
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5077564-81.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: MARCO ANTONIO BELTRAN
Advogados do(a) APELANTE: ELAINE CRISTINA MATHIAS CARPES - SP248100-N, MARCO AURELIO CARPES NETO - SP248244-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5077564-81.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: MARCO ANTONIO BELTRAN
Advogados do(a) APELANTE: ELAINE CRISTINA MATHIAS CARPES - SP248100-N, MARCO AURELIO CARPES NETO - SP248244-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Desembargador Federal Jean Marcos (Relator):
Trata-se de ação destinada a viabilizar a concessão de benefício previdenciário de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez.
A r. sentença (ID 292624636) julgou o pedido inicial procedente para determinar que o INSS conceda à parte autora o benefício de auxílio-doença a partir do requerimento administrativo apresentado em 04/05/2021, com duração até 29/11/2022. Condenou, ainda a autarquia ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atualizado das prestações vencidas até a data da sentença.
Transcrevo um trecho da r. sentença:
“Com efeito, o laudo pericial encartado aos autos não deixa nenhuma dúvida de que o autor, por ser portador de transtornos psiquiátricos, permaneceu total e temporariamente incapacitado para o exercício de atividade laborativa no período de 09/04/2021 a 29/11/2022.
(...)
Anote-se que não cuidou o requerido de apresentar, como lhe competia, parecer divergente por assistente de sua confiança, devendo por isso prevalecer integralmente a conclusão a que chegou o perito no minucioso trabalho realizado, sobretudo porque confortada pelos relatórios e atestados médicos que instruíram a petição inicial.
Logo, faz jus o autor ao recebimento do auxílio-doença a partir do requerimento administrativo (04/05/2021 fls. 46) e até 29/11/2022, data em que houve a cessação da incapacidade em consonância com o laudo pericial (fls. 78).”
Embargos de declaração da parte autora (ID 292624638), rejeitado (ID 292624643).
A parte autora interpôs recurso de apelação (ID 292624648) em que requer a reforma da r. sentença. Afirma que a sua doença é degenerativa e sem perspectiva de melhora. Requer a análise das condições pessoais e a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez.
Subsidiariamente, requer a alteração da data de cessação do benefício a fim de viabilizar o pedido de prorrogação do benefício de incapacidade temporária.
Sem contrarrazões.
O processo foi remetido para o Tribunal de Justiça do estado de Mato Grosso do Sul que determinou a remessa dos autos para esta Corte (fls. 59/65, ID 292195963).
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5077564-81.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: MARCO ANTONIO BELTRAN
Advogados do(a) APELANTE: ELAINE CRISTINA MATHIAS CARPES - SP248100-N, MARCO AURELIO CARPES NETO - SP248244-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Desembargador Federal Jean Marcos (Relator):
A Constituição Federal de 1988, a teor do preceituado no artigo 201, inciso I, garante cobertura à incapacidade laboral.
Dispõe a Lei Federal nº 8.213/91, de 24-07-1991:
“Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
§1º A concessão de aposentadoria por invalidez dependerá da verificação da condição de incapacidade mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social, podendo o segurado, às suas expensas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança.
§2º A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão”.
“Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
§1º Não será devido o auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, exceto quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão”.
Conforme se pode ver, a Lei de Benefícios estabelece que o benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
Por sua vez, o auxílio-doença (auxílio por incapacidade temporária)é direito dosegurado que tiver atingido, se o caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
A implantação de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez exige carência de 12 (doze) contribuições mensais nos termos dos artigos 25, inciso I, da Lei Federal nº 8.213/91.
Não se exige carência “nos casos de segurado que, após filiar-se ao RGPS, for acometido de alguma das doenças e afecções especificadas em lista elaborada pelos Ministérios da Saúde e da Previdência Social, atualizada a cada 3 (três) anos, de acordo com os critérios de estigma, deformação, mutilação, deficiência ou outro fator que lhe confira especificidade e gravidade que mereçam tratamento particularizado”, conforme artigo 26, inciso II, da Lei de Benefícios.
Também independe de carência, para a concessão dos referidos benefícios, nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao RGPS, for acometido por uma das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei.
É oportuno observar que a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no RGPS não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da moléstia.
