Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0001795-24.2016.4.03.6123
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
18/05/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 21/05/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR
INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO E CARENCIA NÃO COMPROVADA. INVERSÃO DO
ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. TUTELA REVOGADA.
1. O pedido é de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença.
2. Requisito de qualidade de segurado não comprovado. Carência não demonstrada.
3.Inversão do ônus da sucumbência. Honorários de advogado fixados em 10% do valor da causa
atualizado. Exigibilidade condicionada à hipótese prevista no artigo 98, § 3°, do CPC/2015.
4. Apelação do INSS provida em parte.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0001795-24.2016.4.03.6123
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELADO: MAURA REGIA LEAL
Advogado do(a) APELADO: TATIANA GOBBI MAIA - SP269492-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0001795-24.2016.4.03.6123
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MAURA REGIA LEAL
Advogado do(a) APELADO: TATIANA GOBBI MAIA - SP269492-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença.
A sentença proferida em 14/09/2018 (ID103968747) julgou parcialmente procedente o pedido,
condenando o réu à concessão do benefício de auxílio doença de 14/12/2011 (data da
cessação) até 14/09/2019. As parcelas em atraso serão acrescidas de juros de mora e correção
monetária, nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Fedreal. Honorários advocatícios
serão fixados na fase de liquidação e incidirão sobre o valor das parcelas vencidas até a
sentença. Concedeu a antecipação da tutela. Dispensado o reexame necessário.
Apela o INSS pugnando pela reforma da sentença, alegando para tanto que a parte autora não
preenche os requisitos para concessão do benefício. Ressalta a ausência da qualidade de
segurado na data do início da incapacidade.
Com contrarrazões, subiram os autos à esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0001795-24.2016.4.03.6123
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MAURA REGIA LEAL
Advogado do(a) APELADO: TATIANA GOBBI MAIA - SP269492-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do
benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da
carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade
que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos
nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
É dizer: a incapacidade total e permanente para o exercício de atividade que garanta a
subsistência enseja a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez; a incapacidade
total e temporária para o exercício de atividade que garanta a subsistência justifica a concessão
do benefício de auxílio-doença e a incapacidade parcial e temporária somente legitima a
concessão do benefício de auxílio-doença se impossibilitar o exercício do labor ou da atividade
habitual por mais de 15 (quinze) dias pelo segurado.
A condição de segurado (obrigatório ou facultativo), requisito para a concessão dos benefícios
por incapacidade, decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o
recolhimento das contribuições correspondentes.
O artigo 15 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre as hipóteses de manutenção da qualidade de
segurado, independentemente de contribuições; trata-se do denominado período de graça,
durante o qual remanesce o direito a toda a cobertura previdenciária. Confira-se:
“Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem
remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de
segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para
prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já
tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a
perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado
desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do
Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a
Previdência Social."
A doutrina e a jurisprudência são pacíficas no sentido de que não flui o período de graça, não
perdendo a qualidade de segurado o trabalhador que deixou de contribuir para o RGPS por se
encontrar impossibilitado de exercer atividades laborativas em decorrência da sua condição de
saúde, e que teve seu benefício de auxílio doença ou aposentadoria por invalidez cessado
indevidamente, ou ainda negada a sua concessão, quando comprovadamente se encontrava
incapacitado.
No que toca à prorrogação do período de graça ao trabalhador desempregado, não obstante a
redação do §2º do artigo 15 da Lei nº. 8.213/1991 mencionar a necessidade de registro perante
o Ministério do Trabalho e da Previdência Social para tanto, o Superior Tribunal de Justiça, em
sede de Incidente de Uniformização de Interpretação de Lei Federal (Pet. 7.115), firmou
entendimento no sentido de que a ausência desse registro poderá ser suprida quando outras
provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal, se revelarem aptas a comprovar a
situação de desemprego.
A perda da qualidade de segurado está disciplinada no §4º desse dispositivo legal, ocorrendo
no dia seguinte ao do término do prazo para recolhimento da contribuição referente ao mês de
competência imediatamente posterior ao final dos prazos para manutenção da qualidade de
segurado.
