Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0005221-28.2013.4.03.6130
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
30/11/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 03/12/2020
Ementa
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. HIPOSSUFICIÊNCIA/MISERABILIDADE NÃO
DEMONSTRADA. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
1. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da
Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco)
anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a
própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da
Lei nº 8.742/93.
2. Requisito de miserabilidade/hipossuficiência não preenchido. Laudo social indica que a parte
autora encontra-se amparada pela família e não há evidência de que suas necessidades básicas
não estejam sendo supridas. O benefício assistencial não se presta a complementação de renda.
3. Benefício assistencial indevido.
4. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na
sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015. Exigibilidade condicionada à hipótese
prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
5. Apelação da parte autora não provida.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0005221-28.2013.4.03.6130
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: WILIAN MILLER DE PAULA, MARIA HELENA DE PAULA
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDA DA SILVEIRA RIVA VILLAS BOAS - SP184680-A
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDA DA SILVEIRA RIVA VILLAS BOAS - SP184680-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
ASSISTENTE: MARIA HELENA DE PAULA
ADVOGADO do(a) ASSISTENTE: FERNANDA DA SILVEIRA RIVA VILLAS BOAS - SP184680-A
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0005221-28.2013.4.03.6130
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: WILIAN MILLER DE PAULA, MARIA HELENA DE PAULA
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDA DA SILVEIRA RIVA VILLAS BOAS - SP184680-A
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R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício assistencial de prestação continuada
(LOAS) previsto pelo inciso V do artigo 203 da Constituição Federal à pessoa portadora de
deficiência.
A sentença, prolatada em 07.01.2019, julgou o pedido improcedente nos termos que seguem:
"Ante o exposto, julgo IMPROCEDENTES os pedidos formulados pelo autor, com resolução de
mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Condeno, ainda, a parte
autora ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor
da causa, de acordo com o art. 85, §20 do CPC; condenação esta suspensa na, forma do art. 98,
§ 30, do CPC. Custas ex lege. Oportunamente, remeta -se os autos o arquivo com baixa na
distribuição. Publique-se. Registre-se. Intime-se."
Apela a parte autora alegando para tanto que preenche os requisitos necessários para a
concessão do benefício assistencial. Prequestiona, a expressa manifestação a respeito das
normas legais e constitucionais aventadas.
Sem contrarrazões, os autos vieram a este Tribunal.
O Ministério Público Federal opinou pelo provimento do recurso da parte autora.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0005221-28.2013.4.03.6130
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: WILIAN MILLER DE PAULA, MARIA HELENA DE PAULA
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDA DA SILVEIRA RIVA VILLAS BOAS - SP184680-A
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDA DA SILVEIRA RIVA VILLAS BOAS - SP184680-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
ASSISTENTE: MARIA HELENA DE PAULA
ADVOGADO do(a) ASSISTENTE: FERNANDA DA SILVEIRA RIVA VILLAS BOAS - SP184680-A
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei
nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco)
anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a
própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
O artigo 20, § 3º da Lei 8742/93 considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com
deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do
salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).
A constitucionalidade dessa norma foi questionada na ADI 1.232-1/DF, tendo o Plenário do
Supremo Tribunal Federal, por maioria, decidido pela improcedência do pedido, ao fundamento
que a fixação da renda per capita no patamar de ¼ do salário mínimo sugere a presunção
absoluta de pobreza. Concluiu, contudo, que não é a única forma suscetível de se aferir a
situação econômica da família do idoso ou portador de deficiência.
Posteriormente, a Corte Suprema enfrentou novamente a questão no âmbito da Reclamação
4374 - PE que, julgada em 18/04/2013, reconhecendo a inconstitucionalidade parcial, sem
pronúncia de nulidade, do § 3º, art. 20 da Lei 8.742/1993, decorrente de notórias mudanças
fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos
patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais
por parte do Estado brasileiro).
Restou decidido que a norma é inconstitucional naquilo que não disciplinou, não tendo sido
reconhecida a incidência taxativa de qualquer critério para aferição da hipossuficiência, cabendo
ao legislador fixar novos parâmetros e redefinir a política pública do benefício assistencial a fim de
suprimir o vício apontado.
Desta forma, até que o assunto seja disciplinado, é necessário reconhecer que o quadro de
pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em
se tratando de pessoa idosa ou com deficiência, é através da própria natureza de seus males, de
seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades.
Não há como enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar, nem tampouco entender
que aqueles que contam com menos de ¼ do salário-mínimo fazem jus obrigatoriamente ao
benefício assistencial ou que aqueles que tenham renda superior não o façam.
