
REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 0002029-59.2013.4.03.6107
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
JUIZO RECORRENTE: TEREZINHA DA SILVA PASCOAL
Advogado do(a) JUIZO RECORRENTE: RAYNER DA SILVA FERREIRA - SP201981-N
PARTE RE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) PARTE RE: LEANDRO MARTINS MENDONCA - SP147180-N
OUTROS PARTICIPANTES:
REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 0002029-59.2013.4.03.6107
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
JUÍZO RECORRENTE: TEREZINHA DA SILVA PASCOAL
Advogado do(a) JUÍZO RECORRENTE: RAYNER DA SILVA FERREIRA - SP201981-N
PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) PARTE RÉ: LEANDRO MARTINS MENDONCA - SP147180-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez ou, subsidiariamente, de auxílio doença.
A sentença prolatada em 27/11/2014 julgou procedente o pedido para condenar o INSS a conceder o benefício de aposentadoria por invalidez a partir da data do requerimento administrativo, em 12/03/2010. As parcelas em atraso serão acrescidas de juros de mora pelos índices da caderneta de poupança e correção monetária nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal (INPC). Honorários advocatícios fixados em 10% do valor das parcelas vencidas até a sentença. Concedeu a tutela antecipada.
Não houve recurso das partes.
Sentença submetida ao reexame necessário.
É o relatório.
REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 0002029-59.2013.4.03.6107
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
JUÍZO RECORRENTE: TEREZINHA DA SILVA PASCOAL
Advogado do(a) JUÍZO RECORRENTE: RAYNER DA SILVA FERREIRA - SP201981-N
PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) PARTE RÉ: LEANDRO MARTINS MENDONCA - SP147180-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Considerando que a sentença foi proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, passo ao exame da admissibilidade da remessa oficial prevista no seu artigo 475.
Embora não seja possível, de plano, aferir-se o valor exato da condenação, pode-se concluir, pelo valor apurado (fls.88.pdf), que o total da condenação ultrapassará a importância de 60 (sessenta) salários mínimos estabelecida no § 2º.
Assim, conheço da remessa oficial.
A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
É dizer: a incapacidade total e permanente para o exercício de atividade que garanta a subsistência enseja a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez; a incapacidade total e temporária para o exercício de atividade que garanta a subsistência justifica a concessão do benefício de auxílio-doença e a incapacidade parcial e temporária somente legitima a concessão do benefício de auxílio-doença se impossibilitar o exercício do labor ou da atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias pelo segurado.
A condição de segurado (obrigatório ou facultativo), requisito para a concessão dos benefícios por incapacidade, decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes.
O artigo 15 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre as hipóteses de manutenção da qualidade de segurado, independentemente de contribuições; trata-se do denominado período de graça, durante o qual remanesce o direito a toda a cobertura previdenciária. Confira-se:
“Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social."
A doutrina e a jurisprudência são pacíficas no sentido de que não flui o período de graça, não perdendo a qualidade de segurado o trabalhador que deixou de contribuir para o RGPS por se encontrar impossibilitado de exercer atividades laborativas em decorrência da sua condição de saúde, e que teve seu benefício de auxílio doença ou aposentadoria por invalidez cessado indevidamente, ou ainda negada a sua concessão, quando comprovadamente se encontrava incapacitado.
No que toca à prorrogação do período de graça ao trabalhador desempregado, não obstante a redação do §2º do artigo 15 da Lei nº. 8.213/1991 mencionar a necessidade de registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social para tanto, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Interpretação de Lei Federal (Pet. 7.115), firmou entendimento no sentido de que a ausência desse registro poderá ser suprida quando outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal, se revelarem aptas a comprovar a situação de desemprego.
A perda da qualidade de segurado está disciplinada no §4º desse dispositivo legal, ocorrendo no dia seguinte ao do término do prazo para recolhimento da contribuição referente ao mês de competência imediatamente posterior ao final dos prazos para manutenção da qualidade de segurado.
Depreende-se, assim, que o segurado mantém essa qualidade por mais um mês e meio após o término do período de graça, independente de contribuição, mantendo para si e para os seus dependentes o direito aos benefícios previdenciários.
Anote-se que a eventual inadimplência das obrigações trabalhistas e previdenciárias acerca do tempo trabalhado como empregado deve ser imputada ao empregador, responsável tributário, conforme preconizado na alínea a do inciso I do artigo 30 da Lei nº 8.213/91, não sendo cabível a punição do empregado urbano pela ausência de recolhimentos, computando-se, assim, o período laborado para fins de verificação da qualidade de segurado.