Depreende-se, assim, que o segurado mantém essa qualidade por mais um mês e meio após o
término do período de graça, independente de contribuição, mantendo para si e para os seus
dependentes o direito aos benefícios previdenciários.
Anote-se que a eventual inadimplência das obrigações trabalhistas e previdenciárias acerca do
tempo trabalhado como empregado deve ser imputada ao empregador, responsável tributário,
conforme preconizado na alíneaado inciso I do artigo 30 da Lei nº 8.213/91, não sendo cabível
a punição do empregado urbano pela ausência de recolhimentos, computando-se, assim, o
período laborado para fins de verificação da qualidade de segurado.
Quanto à carência, a redação original do artigo 25, inciso I, da Lei de Benefícios exige o
cumprimento de 12 (doze) contribuições mensais para a concessão de aposentadoria por
invalidez ou auxílio-doença, in verbis: "Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do
Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o
disposto no art. 26:I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições
mensais;".
Na hipótese de perda da qualidade de segurado, o parágrafo único do artigo 24 da mencionada
lei previa que as contribuições anteriores a essa data só seriam computadas para efeito de
carência depois que o segurado contasse, a partir da nova filiação à Previdência Social, com,
no mínimo, 1/3 (um terço) do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência
definida para o benefício a ser requerido.
Tal disposição foi revogada pela Medida Provisória nº 739/2016, de 07 de julho de 2016, que
incluiu o parágrafo único no artigo 27 da Lei nº 8.213/91, dispondo que “No caso de perda da
qualidade de segurado, para efeito de carência para a concessão dos benefícios de auxílio-
doença, de aposentadoria por invalidez e de salário-maternidade, o segurado deverá contar, a
partir da nova filiação à Previdência Social, com os períodos previstos nos incisos I e III do
caput do art. 25”.
Todavia, essa norma não foi convertida em lei dentro do prazo de 120 dias (05 de novembro de
2016), tendo perdido a eficácia com efeitos retroativos à data da edição, nos termos do §3º do
artigo 62 da Constituição Federal de 1988, voltando, portanto, a viger a norma anterior.
Anote-se que não tendo sido editado o decreto legislativo previsto no mencionado §3º, apenas
as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados sob a sua vigência
conservar-se-ão por ela regidas, conforme disposto no §11 do mesmo artigo 62 da Lei Maior.
Em 06 de janeiro de 2017, entrou em vigor a Medida Provisória nº 767/2017, que novamente
revogou o parágrafo único do artigo 24, disciplinando a matéria por meio da inclusão do artigo
27-A na Lei nº 8.213/91, repetindo o texto da Medida Provisória nº 739/2016.
Convertida na Lei nº 13.457/2017, a norma do art. 27-A foi modificada para exigir o
recolhimento de metade das contribuições exigidas para a carência dos benefícios por
incapacidade (para todos os segurados) e do salário-maternidade (para as seguradas
contribuinte individual e facultativa).
Na sequência, houve nova alteração do texto do artigo 27-A pela Medida Provisória nº
871/2019, de 18 de janeiro de 2019, que retomou a necessidade do cumprimento dos períodos
integrais de carência previstos nos incisos I, III e IV do caput do art. 25. Por fim, convertida na
Lei nº 13.846, de 2019, houve o restabelecimento da exigência da metade das contribuições,
conforme anteriormente fixado na Lei nº 13.457/2017.
Em resumo, na hipótese de perda da qualidade de segurado, para readquirir a carência
necessária para fins da concessão dos benefícios de auxílio-doença, e de aposentadoria por
invalidez, o segurado deverá, quando da data do requerimento administrativo, ter vertido: I) até
05/01/2017, 4 contribuições; II) de 06/01/2017 a 26/06/2017 (MP 767/2017), 12 contribuições;
III) 27/06/2017 a 17/01/2019 (Lei 13.457/2017), 6 contribuições; IV) de 18/01/2019 a 17/06/2019
(MP 871/2019), 12 contribuições; e V) a partir de 18/06/2019, 6 contribuições.
