Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5072954-80.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
07/01/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 17/01/2020
Ementa
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. HIPOSSUFICIÊNCIA/MISERABILIDADE NÃO
DEMONOSTRADA. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
1. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da
Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco)
anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a
própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da
Lei nº 8.742/93.
2. Requisito de miserabilidade/hipossuficiência não preenchido. Laudo social indica que a parte
autora encontra-se amparado pela família e não há evidência de que suas necessidades básicas
não estejam sendo supridas. O benefício assistencial não se presta a complementação de renda.
3. Benefício assistencial indevido.
4. Sucumbência recursal. Aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015. Exigibilidade
condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
5. Apelação da parte autora não provida.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5072954-80.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ORANI DA COSTA NOMIYAMA
Advogados do(a) APELANTE: JOSE GONCALVES VICENTE - SP83730-N, WAGNER
GONCALVES VICENTE - SP359142-N, VITOR GONCALVES VICENTE - SP389790-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5072954-80.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ORANI DA COSTA NOMIYAMA
Advogados do(a) APELANTE: JOSE GONCALVES VICENTE - SP83730-N, WAGNER
GONCALVES VICENTE - SP359142-N, VITOR GONCALVES VICENTE - SP389790-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício assistencial de prestação continuada
(LOAS) previsto pelo inciso V do artigo 203 da Constituição Federal.
A sentença, prolatada em 19.07.2018, julgou improcedente o pedido ante o não preenchimento
por parte da autora do requisito de miserabilidade imprescindível para a concessão do benefício.
Condenou-a ao pagamento de honorários de advogado fixados em R$ 954,00, observada a
assistência judiciária gratuita.
Apela a parte autora alegando para tanto que restou preenchido o requisito de miserabilidade,
não tendo condições de prover a sua própria subsistência ou tê-la provida pela sua família.
Com contrarrazões, os autos vieram a este Tribunal.
O Ministério Público Federal opinou pelo prosseguimento da demanda.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5072954-80.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ORANI DA COSTA NOMIYAMA
Advogados do(a) APELANTE: JOSE GONCALVES VICENTE - SP83730-N, WAGNER
GONCALVES VICENTE - SP359142-N, VITOR GONCALVES VICENTE - SP389790-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei
nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco)
anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a
própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
O artigo 20, § 3º da Lei 8742/93 considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com
deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do
salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).
A constitucionalidade dessa norma foi questionada na ADI 1.232-1/DF, tendo o Plenário do
Supremo Tribunal Federal, por maioria, decidido pela improcedência do pedido, ao fundamento
que a fixação da renda per capita no patamar de ¼ do salário mínimo sugere a presunção
absoluta de pobreza. Concluiu, contudo, que não é a única forma suscetível de se aferir a
situação econômica da família do idoso ou portador de deficiência.
Posteriormente, a Corte Suprema enfrentou novamente a questão no âmbito da Reclamação
4374 - PE que, julgada em 18/04/2013, reconhecendo a inconstitucionalidade parcial, sem
pronúncia de nulidade, do § 3º, art. 20 da Lei 8.742/1993, decorrente de notórias mudanças
fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos
patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais
por parte do Estado brasileiro).
Restou decidido que a norma é inconstitucional naquilo que não disciplinou, não tendo sido
reconhecida a incidência taxativa de qualquer critério para aferição da hipossuficiência, cabendo
ao legislador fixar novos parâmetros e redefinir a política pública do benefício assistencial a fim de
suprimir o vício apontado.
Desta forma, até que o assunto seja disciplinado, é necessário reconhecer que o quadro de
pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em
se tratando de pessoa idosa ou com deficiência, é através da própria natureza de seus males, de
seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades.
Não há como enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar, nem tampouco entender
que aqueles que contam com menos de ¼ do salário-mínimo fazem jus obrigatoriamente ao
benefício assistencial ou que aqueles que tenham renda superior não o façam.
Com relação ao cálculo da renda per capita em si, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de
recurso repetitivo REsp 1.355.052/SP, em conformidade com a decisão proferida pelo Supremo
Tribunal Federal no RE 580.963/PR, definiu que a se aplica, por analogia, a regra do parágrafo
único do artigo 34 do Estatuto do Idos0 (Lei 10.741/03), a pedido de benefício assistencial
formulado por pessoa com deficiência, a fim de que qualquer benefício previdenciário recebido
por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado na sua aferição.
Por fim, entende-se por família, para fins de verificação da renda per capita, nos termos do §1º do
artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.435/2011, o conjunto de pessoas
composto pelo requerente, o cônjuge, o companheiro, a companheira, os pais e, na ausência de
um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os
menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
Contudo, em que pese a princípio os filhos casados ou que não coabitam sob o mesmo teto não
integrarem o núcleo familiar para fins de aferição de renda per capita, nos termos da legislação
específica, não se pode perder de vista que o artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece
que o benefício é devido quando o idoso ou deficiente não puder prover o próprio sustento ou tê-
lo provido pela família. Por sua vez, a regra do artigo 229 da Lei Maior dispõe que os filhos
maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, premissa
também assentada nos artigos 1694 a 1697 da lei Civil.