A lei determina que para o implemento dos benefícios em tela, é de rigor a existência do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as respectivas contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art. 15 da Lei Federal nº 8.213, in verbis:
“Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
(...)
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º. O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º. Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º. Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
§ 4º. A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos”.
Observa-se, desse modo, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o lapso da graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
O §2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de mais 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Na hipótese de perda de qualidade de segurado, é viável a implantação do benefício mediante prova do cumprimento de metade da carência, conforme artigo 27-A, da Lei Federal nº 8.213/91.
Em se tratando de benefícios por incapacidade, a comprovação do fato se faz por meio de prova pericial, salvo se desnecessária em vista de outras provas produzidas (CPC, art. 464).
Ainda quanto às provas, é oportuno ressaltar que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, na medida em que, a teor do art. 479 do CPC: “O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito”.
Contudo, é igualmente certo afirmar que a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que não englobe a questão jurídica em debate, depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto.
À vista do exposto, examina-se o caso concreto.
Quanto à incapacidade, o laudo do exame pericial realizado em 29/11/2022 (ID 292624618) assim consigna:
" a) Queixa que o(a) periciando apresenta no ato da perícia.
Periciando apresenta histórico de depressão e instabilidade emocional.
b) Doença, lesão ou deficiência diagnosticada por ocasião da perícia (com CID).
CID 10 - F32.0 Episódios depressivos.
(...)
d) Doença/moléstia ou lesão decorrem do trabalho exercido? Justifique indicando o agente de risco ou agente nocivo causador.
Multifatorial.
f) Doença/moléstia ou lesão torna o(a) periciado(a) incapacitado(a) para o exercício do último trabalho ou atividade habitual? Justifique a resposta, descrevendo os elementos nos quais se baseou a conclusão.
Não há doença incapacitante atual. Houve incapacidade total e temporária de 09/04/2021 [Relatório Médico (fls.34)] à 29/11/2022.
(...)
Neuropsicológico # Comparece ao exame com vestes e higiene adequada. Pensamento estruturado com curso e conteúdo regulares, não evidenciando atividades delirantes ou deliróides. Discurso conexo e atento à entrevista. Orientada no tempo, espaço e circunstâncias. Tem suficiente noção da natureza e finalidade deste exame. Humor adequado, sem sinais de ansiedade.
Discernimento preservado. Não relata distúrbios senso- perceptivos durante esta avaliação pericial, nem suas atitudes os faz supor. Inteligência dentro dos limites da normalidade. Ideação concreta, evidenciando satisfatória capacidade de abstração, análise e interpretação.
Demonstra compreensão adequada dos assuntos abordados. Pragmatismo preservado. Memória de evocação e fixação preservadas.
(...)
3. CID 10 - F32.0 Episódios depressivos; 03.1) Perciando em acompanhamento ambulatorial multidisciplinar e medicamentoso. Quadro estável. Não apresenta efeitos adversos decorrente do uso das medicações.”
A parte autora nasceu em 02/12/1973 (fl. 02, ID 292624521). Possui, portanto, 51 anos.
O perito concluiu pela incapacidade total e temporária no período de 09/04/2021 a 29/11/2022.
Embora o magistrado não esteja adstrito às conclusões do laudo pericial, nos termos dos artigos 436 do CPC/1973 e 479 do CPC/2015, estas devem ser consideradas, por se tratar de prova técnica, elaborada por profissional da confiança do Juízo e equidistante das partes.
No caso em tela, os documentos médicos juntados são insuficientes para ilidir a conclusão do perito judicial. Não há prova da continuidade patológica. O exame judicial realizado aponta que a parte autora possui “Pensamento estruturado com curso e conteúdo regulares, não evidenciando atividades delirantes ou deliróides.”
Assim sendo, de rigor a manutenção.
Quanto ao prazo de duração, nos termos dos artigos 101 da Lei n. 8.213/1991 e 71 da Lei n. 8.212/91, o benefício de auxílio-doença tem caráter temporário, de modo que a autarquia previdenciária não está impedida de reavaliar em exame médico as condições laborais do segurado.
A Lei Federal n. 8.213/91:
Art. 60. O auxílio-doença será devido ao segurado empregado a contar do décimo sexto dia do afastamento da atividade, e, no caso dos demais segurados, a contar da data do início da incapacidade e enquanto ele permanecer incapaz. (Redação dada pela Lei n. 9.876, de 26.11.99)
(...).
