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PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
10ª TurmaAPELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006985-52.2020.4.03.6183 RELATOR: Gab. 34 - DES. FED. MAURICIO KATO APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: LUIZ ISRAEL DA COSTA Advogado do(a) APELADO: CICERO DONISETE DE SOUZA BRAGA - SP237302-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I OTrata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em face da sentença que julgou procedente o pedido formulado por LUIZ ISRAEL DA COSTA. A decisão de primeiro grau reconheceu como tempo de serviço especial os períodos em que o autor laborou como vigilante/segurança e como Policial Militar do Estado de São Paulo (ID 263654378). O INSS opôs embargos de declaração (ID 263654381), que foram acolhidos para integrar a sentença (ID 263654633), sem, contudo, alterar o resultado do julgamento. Ao final, o INSS foi condenado a conceder o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, com data de início em 16/02/2019 (DER) e a pagar os valores em atraso, com antecipação dos efeitos da tutela. Em suas razões recursais, o INSS pleiteia a reforma da sentença. Sustenta, em preliminar, sua ilegitimidade passiva para a causa no que tange ao período de serviço militar. No mérito, argumenta a impossibilidade de conversão de tempo especial para fins de contagem recíproca; a ausência de comprovação da periculosidade na atividade de vigilante e a falta de fonte de custeio. Requer o conhecimento da remessa oficial e a concessão de efeito suspensivo ao recurso. Subsidiariamente, pleiteia a observância da prescrição quinquenal, a adequação dos consectários legais e dos honorários, a isenção de custas e a exigência de declaração de não acumulação de benefícios (ID 263654635). Não houve apresentação de contrarrazões. É o relatório. V O T OJUÍZO DE ADMISSIBILIDADEO recurso de apelação interposto pelo INSS preenche os requisitos de admissibilidade e, portanto, deve ser conhecido. DO EFEITO SUSPENSIVO REQUERIDO O INSS requer a atribuição de efeito suspensivo à apelação para sobrestar a tutela de urgência concedida na sentença. O pedido não comporta acolhimento. O artigo 1.012, § 1º, V, do Código de Processo Civil, estabelece de forma expressa que a sentença que confirma, concede ou revoga a tutela provisória começa a produzir efeitos imediatamente após a sua publicação, não se sujeitando à regra geral do efeito suspensivo da apelação. A suspensão de sua eficácia é medida excepcional, cabível apenas se demonstrada a probabilidade de provimento do recurso ou, sendo relevante a fundamentação, houver risco de dano grave ou de difícil reparação (art. 1.012, § 4º, CPC), circunstâncias que não se verificam no caso em concreto. DO REEXAME NECESSÁRIOO INSS pugna pela submissão do julgado ao reexame necessário. Contudo, a sentença afastou expressamente sua incidência, ao consignar que "é patente que o proveito econômico certamente não atingirá, nesta data, o limite legal indicado no inciso I do § 3º do artigo 496 do CPC". De fato, em matéria previdenciária, o valor da condenação, ainda que ilíquido, é facilmente mensurável por cálculo aritmético. Dessa forma, quando evidente que o montante não superará o teto de 1.000 (mil) salários mínimos, a dispensa do reexame necessário é medida correta. Assim, a sentença não está sujeita ao duplo grau de jurisdição, razão pela qual não conheço da remessa necessária. DA PRESCRIÇÃO QUINQUENALEm matéria de prestações de trato sucessivo, como as previdenciárias, a prescrição não atinge o fundo de direito, mas apenas as parcelas vencidas antes do quinquênio que antecede o ajuizamento da ação, nos termos da Súmula 85 do STJ. Tendo a ação sido ajuizada em 03/06/2020, para postular benefício com DER em 16/02/2019, não há parcelas atingidas pela prescrição. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA "AD CAUSAM" E DA CONTAGEM RECÍPROCA DE TEMPO ESPECIAL A autarquia previdenciária suscita sua ilegitimidade passiva para analisar e converter o tempo de serviço especial prestado pelo autor como Policial Militar do Estado de São Paulo (11/07/1987 a 22/08/1995), por se tratar de vínculo estatutário, sujeito a Regime Próprio de Previdência Social (RPPS). A preliminar não prospera. A Constituição Federal, em seu artigo 201, § 9º, assegura a contagem recíproca do tempo de contribuição entre os diferentes regimes, com a devida compensação financeira entre eles, mecanismo este disciplinado pela Lei nº 9.796/99. O objetivo da norma constitucional é garantir que o trabalhador que migra entre o serviço público e a iniciativa privada não perca o tempo de contribuição já vertido. Seria um contrassenso interpretativo admitir a averbação do tempo comum prestado em regime próprio, mas vedar a análise da natureza desse mesmo tempo sob a ótica do regime que irá conceder o benefício. A análise da especialidade, neste contexto, não se submete às regras do regime de origem, mas sim às do regime instituidor, o Regime Geral de Previdência Social (RGPS), ao qual o segurado está filiado no momento do requerimento. A Súmula Vinculante nº 33 do Supremo Tribunal Federal, ao aplicar as regras do RGPS para a aposentadoria especial de servidores públicos, já sinalizou a necessidade de diálogo e harmonização entre os sistemas. Na mesma linha, o Tema 278 da TNU reconheceu a possibilidade de contagem especial de tempo celetista prestado a ente público. Ademais, a 3ª Seção deste Tribunal Regional Federal, no julgamento da Ação Rescisória nº 5013982-39.2021.4.03.0000 (j. 27/02/2025), reconheceu a existência de sólidos fundamentos jurídicos para amparar a legitimidade do INSS em casos como