
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0015196-68.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: LENI MARIA ALVES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: EDNEI MARCOS ROCHA DE MORAIS - SP149014-N
APELADO: LENI MARIA ALVES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: EDNEI MARCOS ROCHA DE MORAIS - SP149014-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0015196-68.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: LENI MARIA ALVES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: EDNEI MARCOS ROCHA DE MORAIS - SP149014-N
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R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou restabelecimento de auxílio-doença.
A sentença (ID 89837105), proferida em 12/01/2017, julgou procedente o pedido, determinando a implantação do benefício de auxílio doença até que a autora esteja apta, devendo frequentar os cursos para reabilitação profissional. As parcelas em atraso serão acrescidas de juros de mora, nos termos da Lei nº11.960/2009 e correção monetária pelo IPCA-E. Honorários advocatícios fixados em 20% sobre o valor da causa. Dispensada a remessa necessária.
A parte autora apela alegando, em síntese, que preenche os requisitos para aposentadoria por invalidez. Requer a fixação do termo inicial do benefício na data do indeferimento administrativo.
Apela o INSS sustentando, em síntese, que a parte autora não preenche os requisitos para a concessão do benefício por incapacidade, tampouco à reabilitação profissional. Ressalta que há 30 anos a autora não exerce a função de sapateira. Observa que a requerente voltou a efetuar recolhimentos como contribuinte facultativa em 2010 e teve dois pleitos julgados improcedentes com essa mesma alegação (0001864-26.2011.826.0572 da 2ª Vara de São Joaquim da Barra e 0002005-43.2014.403.6318 do JEF/Franca). Subsidiariamente, requer a alteração dos critérios de juros de mora e correção monetária.
Com contrarrazões da parte autora, subiram os autos à esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0015196-68.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: LENI MARIA ALVES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: EDNEI MARCOS ROCHA DE MORAIS - SP149014-N
APELADO: LENI MARIA ALVES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: EDNEI MARCOS ROCHA DE MORAIS - SP149014-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos de apelação.
Preliminarmente, observo que a requerente ajuizou ação em data anterior à da presente lide, e a análise da coisa julgada é matéria de ordem pública, passível de ser averiguada em qualquer grau de jurisdição.
Consoante o disposto no artigo 337, §4º, do Código de Processo Civil/2015: "(...) há coisa julgada quando se repete ação que já foi decidida por decisão transitada em julgado".
O caráter social do Direito Previdenciário, as questões de saúde que permeiam muitas das ações que versam sobre benefícios previdenciários e assistenciais - cuja melhora ou agravamento provocam a modificação dos fatos - e a variedade dos lapsos temporais que se verificam entre análise administrativa e à apreciação judicial (incluindo os momentos em que são realizadas as perícias médicas e/ou sociais), recomendam uma visão das normas processuais atenta a tais peculiaridades.
Nessa perspectiva, a princípio, cada requerimento administrativo inaugura um novo quadro fático e jurídico passível de ensejar o ajuizamento de nova ação judicial, salvo se verificado, de forma patente, que conteúdo do novo requerimento e da nova ação reproduz, integralmente, o conteúdo do requerimento e da ação anterior.
Na presente ação, distribuída em 31/07/2015, a autora postula concessão de benefício de aposentadoria por invalidez ou concessão de auxílio-doença, invocando a incapacidade laboral total e permanente decorrente de patologias de natureza clínica e ortopédica (NB nº 610930890-4 – DER: 22/06/2015 – fls.39.pdf). Instrui a inicial com documentos médicos contemporâneos ao requerimento administrativo, datados de 2015 e 2016. O laudo médico pericial, elaborado em 18/10/2016, atesta com base no exame clínico, laudos e exames médicos, que a parte autora é portadora diabete mellitus insulino dependente, retinopatia diabética com perda da visão do olho esquerdo e visão subnormal no olho direito, glaucoma, espondilose cervical, e lombalgia. Conclui pela incapacidade parcial e permanente para atividades que requeiram visão conservada.
A primeira ação (0001864-26.2011.826.0572) em trâmite perante a 2ª Vara de São Joaquim da Barra, versou sobre a concessão de benefício de aposentadoria por invalidez, em razão de patologias relacionadas à doença ortopédica e clínica. A sentença de primeiro grau, proferida em dezembro de 2012, julgou improcedente o pedido com base na conclusão do perito judicial afirmando a inexistência de incapacidade. Confira-se: “O perito subscritor do laudo pericial de fls. 75/82 concluiu que "a autora é portadora de artrose de coluna e diabetes mellitus insulina dependente sem complicações, estando, dessa forma, apta para o trabalho. A prova pericial é clara: a autora não está incapacitada para o trabalho, podendo continuar a desempenhar suas atividades habituais”. Em sede de apelação foi mantida a sentença (fls.61/69.pdf).
