
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005964-90.2020.4.03.6102
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: RENATA DE CASTRO CESTARI
Advogados do(a) APELANTE: ISIDORO PEDRO AVI - SP140426-N, MARIA SANTINA CARRASQUI AVI - SP254557-N, VALERIA CRISTINA MACHADO CAETANO - SP346393-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005964-90.2020.4.03.6102
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: RENATA DE CASTRO CESTARI
Advogados do(a) APELANTE: ISIDORO PEDRO AVI - SP140426-N, MARIA SANTINA CARRASQUI AVI - SP254557-N, VALERIA CRISTINA MACHADO CAETANO - SP346393-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Desembargador Federal Jean Marcos (Relator):
Trata-se de ação destinada a viabilizar a concessão de benefício previdenciário de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez.
A r. sentença (ID 293267536) julgou o pedido inicial improcedente por ausência de incapacidade, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil e condenou a parte autora ao pagamento de custas, despesas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa, nos termos do artigo 98, §3º, do Código de Processo Civil.
Transcrevo um trecho da r. sentença:
“Como se vê, o auxílio-doença pressupõe incapacidade total e temporária.
E a aposentadoria por invalidez pressupõe incapacidade total e permanente.
In casu, observa-se que a autora requereu auxílio-doença em 12.06.2018, deferido até 17.10.2019 (NB 31/707.057.939-0), quando foi cessado.
A perícia médica realizada nos autos, concluiu pela inexistência de incapacidade para as atividades anteriormente desenvolvidas (ID 64880776 – p. 5 – Campo Discussão e Conclusões).
Em resposta aos quesitos, disse que a autora é portadora de diabetes mellitus, hipertensão arterial, status pós-operatório de doença degenerativa da coluna, sem déficit neurológico e sem sinais de irritação radicular. A doença apresentada não causa incapacidade para as atividades anteriormente desenvolvidas. A data provável do início da doença é 2011. A data de início da incapacidade 11/2012. Respondeu, ainda, que se trata de incapacidade parcial e permanente para atividades braçais e trabalho de pé, bem como caminhadas longas.”
A parte autora, ora apelante (ID 293267538) requer a reforma da r. sentença. Alega que sua atividade laborativa se encaixa nas limitações que o perito enquadrou dentro das suas incapacidades. Requer a análise das condições sociais.
Sem contrarrazões
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005964-90.2020.4.03.6102
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: RENATA DE CASTRO CESTARI
Advogados do(a) APELANTE: ISIDORO PEDRO AVI - SP140426-N, MARIA SANTINA CARRASQUI AVI - SP254557-N, VALERIA CRISTINA MACHADO CAETANO - SP346393-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Desembargador Federal Jean Marcos (Relator):
A Constituição Federal de 1988, a teor do preceituado no artigo 201, inciso I, garante cobertura à incapacidade laboral.
Dispõe a Lei Federal nº 8.213/91, de 24-07-1991:
“Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
§1º A concessão de aposentadoria por invalidez dependerá da verificação da condição de incapacidade mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social, podendo o segurado, às suas expensas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança.
§2º A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão”.
“Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
§1º Não será devido o auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, exceto quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão”.
Conforme se pode ver, a Lei de Benefícios estabelece que o benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
Por sua vez, o auxílio-doença (auxílio por incapacidade temporária) é direito do segurado que tiver atingido, se o caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
A implantação de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez exige carência de 12 (doze) contribuições mensais nos termos dos artigos 25, inciso I, da Lei Federal nº 8.213/91.
Não se exige carência “nos casos de segurado que, após filiar-se ao RGPS, for acometido de alguma das doenças e afecções especificadas em lista elaborada pelos Ministérios da Saúde e da Previdência Social, atualizada a cada 3 (três) anos, de acordo com os critérios de estigma, deformação, mutilação, deficiência ou outro fator que lhe confira especificidade e gravidade que mereçam tratamento particularizado”, conforme artigo 26, inciso II, da Lei de Benefícios.