o presente. No que se refere ao custeio, essa questão se resolve pelo sistema de compensação financeira, previsto no artigo 94 da Lei nº 8.213/91. Por tais fundamentos, rejeito a preliminar. DA INAPLICABILIDADE DO TEMA 1209/STF O julgamento deste processo não é afetado pela suspensão nacional determinada no âmbito do Tema 1209 da Repercussão Geral do Supremo Tribunal Federal (RE 1.368.225). A controvérsia ali discutida refere-se ao reconhecimento da atividade de vigilante como especial para períodos posteriores à Lei nº 9.032/95. No presente caso, todos os períodos pleiteados são anteriores a 28 de abril de 1995, regidos pela legislação que permitia o enquadramento por categoria profissional, matéria que não é objeto do referido tema. MÉRITO4.1. Do Reconhecimento da Atividade Especial A controvérsia de mérito reside no enquadramento, como especial, do labor exercido pelo autor como vigilante, segurança e policial militar. O benefício foi indeferido na via administrativa por "Falta de tempo de contribuição" (ID 263654352), ante a não apresentação de documentos que caracterizassem a especialidade. A legislação aplicável à época dos fatos (até 28/04/1995) previa que a classificação de determinada atividade como especial podia ocorrer tanto pela função exercida pelo segurado (enquadramento por categoria profissional) quanto pelo seu contato habitual e permanente com os agentes agressivos elencados nos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79. No caso concreto, o autor comprovou o exercício das seguintes atividades:
Tais funções se amoldam perfeitamente à categoria profissional de "guarda", prevista no código 2.5.7 do anexo ao Decreto nº 53.831/64, cuja periculosidade é legalmente presumida. Dada a natureza das atividades desempenhadas nas funções de vigilante e policial militar é coerente equipará-las à atividade de guarda para fins de enquadramento profissional no período em questão. Correta, portanto, a sentença que reconheceu a especialidade dos referidos interregnos. 4.2. Do Direito à Aposentadoria por Tempo de Contribuição Somados os períodos comuns e os períodos especiais convertidos pelo fator 1,40, o autor alcançou, na DER (16/02/2019), um tempo total de 35 anos, 11 meses e 29 dias de contribuição, preenchendo os requisitos para a aposentadoria integral, conforme planilha que acompanha a sentença. DOS CONSECTÁRIOS LEGAISAjusto, de ofício, os critérios de correção monetária e juros de mora. As parcelas vencidas deverão ser atualizadas de acordo com o Manual de Cálculos da Justiça Federal, que já observa a incidência da Selic, nos termos da Emenda Constitucional nº 113/2021. Juros de mora até a expedição do PRECATÓRIO/RPV, após, observar o teor da Súmula Vinculante n. 17. DOS ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA Mantida a procedência do pedido, a condenação do INSS ao pagamento de honorários advocatícios deve ser preservada. A sentença já os fixou nos patamares mínimos do CPC, a serem definidos na liquidação, observada a Súmula 111 do STJ. O INSS é isento de custas. DO PREQUESTIONAMENTOPara fins de eventual interposição de recurso às instâncias superiores, consideram-se prequestionados todos os dispositivos constitucionais e legais invocados pelas partes. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS e, de ofício, ajusto os critérios de correção monetária e juros de mora, nos termos da fundamentação. É como voto. E M E N T AEmenta: PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. POLICIAL MILITAR. REGIME PRÓPRIO. CONTAGEM RECÍPROCA. LEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS. VIGILANTE. ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA PROFISSIONAL. TEMA 1209/STF. INAPLICABILIDADE. REQUISITOS PREENCHIDOS. CONSECTÁRIOS LEGAIS. AJUSTE DE OFÍCIO. I. Caso em exame 1. Recurso de apelação interposto pelo INSS contra sentença que concedeu aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento como especiais de períodos de trabalho como vigilante e como Policial Militar (RPPS), anteriores a 1995. II. Questão em discussão 2. Legitimidade do INSS para reconhecer especialidade de tempo de serviço prestado em Regime Próprio (RPPS) para fins de contagem recíproca. Inaplicabilidade da suspensão determinada no Tema 1209/STF ao caso concreto, por se tratar de períodos anteriores a 28/04/1995. III. Razões de decidir 3. O INSS possui legitimidade passiva para a causa, pois a análise da especialidade de tempo de serviço prestado em outro regime, para fins de concessão de benefício no RGPS, é realizada sob as regras do regime instituidor, garantido o equilíbrio financeiro pelo sistema de compensação entre os entes. 4. A controvérsia do Tema 1209/STF não se aplica ao caso, pois os períodos em análise são anteriores ao marco temporal que delimita o objeto da repercussão geral. 5. A atividade de vigilante, exercida até 28/04/1995, é considerada especial por enquadramento em categoria profissional, por equiparação à de guarda, sendo presumida a periculosidade. 6. Preenchidos os requisitos de tempo de contribuição e carência, é devida a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição. 7. Consectários legais ajustados de ofício para determinar a aplicação do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que contempla a incidência da Taxa SELIC nos termos da EC nº 113/2021, com observância da Súmula Vinculante nº 17. IV. Dispositivo8. Apelação do INSS desprovida. Consectários legais ajustados de ofício. A C Ó R D Ã OVistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS e, de ofício, ajustar os consectários legais, nos termos da fundamentação., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
MAURICIO KATO
Desembargador Federal |
