
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 0001595-82.2013.4.03.6006
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANELITA XAVIER RUA DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: ANDREIA RODRIGUES DOS SANTOS - MS13920-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 0001595-82.2013.4.03.6006
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANELITA XAVIER RUA DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: ANDREIA RODRIGUES DOS SANTOS - MS13920-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença.
A sentença, prolatada em 27/05/2015, julgou procedente o pedido, para condenar o INSS à concessão do benefício de auxílio-doença, em favor do autor, a partir da data da incapacidade laborativa atestada pelo perito, ocorrida em 01/06/2013 até 31/09/2014. As parcelas serão acrescidas de correção monetária, nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal e juros de mora. Honorários advocatícios fixados em R$1.200,00. Condenou o INSS ao reembolso das despesas com a produção da prova pericial, mediante depósito nos autos, após o trânsito em julgado.
Sentença submetida ao reexame necessário.
Apela o INSS alega, preliminarmente, a ausência de interesse processual, pois diante da data da incapacidade constatada no laudo havia necessidade de requerimento administrativo. Caso não reconhecida a preliminar requer a fixação da DIB na data da juntada do laudo ou na data da citação, visto que antes disso, o INSS sequer teve conhecimento da suposta incapacidade da autora. Requer a redução da verba honorária e a fixação dos honorários periciais no valor de R$234,80, nos termos da Resolução nº 558/2007 do CJF e alteração dos critérios de correção monetária.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 0001595-82.2013.4.03.6006
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANELITA XAVIER RUA DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: ANDREIA RODRIGUES DOS SANTOS - MS13920-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Considerando que a sentença foi proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, passo ao exame da admissibilidade da remessa oficial prevista no seu artigo 475.
Embora não seja possível, de plano, aferir-se o valor exato da condenação, pode-se concluir, pelo termo inicial do benefício (01/06/2013), seu valor aproximado e termo final em 31/09/2014, que o valor total da condenação não ultrapassará a importância de 60 (sessenta) salários mínimos estabelecida no § 2º.
Assim, é nítida a inadmissibilidade, na hipótese em tela, do reexame necessário.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
Verifico que a matéria impugnada pelo INSS se limita à questão processual, alteração da DIB e consectários, restando, portanto, incontroversas as questões atinentes à qualidade de segurado, à carência e à existência de incapacidade, limitando-se o julgamento apenas à insurgência recursal.
O art. 5º, XXXV, da Constituição, assegura o pleno acesso ao Poder Judiciário para a proteção dos cidadãos em caso de lesão ou ameaça a direito. Contudo, essa garantia fundamental não deixa de trazer em si a exigência da existência de uma lide, justificando a atuação do Poder Judiciário como forma democrática de composição de conflitos, o que também se revela como interesse de agir (necessidade e utilidade da intervenção judicial).
Existindo lide (provável ou concreta), é perfeitamente possível o acesso direto à via judicial, sem a necessidade de prévio requerimento na via administrativa.
Contudo, em casos nos quais a lide não está claramente caracterizada, vale dizer, em situações nas quais é potencialmente possível que o cidadão obtenha a satisfação de seu direito perante a própria Administração Pública, é imprescindível o requerimento na via administrativa, justamente para a demonstração da necessidade da intervenção judicial e, portanto, do interesse de agir que compõe as condições da ação. Imprescindível, assim, a existência do que a doutrina processual denomina de fato contrário a caracterizar a resistência à pretensão do autor.
Deveras, de acordo com o entendimento jurisprudencial adotado por esta Corte Regional, tratando-se de ação de cunho previdenciário, ainda que não se possa condicionar a busca da prestação jurisdicional ao exaurimento da via administrativa, tem-se por razoável exigir que o autor tenha ao menos formulado um pleito administrativo - e recebido resposta negativa - de forma a demonstrar a necessidade de intervenção do Poder Judiciário ante a configuração de uma pretensão resistida.
Conclui-se, assim, pela aplicação aos segurados da exigência de prévia provocação da instância administrativa para obtenção do benefício e, somente diante de sua resistência, viabilizar a propositura de ação judicial.
Aliás, é nesse sentido a decisão do Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário 631.240/MG, com repercussão geral reconhecida:
"RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR.
1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo.
2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas.
3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado.
4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão.
5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos.
6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir.
7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir.
8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.
9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir."(Tribunal Pleno, Rel. Min. Roberto Barroso,DJe 10/11/2014).
Contudo, nas ações ajuizadas em data anterior à essa decisão, há que se observar as regras de transição nele estabelecidas.
In casu, o feito foi ajuizado em 12/12/2013, data anterior ao julgamento do paradigma de repercussão geral sendo desnecessária a comprovação do prévio requerimento administrativo. O Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, por sua vez, apresentou contestação de mérito e após devidamente instruído foi declarado o direito, o que, consoante a modulação de efeitos ali consignadas, caracteriza o interesse de agir consubstanciado na resistência à lide, razão pela qual afasto a preliminar arguida.
Quanto ao termo inicial do benefício, o E. Superior Tribunal de Justiça, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil no REsp nº 1.369.165/SP, de relatoria do Ministro Benedito Gonçalves, assentou entendimento no sentido de que a citação válida é o marco inicial correto para a fixação do termo "a quo" de implantação de benefício de aposentadoria por invalidez/auxílio-doença concedido judicialmente, quando ausente prévio requerimento administrativo.