§ 8º Sempre que possível, o ato de concessão ou de reativação de auxílio-doença, judicial ou administrativo, deverá fixar o prazo estimado para a duração do benefício. (Incluído pela Lei n. 13.457, de 2017).
§ 9º Na ausência de fixação do prazo de que trata o § 8º deste artigo, o benefício cessará após o prazo de cento e vinte dias, contado da data de concessão ou de reativação do auxílio-doença, exceto se o segurado requerer a sua prorrogação perante o INSS, na forma do regulamento, observado o disposto no art. 62 desta Lei. (Incluído pela Lei n. 13.457, de 2017)
§ 10. O segurado em gozo de auxílio-doença, concedido judicial ou administrativamente, poderá ser convocado a qualquer momento para avaliação das condições que ensejaram sua concessão ou manutenção, observado o disposto no art. 101 desta Lei. (Incluído pela Lei n. 13.457, de 2017)
§ 11. O segurado que não concordar com o resultado da avaliação da qual dispõe o § 10 deste artigo poderá apresentar, no prazo máximo de trinta dias, recurso da decisão da administração perante o Conselho de Recursos do Seguro Social, cuja análise médica pericial, se necessária, será feita pelo assistente técnico médico da junta de recursos do seguro social, perito diverso daquele que indeferiu o benefício. (Incluído pela Lei n. 13.457, de 2017).
(...)
Art. 62. O segurado em gozo de auxílio-doença, insuscetível de recuperação para sua atividade habitual, deverá submeter-se a processo de reabilitação profissional para o exercício de outra atividade.
§ 1º. O benefício a que se refere ocaputdeste artigo será mantido até que o segurado seja considerado reabilitado para o desempenho de atividade que lhe garanta a subsistência ou, quando considerado não recuperável, seja aposentado por invalidez.
A lei determina que o magistrado fixe data para a alta programada, "sempre que possível".
A alta programada ora instituída por lei não impede a realização de perícia para se aferir a necessidade ou não de manutenção do auxílio-doença.
Sendo possível a fixação de data para a alta programada, esta deve ser adotada como data de cessação do benefício (DCB).
O perito judicial fixou a data de cessação da incapacidade na data da perícia judicial. Apontou para tanto documento médico de fls. 34. Contudo, tal documento data de 28/04/2021 e aponta a necessidade de afastamento do segurado por 15 dias.
Verifico ainda, que o documento médico com data mais recente é de 16/08/2021 (fl. 10, ID 292624588). Assim, entendo que a fixação da DCB pelo perito na data da perícia se deu razão da constatação de ausência de incapacidade no ato da perícia.
Neste quadro, mantenho a DCB nos termos da sentença.
Apliquem-se para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos pelo Manual De Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação.
Por tais fundamentos, nego provimento à apelação da parte autora e, altero, de ofício, os critérios de correção monetária e juros.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. AUXÍLIO-DOENÇA OU APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE ATUAL NÃO PROVADA. VERIFICAÇÃO DE INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA ANTERIOR. DCB NA PERÍCIA. SENTENÇA MANTIDA.
1. O perito concluiu pela incapacidade total e temporária no período de 09/04/2021 a 29/11/2022.
2. No caso em tela, os documentos médicos juntados são insuficientes para ilidir a conclusão do perito judicial.
3. Quanto ao prazo de duração, nos termos dos artigos 101 da Lei n. 8.213/1991 e 71 da Lei n. 8.212/91, o benefício de auxílio-doença tem caráter temporário, de modo que a autarquia previdenciária não está impedida de reavaliar em exame médico as condições laborais do segurado.
4. O perito judicial fixou a data de cessação da incapacidade na data da perícia judicial. Apontou para tanto documento médico de fls. 34. Contudo, tal documento data de 28/04/2021 e aponta a necessidade de afastamento do segurado por 15 dias.(...) Neste quadro, mantenho a DCB nos termos da sentença.
5. Apliquem-se para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos pelo Manual De Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação.
6. Apelação da parte autora desprovida. Alteração, de ofício, dos critérios de correção monetária e juros.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