Com relação ao cálculo da renda per capita em si, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de
recurso repetitivo REsp 1.355.052/SP, em conformidade com a decisão proferida pelo Supremo
Tribunal Federal no RE 580.963/PR, definiu que a se aplica, por analogia, a regra do parágrafo
único do artigo 34 do Estatuto do Idos0 (Lei 10.741/03), a pedido de benefício assistencial
formulado por pessoa com deficiência, a fim de que qualquer benefício previdenciário recebido
por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado na sua aferição.
Por fim, entende-se por família, para fins de verificação da renda per capita, nos termos do §1º do
artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.435/2011, o conjunto de pessoas
composto pelo requerente, o cônjuge, o companheiro, a companheira, os pais e, na ausência de
um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os
menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
Contudo, em que pese a princípio os filhos casados ou que não coabitam sob o mesmo teto não
integrarem o núcleo familiar para fins de aferição de renda per capita, nos termos da legislação
específica, não se pode perder de vista que o artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece
que o benefício é devido quando o idoso ou deficiente não puder prover o próprio sustento ou tê-
lo provido pela família. Por sua vez, a regra do artigo 229 da Lei Maior dispõe que os filhos
maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, premissa
também assentada nos artigos 1694 a 1697 da lei Civil.
Depreende-se assim que o dever de sustento do Estado é subsidiário, não afastando a obrigação
da família de prestar a assistência, pelo que, como já dito, o artigo 20, § 3º, da LOAS não pode
ser interpretado de forma isolada na apuração da miserabilidade.
Tecidas tais considerações, no caso dos autos a sentença de primeiro grau julgou improcedente o
pedido com base nos elementos contidos no estudo social, tendo se convencido não restar
configurada a condição de hipossuficiência financeira ou miserabilidade necessárias para a
concessão do benefício. Confira-se:
“Não se encontra, porém, preenchido o requisito da miserabilidade. Como se pode aferir do
parecer social, as necessidades vitais da parte autora são suportadas por seus familiares,
notadamente por sua genitora; a qual tem sido capaz de garantir suas necessidades básicas no
que se refere à saúde, alimentação e moradia. Apesar de não haver provas de que receba ajuda
efetiva dos parentes com quem reside, não foram verificadas más condições de existência. Não
se constataram indícios de que ele sofresse qualquer tipo de privação - fís. 239/251. Ademais, a
mãe (curadora) da parte autora é beneficiária do INSS, vindo, a receber aposentadoria NB
158.665.737-0, e bolsa família NB 212.162.6 8322-1 (fl. 241). Insta observar a parte autora não se
desincumbiu de comprovar que na época da cessação do benefício vivia em condição de
miserabilidade. Conforme a parte autora relata na inicial (fl. 06), em 2008 convivia com sua
genitora (Maria Helena, também curadora), a irmã e três sobrinhos. Cumpre observar que,
consoante se extrai dos autos, os genitores de seus três, sobrinhos, a despeito de haverem
reconhecido a paternidade dos menores, não pagam pensão alimentícia aos filhos. É cediço que
é dever dos pais arcarem com o sustento dos filhos, sendo certo que os menores não são
dependentes do autor, mas de é sua irmã que, reside juntamente na mesma residência familiar;
não se podendo transferir este Ônus (por via transversa) ao Estado mediante o pagamento de
benefício assistencial a ser pago a pessoa deficiente. Assim sendo, em razão destas
circunstâncias fáticas, acolho o laudo pericial socioeconômico que atestou a ausência de
hipossuficiência do autor (fl. 243) e, por conseguinte, deixo de acolher os pedidos formulados pelo
autor.”
De fato, o estudo social (ID 106244002 – pág. 135/146), realizado em 28.11.2017, revela que a
parte autora reside com sua mãe, Sra. ,aria Helena, 67 anos, aposentada, sua irmã, Helenice
Miler, 37 anos, diarista, e quatro sobrinhos, Rafael, 17 anos, , Felipe, 11 anos, Maria Eduarda, 5
anos e Bruma de Paula, 20 anos, em imóvel alugado, de alvenaria, com laje localizada no piso
térreo composta por: Garagem, dois quartos, sala/cozinha conjugados, banheiro e área de serviço
externa, nos dormitórios o piso é em madeira, nos demais cômodos em cerâmico. 0 estado geral
da moradia é bom. No mesmo terreno existem três outras edificações duas delas no piso inferior
a outra no andar superior. Os bens móveis estão em bom estado de uso. Os eletrodomésticos
são: fogão, geladeira, televisor e máquina de lavar em bom estado de conservação, já o micro-
ondas, tanquinho e um dos televisores avariados. A moradia fica localizada na periferia do
Município, porém com infraestrutura adequada, rua é pavimentada, com guias, sarjetas e conta
com iluminação pública. Possui serviço de energia elétrica, abastecimento de água e coleta de
lixo. 0 bairro é beneficiado por: Creche, Escola, UBS, Transporte Coletivo e diversificado
Comércio local.
