
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5015675-36.2021.4.03.6183
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FRANCIMEIRE DE SOUSA OLIVEIRA
Advogados do(a) APELADO: FRANCESCO SCOTONI MENDES DA SILVA - SP389592-A, LUIZA HELENA GALVAO - SP345066-A
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5015675-36.2021.4.03.6183
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FRANCIMEIRE DE SOUSA OLIVEIRA
Advogados do(a) APELADO: FRANCESCO SCOTONI MENDES DA SILVA - SP389592-A, LUIZA HELENA GALVAO - SP345066-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Desembargador Federal Jean Marcos (Relator):
Trata-se de ação destinada a viabilizar a concessão de benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença.
A r. sentença (ID 291880132) julgou procedente o pedido para condenar o INSS a conceder a autora o benefício de aposentadoria por invalidez a partir de 15/10/2014, devendo ser compensado os valores já recebidos a títulos de auxílio-doença. Condenou, ainda, a autarquia ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 20% sobre as parcelas vencidas até a prolação da sentença, observado o disposto na Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça).
Apelação do INSS (ID 291880133) em que requer a reforma da r. sentença. Alega que na data de início da incapacidade a parte autora não detinha qualidade de segurado por se tratar de doença preexistente.
Contrarrazões (ID 291880146).
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5015675-36.2021.4.03.6183
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FRANCIMEIRE DE SOUSA OLIVEIRA
Advogados do(a) APELADO: FRANCESCO SCOTONI MENDES DA SILVA - SP389592-A, LUIZA HELENA GALVAO - SP345066-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Desembargador Federal Jean Marcos (Relator):
A Constituição Federal de 1988, a teor do preceituado no artigo 201, inciso I, garante cobertura à incapacidade laboral.
Dispõe a Lei Federal nº 8.213/91, de 24-07-1991:
“Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
§1º A concessão de aposentadoria por invalidez dependerá da verificação da condição de incapacidade mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social, podendo o segurado, às suas expensas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança.
§2º A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão”.
“Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
§1º Não será devido o auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, exceto quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão”.
Conforme se pode ver, a Lei de Benefícios estabelece que o benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
Por sua vez, o auxílio-doença (auxílio por incapacidade temporária)é direito dosegurado que tiver atingido, se o caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
A implantação de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez exige carência de 12 (doze) contribuições mensais nos termos dos artigos 25, inciso I, da Lei Federal nº 8.213/91.
Não se exige carência “nos casos de segurado que, após filiar-se ao RGPS, for acometido de alguma das doenças e afecções especificadas em lista elaborada pelos Ministérios da Saúde e da Previdência Social, atualizada a cada 3 (três) anos, de acordo com os critérios de estigma, deformação, mutilação, deficiência ou outro fator que lhe confira especificidade e gravidade que mereçam tratamento particularizado”, conforme artigo 26, inciso II, da Lei de Benefícios.
Também independe de carência, para a concessão dos referidos benefícios, nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao RGPS, for acometido por uma das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei.
É oportuno observar que a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no RGPS não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da moléstia.
A lei determina que para o implemento dos benefícios em tela, é de rigor a existência do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as respectivas contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art. 15 da Lei Federal nº 8.213, in verbis:
“Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
(...)
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º. O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º. Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º. Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
§ 4º. A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos”.
Observa-se, desse modo, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o lapso da graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
O §2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de mais 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Na hipótese de perda de qualidade de segurado, é viável a implantação do benefício mediante prova do cumprimento de metade da carência, conforme artigo 27-A, da Lei Federal nº 8.213/91.
Em se tratando de benefícios por incapacidade, a comprovação do fato se faz por meio de prova pericial, salvo se desnecessária em vista de outras provas produzidas (CPC, art. 464).
Ainda quanto às provas, é oportuno ressaltar que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, na medida em que, a teor do art. 479 do CPC: “O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito”.
Contudo, é igualmente certo afirmar que a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que não englobe a questão jurídica em debate, depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto.
À vista do exposto, examina-se o caso concreto.
Quanto à incapacidade, o perito judicial concluiu (ID 291880112):
“Pericianda informa que em 2006 apareceu uma “glândula” no pescoço. Foi submetida a cirurgia de tireoide e da glândula e o diagnóstico foi câncer.
Em 2010 apareceu um caroço na axila e após vários exames foi submetida a mastectomia total radical à direita, com esvaziamento axilar, no IBCC (Instituto Brasileiro de Controle do Câncer).
Em 2014 foi internada novamente no IBCC para retirada do útero. Informa que o último trabalho registrado foi em 1993. De lá para cá trabalha com artesanato (confecção de bolsas) de forma autônoma.
Informa, por último, ser diabética
A Pericianda foi submetida a tratamentos cirúrgicos (tireoidectomia, mastectomia radical e histerectomia). Foi diagnosticada com neoplasias malignas em tireoide e mama direita. Em decorrência das neoplastias apresenta dor, fraqueza em membros superiores, dor em coluna lombo-sacra, inapetência. Está em seguimento ambulatorial de controle no IBCC. Associado ao diagnóstico de neoplastia apresenta osteoporose e laudo de tomografia de crânio com processo expansivo extra axial com base dural em região frontal esquerda (possivelmente processo metastático).
