Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5895754-35.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
30/09/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 06/10/2020
Ementa
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. HIPOSSUFICIÊNCIA/MISERABILIDADE NÃO
DEMONSTRADA. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
1. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da
Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco)
anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a
própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da
Lei nº 8.742/93.
2. Requisito de miserabilidade/hipossuficiência não preenchido. Laudo social indica que a parte
autora encontra-se amparada pela família e não há evidência de que suas necessidades básicas
não estejam sendo supridas. O benefício assistencial não se presta a complementação de renda.
3. Benefício assistencial indevido.
4. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na
sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015. Exigibilidade condicionada à hipótese
prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
5. Apelação da parte autora não provida.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5895754-35.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ANTONIA REGINA DE CAMARGO PEREIRA
Advogados do(a) APELANTE: REGINA DE CASTRO CALIXTO LISBOA - SP280091-N, FABIO
ROBERTO PIOZZI - SP167526-N, EDSON RICARDO PONTES - SP179738-N, GUSTAVO
MARTIN TEIXEIRA PINTO - SP206949-N, CASSIA MARTUCCI MELILLO BERTOZO -
SP211735-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5895754-35.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ANTONIA REGINA DE CAMARGO PEREIRA
Advogados do(a) APELANTE: REGINA DE CASTRO CALIXTO LISBOA - SP280091-N, FABIO
ROBERTO PIOZZI - SP167526-N, EDSON RICARDO PONTES - SP179738-N, GUSTAVO
MARTIN TEIXEIRA PINTO - SP206949-N, CASSIA MARTUCCI MELILLO BERTOZO -
SP211735-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício assistencial de prestação continuada
(LOAS) previsto pelo inciso V do artigo 203 da Constituição Federal à pessoa portadora de
deficiência.
A sentença, prolatada em 31.07.2018, julgou o pedido improcedente nos termos que seguem:
“Ante o exposto, julgo IMPROCEDENTE a ação, condenando a autora ANTONIA REGINA DE
CAMARGO PEREIRA no pagamento das custas, despesas processuais e honorárias
advocatícios, estes no patamar de 10% do valor atribuído à causa, com fundamento no artigo 85,
§ 2º, do Código de Processo Civil, observando-se a gratuidade deferida. Apresentado recurso de
qualquer das partes, intime-se a parte contrária para contrarrazões no prazo legal e,
oportunamente, remetam-se ao Egrégio Tribunal competente. Após o trânsito em julgado da
sentença, expeça-se o necessário, arquivando-se oportunamente. Dê-se ciência ao Ministério
Público. P.I.C.”
Apela a parte autora alegando para tanto que preenche os requisitos necessários para a
concessão do benefício assistencial. Prequestiona, a expressa manifestação a respeito das
normas legais e constitucionais aventadas.
Sem contrarrazões, os autos vieram a este Tribunal.
O Ministério Público Federal opinou pela mantença da sentença monocrática.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5895754-35.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ANTONIA REGINA DE CAMARGO PEREIRA
Advogados do(a) APELANTE: REGINA DE CASTRO CALIXTO LISBOA - SP280091-N, FABIO
ROBERTO PIOZZI - SP167526-N, EDSON RICARDO PONTES - SP179738-N, GUSTAVO
MARTIN TEIXEIRA PINTO - SP206949-N, CASSIA MARTUCCI MELILLO BERTOZO -
SP211735-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei
nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco)
anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a
própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
O artigo 20, § 3º da Lei 8742/93 considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com
deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do
salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).
A constitucionalidade dessa norma foi questionada na ADI 1.232-1/DF, tendo o Plenário do
Supremo Tribunal Federal, por maioria, decidido pela improcedência do pedido, ao fundamento
que a fixação da renda per capita no patamar de ¼ do salário mínimo sugere a presunção
absoluta de pobreza. Concluiu, contudo, que não é a única forma suscetível de se aferir a
situação econômica da família do idoso ou portador de deficiência.
Posteriormente, a Corte Suprema enfrentou novamente a questão no âmbito da Reclamação
4374 - PE que, julgada em 18/04/2013, reconhecendo a inconstitucionalidade parcial, sem
pronúncia de nulidade, do § 3º, art. 20 da Lei 8.742/1993, decorrente de notórias mudanças
fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos
patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais
por parte do Estado brasileiro).
Restou decidido que a norma é inconstitucional naquilo que não disciplinou, não tendo sido
reconhecida a incidência taxativa de qualquer critério para aferição da hipossuficiência, cabendo
ao legislador fixar novos parâmetros e redefinir a política pública do benefício assistencial a fim de
suprimir o vício apontado.
Desta forma, até que o assunto seja disciplinado, é necessário reconhecer que o quadro de
pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em
se tratando de pessoa idosa ou com deficiência, é através da própria natureza de seus males, de
seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades.
Não há como enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar, nem tampouco entender
que aqueles que contam com menos de ¼ do salário-mínimo fazem jus obrigatoriamente ao
benefício assistencial ou que aqueles que tenham renda superior não o façam.
Com relação ao cálculo da renda per capita em si, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de
recurso repetitivo REsp 1.355.052/SP, em conformidade com a decisão proferida pelo Supremo
Tribunal Federal no RE 580.963/PR, definiu que a se aplica, por analogia, a regra do parágrafo
único do artigo 34 do Estatuto do Idoso(Lei 10.741/03), a pedido de benefício assistencial
formulado por pessoa com deficiência, a fim de que qualquer benefício previdenciário recebido
por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado na sua aferição.
