
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001917-63.2022.4.03.6115
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: NATAL RAMOS
Advogados do(a) APELANTE: RICARDO AURELIO DONADEL - SP300532-N, VERONICA APARECIDA ARRUDA FERREIRA - SP381365-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001917-63.2022.4.03.6115
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: NATAL RAMOS
Advogados do(a) APELANTE: RICARDO AURELIO DONADEL - SP300532-N, VERONICA APARECIDA ARRUDA FERREIRA - SP381365-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Desembargador Federal Jean Marcos (Relator):
Trata-se de ação destinada a viabilizar a concessão de benefício previdenciário de auxílio-doença com conversão em aposentadoria por invalidez.
A r. sentença (ID 272811342) julgou o processo extinto sem resolução do mérito, em razão o da ausência de pressuposto processual negativo para ajuizamento da ação, nos termos do artigo 485, inciso IV e V, do Código de Processo Civil e condenou a parte autora ao pagamento de custas e multa por litigância de má-fé, nos termos do artigo 80, inciso V, do Código de Processo Civil no valor de 1% da causa atualizada.
Transcrevo um trecho da r. sentença:
“Em consulta ao processo n. 5000729-69.2021.403.6115, verifica-se que se trata de demanda com fundamentos e pedido idênticos ao do presente feito e que, de fato, foi extinto sem resolução do mérito.
Ocorre que a extinção daquele feito se deu em razão do reconhecimento de litispendência em relação ao processo n. 1003685-24.2019.8.26.0457, que se encontra pendente de análise recursal.
(...)
Havendo extinção do feito sem resolução do mérito, de fato, é possível que o autor ajuíze novamente a ação desde que haja correção do vício que levou à sentença anterior sem resolução do mérito, nos termos do art. 486, § 1°, do CPC.
No caso dos autos, contudo, considerando os fundamentos da sentença proferida no processo apontado no termo de prevenção, seria necessário que a parte autora promovesse novo pedido com fundamento no agravamento da doença e trouxesse prova nesse sentido a fim de afastar a configuração da litispendência em relação ao processo n. 1003685-24.2019.8.26.0457, o que não ocorreu no caso da presente ação.
Portanto, tratando-se a presente ação de mera reiteração do pedido formulado no processo n. 5000729-69.2021.403.6115, com idênticos fundamentos, no qual já se reconheceu a litispendência em relação ao processo n. 1003685-24.2019.8.26.0457, a extinção do presente feito é medida que se impõe em razão da ausência de pressuposto processual negativo para ajuizamento da ação”
A parte autora, ora apelante (ID 272811344) requer a reforma da r. sentença. Alega que o pedido formulado no processo de nº 5000729-69.2021.4.03.6115 não foi julgado em razão de litispendência em relação ao processo de nº 1003685-24.2019.8.26.0457. Assim, afirma ausência de má-fé e requer a nulidade da sentença e novo julgamento.
Contrarrazões (ID 272811350)
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001917-63.2022.4.03.6115
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: NATAL RAMOS
Advogados do(a) APELANTE: RICARDO AURELIO DONADEL - SP300532-N, VERONICA APARECIDA ARRUDA FERREIRA - SP381365-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Desembargador Federal Jean Marcos (Relator):
A teor do art. 337 do Código de Processo Civil:
“Art. 337. Incumbe ao réu, antes de discutir o mérito, alegar:
(...)
VI – litispendência
VII - coisa julgada;
(...)
§ 1º Verifica-se a litispendência ou a coisa julgada quando se reproduz ação anteriormente ajuizada.
§ 2º Uma ação é idêntica a outra quando possui as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido.
§ 3º Há litispendência quando se repete ação que está em curso.
§ 4º Há coisa julgada quando se repete ação que já foi decidida por decisão transitada em julgado”.
É sabido que o estado de saúde de alguém pode variar significativamente com o passar do tempo. Assim, a princípio, cada requerimento administrativo renova o quadro fático e jurídico apto a ensejar o ajuizamento de nova ação judicial, salvo se verificado, de forma patente, que conteúdo do novo requerimento e da nova ação reproduz, integralmente, o conteúdo do requerimento e da ação anterior.
O Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade da exigência de requerimento administrativo prévio no âmbito previdenciário em sede de repercussão geral: STF, Tribunal Pleno, RE 631240, j. em 03/09/2014, Rel. Min. ROBERTO BARROSO. Nos termos da jurisprudência vinculante, dispensa-se o requerimento administrativo nas demandas ajuizadas a partir de 04.09.2014 nas hipóteses de: (a) notório posicionamento contrário da Administração; e (b) revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício precedente, salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração.
