
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004183-04.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ELISETE CAMARGO DE BARROS
Advogado do(a) APELANTE: JOSE BRUN JUNIOR - SP128366
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004183-04.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ELISETE CAMARGO DE BARROS
Advogado do(a) APELANTE: JOSE BRUN JUNIOR - SP128366-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício assistencial de prestação continuada (LOAS) previsto pelo inciso V do artigo 203 da Constituição Federal à pessoa portadora de deficiência.
A sentença, prolatada em 26.10.2018, julgou o pedido improcedente nos termos que seguem: "Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, inc. 1, do Código de Processo Civil. Diante da sucumbência, arcará a parte demandante com custas e despesas processuais, bem como honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, § 2°, do CPC, atualizado de acordo com a Tabela Prática do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Observados os benefícios da gratuidade da justiça, conforme disposto no artigo 98, do o Código de Processo Civil. Nos termos da Resolução n° 305, de 07 de outubro de 2014, do Conselho da Justiça Federal (tabela V), atendendo ao grau de especialização do perito, a complexidade dos exames e, sobretudo, ao local de suas realizações, fixo os honorários em R$ 200,00 (duzentos reais). EXPEÇAM-SE ofícios requisitórios em prol dos peritos, instruindo-os com as cópias necessárias. Após o trânsito em julgado, nada sendo requerido pelos litigantes, com os registros devidos, independentemente de nova conclusão, arquivem-se os autos, com as cautelas legais, observadas as NSCGJ/SP. P.I.C. "
Apela a parte autora alegando para tanto que preenche os requisitos necessários para a concessão do benefício assistencial.
Sem contrarrazões, os autos vieram a este Tribunal.
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso da parte autora.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004183-04.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ELISETE CAMARGO DE BARROS
Advogado do(a) APELANTE: JOSE BRUN JUNIOR - SP128366-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
O artigo 20, § 3º da Lei 8742/93 considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).
A constitucionalidade dessa norma foi questionada na ADI 1.232-1/DF, tendo o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por maioria, decidido pela improcedência do pedido, ao fundamento que a fixação da renda per capita no patamar de ¼ do salário mínimo sugere a presunção absoluta de pobreza. Concluiu, contudo, que não é a única forma suscetível de se aferir a situação econômica da família do idoso ou portador de deficiência.
Posteriormente, a Corte Suprema enfrentou novamente a questão no âmbito da Reclamação 4374 - PE que, julgada em 18/04/2013, reconhecendo a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º, art. 20 da Lei 8.742/1993, decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).
Restou decidido que a norma é inconstitucional naquilo que não disciplinou, não tendo sido reconhecida a incidência taxativa de qualquer critério para aferição da hipossuficiência, cabendo ao legislador fixar novos parâmetros e redefinir a política pública do benefício assistencial a fim de suprimir o vício apontado.
Desta forma, até que o assunto seja disciplinado, é necessário reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência, é através da própria natureza de seus males, de seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades.
Não há como enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar, nem tampouco entender que aqueles que contam com menos de ¼ do salário-mínimo fazem jus obrigatoriamente ao benefício assistencial ou que aqueles que tenham renda superior não o façam.
Com relação ao cálculo da renda per capita em si, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo REsp 1.355.052/SP, em conformidade com a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no RE 580.963/PR, definiu que a se aplica, por analogia, a regra do parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idos0 (Lei 10.741/03), a pedido de benefício assistencial formulado por pessoa com deficiência, a fim de que qualquer benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado na sua aferição.
Por fim, entende-se por família, para fins de verificação da renda per capita, nos termos do §1º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.435/2011, o conjunto de pessoas composto pelo requerente, o cônjuge, o companheiro, a companheira, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
Contudo, em que pese a princípio os filhos casados ou que não coabitam sob o mesmo teto não integrarem o núcleo familiar para fins de aferição de renda per capita, nos termos da legislação específica, não se pode perder de vista que o artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece que o benefício é devido quando o idoso ou deficiente não puder prover o próprio sustento ou tê-lo provido pela família. Por sua vez, a regra do artigo 229 da Lei Maior dispõe que os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, premissa também assentada nos artigos 1694 a 1697 da lei Civil.
Depreende-se assim que o dever de sustento do Estado é subsidiário, não afastando a obrigação da família de prestar a assistência, pelo que, como já dito, o artigo 20, § 3º, da LOAS não pode ser interpretado de forma isolada na apuração da miserabilidade.