Quanto à carência, a redação original do artigo 25, inciso I, da Lei de Benefícios exige o cumprimento de 12 (doze) contribuições mensais para a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, in verbis: "Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;".
Na hipótese de perda da qualidade de segurado, o parágrafo único do artigo 24 da mencionada lei previa que as contribuições anteriores a essa data só seriam computadas para efeito de carência depois que o segurado contasse, a partir da nova filiação à Previdência Social, com, no mínimo, 1/3 (um terço) do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido.
Tal disposição foi revogada pela Medida Provisória nº 739/2016, de 07 de julho de 2016, que incluiu o parágrafo único no artigo 27 da Lei nº 8.213/91, dispondo que “No caso de perda da qualidade de segurado, para efeito de carência para a concessão dos benefícios de auxílio-doença, de aposentadoria por invalidez e de salário-maternidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com os períodos previstos nos incisos I e III do caput do art. 25”.
Todavia, essa norma não foi convertida em lei dentro do prazo de 120 dias (05 de novembro de 2016), tendo perdido a eficácia com efeitos retroativos à data da edição, nos termos do §3º do artigo 62 da Constituição Federal de 1988, voltando, portanto, a viger a norma anterior.
Anote-se que não tendo sido editado o decreto legislativo previsto no mencionado §3º, apenas as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados sob a sua vigência conservar-se-ão por ela regidas, conforme disposto no §11 do mesmo artigo 62 da Lei Maior.
Em 06 de janeiro de 2017, entrou em vigor a Medida Provisória nº 767/2017, que novamente revogou o parágrafo único do artigo 24, disciplinando a matéria por meio da inclusão do artigo 27-A na Lei nº 8.213/91, repetindo o texto da Medida Provisória nº 739/2016.
Convertida na Lei nº 13.457/2017, a norma do art. 27-A foi modificada para exigir o recolhimento de metade das contribuições exigidas para a carência dos benefícios por incapacidade (para todos os segurados) e do salário-maternidade (para as seguradas contribuinte individual e facultativa).
Na sequência, houve nova alteração do texto do artigo 27-A pela Medida Provisória nº 871/2019, de 18 de janeiro de 2019, que retomou a necessidade do cumprimento dos períodos integrais de carência previstos nos incisos I, III e IV do caput do art. 25. Por fim, convertida na Lei nº 13.846, de 2019, houve o restabelecimento da exigência da metade das contribuições, conforme anteriormente fixado na Lei nº 13.457/2017.
Em resumo, na hipótese de perda da qualidade de segurado, para readquirir a carência necessária para fins da concessão dos benefícios de auxílio-doença, e de aposentadoria por invalidez, o segurado deverá, quando da data do requerimento administrativo, ter vertido: I) até 05/01/2017, 4 contribuições; II) de 06/01/2017 a 26/06/2017 (MP 767/2017), 12 contribuições; III) 27/06/2017 a 17/01/2019 (Lei 13.457/2017), 6 contribuições; IV) de 18/01/2019 a 17/06/2019 (MP 871/2019), 12 contribuições; e V) a partir de 18/06/2019, 6 contribuições.
Por fim, não será devido o auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, exceto quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão (art. 42, § 2º e 59, § 1º da Lei 8213/91).
No caso dos autos, a parte autora, serviços gerais, 58 anos na data da perícia, afirma ser portadora de patologias de natureza ortopédicas e clínica, estando incapacitada total e permanentemente para o trabalho.
A sentença de primeiro grau julgou procedente o pedido com base na conclusão do perito judicial afirmando a existência de incapacidade parcial e permanente para o exercício das atividades habituais. Confira-se:
“Nesse contexto, apurou-se por meio da perícia médica judicial (fls.29/38) que a autora está parcial e permanentemente incapacitada para a atividade braçal, por estar acometida de artrose em coluna lombar com escoliose, sem lesões neurológicas, doença degenerativa em joelhos com desvio em valgo estrutural e apresenta diabetes sem complicações clínicas. A doença é degenerativa e evolui com piora progressiva e maiores sintomas de O dor e limitação para movimentos corporais. A autora possui restrição para o trabalho pesado e para a movimentação corporal. Consta do laudo que, há condições de a autora exercer a mesma atividade laboral de faxineira, porém com restrições. Considerando as atividades habituais, pode ser quantificada uma perda de 40% da capacidade laborativa. Existem queixas da doença desde os 27 anos da autora que, provavelmente decorre de alterações estruturais na coluna vertebral e o quadro passou a restringir suas atividades habituais em 2009. Afirma o perito que: ’Existe incapacidade desde 2009 aproximadamente’. Nesse caso, a despeito da conclusão médica declinar pela incapacidade parcial e permanente da autora para atividade braçal, valho-me do art. 436 do CPC ("o juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar a sua convicção com outros elementos ou fatos provados nos autos"), para reconhecer a total incapacidade da autora para o exercício de quaisquer atividades laborativas. Isso porque a requerente já conta com 59 anos de idade, possui ensino fundamental incompleto (4 série), sempre trabalhou em serviços braçais (item 2.1 - fl. 31) e está parcialmente incapacitada para exercer sua função habitual de faxineira. Aliado a isso, é fato notório que pessoas com idade avançada e problemas de saúde não são aceitas pelo mercado de trabalho. Ademais, quando da elaboração do laudo, o perito observou que a autora apresenta queixas da doença desde os 27 anos de idade, com piora do quadro no ano de 2009 (itens 15 de fl. 35 e 06 de fl. 37), já que se trata de doença degenerativa que evolui com piora progressiva e maiores sintomas de dor e limitação para movimentos corporais (item 03 de fls. 33/34).”
