
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5134374-86.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 50 - DES. FED. SILVIA ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: SEBASTIAO CALSAVARA
Advogado do(a) APELADO: MARIA ADRIANA DE OLIVEIRA - SP322504-N
OUTROS PARTICIPANTES:
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5134374-86.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 50 - DES. FED. SILVIA ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: SEBASTIAO CALSAVARA
Advogado do(a) APELADO: MARIA ADRIANA DE OLIVEIRA - SP322504-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Exma. Desembargadora Federal SILVIA ROCHA (Relatora):
Apelação interposta pelo INSS em face de sentença que julgou procedente o pedido do autor, reconhecendo o tempo de serviço especial de 10/10/1983 a 11/10/2013 e concedendo-lhe aposentadoria por tempo de contribuição. O INSS foi condenado ao pagamento das diferenças apuradas desde a citação, observada a prescrição quinquenal, acrescidas de correção monetária, juros de mora e honorários advocatícios fixados em 15% do valor do débito, em conformidade com a Súmula 111 do STJ.
Em suas razões, o INSS alega a impossibilidade de contagem de tempo especial para serviço rural; a falta de enquadramento da atividade de tratorista ou motorista; a irregularidade do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) por ausência de responsável técnico; e a falta de prévia fonte de custeio.
O autor, por sua vez, interpôs recurso adesivo pleiteando a concessão de aposentadoria especial.
Contrarrazões apresentadas apenas pelo autor.
É o Relatório.
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5134374-86.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 50 - DES. FED. SILVIA ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: SEBASTIAO CALSAVARA
Advogado do(a) APELADO: MARIA ADRIANA DE OLIVEIRA - SP322504-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Exma. Desembargadora Federal SILVIA ROCHA (Relatora):
Do Impacto do Procedimento Administrativo. Da Apelação do INSS.
Inicialmente, a análise dos autos revela a ausência de interesse de agir por parte do autor e de interesse recursal por parte do INSS em relação a certos períodos e argumentos.
O procedimento administrativo juntado demonstra que a própria autarquia havia reconhecido a especialidade dos períodos de 08/01/1990 a 15/12/1990, 07/01/1991 a 18/05/1991, 27/05/1991 a 17/12/1991, 06/01/1992 a 09/05/1992, 18/05/1992 a 19/12/1992 e 04/01/1993 a 28/04/1995, por exposição ao agente nocivo ruído, conforme os códigos 2.4.2 do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64 e 1.1.6 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79 (Num. 335178500 - Págs. 84/88).
Para esses intervalos, o autor já obteve o provimento de seu pleito na via administrativa, o que torna o provimento jurisdicional desnecessário, impondo-se decretar, de ofício, a extinção do processo sem resolução do mérito, nos termos do artigo 485, inciso VI, do CPC.
A apelação do INSS, nestes pontos, também é inócua, pois o reconhecimento já ocorreu administrativamente. A autarquia ainda carece de interesse recursal ao alegar a impossibilidade de contagem de tempo especial para o serviço rural, visto que, na via administrativa, converteu todos esses períodos, alcançando o autor o total de 31 anos, 7 meses e 16 dias.
Por consequência, o apelo do INSS não deve ser conhecido nessas partes, por ausência de interesse recursal.
O INSS alega, ainda, que a atividade de tratorista ou motorista não pode ser enquadrada como especial e que a exposição a condições climáticas, como sol, calor, poeira, frio e umidade, não justifica a conversão para tempo de serviço especial. No entanto, a sentença não se baseou em enquadramento profissional nem na exposição do autor a condições climáticas, mas sim na efetiva exposição do autor a agentes nocivos, como ruído, calor e hidrocarbonetos, comprovada por perícia judicial. Assim, as razões do apelo estão dissociadas do fundamento da sentença, o que impede seu conhecimento também nestes pontos.
Portanto, o apelo do INSS somente será conhecido quanto aos argumentos atrelados a inconsistências do PPP e à alegada ausência de fonte de custeio.
