Insta frisar não ser o caso de ter por interposta a remessa oficial, por ter sido proferida a sentença
na vigência do Novo CPC, cujo artigo 496, § 3º, I, afasta a exigência do duplo grau de jurisdição
quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1000 (mil) salários-mínimos.
No presente caso, a toda evidência não se excede esse montante.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a
seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais
obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum,
observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os
trabalhadores assim enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer
tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/98, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento
e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/80.
Nesse sentido, reporto-me à jurisprudência firmada pelo Colendo STJ:
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO
ESPECIAL EM COMUM. AUSÊNCIA DE LIMITAÇÃO AO PERÍODO TRABALHADO.
1. Com as modificações legislativas acerca da possibilidade de conversão do tempo exercido em
atividades insalubres, perigosas ou penosas, em atividade comum, infere-se que não há mais
qualquer tipo de limitação quanto ao período laborado, ou seja, as regras aplicam-se ao trabalho
prestado em qualquer período, inclusive após 28/05/1998. Precedente desta 5.ª Turma.
2. Recurso especial desprovido."
(STJ; REsp 1010028/RN; 5ª Turma; Rel. Ministra Laurita Vaz; julgado em 28/2/2008; DJe
7/4/2008)
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997,
regulamentador da Lei n. 9.032/95, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas
hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial,
pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a
existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, ressalto que vinha adotando a posição de que o enquadramento pela categoria
profissional no rol dos Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79 também era possível até a entrada em
vigor do referido Decreto n. 2.172/97. Entretanto, verifico que a jurisprudência majoritária, a qual
passo a adotar, tanto nesta Corte quanto no e. STJ, assentou-se no sentido de que o
enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei n.
9.032/95). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN,
SEGUNDA TURMA, julgado em 06/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente
agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial,
independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a
edição do Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos n.
83.080/79 e n. 53.831/64 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n. 2.172/97.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento
da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu
nova redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social,
aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo
à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro
de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art.
543-C do CPC, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do
decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para
configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/98 (convertida na Lei n. 9.732/98), foi inserida na
legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do
trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o
enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em
regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a
nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto,
divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a
nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição
do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade
do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão
somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas
instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação
não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
No caso em tela, quanto aos intervalos de 14/03/1988 a 05/03/1997 e 19/11/2003 a 19/2/2015,
consta Perfil Profissiográfico Previdenciário, o qual anota a exposição, habitual e permanente, a
ruído superior aos limites de tolerância previstos na norma em comento e agentes químicos
deletérios.
Desse modo, os períodos citados devem ser enquadrados como atividade especial.
Ademais, para a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição ao portador
de deficiência, nos termos da Lei Complementar n. 142/2013, devem ser preenchidos os
requisitos fixados no artigo 3º, in verbis:
"Art. 3º É assegurada a concessão de aposentadoria pelo RGPS ao segurado com deficiência,
observadas as seguintes condições:
I - aos 25 (vinte e cinco) anos de tempo de contribuição, se homem, e 20 (vinte) anos, se mulher,
no caso de segurado com deficiência grave;
II - aos 29 (vinte e nove) anos de tempo de contribuição, se homem, e 24 (vinte e quatro) anos, se
mulher, no caso de segurado com deficiência moderada;
III - aos 33 (trinta e três) anos de tempo de contribuição, se homem, e 28 (vinte e oito) anos, se
mulher, no caso de segurado com deficiência leve; ou
IV - aos 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se
mulher, independentemente do grau de deficiência, desde que cumprido tempo mínimo de
contribuição de 15 (quinze) anos e comprovada a existência de deficiência durante igual período."
Consoante perícia realizada pela própria autarquia, foi identificada incapacidade de grau leve no
período de 7/3/2010 a 18/7/2016, fl. 102.