A segunda ação (0002005-43.2014.403.6318), interposta no Juizado Especial Federal Cível Franca, versou sobre a concessão de benefício por incapacidade em decorrência de patologias de natureza ortopédicas e clínicas. O laudo pericial realizado em 02/06/2014 atesta que a autora apresenta lombalgia discreta repercussão, discreta contratura, e pequena limitação da flexão, sinal de laseque negativo e marcha com discreta claudicação, diabetes mellitus insulino dependente, com complicações de retina em tratamento com laser. Hipertesão arterial controlada sem sinais clínicos de cardiopatia. Conclui pela inexistência de incapacidade. O pedido foi julgado improcedente e confirmado em sede de apelação. (fls.72/93.pdf)
Desse modo, considerando, tratar-se de doenças degenerativas e evolutivas, bem como a perícia médica indica o agravamento do quadro clínico da requerente, demonstrando que houve alteração da causa de pedir e do contexto fático-probatório nos presentes autos, não há que se falar em reconhecimento da coisa julgada material.
Passo ao exame do mérito.
A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
É dizer: a incapacidade total e permanente para o exercício de atividade que garanta a subsistência enseja a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez; a incapacidade total e temporária para o exercício de atividade que garanta a subsistência justifica a concessão do benefício de auxílio-doença e a incapacidade parcial e temporária somente legitima a concessão do benefício de auxílio-doença se impossibilitar o exercício do labor ou da atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias pelo segurado.
No caso dos autos, a parte autora, faxineira, 64 anos na data da perícia, afirma ser portadora de patologias de natureza clínica e ortopédicas estando incapacitada para o trabalho.
A sentença de primeiro grau julgou procedente o pedido com base na conclusão do perito judicial afirmando a existência de incapacidade para o exercício das atividades habituais. Confira-se:
“O laudo pericial concluiu que: ‘diante das patologias existentes, evidenciadas por relatório oftalmológico anexado a este laudo, posso afirmar tecnicamente que a parte autora apresenta incapacidade parcial e permanente para exercer atividades que requeiram visão conservada. Não existe incapacidade para as outras atividades. Ela não tem condições para continuar a desempenhar as atividades laborativas de ‘chanfradeira’ em fábrica de calçados, mas reúne condições para o exercício de outras atividades compatíveis com suas limitações e condições físicas" (fls. 137).
O laudo médico pericial (ID 89837105), elaborado em 18/10/2016, atesta com base no exame clínico, laudos e exames médicos, que a parte autora é portadora diabete mellitus insulino dependente, retinopatia diabética com perda da visão do olho esquerdo e visão subnormal no olho direito, glaucoma, espondilose cervical e lombalgia. Conclui pela incapacidade parcial e permanente para atividades que requeiram visão conservada. Não existe incapacidade para as outras atividades. Não tem condições para continuar a desempenhar as atividades laborativas de “chanfradeira” em fábrica de calçados, mas reúne condições para o exercício de outras atividades compatíveis com suas limitações e condições físicas.
O restante do conjunto probatório trazidos aos autos (atestado e declaração médicos - ID 89837104 e 89837105) corrobora a conclusão da perícia médica judicial no sentido da existência de incapacidade da parte autora.