O laudo médico pericial (ID 88073494), elaborado em 31/07/2013, atesta com base no exame clínico, atestados e exames complementares, que a parte autora é portadora de artrose em coluna lombar com escoliose, sem lesões neurológicas; doença degenerativa em joelhos, com desvio em valgo estrutural. Apresenta diabetes, sem complicações clínicas. Conclui pela incapacidade parcial e permanente para a atividade braçal. Estabelece como data de início da incapacidade desde 2009 aproximadamente.
Ainda que o médico perito tenha indicado em seu laudo que a incapacidade que acomete a requerente acarreta incapacidade parcial e permanente, é certo que a enfermidade que acomete a autora é degenerativa, progressiva e irreversível, está presente desde que a autora tinha 27 anos de idade, e traz incapacidade para a sua função habitual e para qualquer atividade que demande esforços físicos ou sobrecarga da coluna e joelho. Relevante observar que a autora, exerce serviço braçal, e apresentando baixo grau de instrução e idade avançada (atualmente com 65 anos de idade), certamente a incapacidade apontada no laudo médico pericial constitui óbice definitivo ao desenvolvimento de atividades laborativa e, portanto, de rigor a concessão da aposentadoria por invalidez.
O INSS, por sua vez, não logrou trazer quaisquer elementos aptos a ilidir a prova produzida pelo autor e a conclusão da perícia judicial, limitando-se a reafirmar a inexistência de incapacidade com base no laudo médico produzido na esfera administrativa, cuja presunção de veracidade não é absoluta.
O extrato do sistema CNIS (fls.19.pdf) e a CTPS (fls.18.pdf) indicam que a parte autora manteve vínculo de trabalho no período de 01/02/2008 a 19/02/2009, verteu contribuições, como contribuinte individual, de 06/2012 a 01/2013, restando comprovada a qualidade de segurado e o cumprimento da carência.
Assim, constatada a qualidade de segurado, o cumprimento da carência e a existência de incapacidade laboral total e permanente, com restrição para a atividade habitual, de rigor a concessão/manutenção da aposentadoria por invalidez.
No que tange aos critérios de atualização do débito, verifico que a sentença desborda do entendimento firmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
Assim, as parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial.
Anoto que os embargos de declaração opostos perante o STF que objetivavam a modulação dos efeitos da decisão supra, para fins de atribuição de eficácia prospectiva, foram rejeitados no julgamento realizado em 03.10.2019.
Deixo de majorar os honorários de advogado fixados na sentença, considerando que o recurso foi interposto na vigência do Código de Processo Civil /1973, não aplicando a ele as normas dos §§ 1º a 11º do artigo 85 do CPC/2015, inclusive no que pertine à sucumbência recursal (Enunciado Administrativo nº 7/STJ).
Ante o exposto, conheço da remessa oficial e dou-lhe parcial provimento para fixar os critérios de atualização do débito, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. AUXÍLIO-DOENÇA REMESSA OFICIAL CONHECIDA. REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO COMPROVADOS. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL.
1. Valor da condenação superior a 60 salários mínimos. Inaplicável o §2º do artigo 475 do CPC/73. Remessa oficial conhecida.
2. Qualidade de segurado e carência comprovados pelo extrato CNIS e anotações da CTPS. Laudo médico pericial e demais documentos do conjunto probatório indicam a existência de incapacidade total e permanente, com restrição para a atividade habitual. Aposentadoria por invalidez concedida.
3. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
4. Remessa oficial conhecida e parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu conhecer da remessa oficial para dar-lhe parcial provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