Vale explicitar, ainda, que nos termos do § 1º do artigo 70-F do Decreto 3048/99, é garantida a
conversão do tempo de contribuição cumprido em condições especiais que prejudiquem a saúde
ou a integridade física do segurado, inclusive da pessoa com deficiência, para fins da
aposentadoria de que trata o art. 70-B, se resultar mais favorável ao segurado, conforme tabela,
ajustando a aposentadoria de 25 anos de atividade (especial) para 33 anos (deficiência em grau
leve), através do fator 1,32.
Assim, não se confunde o regra do artigo 70-F, que proíbe a cumulação das reduções, a qual, in
casu, seria aplicar o fator 1,4 ao tempo especial desempenhado na condição de portador de
deficiência em grau leve.
Por conseguinte, feitos os ajustes nos termos dos Artigos 70-E e 70-F, e parágrafos do Decreto n.
3.048/99, o autor contava mais de 34 anos de tempo de serviço.
Por conseguinte, viável a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição a
portador de deficiência.
Diante do exposto, conheço da apelação do INSS e lhe nego provimento, bem como conheço da
apelação da parte autora e lhe dou provimento para, nos termos da fundamentação, também
enquadrar como atividade especial o intervalo de 7/3/2010 a 19/2/2015.
É o voto.
VOTO-VISTA
Pedi vista dos autos para melhor analisar a questão relativa à comprovação dos requisitos
necessários à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição à pessoa com deficiência.
O senhor Relator negou provimento à apelação do INSS e deu provimento à apelação da parte
autora para reconhecer como especial o período de 7/3/2010 a 19/2/2015 e conceder a
aposentadoria por tempo de contribuição de pessoa com deficiência.
O benefício pretendido é concedido ao segurado da Previdência Social com deficiência grave,
moderada ou leve, que comprove o recolhimento de contribuições previdenciárias pelo período
respectivo. Trata-se de benefício que não tem o requisito da idade mínima, mas que impõe a
comprovação do grau de deficiência. Tudo na forma do disposto na Lei 13.146, de 06.07. 2015
(Estatuto da Pessoa com Deficiência) e na Lei Complementar 142, de 08.05.2013.
O conceito de pessoa com deficiência é dado pelo art. 2º da LC 142/2013: aquela que tem
impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em
interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade
em igualdade de condições com as demais pessoas.
O art. 3º da mesma Lei Complementar estabelece que a deficiência tem graus: leve, moderada e
grave.
A LC 142/2013 foi regulamentada pelo Decreto 8.145, de 03.12.2013, que estabeleceu que os
impedimentos de longo prazo seriam definidos por Ato Conjunto do Ministro de Estado Chefe da
Secretaria de Recursos Humanos da Presidência da República, dos Ministros de Estados da
Previdência Social, da Fazenda, do Planejamento, Orçamento e Gestão e do Advogado-Geral da
União, o que se concretizou com a edição da Portaria Interministerial AGU/MPS/MF/SEDH/MP n.
1, de 27.01.2014, que deu o conceito de impedimento de longo prazo: aquele que produza efeitos
de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos, contados
de forma ininterrupta.
Cabe às perícias médica e social, administrativa ou judicial, avaliar a condição de deficiência, cujo
grau será fixado considerando os aspectos médico e funcional. Perícia complexa que não se
esgota apenas na constatação da condição e grau de deficiência, mas que impõe a avaliação de
suas consequências na participação plena no grupo social.
Considerando a complexidade da avaliação, a avaliação dos graus de deficiência é feita na forma
do art. 2º da Portaria Interministerial AGU/MPS/MF/SEDH/MP n. 1/2014:
Art. 2º Compete à perícia própria do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, por meio de
avaliação médica e funcional, para efeito de concessão da aposentadoria da pessoa com
deficiência, avaliar o segurado e fixar a data provável do início da deficiência e o respectivo grau,
assim como identificar a ocorrência de variação no grau de deficiência e indicar os respectivos
períodos em cada grau.