Dentre a documentação médica apresentada, destaque-se a declaração do oftalmologista, datada de 14/10/2016, confira-se:
“(...)Ao exame, apresenta acuidades visuais corrigidas de 0,3 (20/60) em olho direito e percepção de movimentos de mão junto ao rosto (<20/1.000) em olho esquerdo. Hipertensão ocular direita controlada com colírio anti-hipertensivo ocular. Pseudofacia em bom estado em ambos olhos. Ao exame de seus fundos oculares (segmento ocular posterior) mostrou muitas marcas cicatrizadas de fotocoagulação a Lazer, com retinopatia diabética ainda em discreta atividade. Em seu olho esquerdo foi impossível a visualização das estruturas do fundo ocular devido à presença de hemorragia vítrea acentuada. A acuidade visual de seu olho direito apresenta poucas chances de melhora significativa, devido às sequelas da retinopatia diabética, requerendo ainda avaliações adicionais com vistas à possibilidade de novos tratamentos para esta morbidade. Devido à presença de hemorragia vítrea no olho esquerdo, não é possível afirmar sobre a potencialidade de melhoria da baixa de visão deste olho. É necessária a espera para reabsorção espontânea ou cirúrgica da hemorragia vítrea para melhor avaliação do prognóstico visual deste olho esquerdo”. (fls.143.pdf)
Pois bem, em que pesem as divergências entre os laudos periciais e administrativo, é certo que a autora, com 64 anos de idade no momento da perícia, apresenta diabete mellitus insulino dependente, retinopatia diabética com perda da visão do olho esquerdo e visão subnormal no olho direito, glaucoma, espondilose cervical, e lombalgia, gerando incapacidade para funções que requeiram visão conservada. Os documentos médicos apresentados emitidos em 2015 e 2016 são indícios de que a requerente apresentava dificuldade para o desempenho de suas atividades laborais. É sabido que o mal que acomete a autora, pode acarretar em perda da capacidade laborativa, especialmente em indivíduos com idade avançada e trabalhadores braçais, como é o caso da requerente, e, portanto, evidenciada está a existência de incapacidade para a atividade habitual da requerente (faxineira).
Entretanto, não havendo consenso entre as perícias realizadas, e considerando a ausência de qualquer documento apto a comprovar a existência de incapacidade laboral total e permanente, incabível a concessão de aposentadoria por invalidez.
Na hipótese em que se vislumbra a possibilidade readaptação/reabilitação, é de se priorizar a busca pela sua efetivação, com vistas a restituir-lhe, tanto quanto possível, a capacidade de trabalho e a realização profissional, e com isso garantir-lhe uma vida digna e plena em todos os seus aspectos. Nesse sentido, de sua vez, cabe à parte autora aderir ao tratamento médico adequado e ao processo de recuperação e/ou reabilitação profissional, com seriedade e constância, favorecendo o seu êxito.
Cabe a autarquia submeter a parte autora ao processo de reabilitação profissional previsto na legislação em vigência, devendo o auxílio doença ser mantido até o final do programa de reabilitação, e, nesse sentido, cabe à requerente aderir ao tratamento médico adequado e ao processo de reabilitação com seriedade e constância, favorecendo o seu êxito.
Assim, constatada a existência de incapacidade laboral parcial e permanente, com restrição para a atividade habitual, de rigor a concessão/manutenção do auxílio doença.
Quanto ao termo inicial do benefício, a Súmula n. 576 do STJ assim firmou entendimento: “Ausente requerimento administrativo no INSS, o termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida judicialmente será a data da citação válida. (Súmula 576, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/06/2016, DJe 27/06/2016)”
Desta feita, havendo requerimento administrativo em 22/06/2015 - fls. 39.pdf, este é o termo inicial do benefício.
No que tange aos critérios de atualização do débito, verifico que a sentença desborda do entendimento firmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
Assim, tratando-se de matéria cognoscível de ofício (AgRg no AREsp 288026/MG, AgRg no REsp 1291244/RJ), corrijo a sentença e estabeleço que as parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial.
Anoto que os embargos de declaração opostos perante o STF que objetivavam a modulação dos efeitos da decisão supra, para fins de atribuição de eficácia prospectiva, foram rejeitados no julgamento realizado em 03.10.2019.
Considerando o não provimento do recurso, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de advogado devidos pelo INSS, no montante de 2% do valor já fixado na sentença de primeiro grau.
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS e dou parcial provimento ao apelo da parte autora, para fixar o termo inicial do benefício na data do requerimento administrativo (22/06/2015) e, de ofício, corrijo a sentença para fixar os critérios de atualização do débito, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE LABORATIVA COMPROVADA. COISA JULGADA AFASTADA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ INDEVIDA. TERMO INICIAL. READAPTAÇÃO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
1.Trata-se de doenças degenerativas e evolutivas. A perícia médica indica o agravamento do quadro clínico da requerente. Houve alteração da causa de pedir e do contexto fático-probatório nos presentes autos. Não há que se falar em reconhecimento da coisa julgada material.
2. Laudo médico pericial e demais conjunto probatório indicam a existência de incapacidade parcial e permanente, com restrição para a atividade habitual. Auxílio doença concedido. Aposentadoria por invalidez indevida.
3. Havendo requerimento administrativo em 22/06/2015, este é o termo inicial do benefício.
4. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux. Correção de ofício.
5. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015.
6. Apelação do INSS não provida. Apelo da parte autora provido em parte. Sentença corrigida de ofício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS, dar parcial provimento ao apelo da parte autora, e, de ofício, corrigir a sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