• Pelo quadro pode-se concluir pela incapacidade laboral da pericianda
O(a) periciando(a) é portador(a) de doença ou lesão, ou ainda, de deficiência física (alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento de função física)?
Sim, carcinoma de mama com mastectomia e esvaziamento axilar à direita
2. Em caso afirmativo, essa doença, lesão ou deficiência, levando em consideração o local onde mora, as atividades que sempre exerceu, a idade, o grau de instrução, e demais condições pessoais, o(a) incapacita para o exercício da atividade laborativa atual?
Sim
3. Em caso afirmativo, essa doença, lesão ou deficiência, levando em consideração o local onde mora, as atividades que sempre exerceu, a idade, o grau de instrução, e demais condições pessoais, é insusceptível de recuperação ou reabilitação para o exercício de outra atividade?
Sim
4. Caso o(a) periciando(a) esteja incapacitado(a), é possível determinar, a partir dos documentos trazidos por ele(a) e dos demais documentos médicos porventura juntados aos autos, a data do início da incapacidade, ainda que de maneira aproximada?
2010
5. Caso o(a) periciando(a) esteja incapacitado(a), é possível determinar a data do início da doença deficiência, ainda que de maneira aproximada?
2010
6. Caso o(a) periciando(a) esteja incapacitado(a), essa incapacidade é temporária ou permanente?
Permanente
7. Caso o(a) periciando(a) esteja incapacitado(a), temporária ou permanente, qual o nome da(s) enfermidade(s), lesão ou deficiência de que está acometido? Qual o código na C.I.D. (classificação Internacional de Doenças?
CID10: C50.9 (Carcinoma ductal invasivo grau II nuclear)
CID10: C73 (Carcinoma Papilífero de tireoide)
CID10: N80.0 (Endometriose de útero)
CID10: M81.9 (Osteoporose)”
O perito concluiu pela incapacidade total e permanente.
Embora o magistrado não esteja adstrito às conclusões do laudo pericial, nos termos dos artigos 436 do CPC/1973 e 479 do CPC/2015, estas devem ser consideradas, por se tratar de prova técnica, elaborada por profissional da confiança do Juízo e equidistante das partes.
A alegação do INSS tem pertinência.
O reingresso da parte autora no RGPS em novembro de 2013 como segurada facultativa foi posterior a data de início da incapacidade, em 2010, ano da cirurgia de mastectomia para a retirada do câncer de mama.
Conforme o laudo atestou, a incapacidade da autora foi decorrente da neoplastia, apresentando dor, fraqueza em membros superiores, dor em coluna lombo-sacra e inapetência, ou seja, sua incapacidade foi devido a neoplasia diagnosticada em data anterior ao reingresso da parte autora no RGPS.
Dessa forma, na data de início da incapacidade a requerente não cumpria o requisito da qualidade de segurada para a concessão do benefício.
Assim sendo, não é devido o benefício de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, nos termos do artigo 42 e 59, da Lei Federal nº. 8.213/91.
Por tais fundamentos, dou provimento à apelação do INSS.
Em decorrência do reconhecimento da improcedência do pedido, é devida a revogação de tutela antecipada, com a aplicação do entendimento repetitivo firmado pelo Superior Tribunal de Justiça (Tema nº 692), no sentido de determinar a repetição dos valores recebidos pela parte autora por força da tutela cassada, nos próprios autos e após regular liquidação, com a possibilidade de desconto de até 30% sobre parcelas de outro benefício.
Inverto o ônus sucumbencial. Condeno a parte autora ao ressarcimento das despesas processuais desembolsadas pela autarquia e fixo honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, observada a suspensão da exigibilidade, em razão do deferimento da assistência judiciária gratuita, conforme, o § 3º, do artigo 98, do Código de Processo Civil.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO NÃO COMPROVADA. INVERSÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL. DEVOLUÇÃO DOS VALORES.
1. O reingresso da parte autora no RGPS em novembro de 2013 como segurada facultativa foi posterior a data de início da incapacidade, em 2010, ano da cirurgia de mastecomia para a retirada do câncer de mama.
2. Dessa forma, na data de início da incapacidade a requerente não cumpria o requisito da qualidade de segurada para a concessão do benefício.
3. Assim sendo, não é devido o benefício de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, nos termos do artigo 42 e 59, da Lei Federal nº. 8.213/91.
4. Devolução dos valores. Inteligência do Tema 692/STJ.
4. Inverto o ônus sucumbencial. Condeno a parte autora ao ressarcimento das despesas processuais desembolsadas pela autarquia e fixo honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, observada a suspensão da exigibilidade, em razão do deferimento da assistência judiciária gratuita, conforme, o § 3º, do artigo 98, do Código de Processo Civil.
5. Apelação do INSS provida.