No caso dos autos, a autora, atendente em callcenter, 46 anos na data da perícia, afirma ser
portadora de patologias de natureza neurológicas, ortopédicas e psiquiátricas, condição que lhe
traz incapacidade para o trabalho.
O laudo médico pericial realizado em 20/07/2017 (fls.141 – ID 103968746) atesta que a parte
autora é portadora de Doença de Fahr; espondilodiscoartrose de coluna cervical; transtorno
misto ansioso e depressivo; transtorno de personalidade e hipotireoidismo. Não comprova a
presença de incapacidade laborativa para sua atividade habitual.
O laudo médico psiquiátrico judicial realizado em 09/02/2018 (fls.171 – ID103968746) revela
que a parte autora é portadora de Doença de Fahr; transtorno misto ansioso e depressivo;
transtornos mentais e comportamentais devido a uma lesão ou disfunção cerebral e uma
doença física. Conclui pela incapacidade total e temporária. Observa que a autora não está
realizando tratamento em sua plenitude, não permite conhecer o seu potencial de recuperação.
Sugere nova avaliação no período de um ano. Indica o início da incapacidade em 2008.
Embora o perito tenha fixado a data de início da incapacidade laborativa em 2008, não há nos
autos elementos aptos a indicar a existência de incapacidade naquela data ou enquanto
mantinha a qualidade de segurado, não estando o juiz adstrito ao laudo.
Observe-se que o pedido de restabelecimento do benefício de auxílio-doença, cessado em
2011, foi objeto de discussão em ação proposta anteriormente, cujo pedido foi julgado
improcedente ante a ausência da incapacidade da parte autora naquela época, impede a
análise da incapacidade em momento anterior ao novo pedido administrativo, tendo em vista a
imutabilidade da coisa julgada.
Observe-se que as diversas perícias médicas realizadas na esfera administrativa, após a
cessação do último benefício, não constataram a existência de incapacidade naquela época.
O extrato do sistema CNIS (fls.113 – ID103968746) indica que a parte autora ingressou no
RGPS em 1995, mantendo vínculos empregatícios, de 08/02/995 a 13/04/1995, reingressou ao
sistema em 2006, mantendo vínculos empregatícios de 03/07/2006 a 30/08/2007, 01/02/2008 a
11/2009, recebeu auxílio doença de 12/04/2008 a 03/03/2009, 08/08/2009 a 16/08/2010 e de
17/08/2010 a 14/12/2011, que lhe garantiu a qualidade de segurado até 15/02/2013.
Reingressou ao sistema, em 2016, mantendo vínculo empregatício de 11/02/2016 a 29/03/2016,
vindo a requer novamente o benefício em 02/05/2016, assim, não verteu contribuições
suficientes para concessão do benefício.
Inverto o ônus da sucumbência e condeno a parte autora ao pagamento de honorários de
advogado, que ora fixo em 10% (dez por cento) do valor da causa atualizado, cuja exigibilidade
fica condicionada à hipótese prevista no artigo 98, §3º do CPC/2015.
Revogo a antecipação de tutela anteriormente concedida. A questão referente à eventual
devolução dos valores recebidos a este título deverá ser analisada e decidida em sede de
execução, nos termos do artigo 302, I, e parágrafo único, do CPC/2015, e de acordo com o que
restar decidido no julgamento do Tema 692, pelo C. Superior Tribunal de Justiça.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS, para julgar improcedente o pedido
formulado na inicial.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR
INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO E CARENCIA NÃO COMPROVADA. INVERSÃO
DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. TUTELA REVOGADA.
1. O pedido é de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença.
2. Requisito de qualidade de segurado não comprovado. Carência não demonstrada.
3.Inversão do ônus da sucumbência. Honorários de advogado fixados em 10% do valor da
causa atualizado. Exigibilidade condicionada à hipótese prevista no artigo 98, § 3°, do
CPC/2015.
4. Apelação do INSS provida em parte. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do INSS, para julgar improcedente o
pedido formulado na inicial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante
do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA