APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0023826-79.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO BATISTA DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: ADRIANA DA SILVA FERREIRA - SP269834-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0023826-79.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO BATISTA DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: ADRIANA DA SILVA FERREIRA - SP269834-N
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R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio doença.
A sentença prolatada em 27/06/2018 (fls.75/78) julgou procedente o pedido, condenando a autarquia a conceder ao autor o benefício de auxílio doença, a partir de 24/02/2017 (data do requerimento administrativo) por três meses. Os valores em atraso serão acrescidos de juros de mora de 0,5% ao mês até 11/01/2003, a partir dessa data será de 1% até 28/06/2009, quando, então, incidirá os índices da caderneta de poupança. A correção monetária será calculada observando-se o INPC até 28/06/2009, após o IPCA-E. Honorários advocatícios fixados em 10% do valor das parcelas vencidas até a sentença.
Apela a autarquia sustentando, em síntese, que a parte autora não preenche o requisito para concessão do benefício no tocante à qualidade de segurado. Subsidiariamente requer a alteração do termo inicial do benefício e correção monetária.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0023826-79.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO BATISTA DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: ADRIANA DA SILVA FERREIRA - SP269834-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Considerando que a sentença se enquadra entre as hipóteses de exceção de submissão ao reexame necessário previstas nos § 3º e 4º do artigo 496 do CPC/2015, restrinjo o julgamento apenas à insurgência recursal.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
É dizer: a incapacidade total e permanente para o exercício de atividade que garanta a subsistência enseja a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez; a incapacidade total e temporária para o exercício de atividade que garanta a subsistência justifica a concessão do benefício de auxílio-doença e a incapacidade parcial e temporária somente legitima a concessão do benefício de auxílio-doença se impossibilitar o exercício do labor ou da atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias pelo segurado.
A condição de segurado (obrigatório ou facultativo) decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes.
O artigo 15 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre as hipóteses de manutenção da qualidade de segurado, independentemente de contribuições; trata-se do denominado período de graça, durante o qual remanesce o direito a toda a cobertura previdenciária. Também é considerado segurado aquele que trabalhava, mas ficou impossibilitado de recolher contribuições previdenciárias em razão de doença incapacitante.
Nesse passo, acresça-se que no que toca à prorrogação do período de graça ao trabalhador desempregado, não obstante a redação do §2º do artigo 15 da Lei nº. 8.213/1991 mencionar a necessidade de registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social para tanto, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Interpretação de Lei Federal (Pet. 7.115), firmou entendimento no sentido de que a ausência desse registro poderá ser suprida quando outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal, se revelarem aptas a comprovar a situação de desemprego.
A perda da qualidade de segurado está disciplinada no §4º desse dispositivo legal, ocorrendo no dia seguinte ao do término do prazo para recolhimento da contribuição referente ao mês de competência imediatamente posterior ao final dos prazos para manutenção da qualidade de segurado.
Depreende-se, assim, que o segurado mantém essa qualidade por mais um mês e meio após o término do período de graça, independente de contribuição, mantendo para si e para os seus dependentes o direito aos benefícios previdenciários.
Anote-se que a eventual inadimplência das obrigações trabalhistas e previdenciárias acerca do tempo trabalhado como empregado deve ser imputada ao empregador, responsável tributário, conforme preconizado na alínea a do inciso I do artigo 30 da Lei nº 8.213/91, não sendo cabível a punição do empregado urbano pela ausência de recolhimentos, computando-se, assim, o período laborado para fins de verificação da qualidade de segurado.
Quanto à carência, exige-se o cumprimento de 12 (doze) contribuições mensais para a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, conforme prescreve a Lei n.º 8.213/91, em seu artigo 25, inciso I, in verbis: "Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;".
Por fim, não será devido o auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, exceto quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão (art. 42, § 2º e 59, § 1º da Lei 8213/91).
No caso concreto.
O autor, encanador, com 60 anos de idade no momento da perícia médica judicial, informa que é portador de patologias pulmonares, ortopédicas e reumáticas, condição que o torna incapaz para o trabalho.
O laudo médico pericial elaborado em 27/03/2018 (fls.64/66) revela que a parte autora é portadora de doença pulmonar obstrutiva crônica. Apresenta quadro de broncoespasmo descompensado, porém passível de melhora com tratamento clínico otimizado. Conclui pela incapacidade total e temporária para atividades laborativas. Estabelece o início da incapacidade na data da perícia, tendo em vista que o autor não apresentou exame complementar.
O extrato do sistema CNIS (fls.43) indica que a parte autora ingressou no RGPS em 1979, mantendo vínculos empregatícios, de forma descontínua, no período entre de 01/11/1979 a 24/12/1996 (perfazendo 15 anos, 11 meses e 22 dias de contribuição ininterruptos); de 01/10/1998 a 19/09/2000 e, de forma descontínua, entre 02/07/2007 a 02/2015, sendo o último vínculo em 12/02/2015 a 01/10/2015, o que lhe garantiu a qualidade de segurado até 15/12/2017, já considerada a extensão do período de graça em razão do desemprego.
O autor, na data da incapacidade, havia recolhido mais de 120 contribuições, o que lhe garantiu a qualidade de segurado por mais 24 meses (art. 15, II e §1º da Lei nº 8.213/91), ou seja, manteve tal qualidade até 15/12/2018, restando, assim, demonstrada a qualidade de segurado e carência.
Considerando a data da incapacidade estabelecida em 27/03/2018, o requerimento administrativo formulado em 24/02/2017, restam demonstrados a qualidade de segurado e o cumprimento da carência.
Ressalte-se que, apesar do registro junto ao Ministério do Trabalho e da Previdência Social constituir prova absoluta da situação de desemprego, tal fato também poderá ser comprovado por outros meios de prova, nos termos da Súmula nº 27, da Turma de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais, que dispõe: "A ausência de registro em órgão do Ministério do Trabalho não impede a comprovação de desemprego por outros meios admitidos em Direito".
Assim, o fato de não haver novo vínculo de emprego na CTPS do segurado, bem como no banco de dados da autarquia, é suficiente para presumir a condição de desempregado.
Nesse sentido:
"PREVIDENCIÁRIO. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO. MANUTENÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO. ART. 15 DA LEI 8.213/91. CONDIÇÃO DE DESEMPREGADO. DISPENSA DO REGISTRO PERANTE O MINISTÉRIO DO TRABALHO E DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. COMPROVAÇÃO DA SITUAÇÃO DE DESEMPREGO POR OUTROS MEIOS DE PROVA. 1. Conforme o art. 15, II, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91, é mantida a qualidade de segurado nos 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, podendo ser prorrogado por mais 12 (doze) meses se comprovada a situação por meio de registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social. 2. Segundo entendimento da Terceira Seção desta Corte, a ausência de registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social poderá ser suprido quando for comprovada a situação de desemprego por outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal. 3. Demonstrado na instância ordinária que o segurado era incapaz para o desempenho de qualquer atividade, bem como seu desemprego, é possível a extensão do período de graça por mais 12 meses, nos termos do art. 15, § 2º, da Lei n. 8.213/1991. Precedentes. 4. Agravo regimental improvido."(STJ, AgRg na Pet 8694/PR, Rel. Min. Jorge Mussi, 3ª Seção, DJe 09.10.2012)
"AGRAVO. PENSÃO POR MORTE. REQUISITOS LEGAIS PREENCHIDOS. ART. 74 DA LEI Nº 8.213/91 AGRAVO IMPROVIDO. (...)3. Verificando a condição de segurado do de cujus, no caso dos autos, o documento de fls. 16/23 reconhece trabalho com registro em carteira até 17/02/1988, sendo certo que o falecido foi beneficiário de auxílio-doença de 08/10/1988 a 22/11/1996 (fl. 67), data a partir da qual se presume o desemprego do segurado, ante a ausência de novo vínculo laboral registrado em CTPS. Ressalte-se que a jurisprudência majoritária dispensa o registro do desemprego no Ministério do Trabalho e da Previdência Social para fins de manutenção da qualidade de segurado nos termos do art. 15, §2º, da Lei 8.213/1991, se aquele for suprido por outras provas constantes dos autos. 4. Agravo improvido.(TRF da 3ª Região; AC 14051960919984036113; Sétima Turma; Rel. Des. Federal Roberto Haddad; v.u.; e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/06/2012 )"
Constada a existência de incapacidade total e temporária e, preenchidos os requisitos de qualidade de segurado e carência, de rigor a concessão do auxílio-doença, conforme determinado na sentença.
O E. Superior Tribunal de Justiça, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil no REsp nº 1.369.165/SP, de relatoria do Ministro Benedito Gonçalves, assentou entendimento no sentido de que a citação válida é o marco inicial correto para a fixação do termo "a quo" de implantação de benefício de aposentadoria por invalidez/auxílio-doença concedido judicialmente, quando ausente prévio requerimento administrativo.
No mesmo sentido o teor da Súmula nº 576 daquela C. Corte Superior: “Ausente requerimento administrativo no INSS, o termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida judicialmente será a data da citação válida. (Súmula 576, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/06/2016, DJe 27/06/2016)”
Afasta-se, assim, a possibilidade de fixação do início do gozo do benefício na data em que realizado o laudo pericial judicial que constata a incapacidade, eis que tal ato constitui apenas prova produzida em juízo com o objetivo de constatar uma situação fática preexistente, não tendo, a princípio, o condão de estabelecer o termo a quo da benesse.
Desta feita, havendo requerimento administrativo em 24/02/2017 (fls.14), este é o termo inicial do benefício.
No que tange aos critérios de atualização do débito, verifico que a sentença desborda do entendimento firmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
Assim, tratando-se de matéria cognoscível de ofício (AgRg no AREsp 288026/MG, AgRg no REsp 1291244/RJ), corrijo a sentença e estabeleço que as parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial.
Anoto que os embargos de declaração opostos perante o STF que objetivavam a modulação dos efeitos da decisão supra, para fins de atribuição de eficácia prospectiva, foram rejeitados no julgamento realizado em 03.10.2019.
Considerando o não provimento do recurso do INSS, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de advogado arbitrados na sentença em 2%.
Diante do exposto, nego provimento ao apelo do INSS e, de oficio, corrijo a sentença para fixar os critérios de atualização do débito, nos termos da fundamentação exposta.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. AUXILIO DOENÇA. INCAPACIDADE LABORAL TOTAL E TEMPORARIA. QUALIDADE DE SEGURADO. CARÊNCIA CUMPRIDA. TERMO INICIAL. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
1.Trata-se de ação objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio doença previdenciário.
2.Laudo médico pericial indica a existência de incapacidade laboral total e temporaria que enseja a concessão de auxílio doença.
3.Carência cumprida. O conjunto probatório indica que a incapacidade apurada teve início enquanto a parte autora mantinha a qualidade de segurado. Extensão do período de graça pelo desemprego.
4. Havendo requerimento administrativo este é o termo inicial do benefício.
5. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR - Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux, observado quanto a este o termo inicial a ser fixado pela Suprema Corte no julgamento dos embargos de declaração. Correção de ofício.
6. Sucumbência recursal. Aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015. Majoração dos honorários de advogado arbitrados na sentença em 2%.
7. Apelação do INSS não provida. Sentença corrigida de ofício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento ao apelo do INSS e, de oficio, corrigir a sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.