No caso concreto, a parte autora ajuizou anteriormente ação previdenciária de n.º 5000729-69.2021.4.03.6115, com trânsito em julgado em 24/10/2022 (fl. 34, ID 152703665), visando o restabelecimento de auxílio doença sob o benefício de nº 626.020.857-3, bem como o pagamento das parcelas vencidas a contar desde a data da cessação do benefício em 21/12/2020 em razão de Transtorno Afetivo Bipolar – CID: F31. Transcrevo trecho do pedido:
“a) Seja deferida a Tutela Antecipada com o fim de restabelecer o auxílio doença sob o benefício de nº 626.020.857-3, bem como o pagamento das parcelas vencidas a contar desde a data da cessação do benefício em 21/12/2020. Designando ainda Perícia Médica para que ratifique a situação do requerente convertendo o auxílio-doença em aposentadoria por invalidez”
Na presente demanda alega Transtorno Afetivo Bipolar – CID: F31 e requer:
“a) Seja deferida a Tutela Antecipada com o fim de restabelecer o auxílio doença sob o benefício de nº 626.020.857-3, bem como o pagamento das parcelas vencidas a contar desde a data da cessação do benefício em 21/12/2020. Designando ainda Perícia Médica para que ratifique a situação do requerente convertendo o auxílio-doença em aposentadoria por invalidez”
Trata-se de pedidos idênticos. Contudo, juntou novos documentos (ID 47188919). Alega a parte autora a possibilidade de julgamento ainda que as ações sejam idênticas, em razão da extinção do feito sem resolução do mérito. Vejamos.
No processo de nº 1003685-24.2019.8.26.0457, a parte autora ajuizou ação visando o restabelecimento do “auxílio doença sob o benefício de nº 626.020.857-3, bem como o pagamento das parcelas vencidas a contar desde a data da cessação do benefício em 09/08/2019” (fls. 01/12, ID 150056784).
A sentença referente a este processo (fls. 20/22, ID 150056784) julgou o pedido procedente e condenou a autarquia ao restabelecimento do pedido desde 14/11/2019.
Já no processo de nº 5000729-69.2021.4.03.6115, o laudo pericial realizado em 06 /07/2021 constatou a incapacidade total e permanente (ID 147660944). Em resposta ao laudo pericial, a autarquia alegou litispendência em relação ao processo anterior de nº 1003685-24.2019.8.26.0457, que ainda não havia transitado em julgado (ID 150056783). A r. sentença do feito em questão (ID 150056784) assim dispôs:
“No caso dos autos, o autor pretende restabelecimento do auxílio-doença NB 31/626.020.857-3, cessado em 21/12/2020, e sua conversão em aposentadoria por invalidez.
Submetido a perícia na especialidade Psiquiatria, a Perita Judicial concluiu que o autor é portador transtorno do humor bipolar e quadro depressivo de grave intensidade com sintomas psicóticos. Em resposta ao quesito 2, respondeu, ao final, que “No caso em tela, constatado prejuízos graves no psiquismo do autor, com deterioração de processos cognitivos e evolução com sintomas psicóticos que não vislumbram possibilidade de resolução”.
Indicou início da doença em 2013, com incapacidade total e permanente desde 08/08/2019.
(...)
Ocorre que a incapacidade indicada no laudo pericial indica data de início da incapacidade em data anterior à indicada como início da incapacidade no laudo produzido no processo 1003685-24.2019.8.26.0457, no qual indicado início da incapacidade em 14/11/2019, e no qual se entendeu pela exisência de incapacidade total e temporária por 01 (um) ano (v. fl. 9 do ID 47188928).
Naquele feito, proferida sentença de procedência parcial para “condenar o requerido a restabelecer o auxílio[1]doença ao autor a partir do dia seguinte ao da alta médica indevida e pelo prazo mínimo de 01 ano contados da data do laudo pericial ( partir da DII em 14/11/2019)” (ID 47188628).
Já se viu, aquele feito pende de análise de recurso interposto pela ré e remessa oficial.
Portanto, a questão da incapacidade laborativa da parte autora com início em 14/11/2019 já é objeto de discussão e julgamento nos autos nº 1003685-24.2019.8.26.0457.
A causa de pedir e o pedido constantes na petição inicial são no sentido de restabelecimento do benefício desde a cessação, porque a parte ainda estaria incapacitada.
É impossível a este Juízo, portanto, analisar novamente a incapacidade da parte autora iniciada em 08/2019, conforme laudo pericial, em razão da litispendência.
Eventual agravamento da doença diagnosticada não foi mencionado na exordial e configura nova causa de pedir, que poderá embasar um novo pedido perante a autarquia, ainda não analisado administrativamente.” s.m.j
Nesse sentido, verifico que a sentença do processo de nº 5000729-69.2021.4.03.6115, não analisou o pedido proposto em razão de litispendência.