A alegação de irregularidade do PPP não prospera. A autarquia incorre em comportamento contraditório (venire contra factum proprium) ao questionar a validade do mesmo documento que utilizou para reconhecer a especialidade de parte dos períodos na via administrativa (Num. 335178500 - Pág. 76). Além disso, a prova pericial produzida em juízo, que tem plena validade, supre qualquer eventual deficiência do PPP.
É fundamental destacar que a apelação do INSS não impugnou especificamente os dados técnicos do laudo pericial judicial, que concluiu pela exposição do autor a agentes nocivos. O INSS se limitou a atacar o PPP de forma genérica, sem refutar as conclusões da perícia, que é a prova principal para atestar a nocividade dos agentes agressivos no ambiente de trabalho.
Por fim, o argumento da ausência de prévia fonte de custeio também não se sustenta. O entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal é de que a responsabilidade pela contribuição adicional é da empregadora. A ausência de recolhimento não pode penalizar o segurado com a negativa do benefício.
Do Recurso Adesivo do Autor
O recurso adesivo do autor, que pleiteia a concessão da aposentadoria especial, não pode ser conhecido.
A pretensão de obter um benefício distinto daquele que foi objeto da petição inicial — a aposentadoria por tempo de contribuição — configura inovação recursal. A matéria não foi discutida nem julgada em primeira instância, e, portanto, não pode ser apreciada nesta fase processual.
Dos Cálculos do Tempo de Contribuição e Da Concessão do Benefício
Para fins de concessão do benefício, o cálculo do tempo de contribuição se dá em acréscimo ao tempo já reconhecido administrativamente.
Os períodos não averbados, mas reconhecidos pela sentença, quando convertidos de comum para especial com a aplicação do fator de acréscimo de 0,40, resultam no acréscimo de 09 anos e 20 dias, conforme demonstrado na tabela a seguir:
Período | Tempo Comum | Tempo Adicional(0,40) |
|---|---|---|
| 10/10/1983 a 07/01/1990 | 6 anos, 4 meses e 2 dias | 913 dias |
| 16/12/1990 a 06/01/1991 | 22 dias | 9 dias |
| 19/05/1991 a 26/05/1991 | 8 dias | 3 dias |
| 18/12/1991 a 05/01/1992 | 19 dias | 8 dias |
| 10/05/1992 a 17/05/1992 | 8 dias | 3 dias |
| 20/12/1992 a 03/01/1993 | 15 dias | 6 dias |
| 06/03/1997 a 09/05/2013 | 16 anos, 4 meses e 29 dias | 2.363 dias |
TOTAL | 9 anos e 20 dias |
Somados os 9 anos e 20 dias aos 31 anos, 7 meses e 16 dias já reconhecidos administrativamente, o autor alcança um tempo total de 40 anos, 8 meses e 6 dias.
Com esse tempo, o autor faz jus à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição a partir da DER de 09/05/2013.
Da não incidência do Tema 1124/STJ no caso concreto
O procedimento administrativo demonstra que o PPP foi devidamente apresentado na esfera administrativa. Essa circunstância evidencia a resistência do INSS em relação a alguns períodos, uma vez que o mesmo documento serviu de base para o reconhecimento da especialidade de outros. Desse modo, o caso concreto não se enquadra na hipótese de suspensão prevista pelo Tema 1124/STJ.
Em relação aos efeitos financeiros, permanece o que foi consignado na sentença (Num. 12324985 - Pág. 3), observando-se o pagamento das diferenças desde a DER em 09/05/2013, sendo a prescrição quinquenal inoperante no presente caso, uma vez que o ajuizamento da ação se verificou em 11/10/2013 e a citação do INSS em 06/12/2013.
Conclusão
Diante do exposto, não conheço do recurso adesivo do autor e não conheço da apelação do INSS na parte referente aos períodos e argumentos já reconhecidos na via administrativa, por ausência de interesse recursal. De ofício, julgo extinto o processo sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, inciso VI, do CPC, com relação aos períodos rurais reconhecidos como especiais no âmbito administrativo. Na parte conhecida da apelação interposta pelo INSS, nego provimento e mantenho a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição.
Em razão da sucumbência mínima do autor, mantém-se a condenação da autarquia no pagamento da verba honorária, conforme fixada na r. sentença.
É o voto.
EMENTA: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. INOVAÇÃO RECURSAL. VALIDADE DE DOCUMENTOS E PROVAS.
I. Caso em exame
- Apelação interposta pelo INSS contra sentença que julgou procedente o pedido do autor, reconhecendo o tempo de serviço especial e concedendo-lhe aposentadoria por tempo de contribuição. O autor também interpôs recurso adesivo para pleitear aposentadoria especial.
II. Questão em discussão
- As questões em discussão consistem em saber: (i) se o autor tem interesse de agir e o INSS, interesse recursal em relação a períodos já reconhecidos administrativamente; (ii) se a atividade de tratorista pode ser enquadrada como especial e se a alegação de exposição a condições climáticas é válida; (iii) se o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é irregular por ausência de responsável técnico; (iv) se a ausência de prévia fonte de custeio impede a concessão do benefício; e (v) se o recurso adesivo do autor que pleiteia aposentadoria especial configura inovação recursal.
III. Razões de decidir
- Ausência de interesse de agir do autor e de interesse recursal do INSS para os períodos já reconhecidos administrativamente, tornando desnecessário o provimento jurisdicional. Extinção do processo sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, inciso VI, do CPC.
- Não conhecimento do recurso do INSS em relação à atividade de tratorista e à exposição a condições climáticas, por dissociação das razões do apelo com a fundamentação da sentença, que se baseou em perícia judicial sobre a exposição a ruído, calor e hidrocarbonetos.
- Alegação de irregularidade do PPP não acolhida, pois o INSS incorre em "venire contra factum proprium" ao questionar a validade do mesmo documento que utilizou administrativamente. A prova pericial produzida em juízo supre qualquer eventual deficiência do PPP.
- A tese da ausência de prévia fonte de custeio é rechaçada, visto que a responsabilidade pela contribuição adicional é da empregadora, e sua ausência não pode prejudicar o segurado, conforme entendimento consolidado do STJ e STF.
- O recurso adesivo do autor não pode ser conhecido por inovação recursal, pois pleiteia um benefício distinto do pedido inicial (aposentadoria especial em vez de aposentadoria por tempo de contribuição), não tendo a matéria sido discutida em primeira instância.
- O tempo de contribuição do autor, após a soma do tempo já reconhecido administrativamente com o tempo adicional reconhecido em sentença, totaliza 40 anos, 8 meses e 6 dias, o que lhe dá direito à aposentadoria por tempo de contribuição.
- Não se aplica o Tema 1124/STJ, pois o PPP foi apresentado na via administrativa, demonstrando resistência do INSS à concessão do benefício.
IV. Dispositivo e tese
- Não conhecido o recurso adesivo do autor e não conhecida a apelação do INSS por ausência de interesse recursal. De ofício, julgado extinto o processo sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, inciso VI, do CPC, com relação aos períodos reconhecidos no âmbito administrativo. Na parte conhecida da apelação do INSS, negado provimento, mantendo a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição.
Teses de julgamento:
1. Não há interesse de agir ou interesse recursal em relação a períodos e argumentos já reconhecidos administrativamente pela autarquia previdenciária.
2. A alegação de irregularidade do PPP é infirmada pelo princípio do “venire contra factum proprium” quando o próprio INSS utilizou o documento na esfera administrativa.
3. A ausência de prévia fonte de custeio não impede a concessão do benefício, pois a responsabilidade pela contribuição é da empregadora.
4. É inadmissível a inovação recursal para pleitear benefício distinto do que foi objeto da petição inicial.
Dispositivos relevantes: CPC, art. 485, inciso VI.
Jurisprudência relevante: Súmula 111 do STJ; Tema 1124 do STJ.
ACÓRDÃO
Desembargadora Federal