Tecidas tais considerações, no caso dos autos a sentença de primeiro grau julgou improcedente o pedido com base nos elementos contidos no estudo social, tendo se convencido não restar configurada a condição de hipossuficiência financeira ou miserabilidade necessárias para a concessão do benefício. Confira-se:
“Entretanto, o estudo social de fis. 161 concluiu que: "a renda per capita familiar é de R$ 480,00 superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo, requisito que desqualifica a requerente para a concessão do benefício". Aplicando -se, pois, as exigências legais ao caso concreto, depreende-se que a parte autora não preenche os requisitos para a concessão do benefício, sendo de rigor a improcedência do pedido.”
De fato, o estudo social (ID 87570661 – pág. 158/163), elaborado em 05.05.2018, revela que: “A requerente reside juntamente com seu esposo em casa própria no centro da cidade Coronel Macedo/SP, tendo à disposição os seguintes serviços públicos e privados: pavimentação e calçadas, luz elétrica, internet, abastecimento de água, tratamento de esgoto, -coleta de lixo, correios, bancos, centro de saúde, escola, creche, posto de saúde, CRAS, praça pública, área de lazer, área poliesportiva farmácia, mercado, padaria e demais comércios. A casa possui 2 quartos, 1 sala, 1 cozinha, 1 banheiro, área de serviço, quintal e garagem. A residência é construída de alvenaria, possui telhado de cerâmica, foro de PVC, piso de cerâmica, paredes com a pintura já um pouco gasta, portas e janelas simples, sem sinais de reparos ou reformas recentes, oferecendo à requerente e sua família boas condições de habitação. Os pertences encontrados na residência são: .1 sofá de canto com 5 lugares, 1 estante, 1 geladeira, 1 fogão, 1 armário de cozinha, 1 micro-ondas, 1 aparelho de- celular (modelo antigo, total - funcionalidade através de botões), i mesa com 4 caleiras, 2 camas de casal, 1 guarda roupa 4 portas, 1 TV 32" tela fina, 1 aparelho de DVD, 1 ventilador, 1 colchão de casal, 1 bicicleta, 1 máquina de lavar e centrifugar e 1 aparelho de som que segundo a requerente está quebrado. Os pertences relatados não aparentam serem de alto valor e estão, em sua maioria, em bom estado de conservação. A requerente e sua família possuem 1 automóvel da marca GOL de cor preta flex ano 2009 em bom estado. ”
A renda da casa advém da remuneração do esposo, Sr. Levino Aparecido de Barros, trabalhador rural, aproximadamente R$ 960,00 mensais.
Informaram despesas com água R$ 44,77, energia elétrica R$ 63,04, farmácia R$ 250,00, alimentação/limpeza/higiene R$ 400,00, gás R$ 75,00, IPTU R$ 54,70 e combustível R$ 100,00, totalizando R$ 987,51.
Em que pese a existência de eventuais dificuldades financeiras, não há evidência de que as necessidades básicas do autor não estejam sendo supridas. Nesse sentido, apura-se que a família vive em imóvel próprio que oferece o abrigo necessário, e não havendo comprovação da existência de despesas extraordinárias essências à manutenção da vida do autor, conclui-se, que as provas trazidas aos autos não foram hábeis à demonstração da impossibilidade de sustento, como exige o art. 20 da Lei 8.742/1993
Ressalto que o benefício assistencial não se destina a complementar o orçamento doméstico, mas sim prover aqueles que se encontram em efetivo estado de necessidade.
Verifica-se, assim, que o MM. Juiz sentenciante julgou de acordo com as provas carreadas aos autos e não comprovada a condição de miserabilidade, pressuposto indispensável para a concessão do benefício, de rigor a manutenção da sentença de improcedência do pedido por seus próprios fundamentos.
Considerando o não provimento do recurso, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de advogado arbitrados na sentença em 2%, devendo ser observada, se for o caso, a suspensão da exigibilidade prevista no § 3º do artigo 98 daquele Codex.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação da parte autora e, com fulcro no §11º do artigo 85 do Código de Processo Civil, majoro os honorários de advogado em 2% sobre o valor arbitrado na sentença, nos termos da fundamentação exposta.
É o voto.
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. HIPOSSUFICIÊNCIA/MISERABILIDADE NÃO DEMONSTRADA. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
1. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.
2. Requisito de miserabilidade/hipossuficiência não preenchido. Laudo social indica que a parte autora encontra-se amparada pela família e não há evidência de que suas necessidades básicas não estejam sendo supridas. O benefício assistencial não se presta a complementação de renda.
3. Benefício assistencial indevido.
4. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015. Exigibilidade condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
5. Apelação da parte autora não provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a ilustre representante do Ministério Público Federal retificou o parecer proferido para requerer tão somente seja dado seguimento ao feito, sem se considerar como contrária a posição ministerial. A Sétima Turma, por unanimidade, decidiu NEGAR PROVIMENTO à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