Também independe de carência, para a concessão dos referidos benefícios, nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao RGPS, for acometido por uma das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei.
É oportuno observar que a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no RGPS não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da moléstia.
A lei determina que para o implemento dos benefícios em tela, é de rigor a existência do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as respectivas contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art. 15 da Lei Federal nº 8.213, in verbis:
“Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
(...)
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º. O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º. Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º. Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
§ 4º. A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos”.
Observa-se, desse modo, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o lapso da graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
O §2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de mais 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Na hipótese de perda de qualidade de segurado, é viável a implantação do benefício mediante prova do cumprimento de metade da carência, conforme artigo 27-A, da Lei Federal nº 8.213/91.
Em se tratando de benefícios por incapacidade, a comprovação do fato se faz por meio de prova pericial, salvo se desnecessária em vista de outras provas produzidas (CPC, art. 464).
Ainda quanto às provas, é oportuno ressaltar que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, na medida em que, a teor do art. 479 do CPC: “O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito”.
Contudo, é igualmente certo afirmar que a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que não englobe a questão jurídica em debate, depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto.
À vista do exposto, examina-se o caso concreto.
A qualidade de segurado e o cumprimento da carência não forma impugnados.
Quanto à incapacidade, o laudo do exame pericial realizado em 01/07/2021 (ID 293267519) assim consigna:
"Marcha: marcha parética com muleta.(...)
Palpação: Dor à palpação da coluna cervical (...)
Palpação: dor à palpação da coluna lombossacra
(...)
O (a) periciando (a) é portador (a) de diabetes mellitus, hipertensão arterial, status pós operatório de doença degenerativa da coluna, sem déficit neurológico e sem sinais de irritação radicular.
Incapacidade é parcial e permanente para atividades braçais e trabalho de pé, bem como caminhar longa. A doença apresentada não causa incapacidade para as atividades antes distâncias (mais de 2 quilômetros)eriormente desenvolvidas.
A data provável do início da doença é 2011, segundo conta.
A data de início da incapacidade 11/2012, data do exame mostrando alteração
(...)
18. Há sequelas definitivas que comprometam a capacidade laboral habitual? Quais? Sim. Perda de força e mobilidade parciais.
(...)
21. É possível a reabilitação da parte autora para outras atividades profissionais? Exemplificar algumas atividades que, em tese, poderia exercer. Sim, para atividade sem demanda física e com trabalho sentado. Não poderia voltar a ser cabelereira.
*Integrei os quesitos de fls. ID 293267476 às respostas do laudo”
A parte autora nasceu em 11/02/1965 (ID 290484884). Possui, portanto, 59 anos.
O perito concluiu pela incapacidade parcial e permanente.
Embora o magistrado não esteja adstrito às conclusões do laudo pericial, nos termos dos artigos 436 do CPC/1973 e 479 do CPC/2015, estas devem ser consideradas, por se tratar de prova técnica, elaborada por profissional da confiança do Juízo e equidistante das partes.
Sabe-se que o caráter da incapacidade, a privar o segurado do exercício de todo e qualquer trabalho, deve ser avaliado conforme as circunstâncias do caso concreto, sendo que tal entendimento está em consonância com o disposto no enunciado da súmula 47 da TNU, segundo o qual: “Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez”.
No presente caso, trata-se de pessoa com 59 anos, cabelereira, com baixa instrução, cuja patologia a impede de exercer a atividade que habitualmente exercia. Observo ainda, que a parte autora manteve-se afastado do mercado de trabalho desde 29/10/2012, com o recebimento de benefício previdenciário.
A sentença proferida não considerou o quadro social que deve ser somado ao quadro médico da parte autora, nos termos da Súmula 47, da Turma Nacional de Uniformização.
Diante das condições sociais da parte autora, improvável a sua reinserção no mercado de trabalho. Ainda que o laudo pericial vislumbre a possibilidade de realização de outras atividades profissionais, com o nível de instrução que possui e o tempo de afastamento do mercado de trabalho, entendo ineficaz a medida.