Depreende-se assim que o dever de sustento do Estado é subsidiário, não afastando a obrigação
da família de prestar a assistência, pelo que, como já dito, o artigo 20, § 3º, da LOAS não pode
ser interpretado de forma isolada na apuração da miserabilidade.
Tecidas tais considerações, no caso dos autos a sentença de primeiro grau julgou improcedente o
pedido com base nos elementos contidos no estudo social, tendo se convencido não restar
configurada a condição de hipossuficiência financeira ou miserabilidade necessárias para a
concessão do benefício. Confira-se:
“Para tanto, foi realizado o laudo assistencial de fls. 36/42, onde consta que a autora reside em
residência própria, apenas com seu esposo, em uma chácara de 5.000m². A renda familiar é
composta pela aposentadoria recebida pelo esposo da autora no valor de R$ 954,00 e pela venda
de ovos e galinhas, no valor variável de R$ 350,00 sendo a renda per capita no valor de R$
652,00 mensais.
Além disso, o estudo social descreveu a residência da família, “Chácara próxima a vicinal dos
Castores, 5.000 metros, formada com plantações, piscina e galinheiros. Toda avarandada, possui
2 quartos, 1 sala e 1 cozinha” e está equipado com móveis e utensílios capazes de atender as
necessidades básicas da família.
Sendo assim, pelo que consta dos autos, apesar de as únicas fontes de renda da família serem
aposentadoria recebida pelo esposo da autora, no valor de R$ 954,00 mensais e a venda de ovos
e galinhas, no valor variável de R$ 350,00 mensais, verifico que ultrapassam em muito o limite de
1/4 (um quarto) do salário mínimo. Ainda que este limite possa ser relativizado, verifico que a
autora tem condições de prover suas despesas mensais, visto que possui meios suficiente para
quita-las (fls. 39) de modo que o valor recebido ultrapassa o dobro do valor dos gastos ordinários
do casal. Além disso, a autora consegue suplementar sua renda com a exploração de aves,
vendendo ovos e galinhas, e com o plantio, visto que reside em uma chácara e não possui
restrições quanto à execução das tarefas da vida diária. Não obstante, conclui-se que a autora
reside em um ambiente com ótimas condições de habitação, haja vista que a casa está muito
bem conservada e que não foi constatada pela Assistente Social que se encontra em situação de
miserabilidade.
Assim, a insuficiência de recursos da parte autora para prover a própria subsistência ou de tê-la
provida por sua família não se restou provada, não fazendo jus ao amparo assistencial. ”
O estudo social (ID 8371540), elaborado em 169.02.2018, revela que:
Reside com a parte autora seu companheiro, Jesus Alves de Oliveira, aposentado.
A parte autora reside em Chácara, própria, próxima a vicinal dos Castores (distrito de Onda
Verde) 5.000 metros, formada com plantações, piscina e galinheiros. Toda avarandada possui
dois quartos, uma sala, uma cozinha, piso de cerâmica, laje, no quarto da requerente uma cama
de casal, um guarda roupa e uma cama de solteiro. Na sala um jogo de sofá, uma televisão e
uma estante, no outro quarto uma cama de casal e um guarda roupa. Na cozinha um armário de
aço, uma geladeira e um fogão de quatro bocas.
A renda familiar advém da aposentadoria do companheiro, Jesus Alves de Oliveira, no valor de
R$ 953,00 e da renda da requerente em média de R$ 350,00 na venda de ovos e galinhas,
totalizando R$ 1303,00.
Relataram despesas no valor de: Alimentação R$ 340,00; luz R$ 75,63; Água R$ 0,00 (Poço
artesiano); Telefone R$ 15,00; Gás R$ 65,00; Remédios R$ 100,00, totalizando R$ 595,63.
Depreende-se da leitura do estudo social que, apesar de não se negar a existência de
dificuldades financeiras, não há indícios de que as necessidades básicas da parte autora não
estejam sendo supridas e, nesse sentido, ressalto que o benefício assistencial não se destina a
complementar o orçamento doméstico, mas sim prover aqueles que se encontram em efetivo
estado de necessidade.
Verifica-se, assim, que o MM. Juiz sentenciante julgou de acordo com as provas carreadas aos
autos e não comprovada a condição de miserabilidade, pressuposto indispensável para a
concessão do benefício, de rigor a manutenção da sentença de improcedência do pedido por
seus próprios fundamentos.
Considerando o não provimento do recurso, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do
CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de
advogado arbitrados na sentença em 2%, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária
gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do
Código de Processo Civil/2015.
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora e, com fulcro no §11º do artigo 85 do
Código de Processo Civil, majoro os honorários de advogado em 2% sobre o valor arbitrado na
sentença, nos termos da fundamentação exposta.
É o voto.
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. HIPOSSUFICIÊNCIA/MISERABILIDADE NÃO
DEMONOSTRADA. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
1. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da
Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco)
anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a
própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da
Lei nº 8.742/93.
2. Requisito de miserabilidade/hipossuficiência não preenchido. Laudo social indica que a parte
autora encontra-se amparado pela família e não há evidência de que suas necessidades básicas
não estejam sendo supridas. O benefício assistencial não se presta a complementação de renda.
3. Benefício assistencial indevido.
4. Sucumbência recursal. Aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015. Exigibilidade
condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
5. Apelação da parte autora não provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