A renda da casa advém da aposentadoria da mãe do autor no valor de R$ 937,00, Bolsa Família
no valor de R$ 209,00 e do trabalho de diarista da mãe e da irmã no valor de R$ 350,00,
totalizando R$ 1.496,00.
Informaram despesas com Aluguel R$ 700,00; Luz R$ 137,69; Agua R$ 47,66; Crédito no Celular
R$ 10,00; Fralda Descartável R$ 36,00; Gás R$ 60,00; Alimentação/Higiene/Limpeza R$ 360,00,
totalizando R$ 1.351,35. Recebem mensalmente uma cesta básica da Prefeitura.
A perita social emitiu parecer, conforme ora transcrevo:
“Segundo a irmã o sustento e manutenção do lar são mantidos através da aposentadoria da mãe
com valor declarado de R$ 937,00, por meio do valor declarado de R$ 209,00, referente à Bolsa
Família, complementam a renda a importância de declarados R$ 150,00 + R$ 200,00 relativos
aos trabalhos informais da mãe que (sic) é passadeira e dela que é diarista uma vez ao mês,
totalizando a receita mensal em R$ 1.496,00, frente ao que foi declarado não foi diagnosticado
divergência entre rendimentos e gastos mensais. Saliento que não identifiquei qualquer evidencia
de que o autor sofra algum tipo de privação quanto a alimentos e demais materiais essenciais à
sobrevivência, o que se percebe é a desestrutura familiar três dos sobrinhos, filhos de sua irmã
são frutos de diferentes relacionamentos e segundo ela nenhum dos pais fornece ajuda financeira
ou material já a sobrinha de vinte anos está grávida de oito meses não trabalha e não tem
relacionamento afetivo com o pai de seu filho, quanto a ela (irmã) poderia estar inserida no
mercado de trabalho formal, cursou o ensino médio, porém está inativa há cinco anos,
trabalhando apenas uma vez ao mês como diarista.”
Depreende-se da leitura do estudo social que, apesar de não se negar a existência de
dificuldades financeiras, não há indícios de que as necessidades básicas da parte autora não
estejam sendo supridas. Nesse sentido, nota-se a ausência de informação acerca de gastos
extraordinários com alimentação especial ou tratamento médico.
Consta ainda que o grupo conta com elementos jovens e aptos ao trabalho.
Ressalto que o benefício assistencial não se destina a complementar o orçamento doméstico,
mas sim prover aqueles que se encontram em efetivo estado de necessidade.
Verifica-se, assim, que o MM. Juiz sentenciante julgou de acordo com as provas carreadas aos
autos e não comprovada a condição de miserabilidade, pressuposto indispensável para a
concessão do benefício, de rigor a manutenção da sentença de improcedência do pedido por
seus próprios fundamentos.
Considerando o não provimento do recurso, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do
CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de
advogado arbitrados na sentença em 2%, devendo ser observada, se for o caso, a suspensão da
exigibilidade prevista no § 3º do artigo 98 daquele Codex.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação da parte autora e, com fulcro no §11º do artigo
85 do Código de Processo Civil, majoro os honorários de advogado em 2% sobre o valor
arbitrado na sentença, nos termos da fundamentação exposta.
É o voto.
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. HIPOSSUFICIÊNCIA/MISERABILIDADE NÃO
DEMONSTRADA. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
1. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da
Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco)
anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a
própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da
Lei nº 8.742/93.
2. Requisito de miserabilidade/hipossuficiência não preenchido. Laudo social indica que a parte
autora encontra-se amparada pela família e não há evidência de que suas necessidades básicas
não estejam sendo supridas. O benefício assistencial não se presta a complementação de renda.
3. Benefício assistencial indevido.
4. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na
sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015. Exigibilidade condicionada à hipótese
prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
5. Apelação da parte autora não provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu NEGAR PROVIMENTO à apelação da parte autora, nos termos do relatório
e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