Assim sendo, é devido o benefício de aposentadoria por invalidez, porque há prova da incapacidade permanente, nos termos dos artigos 42, da Lei Federal nº. 8.213/91.
Conforme jurisprudência consolidada, o termo inicial do benefício deve ser fixado na data do seu pedido administrativo e, na sua ausência, na data da citação (Súmula nº 576, do Superior Tribunal de Justiça).
É possível a ressalva quando fixada a incapacidade em momento posterior ao requerimento administrativo. Na hipótese de benefício cessado indevidamente, o termo inicial deve corresponder ao dia seguinte ao da cessação indevida.
No caso dos autos, o início da incapacidade foi fixado em 2012. O requerimento administrativo foi apresentado em m 04/08/2020 (ID 293267464). Assim, deve ser fixada a data de início do benefício (DIB) em 04/08/2020.
Apliquem-se para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos pelo Manual De Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação.
O artigo 300 do mesmo diploma legal aponta que o juiz poderá antecipar os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que existam elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil ao processo.
No caso concreto, conforme avaliação do Juízo a quo, restaram configurados os requisitos autorizadores da concessão do benefício, pelo que antecipo seus efeitos, sobretudo considerando que a presente ação é de natureza alimentar o que por si só evidencia o risco de dano irreparável tornando viável a antecipação dos efeitos da tutela.
A fixação de multa diária por atraso no cumprimento da decisão é regular. A 7ª Turma desta C. Corte entende que o prazo para cumprimento deve ser de 45 dias úteis. Nesse quadro, é regular a exigência de multa diária se constatada a demora na implantação do benefício.
Inverto o ônus sucumbencial. Condeno a autarquiaao pagamento de honorários advocatícios fixadosem 10% (dez por cento)sobre o valor da condenação, observados os termos da Súmula nº 111 e de acordo com o decidido no Tema 1105, ambos do Superior Tribunal de Justiça.
Por tais fundamentos, dou provimento à apelação da parte autora para determinar que o INSS lhe conceda o benefício de aposentadoria por invalidez com DIB em 04/08/2020.
É o voto.
Comunique o INSS para a implantação do benefício.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. AUXÍLIO-DOENÇA OU APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE. CONDIÇÕES PESSOAIS. SÚMULA 47/TNU. INVERSÃO DO ÔNUS. MULTA SE ATRASO NA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO
1. O perito concluiu pela incapacidade parcial e permanente.
2. Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez”. Inteligência da Súmula 47/TNU.
3. Diante das condições sociais da parte autora, improvável a sua reinserção no mercado de trabalho. Ainda que o laudo pericial vislumbre a possibilidade de realização de outras atividades profissionais, com o nível de instrução que possui e o tempo de afastamento do mercado de trabalho, entendo ineficaz a medida
4. Assim sendo, é devido o benefício de aposentadoria por invalidez, porque há prova da incapacidade permanente, nos termos dos artigos 42, da Lei Federal nº. 8.213/91.
5. Conforme jurisprudência consolidada, o termo inicial do benefício deve ser fixado na data do seu pedido administrativo e, na sua ausência, na data da citação (Súmula nº 576, do Superior Tribunal de Justiça). Assim, deve ser fixada a data de início do benefício (DIB) em 02/06/2022.
6. Apliquem-se para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos pelo Manual De Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação.
7. Cabível a decretação da antecipação da tutela, se evidenciados a probabilidade do direito e a urgência na implantação do benefício em razão de risco de dano irreparável ou de difícil reparação. Inteligência dos artigos 300 e 497 do Código de Processo Civil.
8. A fixação de multa diária por atraso no cumprimento da decisão é regular. A 7ª Turma desta C. Corte entende que o prazo para cumprimento deve ser de 45 dias úteis. Nesse quadro, é regular a exigência de multa diária se constatada a demora na implantação do benefício.
9. Apelação da parte autora provida.