§ 1º A avaliação funcional indicada no caput será realizada com base no conceito de
funcionalidade disposto na Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde -
CIF, da Organização Mundial de Saúde, e mediante a aplicação do Índice de Funcionalidade
Brasileiro Aplicado para Fins de Aposentadoria - IFBrA, conforme o instrumento anexo a esta
Portaria.
§ 2º A avaliação médica e funcional, disposta no caput, será realizada pela perícia própria do
INSS, a qual engloba a pericia médica e o serviço social, integrantes do seu quadro de servidores
públicos.
§ 3º O instrumento de avaliação médica e funcional, destinado a avaliar o segurado, e constante
do anexo a esta Portaria, será objeto de revisão por instância técnica específica instituída no
âmbito do Ministério da Previdência Social, no prazo máximo de um ano, a contar da data de
publicação deste ato normativo, podendo haver revisões posteriores.
O Anexo da referida Portaria traz o Índice de Funcionalidade Brasileiro – IF-BrA que deve ser
aplicado para fins de classificação e concessão da aposentadoria da pessoa com deficiência.
Oportuno citar (José Ricardo Caetano Costa, Perícia biopsicossocial: aplicabilidade, metodologia,
casos concretos. São Paulo, LTr, 2018, p.37-38):
“(...) No rumo que estamos seguindo já é possível dizer que o ato pericial não pode se esgotar
somente na avaliação das funções e estruturas do corpo. Estas, diga-se, são facilmente
avaliáveis por meio de uma perícia médica.
Ocorre que o conceito de incapacidade e deficiência sofreu uma significativa alteração no último
decênio, notadamente a partir de 2001 quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) emitiu a
Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde.
O fundamento desta classificação, que deve ser vista conjuntamente com a CID-10, vez que esta
fornece um modelo etiológico das condições de saúde, repousa na fixação dos critérios de
avaliação fundados em dois domínios: funções e estruturas do corpo e atividades e participação.
A CIF propõe a análise da incapacidade e da funcionalidade por meio de uma interação dinâmica
de diversos fatores, como já acenamos. Nos Fatores Contextuais encontramos os fatores
ambientais e pessoais, sendo que estes últimos interagem com todos os componentes da
funcionalidade e da incapacidade. Vale relembrar, pela importância que assumem nesta
concepção, os conceitos de incapacidade e de funcionalidade: no termo incapacidade estão
presentes as deficiências, limitações de atividades ou restrições na participação, enquanto no
termo funcionalidade estão presentes todas as funções do corpo, atividades e participação (...)”
(destaques originais).
O caso dos autos.
O autor requereu ao INSS o benefício em 03.06.2016, considerando a deficiência em grau leve,
por entender que contava com mais de 33 (trinta e três) anos de contribuição.
O INSS considerou a deficiência como leve no período de 07.03.2010 a 03.06.2016, mas
indeferiu o benefício requerido ao fundamento de insuficiência de tempo de contribuição, uma vez
que apurados apenas 25 anos, 06 meses e 08 dias.
O autor alegou que o INSS não considerou como especiais os períodos de 14.03.1988 a
05.03.1997 e de 19.11.2003 a 19.02.2015, razão pela qual não fez a devida conversão, e também
não averbou períodos de atividade urbana em outras empresas.
Os períodos especiais, se considerados, somariam aos demais tempo de contribuição superior a
33 (trinta e três) anos.
Em consulta ao CNIS, ora anexada, verifica-se que o autor esteve em gozo de cobertura
previdenciária decorrente de acidente do trabalho (auxílio-doença e auxílio-acidente) de
22.10.2010 a 02.06.2016, sendo que obteve aposentadoria por tempo de contribuição (B42) a
partir de 03.06.2016, cessado o auxílio-acidente, tendo, inclusive, recebido valores em atraso em
08.01.2018, estando em gozo do benefício.
Portanto, houve reconhecimento administrativo posterior do direito ao B42, com pagamento de
atrasados.
Acompanho o senhor Relator em relação ao reconhecimento e conversão dos períodos de
atividade especial, bem como nos demais pedidos.