Contudo, verifico que os pedidos entre uma ação (1003685-24.2019.8.26.0457) em relação a outra (5000729-69.2021.4.03.6115) são diversos. Naquela, o pedido foi o restabelecimento do beneficio desde 09/08/2019 e neste, o pedido foi o restabelecimento do benefício desde 21/12/2020.
O juiz de 1º grau da presente demanda, julgou o processo extinto porque idêntico ao de nº 5000729-69.2021.4.03.6115. Contudo, o período requerido naquela ação não foi julgado porque o perito judicial fixou a incapacidade em data que ainda vigia o benefício cessado em 21/12/2020.
Vê-se, então, que o fundamento da sentença de 1º grau não se mantém. O alicerce da decisão a quo é a ausência de novo requerimento administrativo que demostre interesse na causa. Contudo, na ação de nº 5000729-69.2021.4.03.6115, o pedido inicial não foi julgado, razão pela qual não é aplicável, por conseguinte, o preceituado no art. 485, IV do CPC.
No caso concreto, a parte autora requer o restabelecimento de benefício administrativo cessado anteriormente e não discutido em ação subsequente, porque o feito foi extinto sem resolução do mérito.
Nos termos do artigo 486, §1º, do Código de Processo Civil, “a nova ação depende da correção do vício que levou à sentença sem resolução do mérito.”
A correção do vício foi o trânsito em julgado da sentença relativa ao processo de nº 1003685-24.2019.8.26.0457.
A causa não está apta para ser julgada, nos termos do art. 1.013, §3º, I, do Código de Processo Civil, razão pela qual a r. sentença deve ser anulada e o feito, retornar à vara de origem para regular prosseguimento do feito.
Nesse sentido, a jurisprudência específica desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. LITISPENDÊNCIA. NÃO CONFIGURADA. NOVO QUADRO FÁTICO. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. INSTRUÇÃO INSUFICIENTE. DEVOLUÇÃO DOS AUTOS AO JUÍZO DE ORIGEM. PROCESSAMENTO DA AÇÃO.
1.Nos moldes da norma processual (artigo 301, V, e §§ 1º a 3°, do CPC/1973), dá-se a litispendência quando se repete ação idêntica a uma que se encontra em curso, vale dizer, quando a nova ação proposta tem as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido.
2.Restabelecimento de benefício por incapacidade concedido em ação judicial precedente e cessado administrativamente.
3.As ações judiciais reportam-se a quadros fáticos diversos. Litispendência não configurada.
4.Sentença anulada.
5.Instrução probatória insuficiente. Autos devolvidos à vara de origem para regular processamento.
6.Apelação da parte autora provida.
(TRF-3, 7ª Turma, AC 5512466-68.2019.4.03.9999, DJe 05/12/2020, Rel. Des. Fed. PAULO DOMINGUES).
Por tais fundamentos, dou provimento à apelação da parte autora para reconhecer a presença dos pressupostos processuais e condições da ação, anular a r. sentença e determinar o retorno dos autos à vara de origem para regular prosseguimento do feito com a devida instrução processual até a ulterior prolação de sentença de mérito.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. AUXÍLIO-DOENÇA OU APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. APRESENTAÇÃO DE NOVOS DOCUMENTOS. PEDIDO DE RESTABELECIMENTO. CORREÇÃO DO VÍCIO: TRÂNSITO EM JULGADO CERTIFICADO. NULIDADE DO FEITO PARA REEXAME. RETORNO DOS AUTOS À VARA DE ORIEGEM.
1. Há litispendência quando se repete ação que está em curso. Inteligência do artigo 337, §3º, do Código de Processo Civil
2. É sabido que o estado de saúde de alguém pode variar significativamente com o passar do tempo. Assim, a princípio, cada requerimento administrativo renova o quadro fático e jurídico apto a ensejar o ajuizamento de nova ação judicial, salvo se verificado, de forma patente, que conteúdo do novo requerimento e da nova ação reproduz, integralmente, o conteúdo do requerimento e da ação anterior.
3. Perceba que os pedidos são idênticos! Contudo, juntou novos documentos.
4. No caso concreto, a parte autora requer o restabelecimento de benefício administrativo cessado anteriormente e não discutido em ação subsequente porque o feito foi extinto sem resolução do mérito.
5. Nos termos do artigo 486, §1º, do Código de Processo Civil, “a nova ação depende da correção do vício que levou à sentença sem resolução do mérito.” A correção do vício foi o trânsito em julgado da sentença relativa ao processo de nº 1003685-24.2019.8.26.0457.
6. Apelação da parte autora provida.