Por fim, entende-se por família, para fins de verificação da renda per capita, nos termos do §1º do
artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.435/2011, o conjunto de pessoas
composto pelo requerente, o cônjuge, o companheiro, a companheira, os pais e, na ausência de
um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os
menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
Contudo, em que pese a princípio os filhos casados ou que não coabitam sob o mesmo teto não
integrarem o núcleo familiar para fins de aferição de renda per capita, nos termos da legislação
específica, não se pode perder de vista que o artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece
que o benefício é devido quando o idoso ou deficiente não puder prover o próprio sustento ou tê-
lo provido pela família. Por sua vez, a regra do artigo 229 da Lei Maior dispõe que os filhos
maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, premissa
também assentada nos artigos 1694 a 1697 da lei Civil.
Depreende-se assim que o dever de sustento do Estado é subsidiário, não afastando a obrigação
da família de prestar a assistência, pelo que, como já dito, o artigo 20, § 3º, da LOAS não pode
ser interpretado de forma isolada na apuração da miserabilidade.
Tecidas tais considerações, no caso dos autos a sentença de primeiro grau julgou improcedente o
pedido com base nos elementos contidos no estudo social, tendo se convencido não restar
configurada a condição de hipossuficiência financeira ou miserabilidade necessárias para a
concessão do benefício. Confira-se:
“E quanto ao estudo social, extrai-se que a autora reside em casa própria guarnecida do
necessário. Além disso, as despesas auferidas são pagas por seu esposo, que recebe
aposentadoria no valor de R$1.400,00. Assim, é de se atentar que a renda mensal per capita é
bem superior ao limite de ¼ do salário mínimo estabelecido pelo artigo 20, §3° da Lei 8.742/93 e
os gastos apontados são passíveis de cobertura pela renda auferida. Cumpre ressaltar que o
benefício em questão possui caráter nitidamente assistencial, devendo ser destinado somente
àquele que dele necessita e comprova a necessidade, seja porque não provê de renda familiar
suficiente para suprir as próprias necessidades, ou porque não possui condições de exercer o
labor necessário a sua subsistência. Desse modo, não restou comprovado que a autora vive em
estado de miserabilidade ou é hipossuficiente a ponto de se abster do mínimo necessário a sua
mantença, o que só reitera a não necessidade de auxílio governamental. Ainda que a conclusão
médica seja favorável, não é possível a concessão do benefício, pois a autora não preenche os
requisitos legais conjuntamente analisados.”
De fato, o estudo social (ID 82439568), elaborado em 18.07.2017, revela que a parte autora
reside com Seu esposo, Sr. João, em casa própria, com um quarto, cozinha e banheiro. A casa é
guarnecida com o necessário, mobiliários e eletrodomésticos apresentam bom estado de
conservação.
A renda da casa advém da aposentadoria por invalidez do esposo no valor de R$ 1.893,41 (ID
82439574).
Informaram despesas com gás (R$ 65,00), água (R$ 50,00), luz (R$ 50,00), alimentação (R$
500,00) e remédio (R$350,00), totalizando R$ 1.015,00.
A perita social emitiu parecer favorável, por entender que a requerente vive em situação de
vulnerabilidade econômica.
Entretanto, em que pese a existência de eventuais dificuldades financeiras, não há evidência de
que as necessidades básicas do autor não estejam sendo supridas. Nesse sentido, apura-se que
a família vive em imóvel próprio que oferece o abrigo necessário, e não havendo comprovação da
existência de despesas extraordinárias essências à manutenção da vida do autor, conclui-se, que
as provas trazidas aos autos não foram hábeis à demonstração da impossibilidade de sustento,
como exige o art. 20 da Lei 8.742/1993
Ressalto que o benefício assistencial não se destina a complementar o orçamento doméstico,
mas sim prover aqueles que se encontram em efetivo estado de necessidade.
Verifica-se, assim, que o MM. Juiz sentenciante julgou de acordo com as provas carreadas aos
autos e não comprovada a condição de miserabilidade, pressuposto indispensável para a
concessão do benefício, de rigor a manutenção da sentença de improcedência do pedido por
seus próprios fundamentos.
Considerando o não provimento do recurso, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do
CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de
advogado arbitrados na sentença em 2%, devendo ser observada, se for o caso, a suspensão da
exigibilidade prevista no § 3º do artigo 98 daquele Codex.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação da parte autora e, com fulcro no §11º do artigo
85 do Código de Processo Civil, majoro os honorários de advogado em 2% sobre o valor
arbitrado na sentença, nos termos da fundamentação exposta.
É o voto.
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. HIPOSSUFICIÊNCIA/MISERABILIDADE NÃO
DEMONSTRADA. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
1. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da
Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco)
anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a
própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da
Lei nº 8.742/93.
2. Requisito de miserabilidade/hipossuficiência não preenchido. Laudo social indica que a parte
autora encontra-se amparada pela família e não há evidência de que suas necessidades básicas
não estejam sendo supridas. O benefício assistencial não se presta a complementação de renda.
3. Benefício assistencial indevido.
4. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na
sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015. Exigibilidade condicionada à hipótese
prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
5. Apelação da parte autora não provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu NEGAR PROVIMENTO à apelação da parte autora, nos termos do relatório
e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