Com relação à concessão da aposentadoria por contribuição de pessoa com deficiência faço
apenas uma ressalva porque a deficiência e a incapacidade são conceitos totalmente distintos,
que não podem ser tratados como sinônimos.
Reconhecido o direito ao benefício requerido na inicial e estando o autor em gozo de B42, penso
ser o caso de se dar a ele o direito de optar pelo benefício que considerar mais vantajoso.
Com essas considerações, Acompanho o senhor Relator com ressalva em relação ao
entendimento adotado sobre a equiparação conceitual entre deficiência e incapacidade,
reconhecendo o direito do autor à opção pelo benefício mais vantajoso.
É o voto.
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
AO PORTADOR DE DEFICIÊNCIA. ENQUADRAMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO.
REQUISITOS PREENCHIDOS. APELAÇÃO AUTÁRQUICA CONHECIDA E NÃO PROVIDA.
APELAÇÃO DA PARTE AUTORA CONHECIDA E PROVIDA.
- Discute-se o atendimento das exigências à concessão de aposentadoria por tempo de
contribuição ao portador de deficiência, após reconhecimento de vínculos especiais.
- Insta frisar não ser o caso de ter por interposta a remessa oficial, por ter sido proferida a
sentença na vigência do Novo CPC, cujo artigo 496, § 3º, I, afasta a exigência do duplo grau de
jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1000 (mil) salários-
mínimos.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim
enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo",
independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
- Em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista no artigo
28 da Lei n. 9.711/98, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e
conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/80.
- Até a entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei n.
9.032/95, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação de
laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário
preenchido pelo empregador (SB-40 ou DSS-8030), para atestar a existência das condições
prejudiciais. Contudo, para o agente agressivo o ruído, sempre houve necessidade da
apresentação de laudo técnico.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997. Nesse sentido: Recurso
Especial n. 1.398.260, sob o regime do artigo 543-C do CPC, do C. STJ.
- Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/98 (convertida na Lei n. 9.732/98), foi inserida na
legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do
trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
- Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover
o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
- Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em
regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a
nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto,
divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a
nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição
do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade
do agente.
- Sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico
Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou
não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de
preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à
real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
- Quanto aos intervalos de 14/03/1988 a 05/03/1997 e 19/11/2003 a 19/2/2015, consta Perfil
Profissiográfico Previdenciário, o qual anota a exposição, habitual e permanente, a ruído superior
aos limites de tolerância previstos na norma em comento e agentes químicos deletérios.
- Os períodos citados devem ser enquadrados como atividade especial.
- Para a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição ao portador de
deficiência, nos termos da Lei Complementar n. 142/2013, devem ser preenchidos os requisitos
fixados no artigo 3º.
- Nos termos do § 1º do artigo 70-F do Decreto 3048/99, é garantida a conversão do tempo de
contribuição cumprido em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física
do segurado, inclusive da pessoa com deficiência, para fins da aposentadoria de que trata o art.
70-B, se resultar mais favorável ao segurado, conforme tabela, ajustando a aposentadoria de 25
anos de atividade (especial) para 33 anos (deficiência em grau leve), através do fator 1,32.
- Não se confunde o regra do artigo 70-F, que proíbe a cumulação das reduções, a qual, in casu,
seria aplicar o fator 1,4 ao tempo especial desempenhado na condição de portador de deficiência
em grau leve.
- Feitos os ajustes nos termos do Artigo 70-E e 70-F, e parágrafos do Decreto n. 3.048/99, o autor
contava mais de 34 anos de tempo de serviço, necessários para a concessão do benefício em
contenda, visto ser portador de deficiência em grau leve.
- Apelação do INSS conhecida e não provida.
- Apelação da parte autora conhecida e provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo no
julgamento, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS e dar
provimento à apelação da parte autora. A Desembargadora Federal Marisa Santos, pelo voto-
vista, acompanhou o Relator com ressalva de entendimento pessoal. Lavrará acórdão o Relator
Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias
, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