Afasta-se, assim, a possibilidade de fixação do início do gozo do benefício na data em que realizado o laudo pericial judicial que constata a incapacidade, eis que tal ato constitui apenas prova produzida em juízo com o objetivo de constatar uma situação fática preexistente, não tendo, a princípio, o condão de estabelecer o termo a quo da benesse.
Desta feita, inexistindo requerimento administrativo o termo inicial deve ser fixado na data da citação (10/04/2014 – fls.52pdf).
No que tange aos critérios de atualização do débito, verifico que a sentença desborda do entendimento firmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
Assim, tratando-se de matéria cognoscível de ofício (AgRg no AREsp 288026/MG, AgRg no REsp 1291244/RJ), corrijo a sentença e estabeleço que as parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial.
Anoto que os embargos de declaração opostos perante o STF que objetivavam a modulação dos efeitos da decisão supra, para fins de atribuição de eficácia prospectiva, foram rejeitados no julgamento realizado em 03.10.2019.
Os honorários de advogado devem ser fixados em 10% do valor da condenação, consoante o entendimento desta Turma e o disposto §§ 2º e 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015 (art.20 do CPC/73), considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.
No tocante à fixação dos honorários periciais, nos moldes da Resolução nº558/2007 do CJF, o pedido não merece acolhimento.
In casu, da decisão que fixou os honorários do perito em R$350,00 o INSS foi intimado em 02/02/2015 (fls.80 pdf). Entretanto, essa decisão não foi impugnada no momento oportuno e por meio dos recursos cabíveis vigentes àquela época, operando-se a preclusão a respeito da matéria.
Inaplicavél a regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015 que determina a majoração, a título de sucumbência recursal, dos honorários de advogado arbitrados na sentença, eis que o recurso ora apreciado foi interposto na vigência do CPC de 1973.
Ante o exposto, não conheço do reexame necessário, rejeito a preliminar e dou parcial provimento à apelação do INSS, para fixar o termo inicial do benefício na data da citação, alterar a verba honorária e, de ofício, corrijo a sentença, para fixar os critérios de atualização do débito, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. AUXILIO-DOENÇA. REQUISITOS PREENCHIDOS. REMESSA OFICIAL NÃO CONHECIDA. INTERESSE PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. TERMO INICIAL. HONORÁRIOS PERICIAIS. PRECLUSÃO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. HONORÁRIOS DE ADVOGADO.
1. Embora não seja possível, de plano, aferir-se o valor exato da condenação, pode-se concluir, pelo termo inicial do benefício (01/06/2013), seu valor aproximado e termo final em 31/09/2014, que o valor total da condenação não ultrapassará a importância de 60 (sessenta) salários mínimos estabelecida no § 2º. Remessa oficial não conhecida.
2. O art. 5º, XXXV, da Constituição, assegura o pleno acesso ao Poder Judiciário para a proteção dos cidadãos em caso de lesão ou ameaça a direito. Contudo, essa garantia fundamental não deixa de trazer em si a exigência da existência de uma lide, justificando a atuação do Poder Judiciário como forma democrática de composição de conflitos, o que também se revela como interesse de agir (necessidade e utilidade da intervenção judicial). Existindo lide (provável ou concreta), é perfeitamente possível o acesso direto à via judicial, sem a necessidade de prévio requerimento na via administrativa.
3. Em casos nos quais a lide não está claramente caracterizada, vale dizer, em situações nas quais é potencialmente possível que o cidadão obtenha a satisfação de seu direito perante a própria Administração Pública, é imprescindível o requerimento na via administrativa, justamente para a demonstração da necessidade da intervenção judicial e, portanto, do interesse de agir que compõe as condições da ação.
4. O feito foi ajuizado em 12/12/2013, data anterior ao julgamento do paradigma de repercussão geral sendo desnecessária a comprovação do prévio requerimento administrativo. O Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, por sua vez, apresentou contestação de mérito e após devidamente instruído foi declarado o direito, o que, consoante a modulação de efeitos ali consignadas, caracteriza o interesse de agir consubstanciado na resistência à lide. Preliminar afastada.
5. O E. Superior Tribunal de Justiça, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil no REsp nº 1.369.165/SP, de relatoria do Ministro Benedito Gonçalves, assentou entendimento no sentido de que a citação válida é o marco inicial correto para a fixação do termo "a quo" de implantação de benefício de aposentadoria por invalidez/auxílio-doença concedido judicialmente, quando ausente prévio requerimento administrativo.
6. Inexistindo requerimento administrativo o termo inicial deve ser fixado na data da citação (10/04/2014).
7. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux, observado quanto a este o termo inicial a ser fixado pela Suprema Corte no julgamento dos embargos de declaração. Correção de ofício.
8. Honorários de advogado devem ser fixados em 10% do valor da condenação, consoante o entendimento desta Turma e o disposto §§ 2º e 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015 (art.20 do CPC/73), considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.
9. Da decisão que fixou os honorários do perito em R$350,00 o INSS foi intimado em 02/02/2015. Entretanto, essa decisão não foi impugnada no momento oportuno e por meio dos recursos cabíveis vigentes àquela época, operando-se a preclusão a respeito da matéria.
10. Remessa oficial não conhecida. Preliminar afastada. Apelação do INSS parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu não conhecer da remessa oficial, rejeitar a preliminar e dar parcial provimento à apelação do INSS e, de ofício, corrigir a sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
